domingo, dezembro 31, 2023

TOP 20 2023 E O BALANÇO DO ANO




1. TÁR, de Todd Field
2. OS BANSHEES DE INISHERIN, de Martin McDonagh
3. A CIDADE DOS ABISMOS, de Priscyla Bettim e Renato Coelho
4. JOHN WICK 4 – BABA YAGA, de Chad Stahelski




5. CAPITU E O CAPÍTULO, de Júlio Bressane
6. ASTEROID CITY, de Wes Anderson
7. MISSÃO: IMPOSSÍVEL – ACERTO DE CONTAS – PARTE UM, de Christopher McQuarrie
8. NOSSO SONHO, de Eduardo Albergaria




9. OS DELINQUENTES, de Rodrigo Moreno
10. AS BESTAS, de Rodrigo Sorogoyen
11. ASSASSINOS DA LUA DAS FLORES, de Martin Scorsese
12. RETRATOS FANTASMAS, de Kleber Mendonça Filho





13. O ASSASSINO, de David Fincher
14. ANATOMIA DE UMA QUEDA, de Justine Triet
15. CRÔNICA DE UMA RELAÇÃO PASSAGEIRA, de Emmanuel Mouret
16. GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3, de James Gunn




17. A PRAGA, de José Mojica Marins
18. LOBO E CÃO, de Cláudia Varejão
19. AFIRE, de Christian Petzold
20. FOLHAS DE OUTONO, de Aki Kaurismäki 

Menções honrosas

21. O SEQUESTRO DO VOO 375, de Marcus Baldini
22. BABILÔNIA, de Damien Chazelle
23. ARMAGEDDON TIME, de James Gray
24. BATEM À PORTA, de M. Night Shyamalan
25. MEDUSA, de Anita Rocha da Silveira
26. O CONTADOR DE CARTAS, de Paul Schrader
27. FALE COMIGO, de Danny e Michael Philippou
28. MARINHEIRO DAS MONTANHAS, de Karim Aïnouz
29. PRISCILLA, de Sofia Coppola
30. NOITES DE PARIS, de Mikhaël Hers

2023 foi um ano muito bom para mim. Um reencontro muito especial me trouxe fôlego novo, uma nova esperança de um futuro com “a paz de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida”, como diz a canção. É verdade que não tenho mais o vigor físico de quando estava na casa dos vinte e talvez por isso eu tenha achado o ano um pouco cansativo, talvez por causa da mudança de rotina no trabalho, com mais desafios. Mas os desafios trouxeram mais tempero e graça. Ou seja, tudo foi bom, no fim das contas. Não vi tantos filmes nem li tantos livros ou HQs quanto gostaria, mas o que eu vi/li já foi muito bom para os padrões de alguém da classe trabalhadora – vou tentar ler pelo menos um romance de alta literatura em 2024. Quanto às peregrinações, ainda nem consegui terminar a de Brian De Palma, mas pelo menos já ensaiei a do próximo ano, que será de Samuel Fuller. Também pude conhecer muitas pérolas que me deixaram bem empolgado. O melhor do cinema geralmente não está na sala de cinema, é verdade. 

Uma coisa que passamos a nos importar muito quando aprendemos a amar o cinema é valorizar a memória e os cineastas detentores de talento, da entrega e de uma sabedoria acumulada ao longo dos anos. Da lista dos cineastas que aparecem neste top 20, temos três artistas surgidos na década de 1960, sendo que dois deles são brasileiros. E esses brasileiros, José Mojica Marins e Júlio Bressane, são quase opostos. Mojica é mais primitivo, mais brutal, e é quase um milagre que um filme como A PRAGA tenha reaparecido em tão belo estado, como se saído de um túnel do tempo, como se fôssemos parar na virada para os anos 1980. Enquanto isso, o intelectual Bressane parece ser um senhor do tempo, ao adaptar Dom Casmurro à sua maneira no incrível CAPITU E O CAPÍTULO, filme que valoriza cada palavra dita, trazendo o sabor da palavra falada para nossos ouvidos, enquanto também nos deliciamos com as imagens. Quando esses dois filmes estavam em cartaz simultaneamente, eu sentia que estava acontecendo algum tipo de conjunção astral singular.

Já o outro cineasta surgido na década de ouro do século da contracultura é Martin Scorsese, que, contrariando o tempo implacável, segue fazendo filmes ainda maiores, mais ambiciosos, mais desejosos de explicitar a presença do mal (do pecado?) como elemento de construção da civilização americana. ASSASSINOS DA LUA DAS FLORES é mais uma pedra fundamental nesta crônica de um país doente. Por esse olhar para o aspecto mais venenoso da alma humana, ter Scorsese conosco é essencial para nosso crescimento.

Enquanto isso, cineastas de outras gerações tratam de suas próprias obsessões em suas filmografias. É o caso de Wes Anderson, que se mostra em ASTEROID CITY como alguém que ameaça revelar seus mais profundos sentimentos, geralmente escondidos no interesse desmedido pela simetria perfeita e pela dramaturgia estranha. Seu contemporâneo, David Fincher, também um homem preocupado com a forma, faz em O ASSASSINO um filme sobre alguém com excesso de preocupações com a perfeição. Christian Petzold, por outro lado, nos faz pensar em seu próprio eu jovem, ao nos apresentar a um personagem tão pretensioso quanto equivocado em AFIRE. Já Emmanuel Mouret, que se tornou um dos mais queridos da casa nos últimos anos, segue com sua proposta de apresentar o amor romântico rodeado por obstáculos vindos principalmente das inseguranças no belo e divertido CRÔNICA DE UMA RELAÇÃO PASSAGEIRA.

Falando em obstáculos e inseguranças, tivemos também duas obras queer que podem ter passado desapercebidas por muitos. O português LOBO E CÃO é um filme sobre amadurecimento juvenil e necessidade de ousar numa comunidade bastante conservadora. Enquanto o brasileiro A CIDADE DOS ABISMOS é um convite a adentrarmos a noite, e isso me é muito atraente. Além do mais, é um filme sobre solidão e amizade.

Falando em amizade, muito provavelmente por ter perdido um grande amigo durante a pandemia, esse tema se tornou um bocado delicado para mim. Em OS BANSHEES DE INISHERIN, temos a brusca decisão de um dos amigos de encerrar definitivamente a relação de vários anos com o outro. E isso me foi muito doloroso, por mais que o filme também tenha seu aspecto simbólico relacionado à guerra. Ainda por cima, o trabalho de Martin McDonagh opta por caminhos tortuosos e surreais. Já NOSSO SONHO, que aparentemente seria apenas mais uma cinebiografia de uma dupla de artistas brasileiros, me pegou de surpresa com sua história de mistério, amizade e conflitos familiares, em especial com o pai. Que é outro ponto sensível de minha história pessoal de vida. Mas trata-se de um filme do bem, definitivamente. E quem também fala de família (família não-sanguínea) e emociona muito é GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 3, aquele ponto fora da curva no atual momento decadente dos filmes de super-heróis. James Gunn fez um filme com muito coração.

Em se tratando de filmes com rigor formal magnífico, o ano contou com pelo menos dois exemplares extraordinários. JOHN WICK 4 – BABA YAGA é uma obra tão bonita em sua plasticidade, na condução das coreografias e na própria ambição de ser um grande épico sobre a luta de um homem, que é difícil não vê-lo como se não estivéssemos contemplando arte elevada. O mesmo pode ser dito de TÁR, possivelmente a obra máxima de Todd Field, sobre uma grande maestrina vivendo um momento de crise. Tudo no filme é monumental, da atuação de Cate Blanchett às longas primeiras sequências, passando pelos ângulos de câmera menos óbvios e o aprofundamento nos abismos da heroína, em seu temor de estar perdendo a capacidade de conduzir a vida.

No terreno dos filmes de gênero, tivemos o eletrizante MISSÃO: IMPOSSÍVEL – ACERTO DE CONTAS – PARTE UM, perfeito em tudo que apresenta. O esforço e o sorriso de Tom Cruise costumam andar lado a lado em suas produções, mas nunca vi algo como este aqui antes. Ou talvez tenha visto há muito tempo. No território do suspense que deixa o coração batendo mais forte e uma sensação de impotência, tivemos AS BESTAS, de Rodrigo Sorogoyen. Um grande filme que precisa ser mais visto e comentado, especialmente quando entrar em circuito comercial.

Na linha mais arthouse, mas também tratando de crimes, tivemos o ambicioso argentino OS DELINQUENTES, que começa como um heist movie para depois ir se transformando noutra coisa: uma história de amor com dupla face. Já o vencedor de Cannes ANATOMIA DE UMA QUEDA é tão impressionante no modo como faz com que não acreditemos nem mesmo na heroína, que gera algum tipo de paranoia no espectador. Quem também voltou aos holofotes com força foi Aki Kaurismäki, com sua bela história de amor sobre gente sofrida da classe trabalhadora. FOLHAS DE OUTONO tem encantado muito gente. 

Correndo por fora, Kleber Mendonça Filho nos presenteou com um documentário sobre sua relação com os cinemas de rua do Recife, não sem antes deixar muito claro que se trata de algo muito pessoal, nos convidando para entrarmos em sua própria casa, espaço carregado de muitas memórias. RETRATOS FANTASMAS é um verdadeiro deleite para os cinéfilos.

Top 5 – Piores do Ano (ou aquela seção da retrospectiva que sempre penso em deixar de lado)

1. O EXORCISTA – O DEVOTO
2. AS MARVELS
3. A FREIRA 2
4. CREED III
5. SHAZAM! FÚRIA DOS DEUSES

Top 5 – Musas do Ano



Já faz um tempo que quase todo ano Margot Robbie aparece nesta seção. Além de brilhar no filme mais bem-sucedido do ano, BARBIE, ela ainda abrilhantou o deliciosamente aloucado BABILÔNIA e apareceu numa cena linda de ASTEROID CITY. A canceriana Margot é um encanto e por isso a frase da narradora Helen Mirren quando ela se diz feia em BARBIE representa muito.



A sagitariana de sobrenome complicado Adèle Exarchopoulos segue a linha de filmes para o circuito alternativo, mas com um leve apelo comercial. Ela brilha em OS CINCO DIABOS e PASSAGENS, dois filmes muito distintos, mas que curiosamente podem ser classificados como cinema queer. Tudo indica que Adèle é uma jovem ativista política.



A libriana de sardas no rosto Rebecca Ferguson talvez tenha começado a chamar a atenção e a ser amada pelo grande público pela sua primeira participação na franquia Missão: Impossível. Neste ano, sua presença valiosa em MISSÃO: IMPOSSÍVEL – ACERTO DE CONTAS: PARTE UM reacendeu essa chama.



Outra libriana, Tessa Thompson, apareceu em dois filmes ruins, CREED III e numa cena "piscou-perdeu" de AS MARVELS. Mas é só ela aparecer que essas produções ganham em interesse. A atriz só precisa de um agente melhor, pois carisma, beleza e talento ela tem de sobra.



Nossa querida Sophie Charlotte, taurina, nascida na Alemanha, mas brasileira sim senhor, agora é atriz internacional, dada sua pequena participação em O ASSASSINO. Mas seus dois filmes mais importantes do ponto de vista de sua performance são brasileiros: O RIO DO DESEJO e MEU NOME É GAL, duas obras que acentuam sua versatilidade.

Clássicos revisitados ou vistos pela primeira vez no cinema

A PAIXÃO DE JOANA D’ARC / O MARTÍRIO DE JOANA D’ARC, de Carl Theodor Dreyer
A PEQUENA VENDEDORA DE SOL, de Djibril Diop Mambéty
A RAINHA DIABA, de Antonio Carlos da Fontoura
CÂMERA DA ÁFRICA, de Férid Boughedir
CARTA DA SIBÉRIA, de Chris Marker
CEDDO, de Ousmane Sembène
DOMINGO DESPERDIÇADO, de Drahomíra Vihanová
LE FRANC, de Djibril Diop Mambéty
MANDABI, de Ousmane Sembène
MOOLAADÉ, de Ousmane Sembène
O DEMÔNIO DAS ONZE HORAS, de Jean-Luc Godard
OLDBOY, de Park Chan-wook
OS GUARDA-CHUVAS DO AMOR, de Jacques Demy
SHORTBUS, de John Cameron Mitchell

Top 20 – Não-lançamentos vistos na telinha pela primeira vez

À PROCURA DE MR. GOODBAR, de Richard Brooks
A CURA, de Kiyoshi Kurosawa
A METAMORFOSE DOS PÁSSAROS, de Catarina Vasconcelos
A MORTE DE UM BOOKMAKER CHINÊS, de John Cassavetes
A SANGUE FRIO, de Richard Brooks
ANJO OU DEMÔNIO?, de Otto Preminger
A RAPOSA CINZENTA, de Phillip Borsos
AS DUAS FACES DA FELICIDADE, de Agnès Varda
CONTRASTES HUMANOS, de Preston Sturges
ENTRE DEUS E O PECADO, de Richard Brooks
MORTE AO VIVO, de Alejandro Amenábar
NUVENS FLUTUANTES, de Mikio Naruse
O PRANTO DE UM ÍDOLO, de Lindsay Anderson
OS COMPANHEIROS, de Mario Monicelli
OS NOVOS CENTURIÕES, de Richard Fleischer
PÂNICO AO ANOITECER, de Charles B. Pierce
PARCEIROS DA NOITE, de William Friedkin
PELOS CAMINHOS DO INFERNO, de Ted Kotcheff
UMA VEZ MAIS, de Paul Vecchiali
VIVER, de Akira Kurosawa

Revisões na Telinha

A MALDIÇÃO DE FRANKENSTEIN, de Terence Fisher
A MORTE NUM BEIJO, de Robert Aldrich
AUDIÇÃO, de Takashi Miike
CADA UM VIVE COMO QUER, de Bob Rafelson
DÁLIA NEGRA, de Brian De Palma
EU MATEI JESSE JAMES, de Samuel Fuller
FEMME FATALE, de Brian De Palma
GATA EM TETO DE ZINCO QUENTE, de Richard Brooks
GUERRA SEM CORTES, de Brian De Palma
MISSÃO: IMPOSSÍVEL, de Brian De Palma
MISSÃO: MARTE, de Brian De Palma
O EXORCISTA, de William Friedkin
O PAGAMENTO FINAL, de Brian De Palma
O PASSAGEIRO – PROFISSÃO: REPÓRTER, de Michelangelo Antonioni
O PÁSSARO SANGRENTO, de Michele Soavi
OLHOS DE SERPENTE, de Brian De Palma
VAMPIROS DE ALMAS, de Don Siegel

As séries e minisséries
(Quase não vi, é verdade, mas só pra não perder o costume mantenho a seção)

1. SERVANT – QUARTA TEMPORADA
2. AMOR & MORTE
3. LOKI – SEGUNDA TEMPORADA
4. BLACK MIRROR – SEXTA TEMPORADA
5. A QUEDA DA CASA DE USHER

Feliz Ano Novo!

Que o próximo ano seja de mais prosperidade, mais saúde, mais paz, mais amor e mais sabedoria de nossa parte para tomarmos as melhores decisões. Espero poder dar continuidade a esse trabalho no blog, por mais complicado que tenha se tornado nos últimos anos. O importante é que a paixão pelo cinema segue firme, assim como a vontade de pensar, pesquisar e escrever sobre os filmes. Até breve!

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