domingo, setembro 30, 2012

COSMÓPOLIS (Cosmopolis)



Por mais que andem dizendo por aí, David Cronenberg nunca deixou de ser ele mesmo. Nem quando fez aquela célebre trinca de filmes com Viggo Mortensen. E se muitos reclamaran que ele foi por demais convencional em UM MÉTODO PERIGOSO (2011), com certeza não poderão dizer o mesmo de COSMÓPOLIS (2012), o retorno de Cronenberg às origens, de maneira ainda mais radical.

É difícil sair do cinema entendendo completamente o que se passa no filme. O clima de estranheza, tão presente em obras como VIDEODROME – A SÍNDROME DO VÍDEO (1983) e em EXISTENZ (1999), para citar dois grandes filmes do diretor, aparece ainda mais forte. Aliás, o filme é tão corajoso que até lembra a frieza cirúrgica de seus experimentais trabalhos iniciais – STEREO (1969) e CRIMES OF THE FUTURE (1970). Na tradução para as telas, o romance de Don DeLillo se transforma numa autêntica obra cronenberguiana, cheia de elementos familiares à sua filmografia, que certamente serão facilmente compreendidos por aqueles que acompanham o seu trabalho.

Em COSMÓPOLIS, o cineasta não oferece muitas concessões e deixa dúvidas quanto ao tema aparentemente principal do filme. Seria mesmo sobre o capitalismo às vias de entrar em colapso? Afinal, Cronenberg nunca foi um cineasta muito interessado em assuntos de política e economia. Seus principais temas são o corpo, as mutações e o sexo. E isso não deixa de aparecer no filme. Ao tentar compreender o que se passa no universo de COSMÓPOLIS, o espectador pode se ver com os neurônios fervilhando, já que os diálogos são ditos de maneira muito estranha e às vezes aparentemente sem sentido.

Na trama, Robert Pattinson é o magnata Eric Packer, um sujeito que quer atravessar a cidade em sua enorme limusine - que funciona para ele como casa e escritório - para cortar o cabelo. Sua fortuna foi construída fazendo especulações em bolsas de valores em todo o mundo. Mas ele é um sujeito entorpecido, em busca de algo que o faça se sentir vivo. Mesmo em situações intensas ele se mostra indiferente, apático. Um homem morto, como lhe diria o personagem de Paul Giamatti mais adiante. Seu relacionamento com a esposa, com quem ele se casou há poucos dias, vivida por Sarah Gadon, é de esfriamento. O sexo só aparece entre os dois como tópico de conversa, pouco depois de ele ter transado com outras mulheres, entre elas, a personagem de Juliette Binoche. "Você exala sexo", ela diz ao marido.

Falando assim até parece que o filme é fácil. Na verdade, ele é muito desafiador ao optar por usar longas sequências de diálogos frios. Assim, vale a pena experienciar o filme no cinema e ver a reação das pessoas, a maioria delas de ódio ou de rejeição. Então, qual a importância de um filme como esse, se é para desagradar a maior parte do público? Principalmente oferecer algo novo e diferente para as plateias, fazê-las pensar, não esquecer o filme que acabaran de ver assim que sairem do cinema.

Por isso, quem for ao cinema achando que o que é apresentado no trailer - com aquela edição frenética - representa o filme está enganado. Quem for à procura de ação talvez deva manter distância de COSMÓPOLIS. Ou então já ir preparado para uma experiência nova e fascinante. Um objeto estranho que ajuda a pensar, a refletir não só sobre o universo cronenberguiano, mas também sobre o nosso próprio mundo. Que é tão ou mais complicado quanto.

sábado, setembro 29, 2012

A CASA SILENCIOSA (The Silent House)



O que o uruguaio A CASA (2010), de Gustavo Hernández, tinha de diferente e que chamou a atenção mundo afora foi o recurso do plano-sequência contínuo. Ou pelo menos simuladamente contínuo, como Hitchcock havia feito também em FESTIM DIABÓLICO tantos anos atrás. Mas o seu filme tem um roteiro tão simples e vazio que só tendo mesmo uma direção muito eficiente para que o trabalho de criação atmosférica compensasse o roteiro fraco, quase nulo.

Assim, eu já fui esperando que o remake americano, A CASA SILENCIOSA (2011), de Chris Kentis e Laura Lau, fosse no mínimo melhor. E de fato é, embora não o suficiente para se dizer que o resultado ficou bom. Além de uma produção mais caprichada – o que já é de se esperar -, o filme conta com o desempenho satisfatório, na medida do possível, de Elizabeth Olsen. A jovem atriz, que ganhou notoriedade com o ótimo MARTHA MARCY MAY MARLENE, faz o possível para que o filme ganhe um pouco de dignidade.

Mas, infelizmente, embora tenha alguns momentos de tensão, A CASA SILENCIOSA, a versão americana, é quase tão vazia quanto o seu pai uruguaio. O que só mostra que os olheiros de Hollywood muitas vezes quebram a cara ao se precipitar em pegar uma ideia relativamente boa e trazer para si.

Na trama de A CASA SILENCIOSA, Elizabeth Olsen está com o pai numa casa afastada da cidade, prestes a ser vendida. Eles pretendem passar a noite lá, mas coisas estranhas passam a acontecer. A começar por estranhos barulhos e em seguida o desaparecimento de seu pai. O resto é exercício de suspense e tensão e uso de câmera na mão seguindo o tempo todo a personagem. A surpresa no final é interessante, mas nada animadora, depois que o filme já perde a graça.

sexta-feira, setembro 28, 2012

WOODY ALLEN: A DOCUMENTARY



Podem até dizer que WOODY ALLEN: A DOCUMENTARY (2012) é um trabalho por demais louvador do trabalho e até da própria pessoa de Allen, mas não vejo nada de errado nisso. Como bem diz Chris Rock em certo momento, qual outro realizador continua tão bem durante 40 anos? Provavelmente existem outros, mas não com essa regularidade de um filme por ano. Sobre isso, Allen diz que acha interessante ter quantidade, pois dentro da quantidade, há maior possibilidade de haver qualidade. E assim obras-primas surgem em diversas épocas de sua carreira.

O filme, que passou no Festival de Cannes, mas foi exibido numa rede de televisão americana, começa contando da infância de Allen, de seus pais – ambos viveram muito: o pai até os 100 anos, a mãe morreu aos 90 -, de seus primeiros passos como escritor de humor, para depois passar para roteirista, comediante e logo em seguida para cineasta. E realmente se a gente for parar para pensar no salto que foi a passagem de seus cinco filmes iniciais, bem mais ligados ao humor físico e mais trabalhos de esquetes, para uma obra mais coesa e com maior ênfase na criação dos personagens como NOIVO NEURÓTICO, NOIVA NERVOSA (1977), dá para perceber o grau de ambição de Allen.

E em seguida, cada trabalho novo dele era uma expectativa. Em vez de continuar na comédia romântica – que lhe rendeu vários Oscar, inclusive -, ele partiu para um drama bergmaniano: INTERIORES (1978). Depois foi para um filme em preto e branco, MANHATTAN (1979). Em seguida, um filme difícil como MEMÓRIAS (1980). Depois dessas ousadias, a volta à comédia com SONHOS ERÓTICOS DE UMA NOITE DE VERÃO (1982) já mostrava um realizador e também um ator com uma carreira já estabilizada. Mas esse filme marcaria uma nova fase na vida de Allen, que foi a parceria com Mia Farrow, que passou a ser a sua musa em todas as suas obras até MARIDOS E ESPOSAS (1992), que foi feito na época do escândalo envolvendo a filha adotiva de Mia, Soon-Yi Previn.

Claro que Mia não quis saber de dar depoimento para o documentário. Em vez disso a amiga e ex-namorada e amante Diane Keaton, aparece sempre feliz e companheira. Quem aparece dando depoimento além dela e de Chris Rock é Martin Scorsese, a irmã Letty Aronson, Penélope Cruz, John Cusack, Josh Brolin, Larry David, Mariel Hemingway, Scarlett Johansson.

Quanto a Mariel, emocionante o depoimento dela. Na cena em que ela chora quando o namorado vivido por Woody Allen a deixa, em MANHATTAN, ela disse que chorou de verdade, pois aquela cena representava o fim das filmagens de um trabalho que para ela foi tão especial. E quanto a Scarlett, o documentário destaca a amizade que brotou dos dois e que rendeu três filmes. Sem Scarlett não haveria PONTO FINAL- MATCH POINT (2005), que é até agora o filme que melhor soube explorar a sua beleza e sensualidade. Muito sexy esse filme.

Pena que, ainda que o documentário seja longo, deixa de falar de alguns filmes importantes, como CELEBRIDADES (1998), O SONHO DE CASSANDRA (2007) e um de meus favoritos do diretor, A OUTRA (1988). Aliás, Allen é tão impressionantemente bom que é difícil fazer um ranking de favoritos dele, pois são muitos filmes de qualidade e de tons diferentes. Assim, do jeito que é fácil se encantar com um musical como TODOS DIZEM EU TE AMO (1996) e de achar muito engraçado um filme como TRAPACEIROS (2000), é também impactante ver obras tão sérias quanto CRIMES E PECADOS (1989) e o já citado INTERIORES.

Enfim, são muitos filmes e não adianta muito ficar citando um ou outro. O que nós, fãs de Allen, queremos é que ele continue fazendo bons e ótimos filmes até pelo menos a idade de Manoel de Oliveira para que continuemos sempre a esboçar aquele sorriso de familiaridade e de prazer ao ver a tradicional tela preta com os créditos iniciais nos preparando para mais um trabalho seu.

quinta-feira, setembro 27, 2012

QUATRO LONGAS EXIBIDOS EM GRAMADO



Uma das principais reclamações em Gramado era a baixa qualidade dos filmes da Mostra Competitiva Estrangeira. E de fato, assistir a esses filmes era o que havia de mais chato nas noites de competição. Muito provavelmente isso ocorreu porque poucos filmes estrangeiros viram Gramado como uma boa vitrine para seus trabalhos. Dos cinco títulos exibidos nessa mostra, o único que não vi até o fim foi o uruguaio ARTIGAS, LA REDOTA, de Cesar Charlone. Justamente o filme que mais ganhou prêmios. Até porque não havia concorrentes de peso para batê-lo. Desisti de ver o filme pois não estava entendendo o enredo, muito por causa de minha ignorância na História de nossos vizinhos e do Rio Grande do Sul. O que compromete bastante, no caso de um filme que se recusa a ser minimamente didático. Enfim, seria o caso de uma revisão, ou melhor, uma apreciação pra valer, já que se eu não vi completo, então não conta. Os que contam são esses abaixo.

DIEZ VECES VENCEREMOS

A produção é argentina, mas se passa principalmente em território chileno e a preocupação de DIEZ VECES VENCEREMOS (2012), de Cristian Jure, é na causa dos descendentes de uma tribo indígena do território do Chile, a dos índios mapuches. O filme centra na figura de um rapaz mapuche, Pichún, que defendeu a causa de seus ancestrais, aproveitando o fato de ter se graduado em Jornalismo em Buenos Aires, e de ter, portanto, mais desenvoltura para defender os direitos de sua comunidade. O documentário ganha ares de ficção, graças à estrutura montada. O título do filme parece guardar algo de otimista, mas no fim das contas fica o amargo de saber que os mapuches têm pouquíssima chance de sobreviverem aos anos.

LEONTINA 

Filme chileno bem moderrento, LEONTINA (2012) é um tributo de um neto, o diretor Boris Peters, a sua avó, a Dona Leontina do título. Ele procura, em seu uso da narrativa bem lenta e de uma insistente e chata trilha sonora suave, convidar o espectador a refletir sobre a beleza da velhice. A própria Leontina se expõe fisicamente, com cena dela nua, numa banheira, as tantas rugas de seu corpo em destaque. Pode ser que alguém goste, mas a maioria dos críticos que estavam em Gramado achou o filme interminável, mesmo tendo só 70 minutos de duração. Ganhou o prêmio de melhor fotografia.

VINCI 

Quase um teatro filmado, se não fosse o uso dos closes e outras técnicas cinematográficas, o cubano VINCI (2012), de Eduardo Del Llano, se passa totalmente dentro de quatro paredes. Na trama, o jovem Leonardo Da Vinci é preso e colocado num calabouço junto com um ladrão e um assassino. Os homens, a princípio, querem se aproveitar sexualmente do jovem rapaz, que têm uma aparência delicada. Mas aos poucos, com sua cultura e inteligência, o jovem Leonardo passa a ganhar a amizade e a admiração dos dois detentos. Ganhou o prêmio de melhor roteiro e uma menção especial de trilha sonora.

CALAFATE, ZOOLÓGICOS HUMANOS

O melhor dos quatro filmes, o chileno CALAFATE, ZOOLÓGICOS HUMANOS (2011, foto), de Hans Mülchi Bremer, é um documentário que acompanha os descendentes de grupos indígenas que no final do século XIX foram levados por europeus para serem exibidos como aberrações em circos. Como aqueles vistos em VÊNUS NEGRA e em HOMEM-ELEFANTE. O diretor acompanha o antropólogo Peter Mason e o historiador Christian Báez na tentativa de trazer de volta os restos mortais de cinco kawésqar, guardados para estudos científicos em uma universidade em Zurique. 125 anos, eles tinham sido exibidos famintos, doentes e moribundos. Embora possa parecer um documentário para televisão, é bem interessante e tocante.

quarta-feira, setembro 26, 2012

INTOCÁVEIS (Intouchables)



O atual recordista de bilheteria na França não é nenhuma superprodução, mas um filme pequeno, feito sem efeitos especiais, um grande orçamento ou coisas do tipo. Um filme que se baseia apenas em sua história simples e cheia de humanidade e em sua dupla de protagonistas fora do comum. E depois que o filme foi sucesso na França, ele tem repetido a fama também no Brasil, com os números impressionantes de aumento nas bilheterias ao longo das semanas. Em sua quarta semana em cartaz no país, o filme cresceu 23% em relação à semana anterior, o que é surpreendente, tanto por ser uma produção não-hollywoodiana, como por estar conseguindo isso sem precisar fazer muito barulho.

O filme foi baseado no livro O Segundo Suspiro, de Philippe Pozzo di Borgo, lançado recentemente pela Editora Intrinseca, e que se mostra uma obra fragmentária, de anotações, de pedaços de memória, feitas por uma pessoa que não podia usar suas mãos para escrever o seu livro. O filme prefere enfatizar um período específico, mas não menos importante da vida de Philippe: a sua relação com o enfermeiro argelino Abdel Sellou, que no filme é chamado de Driss. E não há nenhum flashback que explore o acidente que deixou Philippe tetraplégico.

Pode-se dizer que o filme mostra mais o ponto de vista de Driss (Omar Sy) do que de Philippe (François Cluzet), até por este ser uma pessoa mais distante de nós espectadores comuns, um homem da aristocracia. E claro que como uma obra de ficção, apesar de ser baseada em fatos reais, INTOCÁVEIS (2011) toma algumas liberdades em prol da boa condução narrativa e da busca pela emoção.

A história é séria, trata de uma tragédia na vida de um homem, mas tem mais momentos de provocar risadas, graças ao alto astral da figura de Driss, um sujeito maltratado pela vida e em liberdade condicional, que só aparece na luxuosa residência de Philippe apenas para garantir a renovação do seu seguro-desemprego, mas que conquista a simpatia do milionário e é escolhido para trabalhar como seu enfermeiro.

O filme de Olivier Nakache e Eric Toledano pode até não ser perfeito, mas é muito difícil imaginar alguém que não saia da sessão do filme satisfeito por ter visto uma obra bem cuidada, ao mesmo tempo sensível e divertida, e que trata do tema da amizade de forma comovente. Poderia ter falado de INTOCÁVEIS há quase um mês, quando o vi no cinema, aproveitando ainda os efeitos que o filme causou em mim, mas por algum motivo isso não aconteceu. Mas não tem problema: INTOCÁVEIS continua ainda em cartaz, firme e forte, emocionando plateias e trazendo mais gente para vê-lo, através, principalmente, da propaganda boca a boca.

terça-feira, setembro 25, 2012

PODER PARANORMAL (Red Lights)



Assim como o recente O DESPERTAR, horror gótico de casa assombrada estrelado por Rebecca Hall, PODER PARANORMAL (2012) tem como ponto de partida o trabalho de pessoas que desmascaram casos de charlatanismo, especialmente em familias que são assombradas por supostos espíritos perturbadores. Mas a única coisa em comum entre os dois filmes é isso, embora seja algo suficiente para menção, já que o embate entre o ceticismo e o acreditar é um tema já muito antigo e alguns filmes de horror, inclusive, optaram pela ambiguidade.

Em PODER PARANORMAL, Sigourney Weaver e Cillian Murphy são dois físicos que trabalham neste tipo de coisa, além de darem aulas em universidades a respeito. A intenção é sempre provar que há alguma explicação racional para fatos considerados milagres ou assombrações. Até que chega à cidade um famoso homem de poderes paranormais que retorna de uma aposentadoria. Este homem é Simon Silver, vivido por Robert De Niro. Cillian Murphy o vê como o próximo a ser desmascarado, mas Sigourney Weaver, mais veterana no meio, tem certo receio de se aproximar do vidente cego.

Aliás, tanto o termo "vidente" quanto o termo "médium", este último usado nas legendas tanto deste filme quanto em DREDD, não cabem muito bem para traduzir o original "psychic", que é a pessoa que tem habilidades que vão além do normal, como ler mentes ou ter poderes telecinéticos. Por não encontrar um equivalente bom e popular na língua portuguesa, optaram por "médium", que tem mais a ver com o espiritismo.

Mas voltando ao filme, é impressionante como Rodrigo Cortés tira leite de pedra de um roteiro que tem uma conclusão insatisfatória e um desenvolvimento depois de sua segunda metade que perde um pouco o ritmo. Ainda assim, é um filme intrigante, há um excelente cuidado com a caracterização dos personagens de Weaver e Murphy, há um De Niro acima da média (ele geralmente tem sorte quando adentra o território do horror), e há a nova e bela Elizabeth Olsen, do inédito no Brasil MARTHA MARCY MAY MARLENE e de A CASA SILENCIOSA. Nota-se com essa amostragem que ela tem se aproximado do cinema de gênero e lhe dado credibilidade na medida do possível.

PODER PARANORMAL é um filme cheio de cartas na manga. Pena que a conclusão não seja tão satisfatória para um filme que oferece tantos momentos de tensão e cenas dramáticas bem cuidadas, como as que envolvem Sigourney Weaver e o filho que está há décadas em estado vegetativo. Entre o ótimo desenvolvimento inicial e o final um tanto insatisfatório, PODER PARANORMAL pode ser visto como um bom filme que merece a atenção dos apreciadores do gênero e mostra que ENTERRADO VIVO (2010) não foi sorte de principiante do diretor.

segunda-feira, setembro 24, 2012

SHAME



Já faz um tempão que estou com este filme na lista para escrever a respeito e por alguma razão fiquei postergando, por acreditar não ter nada a dizer sobre ele, ou se tenho não consegui elaborar nada previamente. Então, antes que completem dois meses que eu vi SHAME (2011) no cinema, aproveito este momento de coragem para traçar algumas poucas linhas sobre o filme, agora que o blog está de cara nova e eu ainda não me recuperei do trauma de perder o visual de mais de dez anos – e ainda me esqueci de dar um print screen, para deixar de lembrança. Coisa de canceriano.

Steve McQueen é um desses novos cineastas que tem chamado a atenção de críticos e cinéfilos. Estreou em longas-metragens com o impactante HUNGER (2008), também estrelado por Michael Fassbender e que é também ousado, mas em outros aspectos. Em SHAME, McQueen leva a sua ousadia para outro terreno: o sexo. Já se nota logo de início uma sofisticação no uso da câmera, muitas vezes parada para registrar um momento especial. Assim como havia em HUNGER aquele longo plano-sequência de Fassbender falando diante da câmera, em SHAME há o personagem de Fassbender conversando com sua irmã, discutindo o frágil relacionamento dos dois, a câmera pegando-os de costas.

Na trama, ele é um homem viciado em sexo. Não basta usar o seu dinheiro com prostitutas com muita frequência, ele se masturba várias vezes ao dia e passa o dia olhando pornografia. Inclusive no trabalho. Já numa idade em que a maioria das pessoas já está casada ou se preparando para se juntar com alguém, Brandon, seu personagem, não tem a menor intenção de ter um relacionamento sério com ninguém. Isso fica claro – e bastante desconfortável – na cena da conversa dele com sua colega de trabalho, que ele convida para um jantar.

Mas a sua vida muda quando chega para visitá-lo a sua irmã Sissy, vivida por Carey Mulligan. Visivelmente frágil emocionalmente, a menina precisa da ajuda de alguém e vê na figura do distante irmão uma possibilidade. Afinal, são parentes próximos. E ainda que o irmão não a queira naquele espaço "sagrado" no qual ninguém pode entrar, que é o seu apartamento, ela força um pouco para ficar.

Um dos momentos mais bonitos do filme, embora na hora eu não tenha conseguido fazer uma relação entre o sentimento dos dois e a canção, é a cena em que Sissy canta num restaurante "New York, New York", enquanto o irmão deixa as lágrimas caírem no rosto. Aquilo claramente mexeu com ele, e a interpretação de Mulligan junto com a imagem daquele homem duro finalmente desmoronando é algo muito bonito de ver. Assim como é também a conclusão do filme. Sem dúvida, McQueen é um diretor a não se perder de vista.

domingo, setembro 23, 2012

TED



Uma das maiores surpresas do cinema americano recente, no que se refere a ótimos números nas bilheterias, TED (2012) é o primeiro longa-metragem de Seth MacFarlane, o criador de séries para a televisão como UMA FAMÍLIA DA PESADA (1999-hoje), AMERICAN DAD! (2005-hoje) e THE CLEVELAND SHOW (2009-hoje), todas animações de sucesso dirigidas principalmente ao público adulto. MacFarlane é também dublador de suas séries e em TED ele é o sujeito que dubla o ursinho. A história se aproxima do surreal, mas os temas que o filme traz à tona são principalmente a amizade e a necessidade de (ou cobrança da sociedade pelo) amadurecer.

Na trama, John é um garoto solitário que ganha de presente de seus pais um ursinho de pelúcia. Ele fica apegado ao urso e quer que ele seja o seu amigo para a vida toda. Na noite quando vai dormir, ele deseja que o urso fale com ele. Uma estrela cadente passa e eis que pela manhã o urso está lá, vivo, para horror dos pais de John, que depois se acostumam e passam a acreditar que aquilo foi milagre de Jesus.

Ted começa a ficar famoso. Afinal, é a primeira vez que um urso de brinquedo ganha vida. Mas como toda fama, ela passa. E anos depois, quando John está com 35 anos (Mark Wahlberg), o urso também envelhece de espírito, mas não de aparência. Como uma celebridade esquecida, ele passa a se dedicar a fumar maconha e a assistir a velhos filmes, como FLASH GORDON, com seu amigo John. Que agora está de namorada (Mila Kunis). Ela é Lori, uma moça com quem John namora há quatro anos. Mas que já acha que está na hora de o namorado começar a ter mais responsabilidades na vida e que para isso precisa se livrar de seu ursinho.

E podemos dizer que esse é apenas o ponto de partida para uma história que ainda toma rumos bem inesperados, com um misto de aventura, bromance e comédia romântica. Ainda que o humor possa ser considerado grosseiro, envolvendo flatulências e sexo com animais (por animais, leia-se Ted), o amor que o filme transborda eclipsa ou pelo menos atenua esses momentos. É ótimo que o filme seja essa mistura e que Ted seja um urso maconheiro e desbocado. Se MacFarlane resolvesse seguir um caminho certinho - o que é pouco provável, devido ao seu histórico -, certamente seu filme não teria alcançado o sucesso que alcançou, tanto de público, quanto de crítica.

No mais, o filme conta com um ritmo quase perfeito, o casal Wahlberg e Kunis tem uma excelente química, a brincadeira em torno das celebridades é bem engraçada e a participação de celebridades como a cantora Norah Jones e Sam J. Jones (o Flash Gordon do filme camp de 1980), além de outras pequenas surpresas, tudo isso faz de TED uma das mais agradáveis e inventivas comédias do ano.

sábado, setembro 22, 2012

HOUSE – SEXTA TEMPORADA (House – Season Six)



A sexta temporada de HOUSE (2009/2010) se assemelha a um bombom com gosto amargo na superfície e muito doce por dentro. Assim é o contraste entre o início e o fim dramáticos e a leveza dos episódios descontraídos ao longo da temporada. A sexta também foi a que mais experimentou, a que mais contou com episódios que saíram da fórmula "doença difícil de diagnosticar + tentativa da equipe de resolver + brincadeiras envolvendo a vida particular da turma + solução do caso, sempre nos últimos minutos do episódio".

Antes de tudo, a temporada já começa com um episódio duplo, o que é uma novidade para HOUSE. E este episódio é apresentado sem a vinheta tradicional, com aquela música do Massive Attack, que é sempre um charme. Em vez disso, vemos Gregory House sofrendo em um hospital psiquiátrico para desintoxicação, depois de anos tomando Vicodin. Isso, ao som de "No surprises", do Radiohead, e de créditos de abertura que não apresentam o tradicional elenco da série.

Na temporada passada, House havia começado a enxergar coisas, a ter alucinações, geradas por anos tomando a medicação pesada para a dor em sua perna. Quando viu que aquelas alucinações poderiam prejudicar a sua vida profissional, ele mesmo resolveu se internar numa clínica. Assim, esse episódio duplo que se assemelha a um filme de longa-metragem foge bastante da fórmula da série.

Mas isso logo vai mudando a partir do episódio seguinte, quando as coisas começam a voltar ao normal e o clima de agradável familiaridade volta à tona. A dança de cadeiras da equipe, a começar pelo próprio House, foi uma marca da série. Assim como uma maior ênfase em Cuddy, a diretora do hospital. Aliás, tanto Cuddy quanto Wilson ganham episódios especiais mostrando suas rotinas diárias, enquanto House e seus pupilos são vistos como coadjuvantes. São episódios interessantes, que fogem do habitual. Há também o episódio do desaparecimento de uma criança, que faz com que todos fiquem presos no Hospital até que seja solucionada a situação.

Quanto aos casos, um dos mais interessantes é o do sujeito que tem um Q.I. altíssimo, um brilhante físico que toma algo para "emburrecer" e conseguir continuar com a esposa. O episódio se chama "Ignorance is bliss". Outro episódio interessante, menos pelo caso médico, e mais pela envolvida é "Open and shut", que traz ninguém menos que Sarah Wayne Callies, a beldade de PRISON BREAK e THE WALKING DEAD. Vê-la contracenando com Olivia Wilde, a Dra. "Thirteen", é uma visão do paraíso.

Mas embora os episódios, em sua maioria, sejam bem descontraídos e provoquem risos, o tema da solidão de House sempre paira no ar, dando à série esse sabor agridoce que faz com que nos apaixonemos por ela. E é com um gosto amargo que terminam os últimos episódios da série, especialmente o último e decisivo "Help me", que me fez chorar. É um episódio em que a equipe do Hospital Princeton é chamada para ajudar um grupo de pessoas que ficaram feridas num acidente que destruiu um prédio comercial. House encontra uma mulher com a perna presa em toneladas de destroços. O episódio em si é devastador, desses de fazer a gente querer um abraço de alguém.

sexta-feira, setembro 21, 2012

CONTOS DA LUA VAGA (Ugetsu Monogatari)



E chegou o dia em que eu finalmente me encantei com o cinema japonês em live action, já que eu já curtia inúmeros animes nipônicos. Sempre tive alguma resistência aos filmes. Por melhores que fossem, havia algo que não me deixava totalmente satisfeito ou sentisse aquela emoção extraordinária depois de ter visto uma obra-prima, como a de um Hawks, um Buñuel, um Ford, um Murnau, um Khouri. Mesmo um cineasta que é dito como sendo mais próximo da cultural ocidental como Akira Kurosawa não chegou a me encantar até hoje. E assim, fui deixando de ver algumas obras essenciais.

Mas chegou o dia em que eu vi CONTOS DA LUA VAGA (1953), de Kenji Mizoguchi, esse assombroso filme que conta a história de dois casais vivendo em circunstâncias difíceis no Japão do século XVII. E o adjetivo assombroso que eu usei não foi em vão. Há realmente momentos em que o filme adentra o território do horror. E se sai muito melhor do que muito filme que se diz de horror.

O fato de o filme ser bastante movimentado e pouco contemplativo ajuda a tornar a história fluida e sempre instigante. Há também toda a construção atmosférica, que começa a ficar sombria quando os dois casais de protagonistas e mais o filho pequeno estão dentro de um pequeno barco. Lá, eles avistam um outro barco à deriva, com um homem moribundo, que os deixa aterrorizados. Há uma neblina que cobre o lago, que deveria ser um lugar de segurança contra os homens que tentam se apoderar das casas e pegar homens para lutar à força em suas batalhas. Mas o perigo só muda de cara para esses personagens.

Em CONTOS DA LUA VAGA, as mulheres têm sempre razão: um dos homens fica muito feliz com o dinheiro que consegue ganhar com o seu trabalho de olaria e começa a ficar ambicioso; o outro tem o sonho de ser samurai e não tem dinheiro para comprar as ferramentas necessárias para se ornamentar. As esposas são contrárias aos desejos de seus maridos, mas não conseguem detê-los.

A grande surpresa do filme está na aparição de uma mulher rica, que logo na primeira vez que surge já causa certo arrepio. É impressionante como Mizoguchi consegue fazer isso sem utilizar efeitos especiais ou qualquer mudança brusca. Apenas a câmera, a maquiagem e o figurino dessa mulher. É a sua capacidade de construir uma atmosfera sobrenatural, mesmo sendo tudo tão palpável à primeira vista, que torna o seu filme tão especial. E que me deixou arrepiado, emocionado, assombrado e encantado. Tudo ao mesmo tempo.

Ia ler alguns textos sobre Mizoguchi antes de escrever esta postagem, a fim de aprender mais sobre o cinema deste mestre, mas preferi fazer o texto sem ter lido nada a respeito. Pelo menos por hora, já que fiquei bastante interessado em me inteirar cada vez mais no universo mizoguchiano. Aceito sugestão de leituras.

CONTOS DA LUA VAGA ficou entre os 50 melhores filmes eleitos da revista inglesa Sight and Sound. Na verdade, ele ficou na quinquagésima posição, empatado com LUZES DA CIDADE, de Charles Chaplin, e LA JETÉE, de Chris Marker. Ficou em excelente companhia.

 P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste, um post de reclamação. Confira AQUI.

quinta-feira, setembro 20, 2012

INSÔNIA



A comparação de INSÔNIA (2012) com a série/novela MALHAÇÃO da Rede Globo não é à toa. Por isso é até possível que o filme de Beto Souza encontre o seu público. A trama da garota mais velha (Luana Piovani) que se apaixona pelo pai da amiga mais nova (Lara Rodrigues) é até bem engraçadinha. E as meninas mais novas, que eu tive oportunidade de vê-las pessoalmente, cinco anos depois das filmagens que aconteceram em 2007, estão ainda mais belas hoje. O personagem do pai (o argentino Daniel Kuzniecka) também conta pontos a favor para o filme, embora os diálogos não sejam bons.

Não deixa de ser curioso o fato de que o filme anterior que eu vi de Beto Souza tenha sido NETTO PERDE SUA ALMA (2001). Pelo menos de acordo com o IMDB, ele ainda dirigiu mais dois filmes depois desse: CERRO DO JARAU (2005) e DIAS E NOITES (2008). Quer dizer, há uma produção forte em Porto Alegre, como eu pude testemunhar em Gramado, tanto na mostra dos curtas gaúchos quanto no pouco que eu vi da mostra dos longas. Acontece que o mercado exibidor não tem ou não dá espaço para esses filmes, que talvez sejam veiculados apelas na cidade ou em algum canal local.

No caso de INSÔNIA, o filme ficou na geladeira por cinco anos para só então ser selecionado em Gramado. E acredito que foi selecionado por sorte, por não ter tantos concorrentes de peso que o desclassificassem e  também pelo fato de ser gaúcho. Provavelmente é comum ter um filme "da casa" nos festivais locais, mesmo que ele não seja tão bom assim. Porém, INSÔNIA não é o tipo de filme para se ficar incomodado. É simpático, não pretende ser mais do que é, tem umas garotas bonitas e um trabalho de construção de personagens superior ao da construção da história, que tem uma conclusão bem boba. No fim das contas, prefiro ver três vezes este filme que rever NETTO PERDE SUA ALMA.

P.S.: Pra quem não viu, confira o resultado do Festival de Toronto. AQUI.

quarta-feira, setembro 19, 2012

REI DOS REIS (King of Kings)



Chegando próximo do final da peregrinação pelo cinema de Nicholas Ray, vi o tão ansiado (por mim) REI DOS REIS (1961), que lembro de ter visto pelo menos algumas partes na televisão vários anos atrás. Antes mesmo de ver o filme e já acumulando uma quantidade considerável de trabalhos de Ray vistos, já enxergava com bastante proximidade os heróis rebeldes e incompreendidos do diretor com a figura de Jesus. O cineasta apresenta um Jesus diferente, um rebelde diferente, que não se utiliza da violência, mas da paz e do amor, e que também se deixa sacrificar, a exemplo dos personagens de AMARGO TRIUNFO (1957) e JORNADA TÉTRICA (1958).

Além de Jesus, vivido aqui por Jeffrey Hunter, que havia trabalhado com Ray em QUEM FOI JESSE JAMES? (1957), outro personagem que ganha um ar muito importante e que entra em sintonia com o espírito dos filmes do diretor é Barrabás (Harry Guardino), que aqui é visto como um revolucionário que tem a intenção de derrubar o poder dos romanos da Judeia. O que não é uma tarefa fácil, a julgar pelas duas cenas de batalha dos homens de Barrabás contra os soldados romanos. Aliás, esses momentos de ação no filme parecem concessões para que a obra ganhe contornos mais épicos.

O filme já começa bastante animador e impressionante, com a narração de Orson Welles a partir de um texto de Ray Bradbury, que conta da chegada de Pompeu à Judeia e de como ele adentrou o lugar sagrado dos judeus, rasgando o véu do templo, sob os olhares de tristeza dos sacerdotes. A narração continua com a chegada de Herodes, o homem que, ao ver que havia uma profecia envolvendo a chegada de um messias, manda matar todas os bebês primogênitos da região.

Uma escolha de Ray é a de não mostrar elementos fantásticos. Não ouvimos, por exemplo, os anjos conversando com os personagens, nem a voz de Deus, muito menos o anjo sentado na pedra que cobre o sepulcro, que na minha cabeça é uma das imagens mais fantásticas dos evangelhos. O único ser não humano que aparece, em voz, é Satanás, no momento em que Jesus está passando 40 dias e 40 noites no deserto. Essa escolha de um maior "realismo" provavelmente foi feita para que a história se tornasse mais verossímil.

Um dos problemas do filme, porém, é o fato de sintetizar demais os acontecimentos. Conta-se que o produtor Samuel Bronston, o mesmo dos épicos EL CID (1961) e A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO (1964), ambos de Anthony Mann, chegou a cortar cerca de 45 minutos da metragem do filme, deixando-o com 2h48min. Ao menos alguns recursos de contar a história por meio do centurião Lucius funcionam bem. Ele é uma espécie de coro do filme, em alguns momentos.

Há também pouca participação de Maria Madalena, que geralmente é vista como mais presente em outros filmes sobre Jesus. Mas não deixa de ser muito bonita a sequência do encontro dela com a mãe de Jesus. Além disso, os apóstolos são por demais passivos. O único que ganha algum destaque, além de Judas, claro, é Pedro, que é visto negando a Cristo por três vezes. Também vale destacar o emocionante momento da visita de Jesus à cela de João Batista, vivido por Robert Ryan. Trata-se de um momento que não consta nos evangelhos, mas que foi bom ter sido incluído no filme.

A cena do sermão da montanha faz lembrar inevitavelmente A VIDA DE BRIAN, que faz troça da quantidade de gente que vem para assistir ao sermão e a impossibilidade de todos ouvirem. Só se Jesus gritasse muito alto para que quem estivesse lá atrás pudesse escutar. Quanto à cena da morte na cruz, hoje em dia ela perde o impacto, uma vez que já vimos filmes como A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO, de Martin Scorsese, e A PAIXÃO DE CRISTO, de Mel Gibson, que exploram mais o aspecto violento do sacrifício. Mas para sua época, REI DOS REIS foi um feito e tanto.

terça-feira, setembro 18, 2012

PARANORMAN



Não deixa de ser impressionante a resistência da animação em stop motion em tempos em que a computação gráfica prevalece e toma cada vez mais o lugar da animação tradicional, que praticamente deixou de ser produzida em Hollywood. É um trabalho hercúleo fotografar fotograma por fotograma os bonecos para que eles ganhem vida num processo quase tão antigo quanto a própria História do Cinema. E assim estúdios como o Laika, o mesmo que produziu CORALINE E O MUNDO SECRETO (2009), continuam existindo.

Porém, se CORALINE E O MUNDO SECRETO já tinha uma ótima base para desenvolver uma história – o livro de Neil Gaiman -, PARANORMAN (2012) surgiu de um roteiro original escrito por um dos diretores, Chris Butler. Difícil não simpatizar com a animação, que já começa com uma homenagem aos antigos filmes de horror do passado. Em poucos minutos de sua duração, logo ficamos sabendo que o protagonista, o garoto Norman, tem a capacidade de ver fantasmas. E por isso é motivo de chacota na escola e não é levado a sério nem mesmo em sua casa. As coisas mudam quando ele tem que proteger a cidade da maldição de uma bruxa.

O filme ainda tem o mérito de apresentar para o público mais jovem o caso das moças que eram executadas como bruxas pelos puritanos de Salem, no século XVII. Resta saber se, apesar de conter fantasmas, bruxas e zumbis, PARANORMAN é um filme que pode assustar o público infantil, da mesma forma que CORALINE E O MUNDO SECRETO assustou. Acredito que não. PARANORMAN segue uma estrutura bem convencional e confesso que até fiquei um pouco entediado do meio para o final do filme. Mas isso não quer dizer que não seja uma boa pedida para crianças e adultos, já que tem recebido ótimas cotações.

Comparando os dois trabalhos, nota-se que o filme da menina que encontrou pais alternativos com botões no lugar dos olhos é muito mais fácil de impressionar, já que impressionou até mesmo o público adulto. Falando nisso, esses filmes, assim como o mais recente exemplar da Pixar, VALENTE, têm em comum o fato de lidarem com o medo e serem dirigidos ao público infantil. Dependendo da idade - e da criança - eles podem causar medo, mas em geral o medo nos filmes, além de fascinante para as crianças, é bastante confortável, já que é um território seguro.

Sem falar que há toda uma tradição de canções de ninar com temas aterrorizantes e de contos de fadas perturbadores. Como não sou psicólogo, não tenho autoridade para dizer se esse tipo de narrativa, seja oral, seja audiovisual, é ou não adequada para as crianças. Mas creio que elas têm o direito de experimentar o medo na ficção desde cedo. Desde que com prudência para que não seja em excesso.

segunda-feira, setembro 17, 2012

FUTURO DO PRETÉRITO: TROPICALISMO NOW!



Acho que este documentário estava me perseguindo. Ele foi exibido no Cine Ceará e foi justamente no dia em que eu não estive presente. Fui ao Festival de Gramado e lá estava ele na mostra competitiva dos longas-metragens nacionais. Suspeito que era o único filme da mostra que não era inédito no país. Enfim, FUTURO DO PRETÉRITO: TROPICALISMO NOW! (2012), de Ninho Moraes e Francisco Cesar Filho, não deixa de ter o seu charme, pelo tema, mas principalmente pelo show de André Abujamra com participações de vários artistas cantando canções representativas do Tropicalismo, que foi, sem dúvida, um dos movimentos culturais mais importantes do Brasil.

O Tropicalismo não estava apenas na música, mas também no cinema, no teatro, nas artes plásticas. Era algo ousado e que estava conectado com a geração modernista de 1922. Há alguns entrevistados importantes do movimento, como Gilberto Gil e outros, mas curiosamente, nomes importantes como Caetano Veloso, os Mutantes e Tom Zé ficaram de fora da edição final. O que eu achei que foi uma atitude ao mesmo tempo ousada e quase um tiro no pé, pois esses artistas são muito importantes.

Segundo o diretor Ninho Moraes, Caetano ficou de fora porque o que ele falou já poderia ser lido em seu livro "Verdade Tropical". E também porque "ele é muito charmosão e ia querer puxar sardinha para um lado". Isso pode até ser verdade, já que, bom leonino que é, Caetano acaba aparecendo muito e deixando os demais eclipsados. Mas sua canção "Tropicália" pode ser considerada a mais importante do show e do filme e seu nome é citado diversas vezes. Porém, quem não sabe desse detalhe da edição fica com a impressão de que ele não aceitou participar do filme, o que não é verdade.

Curiosamente, estreou na última sexta-feira em São Paulo e outras cidades o documentário TROPICÁLIA, de Marcelo Machado, que mostra com mais exatidão e seguindo uma cronologia mais tradicional a história do movimento.

FUTURO DO PRETÉRITO: TROPICALISMO NOW! ganhou o prêmio de melhor trilha musical em Gramado. 

domingo, setembro 16, 2012

CINEMA DE LÁGRIMAS (Cinema of Tears)



Em 1995, quando foi celebrado o centenário do Cinema, foi produzida uma série de documentários a respeito de diferentes cinematografias. O mais famoso deles é UMA VIAGEM PESSOAL ATRAVÉS DO CINEMA AMERICANO, de Martin Scorsese. Jean-Luc Godard dirigiu um sobre o cinema francês; Nagisa Oshima, sobre o japonês; Stephen Frears, sobre o inglês. Lembro até que foi feito um documentário exclusivo sobre o cinema neozelandês, que é um cinema que tem uma história curta e que o documentário até destacou como a melhor produção neozelandesa o thriller ALMAS GÊMEAS, de Peter Jackson. Tirando o do Scorsese, não tenho muita lembrança dos outros documentários (que foram exibidos na extinta Rede Manchete), mas já naquela época fiquei bastante incomodado com o fato de o Brasil não ter um documentário só sobre o seu cinema.

Em vez disso, o representante do BFI (British Film Institute) convidou Nelson Pereira dos Santos para tratar do cinema latino-americano. O que é um absurdo, já que não se poderia dar conta de tantos países. Foi quando Nelson teve a ideia de fazer uma ficção que contivesse cenas de alguns melodramas produzidos no México, na Argentina, em Cuba e sobrou espaço para um filme brasileiro, DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL (1963), de Glauber Rocha, que passa longe de ser classificado como um melodrama.

Na trama de CINEMA DE LÁGRIMAS (1995), Raul Cortez é um ator em decadência que é abordado por um estudante de jornalismo, que quer fazer uma entrevista com ele. Em vez disso, o ator veterano pede para que o jovem (André Barros) o siga até a Cidade do México, pois ele está em busca de um filme. O último filme que sua mãe viu antes de cometer suicídio. Assim, o personagem segue uma rotina de ir até uma cinemateca da capital mexicana e assistir uma série de filmes, dos quais vemos trechos. Um deles me chamou muito a atenção: uma mulher deixa o filho de colo numa lata de lixo por causa de uma paixão por um homem.

Um dos filmes que passa é o mexicano ESCRAVOS DO RANCOR (1954), de Luis Buñuel, que eu confesso não ter reconhecido. Mas fica-se curioso mesmo é para descobrir o tal filme que a mãe do ator viu antes de morrer. Trata-se do argentino ARMIÑO NEGRO (1953), de Carlos Hugo Christensen. Infelizmente não consegui encontrar cópia deste filme na web. Fiquei curioso.

Quanto a CINEMA DE LÁGRIMAS, só não é ruim porque lida com uma obsessão e com o próprio cinema, dois elementos muito bem-vindos quando se quer ver um bom filme. Além do mais, a marca de Nelson Pereira dos Santos está lá, especialmente ao lidar com o fascínio pela mulher, um elemento que de uma forma ou de outra está presente na obra do diretor. Mas não deixa de ser frustrante que não tenha havido um documentário só sobre o cinema mexicano, outro sobre o cinema brasileiro, outro sobre o cinema argentino, só para citar três cinematografias que têm tanto para serem apresentadas ao mundo.

sábado, setembro 15, 2012

RESIDENT EVIL 5: RETRIBUIÇÃO (Resident Evil: Retribution)



Devemos a Paul W.S. Anderson a primeira adaptação bem sucedida de um videogame para o cinema. No caso, MORTAL KOMBAT (1995). Isso abriu as portas para que ele fosse o homem ideal para dirigir RESIDENT EVIL: O HÓSPEDE MALDITO (2002), que até algum tempo atrás ficou com o título de melhor adaptação para o cinema de um game. Título esse só tirado alguns anos depois com TERROR EM SILENT HILL. As duas primeiras continuações do primeiro filme da série estrelada por Milla Jovovich não fizeram jus ao primeiro, mas o retorno do cineasta à direção no quarto título, RESIDENT EVIL 4: RECOMEÇO (2010), deu novo fôlego à cinessérie.

Isso se deveu muito à utilização da tecnologia 3D, a mesma utilizada por James Cameron em AVATAR, acabando por tornar o quarto filme uma experiência sensorial muito agradável e cheia de efeitos, monstros assustadores e algumas surpresas. E um dos méritos do quarto filme foi não entrar em detalhes sobre a história envolvendo a Umbrella Corporation, a empresa que desenvolveu um vírus que transformou as pessoas em zumbis. Na verdade, a trama é bem mais complexa do que isso, mas é possível se divertir com esses filmes sem saber muito a respeito. Afinal, o que interessa mesmo são as cenas de ação e horror, além, claro, das belas atrizes em cena.

E assim chegamos a este quinto filme, que também foi produzido em 3D, mas com uma tecnologia supostamente mais avançada e câmeras mais leves do que as usadas no anterior. Na verdade, o resultado não chega a ser tão empolgante quanto no quarto filme no que concerne à utilização da tecnologia, mas RESIDENT EVIL 5: RETRIBUIÇÃO (2012) não decepciona ao apresentar algumas novidades, como a utilização dos clones na trama. O começo do filme, com Alice (Milla Jovovich) em uma casa aparentemente normal e com um marido e uma filha pequena, é uma bela maneira de trazer estranheza para a franquia, que nunca teve tempo para momentos de "banalidades familiares".

Uma vez que o filme retorna à velha luta de Alice contra a corporação que a persegue, tudo volta a ser como antes, com a vantagem que as cenas de luta estão mais elaboradas. O fato de contar com mulheres bonitas com roupas colantes e empunhando armas torna a franquia cada vez mais fetichista. Não só Alice se veste assim, mas também a personagem de Sienna Guillory, que reprisa o papel de Jill Valentine, mas desta vez sob domínio mental da Umbrella e, portanto, do lado dos inimigos. Outra atriz que retorna é Michelle Rodriguez, que esteve no primeiro filme e já guarda o arquétipo de mulher durona em praticamente todos os seus trabalhos.

Um detalhe curioso deste quinto filme é que ele é o que mais se aproxima da linguagem dos videogames. Diferente dos anteriores que podem ser vistos independentes de suas origens, RESIDENT EVIL 5: RETRIBUIÇÃO não oferece nenhum momento em que não haja uma missão para a personagem. A diferença entre uma mídia e outra é que no cinema não existe a possibilidade de interatividade. Mas as características dos jogos estão todas lá, cada vez mais explícitas. Para o bem e para o mal.

sexta-feira, setembro 14, 2012

E A VIDA CONTINUA...



Quando se pensava que o hype dos filmes espíritas tinha se esgotado com o fraco O FILME DOS ESPÍRITOS, exibido no ano passado, eis que mais uma produção kardecista chega às telas: E A VIDA CONTINUA... (2012), de Paulo Figueiredo. O diretor, curiosamente, já havia dirigido um filme com essa temática alguns anos atrás, o pouco lembrado O MÉDIUM (1983). O novo trabalho é baseado no best-seller homônimo do espírito André Luiz, psicografado por Chico Xavier. Trata-se de uma produção da Versátil Digital Filmes e acredita-se que encontrará o seu público, pela semelhança que guarda com NOSSO LAR (2010), de Wagner de Assis. No entanto, E A VIDA CONTINUA... é uma produção bem mais modesta, não tem os efeitos especiais milionários de seu antecessor.

É também um filme bastante problemático se for analisado como cinema. As atuações não são boas, a montagem é cheia de saltos bruscos, a direção parece de filme para televisão, a fotografia não é suficientemente nítida para uma exibição na telona e os diálogos não soam naturais. Mas uma vez que se entenda a proposta do filme, até que ele não se sai tão mal e tem um enredo bem interessante e que prende a atenção até o fim, o que não deixa de ser um mérito. Muito desse interesse que o filme proporciona vem do próprio assunto. "De onde viemos" e "para onde vamos" são duas perguntas que muitos filósofos até hoje se perguntam ou até já desistiram de procurar saber. E é nessa lacuna que entra o Espiritismo Kardecista para responder essas e outras perguntas.

E A VIDA CONTINUA... fala de algo que os outros filmes não destacaram: não existe acaso; tudo o que acontece tem a sua razão de ser. Na trama, a jovem Evelina (Amanda Acosta) está com o carro quebrado na estrada quando é socorrida por um senhor gentil chamado Ernesto (Luiz Baccelli). Mais tarde, os dois se encontram no mesmo hotel e vão passar por cirurgias complicadas. Ernesto já se mostra um buscador da verdade e acredita que não existem coincidências. Já Evelina prefere não pensar muito nessas coisas e diz seguir direitinho os dogmas da Igreja Católica. Nem é preciso ser muito gênio para saber que os dois vão morrer na cirurgia e se encontrarão em um outro lugar.

O filme possui várias semelhanças com NOSSO LAR, nesse sentido, ao mostrar tanto o lugar onde as pessoas que desencarnaram vão, caso de Evelina e Ernesto, como também um pouco do lado mais sombrio do pós-morte. Há também momentos bem didáticos, especialmente quando entra em cena o personagem de Lima Duarte, que é uma espécie de mestre guia dos espíritos. E A VIDA CONTINUA.. funciona, portanto, como uma aula do Espiritismo Kardecista. Ainda não responde a todas as perguntas, mas elas são muitas para um filme de menos de 100 minutos. E como os médicos e enfermeiros fazem questão de deixar claro: cada resposta no seu devido momento.

quinta-feira, setembro 13, 2012

SUPER NADA



Uma das boas surpresas do Festival de Gramado, SUPER NADA (2012), de Rubens Rewald e Rossana Foglia, é desses filmes que vai conquistando o espectador aos poucos. No início, tanto o filme quanto o protagonista, Guto, vivido por Marat Descartes, são um tanto patéticos, aparentemente. Mas depois vemos que o comportamento do personagem vem do fato de que ele é um artista que trabalha com mímica e humor físico. Descobrimos isso quando o vemos no palco. É quando o filme começa a ficar interessante. E daí pra frente ele só melhora, principalmente quando flerta com o suspense e até com o horror e muitas vezes com uma melancolia muito bonita e poética.

Há a figura do Super Nada, um personagem de televisão vivido por Jair Rodrigues, que pode até não ser um grande ator, mas tem carisma suficiente para conquistar a audiência. Ele rouba as cenas quando aparece. O programa que ele faz apresenta um conjunto de esquetes cômicas um tanto sem graça, mas que, justamente pelo humor duvidoso e pelo aspecto decadente da figura do protagonista, funciona muito bem para o filme. Além de servir também como uma crítica à televisão.

O fato mais importante da trama se inicia a partir do momento em que o personagem de Descartes é convidado para fazer um teste para o "Super Nada". A partir daí, uma série de eventos acontece que mexem com a cabeça de Guto. Vale lembrar que o filme inicia mostrando o esforço de Guto ganhando dinheiro em pequenas participações pouco nobres em filmes; e em alguns momentos até trabalha na rua para ganhar alguns trocados.

Ao final do filme, é possível alguém sair imitando um dos números de Guto (o do procurar alguma coisa nos bolsos) ou mesmo dizendo uma das falas recorrentes do personagem de Jair Rodrigues: "não está fácil pra ninguém". Muita gente comentou de uma possível premiação para o cantor, mas o único prêmio que o filme ganhou no festival foi o de melhor ator para Descartes. O que não deixa de ser merecido.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste, dois textos meus sobre filmes que vêm por aí: um sobre O HOMEM MAIS PROCURADO DO MUNDO, de John Stockwell, e outro sobre SILVER LINES PLAYBOOK, de David O. Russell.

quarta-feira, setembro 12, 2012

GIRLS – A PRIMEIRA TEMPORADA COMPLETA (Girls – The Complete First Season)



Este ano aparentemente não foi muito pródigo de novas séries de primeira qualidade. Mas GIRLS (2012), escrita, produzida, protagonizada e muitas vezes dirigida por Lena Dunham, é sensacional. Com apenas 26 anos, Lena fez um belo trabalho, desses que parece ter saído de suas próprias entranhas. Gordinha e provavelmente já tendo enfrentado preconceito numa sociedade que cada vez mais cultua o corpo magro, ela não se incomoda em se expor fisicamente em cenas de nudez e de bastante intimidade com o ator que faz o seu namorado Adam (Adam Driver, o único personagem masculino no elenco fixo da primeira temporada).

GIRLS mostra um grupo de quatro amigas totalmente diferentes vivendo em Nova York. Pode-se dizer que há semelhanças com SEX AND THE CITY. Talvez haja mesmo. Mas GIRLS, apesar do título, é bem menos florida que a saga de Carrie Bradshaw e amigas. Até porque a série de Dunham parece melhor escrita e suas personagens são dotadas de uma personalidade forte e interessante. Talvez a mais tímida seja exceção. Talvez ela seja uma personagem a ser melhor desenvolvida nas próximas temporadas. Do jeito que está, é quase o calcanhar de Aquiles da série. Só não chega a comprometer porque ela é a que aparece menos das quatro.

Pode até parecer uma contradição eu começar a falar do preconceito com as gordinhas e depois já sair citando as duas mais bonitas da turma, mas não vou conseguir resistir. Allison Williams no papel de Marnie, a colega de quarto de Hannah (Lena Dunham), é adorável, mesmo às vezes sendo um tanto chata, por ser certinha demais. Por outro lado, há a personagem que é o seu extremo oposto, a inglesinha Jessa (Jemima Kirke), que não liga para as consequências de alguns de seus atos. Mas nem tudo é preto no branco, pois mais tarde veremos que tanto uma como a outra são capazes de coisas que duvidávamos.

A série tem algumas ousadias que podem ser ditas como características do canal HBO, mas talvez GIRLS tenha ido um passo a frente, não exatamente no sentido gráfico, mas no mostrar e no falar sobre sexo de maneira tão aberta e sem pudores. O pacote com os dez episódios da primeira temporada já mostra que o material é de primeira. Agora é esperar pelos próximos. E parabéns a Lena Dunham e também a Judd Apatow, que é um dos produtores executivos. Ele já havia se mostrado bem interessado no humor feminino em MISSÃO MADRINHA DE CASAMENTO e dessa vez pode ter sido responsável por nos apresentar a outra mulher talentosa: Lena Dunham.

terça-feira, setembro 11, 2012

TRÊS FILMES EXIBIDOS NO FESTIVAL VARILUX DE CINEMA FRANCÊS



Com o tempo aumentaram o número de filmes vistos e é preciso dar cabo de alguns. Falemos, então de três filmes exibidos no Festival Varilux de Cinema Francês. Curiosamente, não gostei de verdade de nenhum deles, embora tenham as suas qualidades. E como não tenho muito a falar sobre eles, vamos no rápido, rasteiro e objetivo mesmo.

O MONGE (Le Moine) 

Minha expectativa para com este O MONGE (2011), de Dominik Moll, era grande. Até por eu ter gostado demais de LEMMING – INSTINTO ANIMAL (2005). Mas talvez por causa da projeção digital péssima e muito escura do Cine Del Paseo, que eu considero uma falta de respeito para com a audiência, e um sono derivado do cansaço ainda da viagem a Gramado, acabei não curtindo o filme. Talvez em outras circunstâncias, se eu tivesse deixado para ver em casa mesmo, por exemplo, o filme teria descido melhor. Até porque tem elementos de horror bem interessantes. No filme, Vincent Cassel é um monge espanhol do século XVII que passa a ser atormentado pelas tentações de Satanás. Destaque no filme para Déborah François no papel de uma mulher que se infiltra no mosteiro por amor ao monge.

AMERICANO

Tendo Salma Hayek como principal chamariz, AMERICANO (2011) foi a estreia na direção de Mathieu Demy, que também atua como protagonista. Ele é um americano que passou a maior parte de sua vida na França e que retorna a Los Angeles para resolver pendências relativas ao testamento de sua mãe recém-falecida. Sua esposa, vivida por Chiara Mastroianni, fica em casa, enquanto ele procura saber quem é uma moça chamada Lola, uma garota mexicana que costumava ser próxima de sua mãe. Ele vai parar no México e fica obcecada pela personagem de Salma Hayek. AMERICANO foi lançado recentemente direto em vídeo pela Califórnia Filmes.

ADEUS BERTHE OU O ENTERRO DA VOVÓ (Adieu Berthe - L'Enterrement de Mémé)

Este é mais um caso de comédia francesa que não faz a minha cabeça, mas que acabou sendo bem recebido pelo público do festival, que riu das piadas. ADEUS BERTHE OU O ENTERRO DA VOVÓ (2012), de Bruno Podalydès, pode até ter o seu charme, mas não deixa de ser um dos filmes mais esquecíveis do festival, por mais simpático que seja. Na trama, Denis Podalydès é um farmacêutico que tenta equilibrar sua vida entre duas mulheres: sua esposa e a amante. O interessante é que ele parece amar e ser amado pelas duas. E, como diz no próprio título, há também o caso do enterro de sua avó. A comédia leve brinca com a dúvida entre cremar ou enterrar a falecida e mostra como os franceses costumam mais complicar do que facilitar as suas vidas.

domingo, setembro 09, 2012

SANGUE SOBRE A NEVE (The Savage Innocents)



Depois de mais de um mês sem ver um filme de Nicholas Ray, muito por causa do Festival de Gramado, dou prosseguimento à peregrinação pelo cinema do diretor, agora já em sua fase tardia. SANGUE SOBRE A NEVE (1960) é um filme-irmão de SANGUE ARDENTE (1956) e, principalmente, de JORNADA TÉTRICA (1958). Isso porque todos esses filmes são tentativas do cineasta de nos apresentar a outras culturas, tendo um profundo respeito pelos diferentes costumes desses povos.

Se SANGUE ARDENTE é uma apresentação ao modo de vida dos ciganos habitantes dos Estados Unidos e JORNADA TÉTRICA é uma viagem aos pântanos selvagens do país, SANGUE SOBRE A NEVE vai além e nos leva às regiões geladas do Alasca, onde conhecemos alguns aspectos da cultura dos esquimós. Como o filme é uma coprodução EUA-Itália, o produtor italiano Maleno Malenotti exigiu que um ator conhecido encabeçasse a produção. No caso, o escolhido foi Anthony Quinn. Ray preferia fazer um filme só com atores desconhecidos, para dar um ar de mais verossimilhança à história, mas até que Quinn não faz feio, embora às vezes seja difícil comprá-lo como um esquimó.

Em SANGUE SOBRE A NEVE conhecemos a tradição dos esquimós de oferecerem a própria mulher emprestado a um amigo ou visitante; de matarem o primogênito se este nascer menina; de deixarem à morte um ancião, se ele for considerado um estorvo para a família; de sempre comerem carne crua e viverem muito bem em seus iglus. Vendo assim, até parece que é tudo muito cruel, mas comparando depois com a cultura do branco, vemos o quanto eles são de fato inocentes. A sequência do padre que quer introduzir a noção de pecado a eles é bem representativa disso.

Mas não deixa de causar dó ver a cena da morte do bebê-foca, que com seus olhinhos de cachorro, se deixou matar para servir de alimento para a família de Inuk (Quinn). No começo do filme, ele é um sujeito que vive sozinho até que ele tem a opção de escolher entre duas mulheres. Depois de muita confusão e de ele ter escolhido uma delas e do contato com o homem branco, o filme se asssemelha mais a outras obras de Ray, que sempre tem a tendência de torcer pelo herói incompreendido e procurado como criminoso pela sociedade.

Curiosamente SANGUE SOBRE A NEVE, apesar de ser mais redondinho e bem mais agradável e curioso do que JORNADA TÉTRICA, que é um trabalho todo picotado pelos produtores e de mais difícil digestão, é bem menos exaltado pela crítica. Muito por causa da interpretação de Quinn e dos diálogos em terceira pessoa que parecem forçar um pouco a inocência dos personagens. Mesmo assim, não deixa de ser curioso o modo como eles tratam sempre as suas mulheres como sendo "inúteis" ou algo do tipo. Aliás, elas mesmas se referem a si próprias assim.

SANGUE SOBRE A NEVE é, definitivamente, um filme ecológico e respeitador e que ainda conta com sequências próximas de um documentário, com direito a uma narração que se assemelha à de um programa da National Geograpahic.

sábado, setembro 08, 2012

O QUE EU MAIS DESEJO (Kiseki)



O que passa pela cabeça de alguém que não é acostumado com o estilo de narrativa japonesa como eu é pensar no abismo que existe em nossas culturas, a ponto de eu estranhar ou mesmo não compreender muitos filmes produzidos no arquipélago. E o curioso é que o mesmo não costuma ocorrer com os filmes chineses, que aparentemente são menos contaminados com a cultura americana, já que os japoneses receberam ajuda dos Estados Unidos na reconstrução das cidades de Hiroshima e Nagazaki e assimilaram muito da cultura do país rival. Há também a música, que nos filmes chineses são claramente mais dissonantes, enquanto que nos filmes japoneses são carregadas de um ar pop. O que se percebe é que a cultura japonesa é muito forte. Mesmo tendo uma cultura capitalista próxima da ocidental, tem um enorme diferencial que transparece nos filmes.

Talvez a maior estranheza ao ver O QUE EU MAIS DESEJO (2011) esteja mesmo no estilo narrativo do cineasta, Hirokazu Kore-Eda, que em DEPOIS DA VIDA (1998) mostrou uma visão bem particular da vida após a morte e uma capacidade – que parece ser própria dos japoneses – de parecer mais físicos, mesmo quando mostram fantasmas. Assim como DEPOIS DA VIDA, O QUE EU MAIS DESEJO tem um aspecto enigmático, ao mostrar o povo de uma ilha que se acostuma com um vulcão em atividade, que joga cinzas todos os dias para as ruas e casas. Além do mais, as crianças do filme ficam sabendo de uma lenda que diz que é possível fazer um pedido e ser prontamente atendido, ao ficar próximo de dois trens-bala, quando eles passam muito perto um do outro, gerando uma energia semelhante à de uma estrela cadente.

Mas é de NINGUÉM PODE SABER (2004), talvez o filme mais conhecido de Kore-Eda, que O QUE EU MAIS DESEJO se aproxima. Principalmente por mostrar crianças tendo que se virar sozinhas. Não tanto quanto no filme anterior, já que essas têm pais, embora separados, mas o diretor sabe muito bem trabalhar com as crianças e um dos principais méritos do filme é que todas elas estão muito à vontade em seus papéis.

Os personagens principais são dois irmãos que vivem separados após o divórcio dos pais. Koichi tem 12 anos e mora com a mãe e Ryonosuke, o mais novo, mora com o pai. Os dois moram em cidades diferentes e costumam se comunicar com frequência por telefone. Entre os demais personagens, há o avô, que faz uma espécie de doce não muito doce, as outras crianças e os pais e familiares dos meninos. Nem sempre a junção dessas pequenas subtramas são felizes. É o caso de filme que talvez seja melhor assimilado numa segunda vez, mas não dá muita vontade de ver uma segunda vez. A duração de mais de duas horas parece um tanto excessiva.

O QUE EU MAIS DESEJO é um filme sobre sonhos e desejos. Desde o início, quando o professor pede para que as crianças escrevam uma redação sobre o que eles querem ser quando crescerem, o filme já explicita a questão e depois vai além, quando mostra a peregrinação dos meninos até o local onde os trens-bala se cruzam. É também um filme sobre o olhar das crianças sobre a vida trivial e de pouco sentido dos adultos.

Vi o filme numa cópia em digital bem escura no Cine Dragão do Mar. O lugar, pelo menos dentro da atual gestão, está com os dias contados. Diminuíram o preço do ingresso de 12,00/6,00 para 8,00/4,00. Na próxima semana vai para 6,00/3,00 e na última semana, que se encerra no dia 27 de setembro, o preço vai para 4,00/2,00. Espera-se que não seja o fim, mas um novo começo.

sexta-feira, setembro 07, 2012

O LEGADO BOURNE (The Bourne Legacy)



E o que parecia algo próximo de uma picaretagem, já que não se trata mais de uma adaptação de um livro de Robert Lundlum, nem mais conta com Matt Damon no elenco, acabou se tornando o melhor exemplar da série, desta vez com Tony Gilroy no comando (direção e roteiro) e Jeremy Renner mandando ver como mais um participante das experiências ultrassecretas do governo americano que dão origem a homens quase invencíveis numa luta corpo a corpo e em inteligência estratégica.

Antes de mais nada, O LEGADO BOURNE (2012) tem uma das melhores cenas de perseguição nas ruas da história do cinema. De ficar lado a lado com a de OPERAÇÃO FRANÇA, para citar um exemplo bem óbvio. Isso porque o filme, além de trabalhar muito bem com a montagem (a cargo do irmão John Gilroy, o mesmo de SALT), não é adepto da câmera tremida como a de Paul Greengrass, responsável pelos dois títulos anteriores da franquia. Além do mais, o diretor e roteirista já havia se mostrado habilidoso em thrillers, como visto em CONDUTA DE RISCO (2007). A diferença é que aqui a trama está mais a serviço da diversão.

O LEGADO BOURNE começa com Renner no Alasca, enfrentando o frio, os lobos e tomando umas pílulas coloridas. Aos poucos, o filme vai informando o que são as tais pílulas, à medida que também conhecemos um pouco do passado do protagonista. E como há mais ênfase nas experiências bioquímicas ministradas nos voluntários do programa, fica muito mais fácil para o espectador "comprar" as habilidades físicas e mentais do personagem.

Outro trunfo do filme é a presença gloriosa de Rachel Weisz no papel de uma cientista que sobrevive a um tiroteio ocorrido em seu próprio local de trabalho, não por acaso um espaço pertencente ao grupo que organiza o programa, liderado agora por Edward Norton. Aliás, vale destacar o excepcional elenco de apoio, que conta ainda com Stacy Keach, Albert Finney, David Strathairn, Oscar Isaac, Joan Allen e Zeljko Ivanek. A direção, a equipe técnica e o elenco fizeram de O LEGADO BOURNE o melhor filme de ação do ano.

quinta-feira, setembro 06, 2012

O QUE SE MOVE



Sem dúvida um dos melhores longas-metragens exibidos em Gramado – talvez perca somente para O SOM AO REDOR, de Kleber Mendonça Filho -, O QUE SE MOVE (2012), de Caetano Gotardo, é uma experiência incomum e por isso muito bem vinda em nossa cinematografia. Primeiro longa-metragem de Gotardo, o filme consegue ser um filme de segmentos e ainda ter uma unidade orgânica. São três segmentos envolvendo mães perdendo filhos em diferentes circunstâncias. Todas as histórias foram inspiradas em notícias de jornal e algumas delas serão logo percebidas e conhecidas pela audiência.

O ideal é não saber muito das histórias e por isso não pretendo falar sobre elas aqui. Mas creio que não faz mal falar um pouco da estrutura do filme. O QUE SE MOVE se estrutura em três histórias independentes que contam com momentos musicais. As atrizes que protagonizam cada episódio – Cida Moreira, Andrea Marquee e Fernanda Vianna, esta última, vencedora na categoria de melhor atriz no Festival de Gramado – cantam os seus dramas, com muita beleza e passando a dor de seus sentimentos. Nesse sentido, Gotardo teve muita sensibilidade e cuidado para que seu filme não caísse no melodrama choroso. Se bem que eu não iria reclamar se caísse.

Mas do jeito que está o filme se torna mais respeitado por todos, inclusive pelos mais racionais, que verão traços de outros grandes autores do cinema mundial. É fácil perceber, por exemplo, Apichatpong Weerasethakul no clima inicial do primeiro segmento, que a princípio traz o filho adolescente da personagem de Cida Moreira como protagonista. Depois é que isso se inverte. Mas há todo um mistério que envolve a vida e o modo de se relacionar daquele jovem e uma moça que ele encontra numa região campestre, quando dialogam sobre o significado das coisas, muito lembrando poemas de Alberto Caeiro.

O segundo segmento também é marcado por um mistério que assombra mais o pai da criança do que a própria mãe, que aparece numa bela cena envolvendo uma criança, antes de cantar e resumir a tragédia ocorrida. Mas é o terceiro segmento que, embora possa ser visto como o mais feliz, é o que mais traz comoção, com uma performance espetacular de Fernanda Vianna. É quando vemos que a noção de perda no filme é vista de maneira bem ampla e, por isso mesmo, só tem a ganhar com essa história carregada de dor e beleza. Torçamos para que O QUE SE MOVE alcance um bom público quando estrear no circuito comercial. Certamente é um trabalho que merece todo nosso carinho.

P.S.: Confira oito destaques do Festival de Veneza, que está rolando até o dia 8. No Blog de Cinema do Diário do Nordeste. Veja AQUI.

quarta-feira, setembro 05, 2012

O DITADOR (The Dictator)



Uma das coisas mais tristes de se ver é uma comédia sem graça. Claro que estamos falando de algo completamente subjetivo, já que ouvi gente dizendo que O DITADOR (2012) é hilariante. O fato é que não vi a menor graça no novo filme de Sasha Baron Cohen, dirigido por Larry Charles. Os dois novamente juntos depois do sucesso de BORAT – O SEGUNDO MELHOR REPÓRTER DO GLORIOSO PAÍS CAZAQUISTÃO VIAJA À AMÉRICA (2006).

Seis anos separam um filme do outro. A ideia dos dois filmes é parecida, com a diferença que a estrutura da comédia desta vez é mais convencional, saindo o registro do falso documentário. Continua o personagem exótico de outro país que chega aos Estados Unidos e enfrenta choque de valores e de cultura. Mas ao contrário de Borat, que era muito ingênuo, Aladeen, o ditador, tem a intenção de não permitir que a democracia chegue a seu país, como quer a ONU.

De nada adiantou tanta propaganda de Sasha Baron Cohen, que foi até a cerimônia do Oscar deste ano brincar de jogar as cinzas do ditador da Coreia do Norte no tapete vermelho. O filme, que começa com uma dedicatória in memoriam a Kim Jong-il, não teve o sucesso esperado nas bilheterias, ficando atrás tanto de BORAT quanto de BRÜNO (2009). O DITADOR também possui um humor bem mais brando do que o de BORAT. O melhor está no trailer, que de tantas vezes que foi exibido nos cinemas foi perdendo a graça.

Os coadjuvantes de destaque no filme são: Ben Kingsley como o suposto braço direito de Aladeen; Megan Fox, interpretando ela mesma recebendo uma pequena fortuna por um programa com o ditador; Anna Faris, como a moça que ajuda Aladeen quando ele está no anonimato (sem a barba); John C. Reilly, como o homem que tira a barba de Aladeen (e isto está no trailer!); e Edward Norton, numa ponta meio constrangedora e sem graça.

P.S.: Saiu a lista das melhores cenas do cinema eleitas pela Liga dos Blogues Cinematográficos. Confira AQUI.

terça-feira, setembro 04, 2012

CONTOS GAUCHESCOS



Único longa-metragem que eu vi da Mostra Especial de Cinema Gaúcho, que acontecia no período da tarde no Palácio dos Festivais, em Gramado, CONTOS GAUCHESCOS (2012), de Henrique de Freitas Lima, tem uma vantagem para aquelas pessoas que conhecem pouco da história da formação do povo gaúcho, que é começar com um pequeno documentário sobre o livro homônimo de João Simões Lopes Neto, considerado uma obra fundadora da identidade gaúcha e que neste ano completa 100 anos. Eu, como não conhecia nada deste escritor, achei bem interessante esse momento mais didático.

Depois disso, o filme começa a contar algumas histórias que constam no livro. Algumas muito boas, outras, nem tanto. Provavelmente a que mais chama a atenção é a estrelada por Ingra Liberato. No segmento, ela é a mãe de uma garota que está prestes a se casar com um rapaz. Eles vivem nas regiões fronteiriças, onde tantas guerras foram travadas. E é em busca de um vestido de noiva para a filha que o pai encontra um destino trágico.

Outro segmento bem interessante lida com a história de um homem que de tanto apostar, chega ao cúmulo de apostar a própria esposa. Dá para notar, só com esses dois exemplos, que as histórias de CONTOS GAUCHESCOS são todas manchadas de sangue. E aí está a beleza e o interesse que elas causam no espectador. Outra coisa que chama a atenção é a linguagem toda própria dos gaúchos da fronteira, com um vocabulário muitas vezes incompreensível para quem não é do Rio Grande do Sul.

A primeira parte do filme, a que fala da vida e da obra do escritor, foi produzida e dirigida por Pedro Zimmermann. Henrique de Freitas Lima completa o filme com adaptações dos contos "Os cabelos da China", "Jogo do osso", "Contrabandista" e "No manantial".

segunda-feira, setembro 03, 2012

PROCURA-SE UM AMIGO PARA O FIM DO MUNDO (Seeking a Friend for the End of the World)



E Steve Carell tem conseguido se livrar do fantasma de Michael Scott, seu mais famoso personagem, da série THE OFFICE. Depois de aparecer como terapeuta em UM DIVÃ PARA DOIS, ele é o protagonista deste pequeno e simpático filme independente. PROCURA-SE UM AMIGO PARA O FIM DO MUNDO (2012) é uma espécie de MELANCOLIA light. Trata de mostrar o comportamento das pessoas diante do fim iminente com o choque de um meteoro no planeta Terra.

Assim, com pouco tempo de vida, assim que soube do fim do mundo em questão de meses ou semanas, a mulher de Dodge (Steve Carell) o abandona. Sem muito ânimo para viver, ele continua em seu trabalho que cada vez menos tem razão de existir: uma seguradora. Ele encontra um motivo para viver ao encontrar na janela de seu apartamento uma jovem chorando (Keira Knightley). Ela, Penny, havia brigado com o namorado e com o tempo os dois acabam se tornando amigos. Ela entrega umas correspondências atrasadas a ele. E uma das cartas é a de um amor dos tempos de colégio de Dodge. Eis um motivo para passar os seus últimos dias na Terra: sair com Penny e um cachorrinho adotado em busca dessa mulher.

O road movie ao mesmo tempo sentimental e cômico reserva algumas pequenas surpresas e alguns momentos bem divertidos, como o do caminhoneiro suspeito ou o do bar de amigos doidões. Um dos pontos positivos do filme é que o protagonista comete erros estúpidos; e isso torna a história mais envolvente e prepara o espectador para o final.

PROCURA-SE UM AMIGO PARA O FIM DO MUNDO é a estreia na direção da pouco conhecida atriz e roteirista Lorene Scafaria. Seu trabalho discreto para um filme sobre o fim do mundo e que conta com um ator famoso por personagens cômicos conta pontos a seu favor. E Keira Knightley está bem diferente, com o cabelo desgrenhado e quase sempre agarrada a uma meia dúzia de vinis. O destaque do filme é o retorno ao físico, depois de estarmos tão acostumados com o contato distanciado e facilitado através de tecnologias de comunicação.

domingo, setembro 02, 2012

13 CURTAS EXIBIDOS EM GRAMADO



Não vou falar de CASA AFOGADA, de Gilson Vargas, pois já falei sobre ele quando escrevi sobre os curtas gaúchos. E não vi A TRISTE HISTÓRIA DE KID PUNHETINHA, de Andradina Azevedo e Dida Andrade, pois foi o curta que eu perdi de ver, da mostra competitiva. De extra, há o curta de Davi de Oliveira Pinheiro, O BEIJO PERFEITO, que não vi no festival na Mostra Curtas Gaúchos, mas tive a chance de ver em casa. Vamos aos filmes. Jogo rápido. De antemão, já adianto que foi uma bela de uma seleção de curtas.

LINEAR

O breve curta de Amir Admoni tem como destaque visual a junção da animação com o live action com muito sucesso. Na trama, um bonequinho sai fazendo o trabalho de pintar as linhas no asfalto de uma grande avenida, em meio ao trânsito infernal e ao lixo jogado nas ruas. Filme bonito de ver e bom para refletir. 2012, 6'.

DICIONÁRIO 

Acho que eu estava um tanto disperso quando vi este curta kafkiano de Ricardo Weschenfelder. É um dos curtas que mais gostaria de rever para entender melhor. Mas pelo que me lembro há uma bela fotografia e um ar enigmático envolvendo palavras. 2012, 15'.

DIÁRIO DO NÃO VER 

Se não consegui me envolver com DICIONÁRIO, o mesmo não posso dizer de DIÁRIO DO NÃO VER, de Cristina Maure e Joana Oliveira, que emociona e prende a atenção, ao mostrar a crescente chegada da cegueira a uma mulher e seu difícil processo de adaptação. O filme é belo e intimista e destaca os sonhos que ela tem, enquanto seu mundo fica cada vez mais escuro. 2012, 21'.

META 

Provavelmente o mais engraçado dos curtas exibidos na mostra competitiva principal, META, de Rafael Baliu, lembra um pouco o trabalho de HERMES & RENATO, mas é mais criativo e passa longe de descambar para a grosseria. O filme brinca com a metalinguagem, ao mostrar um personagem que quer dirigir um filme em que ele e sua própria equipe técnica atuam. Tudo para conquistar a garota dos seus sonhos. 2012, 20'.

DI MELO, O IMORRÍVEL 

A seleção dos curtas só trouxe dois documentários e certamente DI MELO, O IMORRÍVEL, de Alan Oliveira e Rubens Pássaro, é o mais brilhante. O curta fala de um cantor que gravou um único disco em 1975 e sumiu. Di Melo conquista com sua presença, assim como também sua esposa. O filme ganhou o prêmio de melhor montagem. 2011, 24'.

MENINO DO CINCO

O grande vencedor da categoria de curtas-metragens, o baiano MENINO DO CINCO, de Marcelo Matos e Wallace Nogueira, é um impressionante filme que lembra o trabalho dos irmãos Dardenne, mas que tem identidade própria. Na trama, um cachorrinho de um menino pobre vai parar num condomínio de um menino rico, que deseja adotá-lo. Não dá para imaginar o quanto o filme cresce até chegar ao final impactante. MENINO DO CINCO ganhou os prêmios de melhor filme, Canal Brasil, júri popular, melhor ator (para os dois meninos), melhor roteiro e prêmio da crítica. 2012, 20'.

A MÃO QUE AFAGA 

O lynchiano trabalho de Gabriela Amaral Almeida é outro exemplo da vitalidade dos curtas brasileiros. A MÃO QUE AFAGA mostra a rotina de uma operadora de telemarketing e sua tentativa de fazer um aniversário para o filho de nove anos, contratando um homem vestido de urso. Grande filme sobre a solidão e que trabalha muito bem as sombras. O filme ganhou o prêmio especial do júri. 2011, 19'.

FUNERAL À CIGANA 

Caso de curta que começa muito bem, mas parece que aconteceu alguma coisa na produção para que ele termine de maneira brusca e com uma conclusão pouco satisfatória. Mostra um grupo de ciganos em busca de enterrar o patriarca morto no lugar que ele desejava. FUNERAL À CIGANA, de Fernando Honesko, ganhou o prêmio de melhor trilha musical. 2012, 15'48".

PIOVE, IL FILM DI PIO 

O segundo documentário da seleção é também muito bom. Retrata Pio Zamuner, cineasta esquecido que dirigiu os últimos 12 filmes de Mazzaropi. O trabalho de Thiago Mendonça mostra um homem que, apesar de aposentado, ainda tem a mania de controlar. É também um retrato um tanto melancólico e saudosista da Boca do Lixo. 2012, 14'56".

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O símbolo que pode ser chamado de "jogo da velha" é o título deste curta de André Farkas e Arthur Guttilla que é mais um exercício de composição de luzes e animação num cenário urbano. Chegou a me incomodar um pouco, por causa do excesso de luzes. 2011, 8'48".

O DUPLO

O meu preferido dentre todos da seleção (junto com MENINO DO CINCO), O DUPLO (foto), de Juliana Rojas, é uma beleza de filme de horror, que lida com o mito do doppelgänger, o duplo maligno que cada pessoa supostamente tem. O duplo no filme é o da professora Silvia, que tem sua vida atormentada a partir do momento em que ela vê uma pessoa igual a ela passeando pela escola. O filme tem momentos de arrepiar e outros de causar muito incômodo. Ganhou o prêmio de melhor atriz para Sabrina Greve e teve exibição no Festival de Cannes. 2012, 25'.

UM DIÁLOGO DE BALLET 

O filme de Filipe Matzembacher e Márcio Reolon que encerra a mostra competitiva de curtas do Festival de Gramado não me animou muito. Mas lembro de críticos que elogiaram o trabalho, que lida com sentimentos e pensamentos de um jovem e um homem mais velho diante do fato de serem homossexuais. 2012, 7'30".

O BEIJO PERFEITO

O curta, extremamente curto, de Davi de Oliveira Pinheiro, é daqueles que mal a gente pisca e já acabou. Por isso, foi até bom eu ter visto em casa, já que pude ver pelo menos três vezes para procurar entender o mistério. O pouco que há de imagens é muito bom. Renderia provavelmente um filme melhor se houvesse mais dinheiro envolvido. Do jeito que está, é um bom teaser. 2012, 1'34".

P.S.: Está no ar, finalmente, a nova edição da Revista Zingu!. A edição traz como destaque o Dossiê Júlio Calasso e o Especial Francisco Di Franco. Colaborei com um texto sobre FILME DEMÊNCIA, de Carlão Reichenbach, escrito alguns meses antes de sua morte. A revista é também de despedidas: despedida de Adilson Marcelino como editor chefe e da coluna "Reflexos em Película", de Filipe Chamy.