terça-feira, julho 31, 2012

DEAR ZACHARY – UM CASO CHOCANTE (Dear Zachary: A Letter to a Son about His Father



Quando li o texto de André Barcinski falando a respeito em sua coluna, achava que iria chorar rios de lágrimas com este documentário sobre um rapaz que é assassinado por sua própria namorada. Mas no fim das contas achei o filme mais uma paulada que gera muita indignação do que exatamente um documentário feito para chorar. Mas sei também que cada pessoa reage de maneira diferente. E hoje, pensando no filme, e pensando nos familiares do rapaz e por tudo que passaram, quase deu vontade de chorar.

Mas na hora não. Especialmente em certo momento, DEAR ZACHARY – UM CASO CHOCANTE (2008) se assemelha até a um filme de horror. Mas um horror que chega a ser ainda mais impressionante do que qualquer filme de ficção do gênero, porque se trata de uma história real, o que torna tudo ainda mais absurdo.

O subtítulo original, que em português significa "uma carta para um filho sobre seu pai", dá o tom do que pode ser o filme. O próprio diretor, Kurt Kuenne, era amigo pessoal de Andrew Bagby, o jovem enfermeiro que teve sua vida ceifada por uma maníaca, depois que ele terminou o namoro com ela. Seu corpo foi encontrado num terreno baldio, cravado de balas.

Uma das coisas que causa indignação é a maneira como a justiça trata o caso, prendendo, mas rapidamente soltando a assassina. Que carregava em sua barriga, no tribunal, um filho de Andrew Bagby. Falar mais do que isso (até acho que já falei demais) pode estragar o que ainda há por vir. Como o próprio Barcinscki falou, é um filme que estraga o seu domingo (ou qualquer dia da semana), mas que deve ser visto. Até para refletirmos sobre o mal existente no espírito de certas pessoas e sobre o quanto ainda podemos nos surpreender com este mundo em que vivemos.

P.S.: No blog de cinema do Diário do Nordeste, há uma matéria sobre os filmes que têm sua exibição cancelada nos cinemas e vão parar no mercado de vídeo. AQUI.

segunda-feira, julho 30, 2012

A TERCEIRA MARGEM DO RIO



A gestação de A TERCEIRA MARGEM DO RIO (1994) foi bem complicada. E é uma pena que o resultado tenha sido tão fraco, levando em consideração o fato de que era uma obra bastante perseguida por Nelson Pereira dos Santos. E todas as obras que ele trabalhou com obsessão, como VIDAS SECAS (1963), COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS (1972) e MEMÓRIAS DO CÁRCERE (1984), representam o que de há melhor na filmografia do cineasta. Não foi o caso de A TERCEIRA MARGEM DO RIO, adaptação de cinco contos de Primeiras Estórias, de João Guimarães Rosa, que já era um projeto antigo de Nelson, mas que ele só começou a querer materializar em 1989.

Nesse ano, ele já tinha o roteiro pronto, baseado nos contos "A terceira margem do rio", "A menina de lá", "Os irmãos Dagobé", "Sequência" e "Fatalidade". Em seu roteiro os personagens e as ações desses cinco contos, que são independentes, se reúnem e se interpenetram. O problema foi dar à luz a obra tendo um obstáculo tão grande quanto Fernando Collor de Mello, o homem que conseguiu fazer com o cinema brasileiro em um dia o que a ditadura militar não conseguiu em 21 anos de repressão: destrui-lo completamente.

Era o fim da Embrafilme e 40 projetos de filmes foram atirados na lata de lixo. Além do mais, a primeira parcela do dinheiro que havia sido depositada para a realização do filme de Nelson foi confiscada por Collor e sua ministra Zélia Cardoso de Mello. O lado menos ruim da situação é que Collor não conseguiu fechar o seu mandato: foi expulso em dois anos pelo povo brasileiro com um impeachment. Assim, aos poucos, o cinema brasileiro foi tentando ensaiar seu retorno.

Nelson Pereira dos Santos conseguiu metade do dinheiro da produção com os franceses, que entraram como coprodutores. O problema foi conseguir a outra metade. Foi tudo muito difícil. Após sete anos longe dos sets, Nelson finalmente voltava para filmar A TERCEIRA MARGEM DO RIO em Brasília e em Minas Gerais. Infelizmente o resultado não foi dos melhores e o filme foi bombardeado com críticas negativas. Nelson, em depoimento triste e cansado, chegou a dizer: "Mas consegui terminar o filme. As dificuldades não podem servir para justificar se fiz um filme bom ou ruim. Não teria sentido eu ficar me justificando atrás delas".

Antes de assistir o filme, resolvi ler os cinco contos. Fiquei particularmente encantado com "A menina de lá", pra mim, melhor até do que "A terceira margem do rio", que costuma ser mais incessado. A magia do conto infelizmente não encontra forças no filme, que parece amador, feito de qualquer jeito. Nem parece o mesmo diretor de MEMÓRIAS DO CÁRCERE ali. Dá-se um desconto por causa das dificuldades de produção. Mas há tantos filmes que passaram por infernos nos bastidores e que nasceram belos e poderosos.

domingo, julho 29, 2012

BATMAN – O CAVALEIRO DAS TREVAS RESSURGE (The Dark Knight Rises)



O cinema é uma caixinha de surpresas e justamente como aconteceu no ano passado, quando a adaptação de quadrinhos de super-heróis de 2011 que eu mais esnobava acabou sendo a melhor do ano (X-MEN – PRIMEIRA CLASSE), eis que o fato se repete com BATMAN – O CAVALEIRO DAS TREVAS RESSURGE (2012), justamente de um cineasta de que não sou nada fã, embora reconheça suas ótimas ideias, mas que geralmente me decepciona a maneira como ele materializa essas ideias para as telas.

Todo mundo diz: não há um grande vilão como o Coringa de Heath Ledger no filme. Mas seria mesmo difícil haver. Aquilo foi algo único, uma interpretação quase possessa de um personagem quase demoníaco no corpo de um ator. Portanto, é mais do que satisfatória a opção por um supervilão como Bane, interpretado por um bombado Tom Hardy. Sem falar que a ênfase no tema do terrorismo exacerbado ao longo de todo o filme é muito representativa da sociedade em que vivemos. Principalmente na paranoica sociedade americana.

Elogiar aspectos técnicos como efeitos visuais e pirotecnias de primeira qualidade é chover no molhado. Hollywood, com suas produções milionárias desse porte, tem mais é que mostrar serviço nesse aspecto. É praticamente uma obrigação deles. Portanto, são outros os aspectos que merecem ser avaliados, como: a construção da narrativa; o desempenho dos atores e o quanto eles se ajustam aos personagens; a ordenação das cenas e o cuidado com os furos, que muitas vezes acontecem devido aos cortes na montagem.

Com a ausência do Coringa de BATMAN – O CAVALEIRO DAS TREVAS (2008) e com uma história infinitamente superior ao fraco BATMAN BEGINS (2005), o Bruce Wayne/Batman de Christian Bale ganha força, torna-se um herói ainda mais problemático, quase um Howard Hughes no início do filme, escondido em sua decadente mansão. A queda do homem e o desaparecimento do herói são o mote inicial do filme, além do aparecimento do terrorista mascarado Bane e de uma ladra inescrupulosa e sexy como a Mulher-Gato de Anne Hathaway. A atriz mostra mais uma vez a sua versatilidade e competência.

O elenco, aliás, é muito atraente. Além dos já citados, há ainda Michael Caine como Alfred; Joseph Gordon-Levitt como uma espécie de policial braço direito de Batman; Gary Oldman como o Comissário Gordon; Morgan Freeman como Lucius Fox; a linda Marion Cotillard como a milionária Miranda Tate; e Matthew Modine como um policial de Gotham. Um elenco desses é de fazer inveja a muito diretor.

Algumas sequências são particularmente memoráveis, como a sucessão de explosões na cidade, provocada por Bane, e o caos que se instala (a cena no estádio de futebol americano é fantástica e o garotinho cantando "Star-Spangled Banner" só contribui para tornar o cenário ainda mais frágil); a primeira queda do morcego; as intervenções da Mulher-Gato; a ênfase nos policiais e a batalha corpo-a-corpo entre eles e os seguidores de Bane. Até lembra as batalhas sangrentas de GANGUES DE NOVAS YORK, de Martin Scorsese. Mas, claro, sem a violência explícita.

A trilha sonora tribal, especialmente o tema de Bane, é também digna de nota, cortesia de Hans Zimmer. É curiosamente um filme que, apesar de ter uma duração mais longa do que os anteriores, parece mais bem resolvido, por mais que Bane, com o tempo, deixe de ser um vilão assustador para se tornar até um tanto irritante, no desenvolvimento. E a reviravolta final, embora seja um tanto apressada, é relativamente satisfatória. Enfim, um filme de Nolan que me satisfaz desde INSÔNIA (2002). E lá se vão dez anos.

sábado, julho 28, 2012

LUCK



A palavra "sorte" geralmente é associada a algo positivo. Mas na verdade há a boa sorte e a má sorte. E provavelmente foi essa última que chegou para incomodar a produção de LUCK (2011-2012), a série produzida por Michael Mann (que dirigiu o piloto) e David Milch, criador também de DEADWOOD (2004-2006) e JOHN FROM CINCINNATI (2007). A má sorte em torno de LUCK se deu por causa da morte de quatro cavalos durante as filmagens. A sociedade protetora dos animais, as redes sociais e outros grupos acabaram pressionando até que a série acabou antes do planejado, com nove episódios da primeira temporada e dois da segunda temporada que permaneceram inéditos.

Confesso que nunca fui fã da série. Nem mesmo o piloto dirigido por Michael Mann me entusiasmou. Claro que há aquele visual lindo, as cores são fantásticas, especialmente quando o filme se concentra na corrida de cavalos, mas os personagens parecem ter sempre aquela cara de tédio. Nem mesmo o grupo de apostadores que tem um rapaz com o dom de apostar matematicamente e quase sempre ganhar, para depois torrar tudo em jogo nos cassinos, parece ser feliz. Um deles, inclusive, além de paraplégico, sofre com problemas de respiração e vive tomando oxigênio constantemente.

Além do mais, a cara de bocó de Dustin Hoffman e sua trama complicada e arrastada meio que sintetizam o tom geral da série, embora outros núcleos sejam mais interessantes. Mas não o suficiente para tornar a série suficientemente atraente. Pelo que eu vi de DEADWOOD e de JOHN FROM CINCINNATI, esse parece ser um problema das criações de David Milch. DEADWOOD, não consegui acompanhar uma temporada completa; e JOHN FROM CINCINNATI, eu só vi até o fim a única temporada, pois sabia que era a única. Mesmo caso de LUCK, que só resolvi ver completa pois soube de seu cancelamento. Ainda assim, vi os episódios com um espaçamento longo, sem muita vontade.

Certa vez, para tentar me localizar na trama cheia de personagens, resolvi anotar seus nomes e suas características. Acabei perdendo as anotações, mas creio que isso me ajudou um pouco a entender a lógica das subtramas, mas não me ajudou a gostar da série. Curiosos, no entanto, os últimos dois episódios, que foram feitos com um pouquinho mais de pressa e talvez seguindo um caminho diferente do esperado. A trama do personagem de Dustin Hoffman explicitou os ares de filme de gângster, com direito a violência brutal.

Talvez os personagens mais simpáticos, embora curiosamente sejam um tanto antipáticos, são os de John Ortiz e Nick Nolte, sempre preocupados com seus cavalos e a performance de suas corridas. Nolte quase não fala; muitas vezes resmunga. Mas é um grande ator e soube dar vida ao personagem. E curiosamente LUCK não é uma série que apela para o sexo e a violência, que são características das séries da HBO. Pelo visto, Milch não quis fazer essas concessões, preferindo fazer a série do seu jeito. Teve que pagar o preço por isso. E também pela morte dos cavalos.

sexta-feira, julho 27, 2012

MARGARET


Uma pena ter que dizer isso, mas, hoje em dia, o melhor do cinema não está no cinema. O circuito brasileiro, pelo menos, não tem dado o devido valor às joias que se produzem e que acabam sendo descobertas pelos cinéfilos através da internet. Santa internet, nesse caso. De que outra maneira teríamos acesso a esta maravilha que é MARGARET (2011), de Kenneth Lonergan? Trata-se do segundo longa-metragem do diretor, que só havia feito até então o belíssimo CONTE COMIGO (2000). Como ele é mais dramaturgo que cineasta, Lonergan tem uma habilidade com o trato com os diálogos, o texto e a interpretação, mas sem torná-los "teatrais" quando transpostos para o cinema.

Junte-se sua dedicação ao teatro com as dificuldades enormes da longa gestação de MARGARET e temos esse longo hiato na carreira de um cineasta que poderia nos presentear com mais filmes prazerosos como este. É também uma pena saber que, devido a problemas relacionados a disputas judiciais com financiadores e outros problemas de ordem burocrática e financeira, o filme quase não viu a luz do dia e ainda ficou sem 36 minutos, que foram cortados por imposição da Fox Searchlight. O filme ficou com duas horas e meia. Para se ter uma ideia de quanto o filme rodou, um dos produtores executivos é Sydney Pollack, falecido em 2008! E no final, quem acabou montando a versão para cinema não foi Lonergan, mas Martin Scorsese e Thelma Schoonmaker.

Acontece que MARGARET não é um drama qualquer e sua razoavelmente longa duração não é sentida. Cada cena é feita com tanto carinho que poderia ter cinco horas de duração que sairíamos ganhando. Fica essa impressão, pelo menos. O ideal é fazer como eu: ver o filme sem saber nada a respeito, sem ler nenhuma crítica. Mas como eu estou aqui para escrever a respeito, falemos um pouco da trama sem entregar muita coisa.

MARGARET conta a história de uma garota, Lisa Cohen, vivida por Anna Paquin, no melhor momento de sua carreira, que enfrenta conflitos internos e externos nas mais variadas esferas de sua vida: na família, na escola, na vida sentimental. E tudo se torna ainda mais complicado e intenso depois que ela é parcialmente responsável por um acidente fatal, numa das cenas mais impactantes do cinema dos últimos anos. O fator surpresa, claro, ajuda a torná-la mais perturbadora e trágica.

O filme retrata também um momento especialmente tenso para os americanos, já que a história se passa ainda poucos anos após o calor dos acontecimentos do 11 de setembro. E isso é explicitado nas calorosas discussões das aulas de História e em tomadas que mostram aviões sobrevoando o céu de Nova York. A construção da personagem de Lisa, porém, é que é o grande mérito do filme. MARGARET é quase todo centrado nela e algumas vezes em sua mãe (J. Smith-Cameron). Nota-se uma jovem ainda tateando para encontrar o seu caminho e procurando justiça para o que aconteceu no acidente.

O elenco de apoio excepcional, formado por Mark Ruffalo, Jean Reno, Kiearan Culkin, Matt Damon e outros nomes menos conhecidos mas não menos brilhantes, contribui para tornar MARGARET ainda mais especial. E assim como acontece em CONTE COMIGO, Lonergan deixa a catarse para o final, mas de uma maneira muito discreta e delicada, que faz com que a gente fique olhando para a tela em respeito ao fim de uma obra-prima do cinema contemporâneo.

P.S.: Confira no Blog de Cinema do Diário do Nordeste a relação dos filmes selecionados para o Festival de Veneza 2012. AQUI.

quinta-feira, julho 26, 2012

ATAQUE AO PRÉDIO (Attack the Block)























A estreia de Joe Cornish no cinema com ATAQUE AO PRÉDIO (2011) ocorreu praticamente em paralelo com seu sucesso como roteirista em Hollywood, com AS AVENTURAS DE TINTIM (2011), de Steven Spielberg. Cornish também foi contratado como um dos roteiristas de ANT-MAN, o filme do Homem-Formiga. ATAQUE AO PRÉDIO foi lançado direto em vídeo no Brasil. Por isso é pouco conhecido do grande público, que a princípio pode julgá-lo como um terror B ordinário. Na verdade, esta produção inglesa, além de trazer muita ação e os monstros mais criativos dos últimos anos, também trata da questão do abismo social existente entre os brancos e os negros, filhos de emigrantes, na Inglaterra.

Na trama, um grupo de jovens marginais do sul de Londres assalta uma jovem que passa pela rua à noite. No mesmo momento, caem do céu objetos estranhos, que logo revelam ser criaturas extraterrestres. Uma dessas criaturas, menorzinha, é morta pelo líder da gangue, Moses. Aos poucos, outras criaturas, desta vez, mais assustadoras, pois são maiores, completamente escuras e com apenas os dentes brilhantes à mostra, perseguem ferozmente o grupo. Os garotos acabam tendo que pedir ajuda à moça que eles assaltaram.

ATAQUE AO PRÉDIO é um mix de gêneros: drama, terror, comédia, ficção científica, filme de gangues e ainda lida com as questões sociais que o país quer esconder. Os efeitos especiais são simples, mas funcionam que é uma beleza. Como todas as cenas acontecem à noite, os monstros peludos ficam mais assustadores. Sangue e gore não faltam ao longo da longa perseguição. Não tão longa, na verdade, pois o filme tem menos de uma hora e meia de duração. Assim, não cansa o espectador, diverte, passa um sentimento de solidariedade e traz um espetáculo um pouco diferente do que estamos acostumados a ver no cinema americano.

quarta-feira, julho 25, 2012

ANJO LOIRO



Começando hoje uma nova e pequena peregrinação. Desta vez, pelo cinema do diretor paulista (e também crítico de cinema) Alfredo Sternheim. Como não consegui cópia de seu primeiro longa-metragem, PAIXÃO NA PRAIA (1972), comecemos pelo segundo, que é até bem mais atraente: ANJO LOIRO (1973), estrelando Vera Fischer. O filme é baseado na mesma novela de Heinrich Mann que deu origem a O ANJO AZUL (1930), de Josef von Sternberg. E se o filme de Sternberg, naquela época, foi considerado sensualmente ousado, a versão brasileira, mesmo com a censura que rondava forte na década de 1970, é mais picante, com cenas de nudez da Miss Brasil Vera Fischer, que até então só tinha feito um filme: SINAL VERMELHO – AS FÊMEAS, de Fauzi Mansur.

Mas antes de Vera Fischer e Mário Benvenutti assumirem os papéis principais, ANJO LOIRO havia sido pensado para Adriana Prieto e Francisco Cuoco, que por razões relacionadas ao erotismo do filme acabaram não aceitando. Vera Fischer foi uma imposição do produtor, que dizia que ou tinha a atriz ou não tinha filme. Acabou sendo uma escolha muito boa, já que, apesar de ainda inexperiente como atriz, Vera compensava com sua beleza e sensualidade. No campo da nudez, o máximo que o filme oferece são os seus belos seios.

Mas o que interessa de verdade é que o filme funciona muito bem como descida aos infernos de um homem maduro que perde tudo por causa da paixão por uma moça mais nova e manipuladora, demonstrando um excelente domínio narrativo do diretor. Para quem é homem, é fácil se solidarizar com o sisudo professor de História (Benvenutti) que, depois de aconselhar o seu aluno (Ewerton de Castro) a se afastar da garota para melhorar suas notas que despencaram por causa de sua paixão por ela, ele mesmo, quarentão, mas com pinta do cinquentão de hoje, começa a querer se envolver com a moça.

Pena que o filme, após ser um estouro de bilheteria, em sua quinta semana em cartaz foi proibido pelos censores, que só o liberaram depois de seis meses. Quando retornou, ANJO LOIRO já tinha perdido o fôlego. Mais detalhes sobre a censura desse filme e o encontro de Sternheim com o General Antônio Bandeira, chefe da Polícia Federal do Governo Médici, podem ser conferidos no livro "Alfredo Sternheim – Um Insólito Destino".

terça-feira, julho 24, 2012

VALENTE (Brave)



A Pixar, desde sua criação, pareceu uma versão mais moderna dos clássicos animados da Disney. VALENTE (2012) é o título que mais se aproxima dos filmes de época da produtora, sendo o primeiro que lida com esse universo de reis, princesas, castelos e bruxas. Que é algo que também está na moda novamente. As séries de televisão voltaram a lidar tanto com o épico, o gênero "capa e espada", quanto com os contos de fada, por exemplo. E o cinema, vez ou outra também.

Outra coisa que aproxima VALENTE dos clássicos animados da Disney é o fato de possuir canções. São poucas em comparação com os filmes pré-computação gráfica, mas estão lá. E não incomodam nem um pouco. Ao contrário: contribuem para a poesia do filme. VALENTE é uma bela fábula com lições de moral, mas que também consegue superar ou problematizar a mera lição de que não se deve desobedecer aos pais.

Em VALENTE, a jovem princesa Merida parece não ter nascido para as convenções sociais exigidas pela sociedade real. Daí ela ter mais afinidade com o desengonçado e bruto pai do que com a mãe, elegante e sempre preocupada com as etiquetas e com o comportamento da filha. Quando Merida fica sabendo que vai ser escolhida como noiva em uma competição entre rapazes de três clãs, ela fica indignada. Como se sabe, na Antiguidade e na Idade Média, era muito comum o casamento arranjado. E nas famílias reais era um fato de preocupação ainda maior, já que uma princesa, por exemplo, não podia casar com um plebeu.

Inconformada e revoltada, Merida foge de casa, indo parar, meio que sem querer, na casa de uma bruxa, que a princípio parece lhe trazer uma solução para os seus problemas. Nem é preciso dizer muito para saber que alguma coisa dará muito errado e que Merida vai se arrepender de seus atos.

Tecnicamente perfeito, VALENTE é um colírio para os olhos. Nunca a Pixar caprichou tanto nos cenários, no caso, a geografia, as montanhas, a vegetação da Escócia. Há também algo que sempre foi um problema e que agora foi superado, que é o trabalho árduo na construção dos cabelos. As madeixas encaracoladas de Merida, então, foram um desafio e tanto para a companhia.

Outro detalhe essencial nos desenhos da Pixar e que pode ser um dos grandes diferenciais das concorrentes é o cuidado com o roteiro, que vem antes de se pensar em efeitos especiais ou coisas do tipo. Desde o primeiro TOY STORY (1995) que houve essa preocupação clara com o contar uma boa história, em cativar a plateia com a agradável e milenar experiência de acompanhar com prazer uma narrativa de qualidade. Tão boa que a Pixar sempre agradou adultos e crianças.

No caso de VALENTE, o elemento emocional e que lida com as questões familiares, também presente em um dos melhores clássicos da companhia, PROCURANDO NEMO (2003), reaparece com força, ainda que com mais humor. Não se vê, por exemplo, algo tão traumático quanto a cena da morte da mãe de Nemo. E também bem menos sombrio que alguns clássicos da Disney, como PINÓQUIO e PETER PAN. Ainda assim, não deixa de ser uma obra ousada para as crianças menores, pois lida com um assunto ainda complexo para eles, que é a construção de seu próprio destino.

segunda-feira, julho 23, 2012

MARTHA MARCY MAY MARLENE



Eis um filme que é difícil de classificar. Agrada tanto àqueles que curtem um bom drama quanto aos fãs do cinema de horror. MARTHA MARCY MAY MARLENE (2011), do estreante Sean Darkin, prende a atenção do início ao fim, com seus silêncios, seu andamento lento e hipnotizante, sua narrativa cujos vaivéns no tempo ajudam a tornar a história da perturbada jovem Martha (Elizabeth Olsen) cada vez mais instigante. Isso porque queremos encontrar respostas para o que a traumatizou a ponto de ela fugir de uma estranha comunidade. O filme já começa com sua fuga através de um bosque.

Sua irmã Lucy (Sarah Paulson) recebe a ligação de Martha, que ficou afastada e desaparecida por dois anos. E quer saber o que aconteceu com ela. Nós, espectadores, porém, somos mais privilegiados, ao recebermos em doses homeopáticas, através de flashbacks, cenas do passado de Martha naquela comunidade, uma espécie de seita na qual os homens ditavam as regras e faziam uma espécie de lavagem cerebral nas mulheres. Um lugar em que meninas sem rumo encontravam abrigo, mas pagavam um preço alto por isso.

O grande barato de MARTHA MARCY MAY MARLENE é a expectativa de que algo muito ruim está para acontecer (ou que aconteceu e estamos prestes a ver). O comportamento de Martha, já habituada com a convivência na seita, é cada vez mais estranho para o casal que a abriga. Tudo isso e mais uma série de pequenas coisas que vão se acumulando e nos deixando cada vez mais inquietos e tensos faz da experiência de ver o filme algo sem igual.

Elizabeth Olsen tem todo o jeito de que fará muito sucesso nos próximos anos. Se esse filme, por ser independente e talvez considerado difícil para ser lançado nos cinemas brasileiros, não chegou por aqui, a bela moça está aí com pelo menos uns sete filmes na agulha, prontos ou em fase de finalização ou preparação para serem lançados. Seja no cinema indie, seja no mainstream.

Sean Darkin, o diretor de MARTHA MARCY MAY MARLENE, foi escolhido para dirigir JANIS, o filme sobre Janis Joplin, que por enquanto só tem de definido no elenco a atriz que fará o papel da cantora.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste tem texto sobre o caso do trailer de CAÇA AOS GÂNGSTERES, retirado pela Warner, e a repercussão da tragédia ocorrida em Denver. AQUI.

sábado, julho 21, 2012

CHERNOBYL (Chernobyl Diaries)























Costumo ser mais generoso quando falo de filmes de horror, por ter um especial carinho pelo gênero. Mas tem certos filmes que são indefensáveis. É o caso deste CHERNOBYL (2012), mais uma produção de Oren Peli, um sujeito que ficou rico da noite para o dia, desde que a sua baratíssima produção ATIVIDADE PARANORMAL (2009) faturou milhões nas bilheterias em todo o mundo e ainda teve três continuações (o próximo está por vir) e uma espécie de remake passado no Japão. Claro que a ajudinha do Spielberg foi providencial.

E por mais que eu goste muito de ATIVIDADE PARANORMAL 3 (2011), não dá para sair repetindo a fórmula por aí e ser bem sucedido sempre. Tudo bem que CHERNOBYL não é bem um filme estilo found footage, mas o uso da câmera na mão está lá do mesmo jeito. E de uma maneira usada para descomplicar, já que não é preciso se preocupar com quem está segurando a câmera. Assim, sai de cena o elemento metalinguístico e entra um terror bem ordinário.

Na trama, grupo de amigos passando as férias em Kiev e prestes a ir para Moscou aceitam a proposta louca de um deles de fazer um turismo diferente, visitando a cidade de Pripyat, que há 25 anos era lar dos trabalhadores do reator nuclear de Chernobyl. Hoje é uma cidade fantasma e com índices ainda altos de radiação. Só doido aceitaria fazer uma viagem dessas. E, como em filme de horror toda desgraça é pouca, começam a aparecer coisas bem estranhas assim que eles chegam ao local.

CHERNOBYL é um filme que se sustenta apenas em sustos baratos e manjados. E nem nisso ele é bem sucedido. Até diria que o filme tem alguns momentos de tensão razoáveis, mas isso se perde com o desenvolvimento e a conclusão. O diretor testa-de-ferro é o estreante Bradley Parker. Antes disso, ele lidava com efeitos especiais em algumas boas produções classe A. Melhor sorte na próxima vez.

sexta-feira, julho 20, 2012

A MORTE TEM CARA DE ANJO (Twisted Nerve)



Quem não se lembra daquele assobio que aparece em KILL BILL? Pois é, finalmente eu consegui uma cópia do filme que traz esse assobio, que é a base da trilha sonora de Bernard Herrmann para A MORTE TEM CARA DE ANJO (1968). O filme não é exatamente tão bom assim. Mas por alguma razão deve ter ficado na memória afetiva de Quentin Tarantino para que ele quisesse homenageá-lo em seu sangrento drama de vingança. Ou então gostou apenas da música.

De todo modo, A MORTE TEM CARA DE ANJO não deixa de ser um filme no mínimo interessante e que tenta justificar, logo no início, que não quer dizer que pessoas com Síndrome de Down estejam próximas da psicopatia. O personagem psicopata do filme, o jovem Martin Durnley (Hywel Bennett), não tem Down; o seu irmão, sim. Mas há, em certa cena, um médico afirmando esse tipo de aproximação, o que causou certa controvérsia. Logo no começo do filme, sabemos que ele é a única pessoa da família que visita o irmão em um sanatório, onde ele foi largado pelos pais. Na verdade, a mãe e o padrasto, com quem ele não se dá nada bem.

O filme começa de verdade quando Martin conhece numa loja a jovem bibliotecária Susan Harper (Hayley Mills), numa situação um pouco delicada. Ele rouba um pato de brinquedo e ela paga o pato (literalmente), quando os seguranças da loja pensam que eles estão juntos. Ele se faz de doido, falando de si mesmo em terceira pessoa e logo os gerentes da loja veem que ela não tem culpa nenhuma. Não demora muito para que ele arranje um jeito de entrar de vez na vida da moça. E de fazer outras coisas não muito legais que eu não vou contar aqui para não estragar a surpresa de quem ainda não viu.

Pena que o filme não explore de maneira forte o suficiente a esquizofrenia do personagem (se é mesmo essa a patologia) e também não seja tão bom do ponto de vista do suspense. Assim, o que fica de mais memorável, além do belo colorido e da Londres sessentista (sempre boa de se ver) é a grudenta trilha sonora. Curiosamente, Hitchcock recrutou dois atores do filme (Barry Foster e Billie Whitelaw) para o seu retorno a Londres em FRENESI. Pode ser sinal de que o Mestre do Suspense tenha visto e gostado de A MORTE TEM CARA DE ANJO.

P.S.: O Filmes do Chico, um dos blogs de cinema mais tradicionais e indispensáveis da internet, está de volta com novo endereço. Confira a reestreia AQUI.

quinta-feira, julho 19, 2012

L'APOLLONIDE – OS AMORES DA CASA DE TOLERÂNCIA (L'Apollonide (Souvenirs de la Maison Close))



Quanta beleza se vê neste L'APOLLONIDE – OS AMORES DA CASA DE TOLERÂNCIA (2011), de Bertrand Bonello. E, ao mesmo tempo, quanta crueldade e quanta dor compartilhamos com as meninas do Apollonide, o bordel de luxo parisiense da virada do século XIX para o século XX, onde elas vivem e fazem comércio – termo citado em algumas cenas – e, por que não dizer também, amor. Uma delas é apaixonada por um cliente. Justo a que contrai sífilis. A princípio me incomodei um pouco com o fato de o filme não dar conta, em sua metragem, da dúzia de personagens da casa, mas aos poucos a gente percebe que o foco é dado apenas às mais importantes: a mulher do rosto desfigurado, a jovem caloura, a dona do estabelecimento, entre outras que ficam em segundo plano por causa do pouco tempo para se explorar os seus dramas.

Do mesmo diretor de O PORNÓGRAFO (2001) e TIRESIA (2003), L'APOLLONIDE – OS AMORES DA CASA DE TOLERÂNCIA apresenta o bordel como local de lazer para homens ricos e/ou carentes. Essas mulheres representam mais do que simples diversão para boa parte deles, que se mostram felizes na sala de estar. E também satisfeitos ao poder contar com as garotas que podem satisfazer suas fantasias sexuais mais bizarras, como a da boneca ou a da gueixa. E uma tão bizarra quanto extremamente cruel e horrível: cortar a boca de uma mulher, enquanto ela está amarrada e indefesa.

Madeleine, "a mulher que ri", é a personagem mais complexa do filme, que explora aos poucos o sonho recorrente que ela tem, assim como as lembranças de seu passado recente e traumático. E algumas vezes a trilha sonora, do próprio Bonello, utiliza um registro de tensão, dando ao filme mais dramaticidade e uma expectativa de que algo pior pode acontecer. Mas a canção que abre o filme, nos créditos, a ótima "Bad Girl", de Lee Moses, apesar de ser um rock sessentista, que pode destoar com a época do filme, a Belle Époque, funciona que é uma beleza para apresentar o elenco.

Em certo momento, um homem que trata muito bem as mulheres pede para que uma delas lhe mostre bem sua genitália, dizendo: "os homens nunca olham o bastante para o sexo das mulheres". Como não é apenas uma vez que ele fala isso, essa frase deve ser levada em consideração como uma das mais importantes do filme. Um filme que, embora também tenha muitos diálogos, se sustenta mais nas belas imagens, quase pinturas; na direção de arte e nos figurinos caprichados; e nos belos corpos nus ou seminus daquelas jovens mulheres.

A cópia em digital pode não fazer jus à beleza do que seria ver o filme em glorioso 35 mm, mas vê-lo no cinema é quase um dever para quem gosta de cinema. Especialmente de um cinema cada vez mais raro nestes tempos em que obras que fogem da mesmice, mesmo as que possuem apelo erótico, são relegadas a guetos alternativos.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste tem a lista dos filmes selecionados para o 45º Festival de Cinema Brasileiro de Brasília. Confira AQUI.

quarta-feira, julho 18, 2012

JORNADA TÉTRICA (Wind across the Everglades)



Por mais que seja um filme até que bastante elogiado pela crítica, JORNADA TÉTRICA (1958) é um dos trabalhos de Nicholas Ray de que eu menos gostei. Pra mim, é quase tão desagradável quanto A VIDA ÍNTIMA DE UMA MULHER (1949), que pelo menos não tem problemas de "travamento narrativo". Esse tipo de característica que o filme tem se deve ao fato de que Ray se desligou da produção e passou longe da sala de edição. O filme, que era para ter uma duração de três horas, foi cortado pela metade pela Warner Bros., causando logo a impressão de que alguma coisa está errada naquela narrativa.

Outro problema constante eram as discussões frequentes entre Ray e o roteirista, Budd Schulberg, o mesmo de SINDICATO DE LADRÕES, de Elia Kazan. Além do mais, tanto Ray quanto o roteirista tinham problemas com excesso de bebedeiras durante as filmagens. Para completar, a cena final também não foi filmada por Ray, mas por uma pessoa qualquer. Curiosamente, a cena ficou boa. Foi a terceira produção frustrada seguida de Ray. Com QUEM FOI JESSE JAMES? (1957) e AMARGO TRIUNFO (1957), ele teve também problemas com a produção e os estúdios.

Há semelhança temática entre JORNADA TÉTRICA e AMARGO TRIUNFO: ambos mostram dois homens que são rivais; em ambos, um deles é visto como herói, o outro como vilão, mas Ray trata de borrar essas impressões ao longo do filme. No caso de JORNADA TÉTRICA, temos Walt Murdoch, o professor vivido por Christopher Plummer que chega à Miami da virada do século XIX para o século XX e que é proibido de exercer o seu ofício por arrancar a pluma de uma ave que enfeitava o chapéu de uma mulher que descia do trem. Era moda na época esse enfeite com penas de aves. E ele acreditava que era um absurdo matar as aves para satisfazer a vaidade daquelas mulheres. O filme, inclusive, tem algumas cenas bem cruéis, em estilo semidocumental, dos caipiras dos pântanos matando as aves para venderem as penas.

O antagonista de Murdock é o líder dos caipiras dos pântanos, o agressivo e anárquico Cottonmouth (Burl Ives). O filme cresce justamente quando parte para o que interessa: a disputa final entre Murdock e Cottonmouth. Este último passa a admirar o seu rival, que poderia ser morto conforme ele quisesse, mas os dois passam a noite entornando garrafas de vinho. Depois de ambos caírem bêbados, é a vez de outra prova: desta vez, adentrando o pântano em uma canoa. Curiosamente, há nesse e em outros filmes de Ray personagens com uma coragem que se aproxima do suicídio. Ou, como o autor de "The Films of Nicholas Ray" diz, a redenção através do sacrifício com a morte.

Um problema, pra mim, é que eu vi o filme com legendas em espanhol; e isso geralmente me deixa um pouco irritado, sem saber o que acompanho: se o inglês falado ou o espanhol escrito. Acredito que se eu não soubesse nada de inglês, não teria esse tipo de problema. Mas não quero culpar esse empecilho como principal motivo de eu ter desgostado de JORNADA TÉTRICA. Até porque há muitas sequências sem diálogos.

terça-feira, julho 17, 2012

A CASA (La Casa Muda)



No próximo final de semana estreia A CASA SILENCIOSA, de Chris Kentis e Laura Lau. Trata-se do remake do uruguaio A CASA (2010), de Gustavo Hernández, um filminho vagabundo que só ganhou repercussão internacional por causa de um elemento curioso: ele é todo filmado em um único plano-sequência. Nem chega a ser uma novidade. Alfred Hitchcock já fez isso em FESTIM DIABÓLICO (ainda que trapaceando) e Alexander Sokurov, com ARCA RUSSA. Mas nem se trata de ser ou não original, já que praticamente nada mais é original nos dias de hoje. O que falta em A CASA, principalmente, é um roteiro decente, que pudesse dar substância aos 86 minutos de filme.

Na trama, Laura e seu pai Wilson vão tomar conta de uma casa de campo sem energia elétrica para o seu dono, Nestor, que pretende vendê-la. Acontece que Laura começa a ouvir estranhos barulhos no andar de cima da casa e acorda o pai, que resolve dar uma conferida, achando não se tratar de nada. O pai é assassinado por alguma coisa ou pessoa estranha, que trata de fazer da noite de Laura um inferno.

Um dos momentos mais interessantes do filme é o da fuga da casa, com a câmera na mão a seguindo, mais rapidamente. A câmera, no caso, é quase um personagem do filme, comparável a um fantasma, sempre presente. Infelizmente o filme é maçante, com uma história quase inexistente de tão besta, e que não sabe aproveitar a única coisa que lhe restaria: a atmosfera de horror. Assim, o diretor Hernández desperdiça tudo, copiando os clichês mais manjados dos filmes de casa assombrada, sem saber lidar com eles. Dá até um pouco de desânimo de ver a versão americana, mas não tem como ser pior. Até porque um dos diretores é o mesmo de MAR ABERTO, aquele thriller tenso dos tubarões em alto mar.

ATUALIZAÇÃO: O remake A CASA SILENCIOSA teve sua estreia adiada para o dia 10 de agosto.

segunda-feira, julho 16, 2012

NA ESTRADA (On the Road)



Há uma tendência da crítica brasileira em geral em esnobar o trabalho de Walter Salles. Deve haver alguma razão para isso, embora o cineasta tenha alguns filmes muito bons no currículo, como TERRA ESTRANGEIRA (1996), CENTRAL DO BRASIL (1998), o renegado pelo próprio diretor ÁGUA NEGRA (2005) e agora este NA ESTRADA (2012), um filme que mostra a maturidade do cineasta. E uma vontade enorme de ser fiel ao espírito de uma obra de peso e importância como a de Jack Kerouac, que influenciou gerações e gerações. Se a obra cinematográfica captou ou não o espírito do romance autobiográfico do escritor, aí já é outra história, mas como objeto independente, pode-se dizer que NA ESTRADA é um belo filme.

NA ESTRADA é uma espécie de "filme-irmão" de DIÁRIOS DE MOTOCICLETA (2004), road movies com personagens transgressores, cada um à sua maneira. No filme, Sam Riley é Sal Paradise, na verdade o próprio Jack Kerouac. O papel mais importante do ator até então havia sido a interpretação impressionante de Ian Curtis em CONTROL, de Anton Corbijn. Logo no início do filme ele já começa a falar sobre a importância de ter conhecido Dean Moriarty (Garrett Hedlund). Do jeito que ele fala sobre Dean, nota-se um sentimento de fascinação por aquele jovem rapaz que exerce uma influência forte sobre todos ao seu redor. Amado tanto por sua amante Marylou (Kristen Stewart), quanto por seu amigo gay Carlo Marx (o poeta Allen Ginsberg, vivido por Tom Sturridge). Outro grande nome da geração beatnik que dá as caras em NA ESTRADA é William S. Burroughs, que também aparece com outro nome e que no filme é vivido por Viggo Mortensen.

Muito interessante perceber o quanto essa geração beat já era precursora da contracultura, do rock'n'roll. Até o jazz que era tocado freneticamente nos bares e que era acolhido pelos jovens era uma espécie de protótipo do rock. Assim, já dava para notar a inquietação dos jovens da época, coisa que Hollywood não estava preparada para mostrar, mas que os escritores daquela geração souberam registrar. O uso tanto da benzedrina, o primeiro tipo de anfetamina, tomada com café para ficar ligado, quanto da própria maconha, é bem explorado no filme.

Mas o mais interessante é o modo como o filme mostra os viajantes passando pelos quatro cantos dos Estados Unidos e até pelo México, sob sol, chuva e neve, sem dinheiro e sem luxo. Aliás, as personagens são mostradas com cabelos desgrenhados e sem maquiagem. Outras preocupações estavam em jogo, que eram principalmente experimentar, sugar ao máximo as experiências de vida, o sexo, as drogas, viver com pouco ou nenhum dinheiro e ainda assim procurar soluções de sobrevivência.

A maquiagem é usada em determinada cena por Marylou apenas para manter as aparências e conseguir um quarto num hotel. Depois disso, ela tira o batom. É como se isso a incomodasse. O despojamento é a lei; não importa ter muito dinheiro, apenas o suficiente para a gasolina, a comida e a bebida. Ou quem sabe um bom baseado. Como aquele enorme que eles encontram no México. Há também uma sede literária, que aparece com alguns personagens lendo "No Caminho de Swan", de Marcel Proust, ou "Orlando", de Virginia Woolf.

De Dean, vemos uma vontade quase desesperada de viver a vida da maneira mais louca possível. Nem sempre pronto para assumir responsabilidades, como ter um filho e uma esposa. Sal, por sua vez, quer participar, mas também dar uma de voyeur, já que toda a experiência é para ser transformada em livro. E quando falta comida e cigarro e papel para escrever o livro, ele cata papéis e cigarros do lixo, para que suas memórias e anotações sejam transpostas para o que viria a ser uma das obras mais importantes da geração beat.

A relação de amizade entre os dois personagens principais é bastante explorada. Kristen Stewart está melhor, mais desinibida, fazendo inclusive uma cena tão ou mais excitante do que muito filme erótico ou pornográfico por aí, graças ao caráter de fantasia sexual que ela carrega. Refiro-me à cena do carro. O sexo, aliás, é elemento de extrema importância e bastante valorizado ao longo do filme.

As imagens das paisagens são um respiro, mesmo em lugares menos aconchegantes como o México. A visão das montanhas é de encher os olhos. O filme aproveita praticamente toda a geografia do território americano. Tudo fotografado pelas lentes de Eric Gautier, o mesmo diretor de fotografia do já citado DIÁRIOS DE MOTOCICLETA e de NA NATUREZA SELVAGEM, de Sean Penn, para citar dois filmes que têm muito em comum. Perdemos a conta do número de cidades visitadas. Alguns momentos das viagens são particularmente tristes e belos, como a melancólica chegada a São Francisco, quando a câmera capta a dor de Marylou, ao cruzar a famosa ponte.

Com um elenco de apoio estelar, formado também por Kirsten Dunst, Amy Adams, Alice Braga, Steve Buscemi, Elizabeth Moss e Terrence Howard, NA ESTRADA é um filme claramente ambicioso. Entre erros e acertos, Salles consegue superar uma série de dificuldades e nos oferecer um painel de uma geração, de um livro, de um país, em um registro lento, mas com uma montagem ágil. Claro que deixou passar ou teve que cortar ou condensar inúmeras passagens do livro, mas isso é natural em adaptações.

sexta-feira, julho 13, 2012

HOUSE – QUINTA TEMPORADA (House M.D. – Season Five)



Tinha ouvido falar que esta quinta temporada de HOUSE (2008-2009) era uma das mais fracas da série. Eu não vi nada de fraca. Não tem um final tão comovente como o da temporada passada, mas é boa demais. Já prevejo que sentirei muitas saudades quando eu finalmente terminar de ver as temporadas restantes. Digo isso porque nos últimos dias, não passei um sem ter visto pelo menos um episódio desta quinta temporada. É algo viciante e o apego que temos com os personagens, o sorriso no rosto ao ver as presepadas de House e a cumplicidade com sua solidão, tudo isso faz parte do prazer de ver a série.

Nesta quinta temporada, foram poucos os casos realmente curiosos. Até porque a própria série passou a dar menos importância ao misterioso caso da semana e mais ao que estava acontecendo "nos bastidores". Ainda que goste dos primeiros episódios, os que mostram a tentativa de House de reaver a amizade de Wilson, o primeiro episódio marcante pra mim é o quinto ("Lucky Thirteen"), que mostra a Dra. "Thirteen" (Olivia Wilde) em deliciosos amassos com outra mulher. Coisa bonita de ver, hein. Tanto que quando ela começa a ter uma relação com o Foreman, eu não curti muito a ideia. Fiquei com ciúme, acho. Esse episódio é interessante, pois já começa com ela no prólogo.

Assim como também é destaque o episódio que se inicia com House sendo atendido num pronto-socorro por causa de um acidente de moto e sendo visto por um homem que está vivo, mas seu corpo não consegue se comunicar, exceto por seus olhos e pálpebras. Angustiante, o episódio "Locked In" é um dos poucos a esquecer a vida particular dos médicos e a se concentrar no caso específico, tido por House como um dos mais interessantes. Ele, que se interessa mais em resolver a "equação" do que em salvar a vida, fica fascinado com o caso.

Outro caso memorável é do garotinho(a) que não sabe que nasceu hermafrodita. Seus pais tiveram que escolher o sexo da criança assim que ela nasceu e optaram por ser um menino, tendo que usar hormônios masculinos diariamente e mentir para ele dizendo que são vitaminas.

Nesta temporada, é dado mais espaço de cena para Jennifer Morrison (Cameron) e Jesse Spencer (Chase), que depois que saíram da equipe de House e ficaram trabalhando em outra área do hospital, apareceram bem pouco na temporada passada, que se concentrou mais nos novos pupilos.

Na quinta temporada, também vemos uma maior presença de cena da diretora do hospital, a Dra. Cuddy. E uma vez que ela ganha mais espaço, nota-se mais o seu lado sensual, bem como também o carinho e o jeito maternal com que ela trata um sujeito ácido como House. Quanto ao nosso querido e enjoado médico-investigador, ele encerra a temporada numa situação não muito agradável. Querendo muito ver como a série vai se comportar agora, embora eu saiba que a estrutura básica - paciente com doença difícil de diagnosticar põe toda a equipe a queimar seus neurônios para decifrar o problema – deva continuar.

Outros episódios interessantes: "The Itch", o do agorafóbico; "Last Resort", o do sujeito que pega House e Thirteen como reféns; "Painless", o do suicida que quer se livrar da dor crônica; e o surpreendente "Simple Explanation", que apresenta a triste perda de um membro da equipe.

Agradecimentos ao amigo Zezão pelo empréstimo do box. Quero mais, velho!

quinta-feira, julho 12, 2012

A FONTE DAS MULHERES (La Source des Femmes)



Quando se vê a premissa de A FONTE DAS MULHERES (2011), a primeira coisa que vem à mente é a comédia clássica "Lisístrata", de Aristófanes, que trata da greve de sexo que as mulheres fazem até que seus maridos parem a guerra (do Peloponeso) e estabeleçam a paz. A intenção das mulheres do filme de Radu Mihaileanu não é menos nobre. Elas vivem em um povoado sem água e sem energia elétrica e costumam caminhar para pegar água numa fonte distante e de terreno acidentado, enquanto seus maridos, em sua maioria, ficam parados, sem nada a fazer a não ser jogar conversa fora. Várias dessas mulheres abortaram com o esforço de carregar o peso dos baldes d'água e isso faz com que uma delas, Leila, apresente a ideia de fazerem "greve de amor", enquanto seus maridos não resolverem o problema da água encanada.

Uma ideia dessas, dentro de uma comunidade muçulmana, tradicionalmente machista, gera divisões entre as próprias mulheres. Os homens, claro, ficam indignados. Um deles é violento o suficiente para estuprar a própria esposa, quando ela se recusa a fazer sexo. Leila, porém, a bela e educada moça que incita a pequena revolução, é casada com um homem compreensivo e amoroso. Curiosamente, ele se veste de maneira mais próxima dos trajes ocidentais, contrastando com as roupas tradicionais dos demais, os mais velhos e os que não tiveram a chance de frequentar a escola. A beleza do amor do casal é um dos destaques do filme. Assim como a inveja e a disputa com a mulher que lidera o grupo que rejeita a proposta.

Apesar da situação difícil que elas vivem, o filme apresenta uma visão mais "colorida" do universo dessas mulheres, mostrando seus modos desinibidos ao conversarem entre si em uma sauna, falando inclusive da necessidade do prazer sexual, o que faz com que se tire um pouco a ideia de que as mulheres muçulmanas, pelo menos as do norte da África, não sentem prazer ou vivem condenadas a uma espécie de semiescravidão. Além do mais, as canções que vez ou outra o filme apresenta fazem lembrar as produções de Bollywood, embora as roupas sejam menos coloridas que as das indianas.

Radu Mihaileanu é o diretor de TREM DA VIDA (1998), UM HERÓI DO NOSSO TEMPO (2005) e O CONCERTO (2009). A bela Leïla Bekhti, a protagonista, é francesa de origem argelina. Pode ser vista em filmes como SATÃ; PARIS, TE AMO; INIMIGO PÚBLICO Nº 1 e O PROFETA.

quarta-feira, julho 11, 2012

TORSO (I Corpi Presentano Tracce di Violenza Carnale)



Desde que vi O ALBERGUE – PARTE II, de Eli Roth, e os extras do DVD, que tinha vontade de ver TORSO (1973), de Sergio Martino. Desse talentoso cineasta italiano, conheci o belíssimo SONHOS ERÓTICOS DE UMA MULHER INSACIÁVEL (1972), mais conhecido como ALL THE COLORS OF THE DARK. Que é um filme com algumas características do giallo, mas que já parte para o sobrenatural; é um filme híbrido. Já TORSO é um exemplar mais puro, digamos assim, com o tradicional assassino de luvas pretas deixando um rastro de cadáveres pelo caminho e um mistério a ser resolvido.

Costuma-se considerar o início da década de 1970 como o auge dos gialli, tendo como principal representante O PÁSSARO DAS PLUMAS DE CRISTAL, de Dario Argento. O filme de Argento inspirou muitos cineastas italianos a explorarem esse território, que se mostrou um filão lucrativo, principalmente para os apreciadores de filmes de horror e suspense. A maioria desses filmes utiliza o velho recurso do whodunit, isto é, ao contrário das obras de Hitchcock, que já apresentavam o assassino logo no início, os gialli costumavam brincar com a audiência, fazendo-nos imaginar quem dos suspeitos seria o assassino.

No caso de TORSO, todos os homens são mostrados como suspeitos, já que o ponto de vista é das mulheres, as principais vítimas do assassino misterioso, ou da câmera, que usa o olhar do assassino, mas sem nunca mostrar o seu rosto. Apenas as luvas pretas. O close-up constante no rosto dos homens italianos mostra-os como ameaçadores. A trama em si é muita simples, quase inexistente. O que importa aqui é o modo criativo como Martino lida com o fiapo de roteiro que ele tem, criando uma atmosfera de mistério bem agradável.

TORSO é centrado num grupo de garotas americanas estudando em Roma que gostam de aventuras, mas que se sentem perturbadas com o crescente número de mortes na cidade, o que as faz viajar para uma casa de campo. As cenas eróticas são bem agradáveis de ver. A primeira delas, a do namoro no carro interrompido pelo assassino, já dá o tom do filme, que mistura mistério, horror e muita sensualidade, com um belo time de lindas mulheres.

Curiosamente, a cena dos corpos sendo esquartejados não tem a violência gráfica a que estamos acostumados, graças a outras produções de horror italianas, aos slasheres oitentistas e a filmes mais recentes, como O ALBERGUE e O ALBERGUE – PARTE II. Este último, o principal homenageador de TORSO, traz, inclusive, um de seus atores, Luc Merenda, numa participação especial.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste tem uma matéria sobre os próximos quatro filmes do enigmático Terrence Malick. Confira AQUI.

terça-feira, julho 10, 2012

MARTY



“See, dogs like us, we ain't such dogs as we think we are.” 
(Marty Pilletti) 

Que filme bonito que é MARTY (1955), de Delbert Mann! Infelizmente precisou Ernest Borgnine morrer para que eu finalmente o assistisse, como uma homenagem ao ator. Difícil não simpatizar com a persona que ele cria neste filme, que lhe rendeu seu único Oscar de melhor ator (além de filme, direção e roteiro, e a Palma de Ouro em Cannes). Trata-se de um trabalho bastante influenciado pelo neorrealismo italiano. A bela fotografia em preto e branco que fica mais bonita à noite, a aparente simplicidade do enredo e o ar melancólico são elementos que fazem com que nos lembremos do cinema italiano nascido junto aos destroços da Segunda Guerra Mundial. Ajuda também o fato de Marty e sua família serem ítalo-americanos.

Marty (Ernest Borgnine), o sujeito que dá nome ao título, é um açougueiro de 34 anos que logo no início do filme é cobrado pela sociedade por não ter se casado ainda, ao contrário de seus irmãos e irmãs. Não apenas pelos clientes do açougue, mas também por sua mãe, que o incentiva a sair à noite, quando ele já está cansado de ir para as festas, ser rejeitado pelas mulheres e voltar sozinho e frustrado para casa. Até que, numa festa, ele vê uma moça que se encontra também solitária e rejeitada por não se adequar aos padrões de beleza requeridos pelos homens. Eles usam o termo "dogs" para se referir às pessoas feias. Para as mulheres, traduzem como "barangas" nas legendas.

Mas Marty, ao estabelecer contato com essa mulher, começa a gostar dela. E durante aquela noite, os dois conversam bastante. E o modo como o filme lida com esses momentos ao mesmo tempo tão comuns, mas tão especiais, lembra bastante o cinema europeu, com seu andamento mais despreocupado com o tempo. O filme trata também de outras coisas que complementam o enredo: a forma como sua mãe trata a moça; o fato de os amigos a acharem uma baranga; a tia velha que é largada pelo primo de Marty e a esposa  em sua casa; tudo isso contribui, no final, para a emocionante resolução.

segunda-feira, julho 09, 2012

AMARGO TRIUNFO (Bitter Victory /Amère Victoire)



A experiência de filmar AMARGO TRIUNFO (1957) não foi das mais agradáveis para Nicholas Ray. Uma série de frustrações aconteceu. Desde a não aprovação do roteiro de Ray pelo produtor francês, que fez modificações, até a escalação do ator alemão Curt Jurgens no papel do Major Brand e não um ator americano como Ray queria – o diretor pensava em Montgomery Clift ou Paul Newman. No caso, Clift estava impossibilitado por causa do acidente automobilístico que sofrera. Pelo menos a decisão de colocar Richard Burton como o principal protagonista foi mantida. Ele interpreta o capitão com tendências suicidas James Leith. Outro incidente desagradável: o produtor francês chegou a escrever para a Columbia relatando os problemas com o álcool de Ray. Fora a dificuldade de filmar no deserto africano.

A história se passa durante a Segunda Guerra Mundial, na Líbia, um território invadido pelos alemães, mas com bases inglesas. Assim como acontece em HORIZONTE DE GLÓRIAS (1951), há em AMARGO TRIUNFO uma forte rivalidade entre dois homens. Aqui, o Major Brand e o Capitão Leith. Mas diferente de termos um autoritário e simpático John Wayne, é difícil para a audiência simpatizar com o antipático Curt Jurgens. Há um triângulo amoroso também. A esposa de Brand, também membro do exército britânico, teve um relacionamento antes da guerra com Leith. E ela ainda é apaixonada por ele. Brand não sabia e não gosta nada disso, o que só aumenta a tensão entre os dois homens.

O filme lida também com a questão da coragem e da covardia, que estão em ambos os homens, mas em caráter diferenciado. Durante a missão para roubar papéis de uma base alemã, Brand treme e não tem coragem de matar um sentinela alemão; Leith faz isso com tranquilidade. Toda essa sequência, dos soldados britânicos vestidos com roupas árabes esperando o momento de atacar, é uma das melhores do filme. Bem como o ataque definitivo à base. Ray já havia mostrado domínio em sequências de ação em QUEM FOI JESSE JAMES? (1957).

Porém, essa é apenas a primeira parte do filme, que se mostraria menos centrada no conflito entre britânicos e alemães do que no embate entre Brand e Leith. Brand, para mostrar superioridade e tentar matar Leith, deixa-o no deserto com os homens feridos, para seguir em frente com os demais soldados, que não o veem como um bom líder e nem respeitam sua autoridade. A partir desse momento, o filme é centrado basicamente na sobrevivência no deserto, nas decisões difíceis que é preciso tomar, no reencontro dos dois rivais, nos perigos do próprio deserto, que trata de finalizar aquilo que os oficiais não conseguem.

AMARGO TRIUNFO tem momentos brilhantes. Gosto muito da primeira sequência da invasão da base alemã, de vários momentos no deserto e do final amargo e frio. É mais um belo trabalho do cineasta, embora o considere um pouco abaixo de outros filmes seus.

P.S.: No Blog de Cinema do Diário do Nordeste tem texto sobre a liberação pela Justiça Federal de A SERBIAN FILM - TERROR SEM LIMITES. Veja AQUI.

domingo, julho 08, 2012

CINE HOLLIÚDY



Uma pena ter deixado para escrever sobre CINE HOLLIÚDY (2012) exatamente um mês depois de vê-lo no cinema. Aliás, a exibição do filme no encerramento do Cine Ceará foi uma das experiências mais bonitas que eu já vi, com uma participação popular de dar gosto. E que deve ter deixado o seu diretor, Halder Gomes, muito feliz. Afinal, não é todo diretor que tem a sorte de exibir a sua obra em um teatro lotado e com uma recepção tão calorosa do público, que riu a valer das presepadas de Francisgleydisson e cia. Outra coisa positiva foi a exibição digital de qualidade excepcional. Nunca vi nada parecido em 2D até hoje. A fotografia do filme é de dar gosto, com as cores vivas, um amarelo lindo, que se destaca, assim como a cor do céu nas sequências externas.

O filme é uma versão em longa-metragem, com mudanças consideráveis no enredo, do curta O ARTISTA CONTRA O CABA DO MAL (2004). Segundo o próprio Halder, a ideia de transformar o curta em longa foi de Ana Maria Bahiana, que é citada nos créditos como madrinha do filme. Embora tenha algumas irregularidades, CINE HOLLIÚDY compensa o amadorismo com um amor pelo cinema bonito de ver.

A trama se passa na década de 1970 no interior do Ceará, quando a televisão começa a invadir o espaço e a fechar várias salas de cinema. O fenômeno não foi apenas local, mas devastadoramente nacional. Ainda assim, o sonho de Francisgleydisson é administrar um cinema. Mas ao chegar à cidadezinha já encontra um monte de obstáculos burocráticos e financeiros. Mesmo assim não se dá por vencido e até quando, no meio da projeção, o equipamento para de funcionar, ele resolve ele mesmo contar a história do filme para a audiência, levando a experiência da narração para um momento pré-cinematográfico e até mesmo pré-literário.

O filme é cheio de piadas, sendo que a maioria, em "cearês". Muitos dos diálogos, inclusive, principalmente das crianças, são vistos com legendas em português para que seja possível até para o público local entender melhor o que elas dizem, até porque elas não são profissionais, não tendo ainda uma boa dicção. Exatamente por ser tão cearense em espírito, tenho minhas dúvidas do sucesso nacional do filme. Mas há quem diga que é justamente o ar de novidade que pode ser o seu trunfo, já que o próprio curta também teve uma recepção boa no país. E como o longa é melhor e mais bem produzido, há chances de CINE HOLLIÚDY ter sucesso de audiência quando for lançado no circuito comercial.

O filme traz no elenco Edmilson Filho, Miriam Freeland, Roberto Bomtempo, Falcão, Karla Karenina, João Netto (mais conhecido pelo personagem Zé Modesto), Haroldo Guimarães e faz a estreia no cinema da linda Fiorella Mattheis, no papel da musa dos sonhos do protagonista. A trilha sonora é também um espetáculo à parte, com canções de Márcio Greyck, Odair José e Fernando Mendes.

P.S.: Esqueci de comentar: no blog do Diário tem texto sobre os próximos passos da dominação da Marvel. AQUI. E também a lista dos selecionados para o Festival de Gramado de 2012. AQUI.

sábado, julho 07, 2012

O ESPETACULAR HOMEM-ARANHA (The Amazing Spider-Man)



A tarefa de Marc Webb não foi fácil: recontar a história de um dos heróis mais queridos dos quadrinhos, já sabendo que seu filme seria comparado inevitavelmente com as versões de Sam Raimi, que tiveram boa aceitação, principalmente de público. Se a tarefa fosse pular a origem do herói aracnídeo, talvez não fosse tão complicada, mas há mesmo a intenção por parte dos produtores de "esquecer" o que foi feito por Raimi e sua equipe e fazer o chamado reboot, termo tão em voga nos dias de hoje.

E assim nasce O ESPETACULAR HOMEM-ARANHA (2012), uma obra honesta e que procura ser mais fiel do que o filme de Raimi aos quadrinhos criados por Stan Lee e Steve Ditko cerca de 50 anos atrás. E falando na idade do Aranha, não deixa de ser interessante o quanto o herói ainda permanece sendo o mais popular da Marvel. Talvez por causa de sua proximidade com uma pessoa normal. Como muita gente, Peter Parker foi um adolescente que sofreu bullying na escola; sofre para conseguir dinheiro para pagar as contas e dar conta da vida profissional e afetiva; cuidar de sua querida Tia May e - esse é o principal diferencial - ainda enfrentar uma galeria de supervilões tão rica quanto a do Batman.

Para a nova versão, foi escalado Andrew Garfield como Peter Parker; Emma Stone como Gwen Stacy; Rhys Ifans como o Dr. Curt Connors, que se tornaria o Lagarto; Martin Sheen no papel do Tio Ben; e Sally Field como a Tia May. Um elenco bem interessante. E talvez só a Tia May de Sally Field tenha ficado apagada. Em compensação, Martin Sheen como a figura paterna e amorosa do tio que seria assassinado ajuda a dar ao filme uma dimensão mais emocional.

A escolha de Gwen Stacy e não Mary Jane como a primeira namorada também foi um acerto. Era algo que incomodava a muitos fãs do "amigão da vizinhança" essa queima de etapas. Embora Mary Jane represente a grande mulher da vida de Peter, Gwen teve uma importância crucial e até hoje sua morte nas mãos do Duende Verde é uma das mais impactantes da história dos quadrinhos. Falando no diabo, Norman Osborn é apenas citado no filme, com promessa de que deve aparecer futuramente em uma continuação.

Alguns podem dizer que o filme força demais as coincidências no que se refere à relação entre os personagens. Mas acontece que num longa-metragem de cerca de duas horas não dá para perder muito tempo; é preciso ser objetivo e ainda assim fazer um filme que mergulhe na essência trágica do personagem que sofre a dor de perder o tio por irresponsabilidade sua, para então se tornar o Homem-Aranha, com seus poderes recém-adquiridos.

Assim, não dá tempo, dentro de tanta coisa dramática que acontece ainda no começo da origem do personagem, de mostrar o Aranha piadista dos quadrinhos. Isso é apenas visto de relance na ótima sequência do ladrão de carros. É dever, contudo, do diretor e dos roteiristas de aumentar essa característica nos próximos filmes, já que, pelo visto, será mais uma trilogia.

Outro ponto a favor do novo filme é uma melhor agilidade nas cenas de luta, sem falar numa movimentação no espaço mais próxima do real. O Aranha dos filmes de Raimi não parecia de verdade, mas um desenho de videogame. Só o Lagarto que teve mesmo que ser todo feito em CGI, por razões óbvias. Quanto à Gwen de Emma Stone, além de bela e atenciosa, foi retratada fisicamente de modo parecido com os quadrinhos clássicos: o cabelo com franjinha, a minissaia, as meias longas. E o filme, principalmente em sua metade inicial, trabalha melhor essa questão dos relacionamentos, tão bem mostrados em (500) DIAS COM ELA (2009), o longa de estreia de Webb.

Assim, posso dizer que fiquei satisfeito com o novo Homem-Aranha do cinema. Se o primeiro filme ainda ficou muito amarrado à origem do personagem e ainda assim conseguiu desenvolver bem, para os próximos há a promessa de melhorar. Por enquanto, é momento de parabenizar os envolvidos na produção, que coloca a questão da identidade (quem sou eu, quem é você, quem são vocês) acima da questão da responsabilidade, que era a tônica no longa-metragem de Raimi.

sexta-feira, julho 06, 2012

PARA SEMPRE (The Vow)



Como muitos já disseram por aí, há uma semelhança muito grande entre PARA SEMPRE (2012) e os melodramas baseados nos best-sellers de Nicholas Sparks. É mais fácil acreditar que seja uma adaptação de um romance dele do que o contrário. No entanto, PARA SEMPRE é baseado numa história real, uma bonita história real de uma jovem moça que, após um acidente de automóvel que a deixou em estado de coma durante um bom tempo, esquece tudo o que envolve o passado mais recente. E de passado recente leia-se tudo que envolve o seu atual marido.

A moça é vivida por Rachel McAdams, que pode-se dizer que seja a razão de ser do filme, com seu sempre belo e atraente sorriso. Channing Tatum é o seu par romântico. O diretor é Michael Sucsy, do premiado telefilme GREY GARDENS (2009). E o resultado é acima da média, o que significa alguns momentos de emoção que o filme oferece a quem se permitir.

A premissa do sujeito que tem que reconquistar a sua própria esposa até lembra um pouco o ótimo COMO SE FOSSE A PRIMEIRA VEZ, mas ao ver o filme vemos se tratar de algo bem diferente. Em PARA SEMPRE, a mulher sabe que perdeu a memória, sabe que mora com aquele sujeito que para ela é um completo estranho, vê imagens do seu casamento gravadas, mas ainda assim não consegue se ver dentro daquele "novo" mundo, já que em sua memória, ela ainda se dá muito bem com seus pais, nunca foi vegetariana, fazia faculdade de Direito e nunca se interessou por artes plásticas.

No fim das contas, quem não esperar um grande filme pode sair do cinema satisfeito. Embora Channing Tatum não seja exatamente um bom ator, ele é querido pelas mulheres - Tatum era stripper antes de se tornar ator, o que pode explicar um pouco esse sucesso. O elenco coadjuvante também ajuda, com a presença de veteranos de peso como Sam Neill e Jessica Lange, como os pais da desmemoriada que a querem de volta ao seio familiar.

Quanto a Rachel McAdams, o futuro próximo desta moça promete: ela estará em TO THE WONDER, o próximo trabalho de Terrence Malick; em PASSION, o novo Brian De Palma; em ABOUT TIME, de Richard Curtis; e em A MOST WANTED MAN, de Anton Corbjin. Ela deve estar com um excelente agente.

quinta-feira, julho 05, 2012

ALMA CORSÁRIA



Rever ALMA CORSÁRIA (1993) ajuda a aceitar melhor a partida de Carlos Reichenbach. É um filme que pinta a morte da maneira mais bonita possível. Não apenas por ser interpretada por Carolina Ferraz, mas por mostrar a sua passagem de uma forma muito serena. Rivaldo Torres, o personagem de Bertrand Duarte, fumante tão compulsivo quanto o Carlão, já a reconhece desde a infância e quando finalmente a encontra, no final, a aceitação vem, junto com o sentimento de dever cumprido, de ter deixado suas marcas aqui na forma do livro de poesia em prosa chamado "Sentimento Ocidental", feito a quatro mãos com o amigo Teodoro Xavier (Jandir Ferrari). A morte é vista, segundo as palavras do próprio Carlão "como bênção e êxtase maior do poeta".

O filme foi exibido na noite desta quarta-feira, dia 4, oficializando a última Sessão do Comodoro. Não pude estar presente, mas resolvi rever o filme em casa para entrar em sintonia com quem esteve lá no CineSesc. Deve ter sido muito bonito. E escolha melhor dentro de sua filmografia não poderia haver. Não que ALMA CORSÁRIA seja o meu favorito dele, mas é, sem dúvida, um de seus trabalhos mais pessoais. E um dos mais bonitos também.

O filme começa com a voz do Carlão, informando que os eventos mostrados naquele filme de ficção foram baseados nas vidas de amigos e na sua própria vivência. Logo, a voz do cineasta está presente nos diálogos, na opção pelo anarquismo como ideologia (a cena das camisas explicita isso), no respeito pelos amigos que resolveram seguir na luta armada contra a ditadura, seguindo doutrinas marxistas e similares, e correndo o risco de serem mortos ou torturados.

O pano de fundo político tinha que estar presente, já que o filme segue as lembranças do protagonista desde fins da década de 1950, passando pelo período mais barra pesada da ditadura, pelas lembranças das mulheres que passaram por sua vida, da fase lisérgica do final da década de 1960, e retornando sempre para a celebração do lançamento do livro, numa modesta pastelaria.

As minhas cenas favoritas são as que envolvem as duas mulheres mais importantes da vida de Torres, as que preencheram a sua vida solitária com momentos de prazer e alegria, ainda que bastante momentâneas. Afinal, não é assim mesmo a vida? Algo que quando visto pelo viés do passado pode ser encarado com romantismo mesmo nos momentos mais rotineiros, mas que ganha ainda mais força quando o coração bate mais forte por causa do amor, efêmero que seja.

quarta-feira, julho 04, 2012

A REENCARNAÇÃO DO SEXO



Quando se fala em filmes de horror brasileiros, os primeiros que vêm à mente são os dirigidos por José Mojica Marins. No entanto, nas décadas de 1970 e 1980, alguns filmes do gênero foram produzidos no Brasil, ainda que hoje boa parte dessas obras esteja esquecida ou conhecida apenas por um pequeno grupo de aficionados. Este A REENCARNAÇÃO DO SEXO (1982), de Luiz Castellini, é um belo exemplar do que de melhor se fazia no cinema brasileiro na época, isto é, filmes com conteúdo erótico, associado a um tempero fantástico.

Na trama, que se desenrola em várias etapas, Patrícia Scalvi é uma jovem que faz sexo com o empregado da casa e o pai, depois de pegar os dois na cama, resolve cortar o mal pela raiz, isto é, cortar o rapaz em pedacinhos com um machado. Eis que Patrícia (os nomes dos personagens sãos os mesmos dos atores), ao procurar pelo amante, encontra sua cabeça enterrada e a guarda dentro de um jarro de uma planta, dentro de casa. O espírito do rapaz faz com que o local fique assombrado. A jovem fica doente e morre; o pai vai para um hospício e a mãe deve ter morrido também.

O fato é que em seguida, as pessoas que alugam a casa passam a ser assombradas pela voz que vem do vaso e, além de ter a libido elevada a alturas monumentais, mostram-se extremamente violentas, a ponto de matar quem estiver pela frente. A REENCARNAÇÃO DO SEXO apresenta algumas sequências de boa voltagem erótica, como a que envolve duas mulheres e um vibrador, ou a da orgia final, que também coincide com o ótimo clímax de horror.

O filme chegou a ser lançado em VHS e era famoso por apresentar Patrícia Scalvi com um machado na mão, causando uma boa impressão para quem procurava um filme pela capa, coisa que era muito comum décadas atrás. E quem fazia filmes exploitation sabia muito bem que a capa era importante para se vender o produto. Nem sempre o cliente podia sair satisfeito, mas muito provavelmente aqueles que alugaram A REENCARNAÇÃO DO SEXO não devem ter se arrependido.

terça-feira, julho 03, 2012

A ERA DO GELO 4 (Ice Age: Continental Drift)



O primeiro A ERA DO GELO (2002) foi bombástico, mostrando que nem só de Pixar e Dreamworks se fazia animação por computador de qualidade. Aliás, o longa que apresentou o tigre dentes-de-sabre Diego, o mamute Manny e o bicho-preguiça Sid mostrou-se até superior às animações da empresa de animação de Spielberg e cia., de tão simpático que era. E assim também foi conquistando o público pagante a cada novo filme, rendendo mais e mais nas bilheterias. Se A ERA DO GELO 4 (2012) conseguirá ultrapassar os números do anterior, ainda não se sabe, mas ouso dizer que muito da graça da cinessérie parece ter se esvaído. Ou derretido, se comparado com o gelo.

Até é possível dizer que a melhor coisa de se ver A ERA DO GELO 4 no cinema é poder assistir o gracioso curta THE SIMPSONS: THE LONGEST DAYCARE, que mostra a pequena Maggie sendo deixada pela primeira vez numa creche. Dizer mais estraga um pouco da graça do já pequeno curta. Não deixa de ser uma sorte a Fox ter entre seus maiores sucessos o longevo desenho dos Simpsons.

Quanto ao quarto A ERA DO GELO, talvez o longa tenha sofrido a ausência de Carlos Saldanha, que esteve presente nos três primeiros filmes como diretor, mas que não pôde estar neste por causa da produção de RIO (2011), que aliás já está com continuação confirmada para 2014, tendo a Copa do Mundo como tema. Saldanha pelo visto é também um sábio homem de negócios.

Na trama de A ERA DO GELO 4, o solitário esquilo Scrat, em sua eterna busca por nozes, acaba indo parar no centro do planeta, causando uma rachadura imensa que formará os continentes como os conhecemos hoje. Isso acaba por separar os três amigos de seus agregados, personagens que haviam surgido nos filmes anteriores. Na separação, eles ficam à deriva num pequeno iceberg, e acabam encontrando pelo caminho um perverso orogantago pirata, o Capitão Entranha. 

Embora o filme tenha seus momentos divertidos, graças principalmente às presepadas de Sid e de sua avó, que lhe é entregue "espontaneamente" por sua família para que ele cuide dela, a busca por efeitos visuais que pudessem ser explorados no 3D fez do filme um mero passatempo estilo montanha-russa light, com seus personagens à deriva não apenas no pedaço de gelo em que se encontram, mas também à deriva no sentido de que parece não ter havido um esforço para se criar uma boa história.

segunda-feira, julho 02, 2012

LUZ NAS TREVAS – A VOLTA DO BANDIDO DA LUZ VERMELHA



Rogério Sganzerla não está mais entre nós. E talvez por isso o espectador já saiba que não deve esperar de LUZ NAS TREVAS – A VOLTA DO BANDIDO DA LUZ VERMELHA (2012) um filme do diretor. Ainda assim, na experiência bem incomum que é a apreciação desta continuação de O BANDIDO DA LUZ VERMELHA (1968), dirigida pela esposa do cineasta, Helena Ignez, e co-dirigida por Ícaro C. Martins, é possível ver a presença de Sganzerla, seja no espírito transgressor e anárquico da montagem, que procura emular o espírito do original, seja em sequências retiradas do próprio filme que deu início ao movimento do Cinema Marginal.

Ney Matogrosso aparece no papel do bandido, que não se conforma com a maneira como foi retratado no filme de 1968 e aparece também lendo livros em voz alta em sua cela, como saído de um filme de Godard. O pouco conhecido André Guerreiro Lopes interpreta o filho do bandido, que usa a alcunha de "Tudo-ou-Nada" e tenta repetir o que o pai fez, inclusive com momentos que remontam sequências do filme de Sganzerla, com direito à famosa sequência do carro na praia e a uma imitação de Jean-Paul Belmondo em ACOSSADO, com Tudo-ou-Nada passando os dedos por sobre os próprios lábios. Guerreiro Lopes já havia trabalhado com Helena Ignez, co-dirigindo com ela uma peça chamada "O Belo Indiferente", baseada em texto que Jean Cocteu escreveu para Edith Piaf, e estrelada por Djin Sganzerla.

Falando na musa, filha do cineasta, ela aparece em toda sua glória em vários momentos do filme e de corpo nu em uma cena de LUZ NAS TREVAS. Outras mulheres importantes que dão o ar da graça são: Simone Spoladore, Maria Luísa Mendonça, Bruna Lombardi e Sandra Corveloni. Mas é Djin quem mais se sobressai e que mais aparece na tela, como a amante de Tudo-ou-Nada. Nada mais justo: ela é a filha do criador e tem uma beleza ímpar.

O que talvez incomode no filme seja justamente essa tentativa de emular sem muitas diferenças, sem fazer maiores atualizações, uma obra que carrega um determinado espírito do tempo, no caso, o do final dos anos 1960, conturbados mundialmente por uma rebeldia e uma vontade de mudar revolucionária, no sentido mais amplo do termo. Será que esse espírito hoje, em tempos mais amargos e distópicos, causa o mesmo impacto e gera o mesmo interesse na plateia? Ou serve apenas como uma homenagem a um de nossos mais inventivos cineastas? Sinceramente, ainda não sei dizer.

domingo, julho 01, 2012

JOVENS ADULTOS (Young Adult)



Não sei se fiquei deprimido porque vi o filme ou se já estava deprimido e fiquei ainda mais vendo JOVENS ADULTOS (2011), o mais recente trabalho de Jason Reitman, novamente em parceria com a roteirista Diablo Cody. Os dois haviam feito um ótimo trabalho juntos em JUNO (2007). O fracasso com os rumos da vida e a solidão novamente aparecem como temas caros ao diretor, assim como havia aparecido em AMOR SEM ESCALAS (2009). O diretor e a roteirista não têm pena de sua personagem. Ou talvez até tenham, mas é preciso que ela desça merecidamente ao seu inferno pessoal para que possa aprender. Se bem que pelo final do filme, será que ela realmente mudará? De todo modo, esse questionamento é mais um ponto a favor.

Na trama, Charlize Theron é uma escritora de livros juvenis que sofre com a solidão e o alcoolismo, embora procure manter as aparências. Certo dia recebe um e-mail do ex-namorado dos tempos de colégio (Patrick Wilson), mostrando o bebê recém-nascido de seu feliz casamento. Intrigada, ela vê isso como um sinal, uma oportunidade de reconquistá-lo, não importando que para isso tenha que acabar com o casamento do sujeito. Com toda sua arrogância, ela volta à cidadezinha onde nasceu e a única pessoa com quem ela trava algo próximo de uma amizade é um sujeito que ficou paralítico depois de uma surra na escola, de uma turma de machistas que o consideravam gay, vivido por Patton Oswalt.

A personagem de Theron tem algo que faz com que não a odiemos, embora tenha tudo para isso. Claro que o tom aparente de comédia do filme contribui para isso. O que sentimos por ela, apesar de tudo, é um sentimento de solidariedade, para usar palavra melhor do que pena. Creio que solidariedade é melhor também pois podemos nos colocar em seus sapatos, já que uma vez que não estejamos satisfeitos com os rumos de nossas vidas, é possível que haja uma espécie de identificação aproximada. Mesmo nas sequências mais constrangedoras para a personagem. E nisso, JOVENS ADULTOS, embora pareça menos interessante que JUNO ou AMOR SEM ESCALAS, é bem mais incômodo. E nisso reside sua força.

E ponto mais uma vez para Charlize Theron, que encara mais uma personagem antipática, sem medo de perturbar sua beleza com isso.