terça-feira, outubro 31, 2006
A CRIANÇA (L'Enfant)
Há algo de bressoniano neste A CRIANÇA (2005), filme dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne vencedor da Palma de Ouro em Cannes. Digo isso principalmente por causa daquele final, que deveria ser catártico - e talvez o seja para algumas pessoas - mas que não me comoveu de fato. O final do filme me lembrou bastante o final de PICKPOCKET, de Robert Bresson. Tanto pelo tipo de sentimento envolvido, quanto pela própria situação e modo de vida dos personagens. Bom, a comparação com Bresson pode ser encarada como um elogio, claro.
A CRIANÇA é o tipo de filme que cresce à medida que pensamos nele. O fato de os Dardenne terem nos dado mais espaço para respirar, tirando a câmera da nuca do protagonista - como acontece em O FILHO (2002) -, é um ponto a favor do filme, nos dando mais chance para nos distanciar do personagem e ter a opção de julgar ou não os seus atos. Ao menos, eu, inconscientemente, o fiz. Quando Bruno (Jérémie Renier) vende o próprio filho recém-nascido, confesso que fiquei indignado. Talvez pelo meu lado canceriano, que valoriza a maternidade acima de muitas coisas, tenha contribuído para isso. Por isso, achei totalmente justo o "castigo" que Sonia (Déborah François) lhe inflingiu. Mas ao mesmo tempo, o filme consegue ser até hitchcockiano no sentido em que torcemos pelo personagem em vários momentos, como quando ele quer reaver a criança ou quando ele foge depois de ter cometido um delito. Inclusive, não deixa de ser curioso como eu não julguei o personagem quando ele roubou, mas o fiz quando ele cometeu o "pecado mortal" de vender a criança. É hitchcockiano também o modo como a câmera, o ponto de vista, muda de Sonia para Bruno, que é um personagem muito mais rico e cheio de nuances que a jovem mãe. Quando a câmera persegue Sonia no começo do filme, é como se ela também estivesse à procura do rapaz. E quando o encontra, não larga mais.
Quanto ao prêmio em Cannes, não sei se a Palma de Ouro foi merecida. Já nem me lembro mais quais foram os outros filmes que concorrem no ano passado. A surpresa foi que essa foi a segunda vez que os Dardenne ganharam o festival, um fato inédito. A primeira foi com ROSETTA (1999), que dizem ser excelente. Quero ver. Estou na expectativa pra conferir também o vencedor de Cannes deste ano, THE WIND THAT SHAKES THE BARLEY, de Ken Loach, que está dividindo opiniões. Aliás, qual filme hoje em dia não divide opiniões?
segunda-feira, outubro 30, 2006
FLYBOYS
Meu interesse por FLYBOYS (2006) se deve mais pelo tema. Não conheço nenhum outro filme que mostre a admissão, o treinamento e a guerra nos céus de pilotos aéreos durante a Primeira Guerra Mundial. Desde que assisti O AVIADOR, de Martin Scorsese, que fiquei fascinado com a coragem dos pilotos do início do século XX. O avião mal havia sido inventado e lá estavam aqueles homens fazendo malabarismos no céu ou mesmo usando o novo meio de transporte como uma máquina de guerra. o cenário das trincheiras da Primeira Grande Guerra também me interessa, graças ao filme GLÓRIA FEITA DE SANGUE, de Stanley Kubrick. Aqueles homens que lutavam nas trincheiras só com muita sorte conseguiam escapar vivos daquele combate. Da mesma maneira, os pilotos franceses e americanos que lutavam contra os alemães também tinham uma expectativa de vida baixa: de três a seis semanas.
O material principal da trama é muito bom. Pena que Tony Bill não é um diretor talentoso o suficiente para transformar isso num grande filme. FLYBOYS só rende nos momentos de guerra nos céus, ainda que muitas cenas pareçam videogame por causa do CGI. Ainda assim, uma cena como a da explosão do Zeppelin não é sempre que se pode ver no cinema. Se o filme não fosse tão leve, tão família, tão certinho, poderia render mais emoção. O estilo excessivamente clássico e épico compromete o resultado final. Além do mais, o tratamento dado aos personagens é raso e estereotipado e os acontecimentos resultam previsíveis.
O filme mostra um grupo de americanos que chegam na França de 1916 para aprender a pilotar aviões e a usá-los como armas. O detalhe é que eles chegam na França para lutar antes mesmo de os Estados Unidos aderirem à guerra. O protagonista é James Franco, um caubói que vai para a França por ter perdido tudo em seu país. Entre os outros pilotos, temos um rapaz negro cujo pai foi escravo e que quer conseguir um pouco de respeito da sociedade, um jovem filho de pai rico que foi forçado pelo próprio pai a ingressar na luta armada, um rapaz que cometeu um crime nos Estados Unidos e fugiu para a França para escapar da prisão, entre outros. O líder do pelotão é Jean Reno.
Vendo o filme, difícil não lembrar de O PARAÍSO INFERNAL, obra-prima de Howard Hawks que mostra a coragem de homens que lidam com um trabalho muito perigoso e que, por isso, precisam viver cada momento de suas vidas como se fosse o último, às vezes procurando nos bares uma espécie de fuga da realidade. Claro que comparar os dois filmes é covardia, mas não perco a oportunidade de elogiar um filme de Howard Hawks sempre que posso. :-)
FLYBOYS foi baseado em fatos reais. Existiu mesmo essa Esquadrilha Lafayette e no final do filme, antes dos créditos finais, vemos o destino dos personagens sobreviventes após o fim da guerra. O diretor Tony Bill é pouco conhecido e tem um currículo de diretor mais ligado a produções para a televisão. FLYBOYS seria o seu filme mais famoso, então.
sábado, outubro 28, 2006
TUDO PELA FAMA (American Dreamz)
Como fã que sou de Hugh Grant e do filme UM GRANDE GAROTO (2002), não tinha como deixar de assistir esse TUDO PELA FAMA (2006), segunda parceria de Grant com o diretor Paul Weitz. Também trabalhando pela segunda vez com o diretor está Dennis Quaid, no papel do Presidente dos EUA. Quaid havia protagonizado EM BOA COMPANHIA (2004), outra agradável comédia de Weitz.
TUDO PELA FAMA, que saiu no Brasil direto em vídeo, foca no universo dos programas de televisão tipo Fama e Ídolo, que tentam transformar calouros em superstars. Grant é o apresentador do programa. Um sujeito cínico e meio insensível que só quer lucrar com o programa, que precisa urgentemente de um canditado exótico. Por isso que eles selecionam o árabe Omer (Sam Golzari), que na verdade estava nos EUA com a intenção de participar de uma missão terrorista suicida. A outra participante importante é Sally Kendoo (Mandy Moore), que só foi escolhida por se mostrar capaz de qualquer coisa para alcançar os seus objetivos. Quando o personagem de Grant a encontra, rola logo uma identificação. Willem Dafoe está bem diferente - careca - no papel de Vice-Presidente.
O filme pode não ser tão bom quanto os anteriores de Weiz, mas é uma diversão das mais agradáveis. Mal se percebe o tempo passando. Na verdade, à medida que se aproxima do final, o filme cresce ainda mais. E Mandy Moore é uma graça. Já tinha gostado dela no melodrama UM AMOR PARA RECORDAR (2002) e dessa vez ela mostrou que também sabe fazer uma personagem um pouco mais venenosa. Só não gosto muito é do estilo de música dela, mas aí já é outra história. Ela está no novo de Richard Kelly, SOUTHLAND TALES (2006), filme que, com certeza, é dos mais aguardados. Quanto a Hugh Grant, o peso da idade já começa a ficar evidente e talvez ele tenha que mudar um pouco o tipo de papel que está acostumado a pegar. Mas por enquanto ainda está dando pra fazer comédias românticas, tanto que no próximo ano ele estará presente em MUSIC AND LYRICS BY, ao lado da sempre simpática Drew Barrymoore.
Agradecimentos especiais ao amigo Zezão, que fez a gentileza de gravar o filme pra mim.
sexta-feira, outubro 27, 2006
MASCULINO-FEMININO (Masculin Féminin: 15 Faits Précis)
Minha peregrinação pelo cinema de Jean-Luc Godard está andando a passos de tartaruga. A última vez que escrevi sobre um filme dele - PIERROT LE FOU (1965) - foi em agosto. Confesso que, apesar do respeito e admiração, Godard ainda não é o que eu chamaria de cineasta do coração. Ainda preciso me preparar psicologicamente para ver qualquer um de seus filmes. A surpresa é que MASCULINO-FEMININO (1966) é uma delícia. Apesar do título remeter à diferença de gêneros, acho que Godard foi mais feliz em estabelecer critérios de comparação entre os sexos em UMA MULHER É UMA MULHER (1961). Mas gostei bem mais desse MASCULINO-FEMININO. Muito pela presença de Jean-Pierre Léaud. Por causa dos filmes das aventuras de Antoine Doinel, de François Truffaut, estabeleci uma espécie de vínculo afetivo com o ator. Em alguns momentos, deu até pra fingir que estava vendo um filme de Truffaut, mas aí apareciam aquelas experimentações godardianas e eu lembrava quem era o dono do filme.
Em MASCULINO-FEMININO, Léaud é Paul, um jovem recém-saído das forças armadas que conhece num cafè Madeleine, interpretada pela gracinha Chantal Goya, na época, uma cantora muito popular na França. Inclusive, a trilha sonora do filme traz algumas das canções de Chantal, que são muito gostosas de ouvir. Paul se apaixona por Madeleine, mas a moça se revela muito difícil, tendo resistido muitas vezes às abordagens do rapaz, muito por medo de engravidar. Um dos momentos mais bonitos do filme é quando Paul entra numa cabine de gravações, bota pra fora toda sua paixão pela jovem e sai com um disquinho compacto na mão.
Nesse filme, Godard explicitava seu interesse pela política. Felizmente, a parte política não ficou datada, quer dizer, não perdeu a sua importância, já que o momento era mesmo de efervescência e Godard soube documentar muito bem a sua época, falando de temas relevantes como a Guerra do Vietnã, o marxismo, o acostumar-se com a violência e a alienação da juventude. Sobre esse último tópico, tem uma cena de uma jovem sendo entrevistada (Eva-Britt Strandberg), que é maravilhosa. Muito por causa da beleza, graça e sensualidade da moça. Sobre a violência crescente, interessante notar que nunca se fala na cena seguinte sobre algum ato violento mostrado anteriormente.
O filme é composto por 15 capítulos que se iniciam com títulos muitas vezes acompanhados por sons de tiros. Esse tipo de estrutura já havia sido utilizada em VIVER A VIDA (1962), que era constituido de doze capítulos. É uma maneira interessante de se livrar da obrigação de se fazer um filme coeso. Nesse filme, o barulho das ruas e a presença de pessoas alheias à cena no canto do quadro dá ao filme um aspecto documental. Mesmo que o filme tivesse uma narrativa convencional, ainda assim seria um belo documento da juventude da época, que consumia produtos americanos (cinema, coca-cola, rock and roll), ouvia música em jukeboxes nos bares e em discotecas; as meninas usavam mini-saia e os rapazes ficavam ainda mais loucos. Godard registrou também a repercussão que a música de um jovem chamado Bob Dylan estava causando mundo afora.
Uma das maiores vantagens de se assistir aos filmes de Godard é que eles ficam melhores no dia seguinte. Cada vez que a gente pensa ou escreve sobre seus filmes, eles crescem de forma impressionante. São também filmes que precisam da participação do espectador para que sejam melhor apreciados. O espectador é levado a pensar a todo instante. Talvez por isso seus filmes sejam um pouco cansativos ao mesmo tempo que trazem prazer estético.
Na época, Godard já podia se dar ao luxo de colocar referências ao próprio trabalho. Pelo menos três filmes são citados: ACOSSADO (1960), UMA MULHER É UMA MULHER e PIERROT LE FOU. De ACOSSADO, temos Léaud imitando os trejeitos de Jean-Paul Belmondo, seja tentando acertar o cigarro na boca, seja passando os dedos sobre os lábios. Da mesma forma, Chantal parece imitar Anna Karina. O extremo respeito pelo cinema é explicitada na cena em que Léaud sai correndo da sala de projeção para reclamar que o filme estava sendo exibido na janela errada.
No próximo trabalho - MADE IN U.S.A. (1966) -, Godard junta Jean-Pierre Léaud com sua musa Anna Karina. Qual deve ter sido o resultado? Isso eu pretendo conferir em breve.
quinta-feira, outubro 26, 2006
FARSA TRÁGICA (The Comedy of Terrors / The Graveside Story)
Ia postar sobre esse filme ontem, mas eu vivi um dia dos infernos, com um preocupante aumento nas crises de pânico, um diretor novo na empresa mais parecido com a Merryl Streep de O DIABO VESTE PRADA e muita pressão no trabalho. Tudo que eu queria ontem era minha cama, o meu quarto e um bom filme, mas não posso ficar fugindo de tudo. Sem falar que a luta maior é interior. Espero que hoje seja um dia um pouco mais sossegado, mas a julgar pela movimentação que está tendo aqui acho que não será não. Mas falemos de coisas boas.
Este FARSA TRÁGICA (1964) eu vi no Cineclube da Casa Amarela. As meninas (Bia e Carol) organizaram com muito carinho uma pequena mostra de filmes de terror, com vários exemplares estrelados por Vincent Price. Essa agradável comédia de humor negro foi uma delas. Jacques Torneur, mais conhecido pelos clássicos SANGUE DE PANTERA (1942) e FUGA DO PASSADO (1947), estava em final de carreira, mas teve a sorte de trabalhar com um elenco de peso. Além de Price, integram o filme Peter Lorre, Boris Karloff e Basil Rathbone, todos nomes ligados de uma forma ou de outra ao cinema de horror.
FARSA TRÁGICA tem sabor de antigas sessões da tarde. Digo isso mais pelo andamento, típico dos filmes americanos dos anos 60, do que pela trama e pelo ilustre elenco envolvido. No filme, Vincent Price é um dos donos de uma empresa funerária decadente. O outro dono é Boris Karloff no papel de um velho esclerosado cuja filha (Joyce Jameson) é casada com Price. O assistente de Price é Peter Lorre, em seu típico papel de humilhado. Os dois, para contenção de despesas, usam a estratégia de reaproveitamento do caixão. Assim que os familiares vão embora, eles pegam o caixão de volta e enterram o cadáver só com terra por cima. Apesar desse interessante exemplo de como economizar, a empresa está na pior já que eles não têm dinheiro para pagar o aluguel atrasado. Como bom tomador de decisões, Price resolve matar algum homem rico da região para que ele possa conseguir o dinheiro do aluguel. Mas as coisas não saem como planejado.
Até aí o filme ainda não havia me conquistado. Quem rouba o filme quando aparece é mesmo Basil Rathbone, o dono do imóvel onde funciona a funerária. Ele adora recitar textos de Shakespeare e tem problemas de catalepsia. Só por esse último detalhe, já dá pra imaginar o que pode acontecer. Melhor cena do filme: Joyce Jameson cantando "He is not dead but sleeping" no velório de Rathbone. Nessa hora eu não me contive e dei uma boa gargalhada. Só por esse momento genial, o filme já subiu no meu conceito.
Agradecimentos a Bia pelo convite. A propósito, pedi a ela a programação dos meses de novembro e dezembro do Cineclube para divulgar por aqui. E tem muita coisa boa. Vejam só:
Novembro
DO LUXO AO LIXO (Festival John Waters)
06.11 - CRY-BABY (1990)
13.11 - POLYESTER (1981)
20.11 - PROBLEMAS FEMININOS (Female Trouble, 1974)
27.11 - PINK FLAMINGOS (1972)
Dezembro:
04.12 - ERASERHEAD (1977), de David Lynch
11.12 - A NOITE DOS MORTOS VIVOS (Night of the Living Dead, 1968), de George Romero
18.12 - OS FILMES PROIBIDOS DA MEIA-NOITE (Midnight Movies: From the Margin to the Mainstream, 2005), de Stuart Samuels
terça-feira, outubro 24, 2006
EDMOND
Até parece que estou fazendo um aquecimento para a segunda temporada de MASTERS OF HORROR. Depois do novo filme de Lucky McKee, vi ontem o ótimo EDMOND (2005), de Stuart Gordon. Tanto McKee quanto Gordon são cineastas que participaram (com trabalhos de respeito) da primeira temporada da antologia, sendo que Gordon estará de volta na segundona, dessa vez adaptando o conto "O Gato Preto", de Edgar Allan Poe. Gordon deve mostrar que, além de ser o melhor adaptador de Lovecraft, também se dá bem adaptando Poe. Assim espero. Enquanto o gato preto não passa na nossa frente, falemos de EDMOND.
Antes de mais nada, a parceria de Gordon com o dramaturgo e cineasta David Mamet se revelou um trabalho próximo da perfeição e EDMOND é uma viagem ao abismo da alma de um homem, um convite a um estado de insanidade crescente, bem como uma fábula sobre preconceitos. Interessante que em alguns momentos até é possível entender o ponto de vista do personagem e ser solidário com sua revolta. Talvez por culpa da ingenuidade do personagem diante do mundo, talvez por termos adormecidos em nós os mesmos preconceitos ou talvez por também estarmos cheios de nossa rotina e das "injustiças" que sofremos freqüentemente.
Na trama, William H. Macy é um executivo entediado com a vida que leva. Saindo do trabalho, e devido a uma pequena coincidência do destino, ele passa numa cigana, que lê sua sorte através das cartas e lhe diz que ele está vivendo no lugar errado. Percebendo a necessidade de mudar urgentemente de vida, ele larga a esposa e diz que vai embora. Sai à noite à cata de emoções, adentrando o submundo da prostituição e entrando num processo crescente de loucura.
Soube que David Mamet escreveu esse roteiro logo após ter se separado da esposa. Talvez por isso o texto - e o filme - tenha resultado tão vivo e tão catártico. A cena em que Macy é abordado pelo suposto cafetão e finalmente age "como um homem" é uma dessas cenas que despertam a nossa raiva interior. William H. Macy foi uma escolha perfeita para viver o personagem-título. O ator é geralmente convidado para interpretar tipos losers, mas nesse filme, a partir do segundo ato, ele se revela um gigante. Os coadjuvantes também se destacam. Especialmente Joe Mantegna e Julia Stiles. Julia participa da cena mais chocante do filme.
EDMOND foi exibido no Festival do Rio de 2005 e faz parte da Mostra Internacional de Cinema de 2006. Imperdível. Valeu pela dica, Leandro!
segunda-feira, outubro 23, 2006
UM CARA QUASE PERFEITO (Man about Town)
Se UM CARA QUASE PERFEITO (2006) desagrada boa parte da audiência, isso é culpa da maneira como o filme foi vendido. A começar por essa mania que os "tradutores" - ou seja lá quem seja - têm de colocar esse "quase perfeito" nos títulos dos filmes. Até para aqueles que já esperam um drama ou uma comédia dramática, o filme de Mike Binder surpreende. É uma obra estranha em muitos sentidos. Não uma estranheza à Wes Anderson, embora a cena do velho dentro do aquário até possa remeter a Anderson, mas uma estranheza ligada à própria trama.
No filme, Ben Affleck é um empresário de talentos de Hollywood que passa por um momento de crise existencial. Ele busca sentido para sua vida e resolve entrar num curso de auto-ajuda. O método que o orientador (John Cleese, muito bom) utiliza é o de se escrever um diário. Olha aí uma dica pra quem está sentindo aquele vazio e está querendo economizar grana. Em vez de procurar um desses cursos picaretas que servem mais pra comer o dinheiro do povo, uma boa alternativa é escrever um blog, coisa que, aliás, muita gente já está fazendo.
Pois bem. Aparentemente, o personagem de Ben Affleck não tem do que reclamar, já que ele tem a vida que muita gente pediu a Deus. Tem muito dinheiro no banco, uma mansão, um carrão de luxo e uma belíssima esposa (Rebecca Romijn, mais linda do que nunca). Quando ele achava que sua vida estava sem graça, começam a aparecer desgraças. A mulher confessa tê-lo traído, sua casa é invadida, ele é espancado e seu diário (contendo informações confidenciais) é roubado.
Interessante que a chave utilizada por Binder nessa primeira metade do filme é a de um drama com poucos toques cômicos. As lembranças de infância do personagem de Aflleck são bastante fortes, incômodas e até violentas. Mas foi esse tom quase melodramático que me conquistou. Especialmente no auge da crise do personagem, quando toca a bela "Cucurucucu Paloma", que já havia sido cantada por Caetano Veloso na obra-prima FALE COM ELA, do Almodóvar. Claro que nem tudo é perfeito, mas o filme me deixou uma ótima impressão. Mike Binder mostrou criatividade utilizando uma edição muito interessante, tirando proveito de efeitos especiais e do efeito de tela divida. O papel de coadjuvante de Binder nesse filme é bem parecido com o que ele fez em A OUTRA FACE DA RAIVA (2005), seu filme anterior. Ele faz novamente um amigo fiel, sempre pronto pra ajudar o companheiro nas horas difíceis.
Quanto a Ben Affleck, quando ele ganhou o prêmio de melhor ator em Veneza por HOLLYWOODLAND (2006) todo mundo ficou admirado. Depois de UM CARA QUASE PERFEITO, eu até que não fico mais.
sexta-feira, outubro 20, 2006
O DESESPERO DE VERONICA VOSS (Die Sehnsucht der Veronika Voss)
Engraçado que o meu primeiro contato com a obra de Rainer Werner Fassbinder - com O CASAMENTO DE MARIA BRAUM (1978), LILI MARLENE (1980) e LOLA (1981) - havia me deixado com uma impressão diferente de agora, quando peguei pra ver MARTHA (1972) há poucos meses e O DESESPERO DE VERONICA VOSS (1982) mais recentemente. Ambos os filmes me pareceram difíceis de assistir, excessivamente densos e pesados. Não dá pra negar que eles são trabalhos feitos por quem realmente entende de cinema, mas senti falta da leveza do cinema americano enquanto via esses dois filmes. Principalmente se compararmos com os melodramas clássicos hollywoodianos, como os de Douglas Sirk e Leo McCarey. Nos filmes de Fassbinder há menos chances de o espectador cair no choro. Quase improvável.
Em O DESESPERO DE VERONICA VOSS, estamos na Alemanha de 1955. Um jornalista esportivo conhece Veronica Voss - Rosel Zech, que faz a personagem-título, é bem parecida com Marlene Dietrich, com aquele aspecto austero -, uma atriz que, dizem, teve um caso com Goebbels na época do auge do nazismo. Hoje ela está decadente e sofre de dependência de morfina. O jornalista, ao mesmo tempo que quer fazer uma matéria exclusiva sobre a atriz, começa a se relacionar afetivamente com ela. Veronica tem os seus segredos e sofre de dores constantes, só aliviadas com o auxílio da droga. Talvez Fassbinder, já próximo de morrer de overdose, se sentisse próximo das pessoas dependentes químicas. O cineasta tinha uma rotina diária de consumo de álcool, pílulas para dormir e cocaína. Não podia durar muito mesmo.
Assim como MARTHA, O DESESPERO DE VERONICA VOSS lida com personagens vítimas. Ao que parece, esse é um tema recorrente na obra de Fassbinder. Suas personagens tentam em vão livrar-se de seu inferno pessoal, seja ele na figura de um homem perverso, seja na dependência química e na vilaneza de uma médica. O que destaca O DESESPERO... de boa parte dos filmes de Fassbinder é o capricho na fotografia em preto e branco, a cargo de Xaver Schwarzenberger, colaborador habitual do diretor. Foi a primeira experiência do fotógrafo com o preto e branco e a intenção de Fassbinder era fazer um filme de alto contraste de preto e branco e uma quase ausência da tonalidade cinza. Ele não queria que seu filme ficasse parecido com os filmes americanos, mas que seguisse o exemplo de ROMA, CIDADE ABERTA, de Roberto Rosselini, entre outros filmes europeus que usavam tal contraste. As cenas em que as luzes brilham exageradamente ficam marcadas na memória. Com esse filme, Fassbinder também homenageou CREPÚSCULO DOS DEUSES, de Billy Wilder.
O filme foi inspirado na vida da atriz Sybille Schmitz (1909-1955), que esteve em O VAMPIRO, de Carl Th. Dreyer. O DESESPERO DE VERONICA VOSS é o terceiro filme da trilogia da Alemanha, iniciada com O CASAMENTO DE MARIA BRAUM e LOLA. No DVD da Versátil há uma entrevista com a atriz principal e com a editora. O filme ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 1982.
P.S.: Ontem vi o piloto de DEXTER, série que estreou há poucas semanas no canal Showtime. Impressionante como a televisão está ousada. Jamais imaginaria que aparecesse uma série em que o "herói" da trama é um serial killer! Devo acompanhar essa série, estrelada pelo ótimo Michael C. Hall, de A SETE PALMOS. Parece que a série só tem doze episódios por temporada.
quinta-feira, outubro 19, 2006
ESTAMIRA
Para um filme que deve muito de sua importância ao discurso da personagem título, ESTAMIRA (2004) não me convenceu muito não. Quando o filme começa e mostra aquelas imagens sem diálogos de Estamira pegando ônibus e indo para o lixão do Aterro Sanitário de Jardim Gramacho, aquela fotografia granulada e com aspecto sujo e a sensação de desalento me fascinaram. Acredito que Marcos Prado tem futuro no cinema de ficção, se um dia ele se interessar a dirigir um. Como ele atualmente está produzindo a ficção TROPA DE ELITE (2007), de José Padilha, é possível que ele se aventure na direção de ficção algum dia.
Quanto a Estamira, a velha me incomodou. Aliás, não foi nem ela quem me incomodou tanto, mas a tentativa que o filme faz a todo custo de dar sentido aos pensamentos sem nexo da catadora de lixo, como se ela fosse uma espécie de filósofa, sábia ou detentora da verdade, como aliás a própria se julga. Ela afirma que sua missão no mundo é "mostrar a verdade e capturar a mentira". Talvez a pretensão da mulher tenha despertado a atenção do cineasta. O que eu vi na tela foi apenas uma senhora paranóica e raivosa, que vive culpando os "espertos aos contrário" e o "trocadilo" pela sua desgraça. Em certo momento, inclusive, eu cheguei a acreditar na teoria do filho dela, de que ela estaria sofrendo influência de algum espírito demoníaco. Do jeito que eu sou supersticioso, não descartaria essa hipótese.
Deu pra notar que Estamira ficava às vezes envaidecida quando discursava para a câmera, como naquela vez em que ela estava no lixão, próximo de um companheiro de trabalho. Deu pra perceber também a proximidade que ela tinha com o cineasta, embora essa aproximação não tenha sido tão forte quando a de Roberto Berliner e as ceguinhas de A PESSOA É PARA O QUE NASCE.
Das coisas que Estamira falou, o que eu achei mais interessante foi justamente aquilo que está escrito no cartaz: "tudo que é imaginário, tem, existe, é." Isso mostra uma lucidez impressionante para uma pessoa que sofre de distúrbios mentais e não teve uma educação suficiente para explicar de forma um pouca mais precisa seus pontos de vista e sua idéia de mundo. Em razão disso, fiquei sem saber o que ela quis dizer quando falava coisas como "aquele que revelou o homem como único condicional" - isso ela falou umas três vezes - ou quando se referia a um "controle remoto".
quarta-feira, outubro 18, 2006
PARANOIA AGENT (Mousou Dairinin)
Só fui saber que Satoshi Kon havia realizado essa série quando li um artigo sobre ele por ocasião da exibição no Festival de Veneza de PAPRIKA (2006), seu mais recente longa-metragem. Poucas semanas depois, como num passe de mágica, lá estava eu de posse dos 13 episódios de PARANOIA AGENT (2004), uma série muito louca sobre pessoas desesperadas e angustiadas que encontram a salvação nas mãos de um agressor que aparece na figura de um garoto com um bastão de beisebol.
A série já começa bizarra com a abertura, que mostra os personagens da série dando gargalhadas como se tivessem tomado algum tipo de droga, alcançado a iluminação ou descoberto algo muito importante a respeito da vida. A série vai apresentando os personagens aos poucos. A primeira a ser destaque é Tsukiko, uma garota tímida que criou um bonequinho que virou uma verdadeira febre no Japão, o Maromi, um cachorrinho cor-de-rosa e com os olhos bem grandes. O problema é que a companhia em que ela trabalha está pressionando a garota para que ela crie um outro personagem o mais rápido possível, mas Tsukiko está carente de idéias. Angustiada e perturbada, ela é atacada por um sujeito e acorda num hospital. Ela descreve para a polícia que o tal agressor é um menino de boné, sorriso brilhante no rosto, patins e um taco de beisebol.
Os episódios seguintes mostram outras pessoas que têm suas vidas mudadas graças ao "Shounen Bat", apelido que o agressor recebe pela mídia. Temos o garotinho que é confundido com o tal sujeito por causa de seus patins, boné e sorriso brilhante; temos a garota que tem vida dupla, sendo que à noite ela é prostituta; temos o policial que faz negócios com a Yakuza e precisa ele mesmo cometer assaltos para pagar suas dívidas.
Depois de quatro episódios excepcionais, a série começa a cair um pouco a partir do quinto, quando a trama vai ficando cada vez mais intrincada e os episódios vão trazendo situações cada vez mais bizarras. Alguns episódios não têm uma ligação direta com a trama principal, mas apenas com a lenda urbana do "Shounen Bat". É o caso do episódio "Happy Family Planning", que mostra um grupo de três amigos que se conhecem pela internet e decidem fazer um suicídio coletivo para pôr fim às suas vidas miseráveis. Esse é um dos episódios mais interessante e que até pode ser visto independente da série, ainda que eu não recomende. Outro episódio de destaque é o que lida com a força do boato, mostrando um grupo de senhoras que conta estórias absurdas sobre o "Shounen Bat".
A série perde a força quando fecha com os três últimos episódios a trama principal, com um dos policiais encarregados do caso se transformando numa espécie de super-herói e o seu parceiro indo parar num mundo bidimensional. Muita loucura. Muitas perguntas ficam no ar e alguns dos personagens mais interessantes, como Harumi Chono - a menina de vida dupla -, são deixados de lado. No fim das contas, eu fiquei sem saber qual foi a intenção de Satoshi Kon ao criar essa série. Ainda assim, não é sempre que se pode ver uma série animada tão bem cuidada e que ainda incita à reflexão.
Agradecimentos a Marcelo Reis, que muito gentilmente me enviou de surpresa uma cópia dessa brilhante série. Valeu, meu chapa!
terça-feira, outubro 17, 2006
FREE ZONE
O plano-seqüência que abre FREE ZONE (2005), além de muito bonito, funciona também como uma forma de acalmar os ânimos da platéia, que normalmente está acostumada a uma narrativa mais apressada. Assim, somos obrigados a assistir a quase dez minutos de câmera parada no rosto de Natalie Portman. Levando em consideração a dona do rosto, é uma obrigação das mais prazerosas. Natalie, além de linda, é inteligente (fala várias línguas) e tem um carisma impressionante. Ainda que o filme não fosse bom, não seria nada mal passar 90 minutos só olhando pra ela. E sabendo do tesouro que estava nas mãos, a câmera de Amos Gitaï "namora" a protagonista. O close é tão próximo de seu rosto que é quase como se pudéssemos beijá-la. Essa primeira seqüência do filme mostra Miss Portman chorando copiosamente. Não sabemos o motivo e essa pergunta obviamente passa por nossa cabeça, ao mesmo tempo que prestamos atenção na canção que toca no carro, que tem uma estrutura parecida com a popular "Velha a Fiar" e que retrata o clima de opressão vivido em Israel.
Na trama, Natalie Portman é Rebecca, uma americana filha de pai judeu, que está em Israel, e embarca numa viagem até uma "free zone", uma zona de livre comércio onde pessoas de vários países (Israel, Jordânia, Egito, Iraque etc) podem fazer transações comerciais sem se importar com nacionalismos. A jovem está na companhia de Hanna, uma judia alemã que mora em Israel. Elas vão até essa "free zone" na Jordânia a negócios. Para Hanna, a viagem é apenas de negócios, mas para Rebecca, ela significa a porta para um novo mundo, um mundo até então desconhecido e que serve também como fuga para a jovem, que está sofrendo o trauma de uma separação.
Amos Gitaï sai um pouco da narração tradicional quando utiliza camadas de imagens no lugar dos manjados flashbacks para mostrar o que aconteceu com as personagens antes daquele momento retratado no filme. Não tenho nada a falar sobre a visão política e ideológica que o filme passa. Tanto por não ter muito background no assunto, quanto pelo fato de que tudo que eu li a respeito do filme, sejam as críticas sejam as entrevistas, soaram um pouco vagas pra mim. Do ponto de vista narrativo, o filme perde um pouco da força momentos depois que as três mulheres (a americana, a judia e a palestina) vão até o lugar onde mora o tal "americano" que deve dinheiro ao marido de Hanna. A cena em que Natalie conversa com um senhor é um balde de água fria e prejudica todo o andamento, trazendo irregularidade para o filme, que até então estava indo muito bem. As cenas de dentro do carro lembram DEZ, de Abbas Kiarostami.
segunda-feira, outubro 16, 2006
O GRITO 2 (The Grudge 2)
Uma dos aspectos mais interessantes nesse O GRITO 2 (2006) é a interessante edição que alterna três tramas diferentes, tornando o filme bastante instigante. Esse é um dos pontos positivos do filme. O GRITO 2 não chega a pregar tantos sustos quanto o "original", nem a bela Sarah Michelle Gellar aparece o suficiente, mas a competência técnica de Takashi Shimizu pode ser sentida a todo instante. E isso é o suficiente para que o interesse pelo filme seja sentido até o final.
As três subtramas acontecem em locais diferentes, sendo que uma delas acontece em Chicago e as outras duas no Japão. Em todas, há uma ligação com a casa amaldiçoada de Kayako e Toshio, os dois espíritos que "vivem" atazanando a vida de quem cruza o seu caminho. O prólogo do filme é bem interessante, mostrando a personagem de Jennifer Beals matando o marido depois de um ataque de fúria. Depois, entram os criativos créditos de abertura, destacando os cabelos pretos de Kayako.
O som que Kayako emite, parecido com um arroto e motivo de riso das platéias, é menos utilizado nesse segundo filme, bem como o miado do "menino-gato". Um problema do filme se deve à pouca solidez da trama fantasmagórica. Quanto mais eles tentam explicar, mas fraca ela fica. Talvez a melhor coisa a fazer seria não explicar nada e torcer para que o filme ganhasse com o clima de mistério. A cena que mais se assemelha a uma comédia rasgada é a seqüência do motel. Mas tem o velhinho do ônibus também, que é uma simpatia.
Dos personagens que compõem as tramas paralelas, a que mais se aproxima de uma protagonista é Amber Tamblyn, que interpreta a irmã da personagem de Sarah Michelle Gellar. Não chegou a ser uma troca justa, já que Amber tem aquela cara de quem está chupando limão o tempo todo.
Interessante notar que tem uma cena de chuveiro no filme que se assemelha muito a uma cena de TODO MUNDO EM PÂNICO 4, que trazia Anna Faris no banho. Não é de se admirar que a platéia a certa altura imagine estar vendo uma comédia, principalmente levando em consideração que o filme economiza muito na crueldade das mortes. Se o filme fosse mais violento e assustador, talvez fosse levado mais a sério pela audiência.
P.S.: Está no ar no CCR minha nova coluna, sobre atores que morreram no meio das filmagens. Confiram!
domingo, outubro 15, 2006
A FLORESTA (The Woods)
A julgar pelos anteriores MAY - OBSESSÃO ASSASSINA (2002) e SICK GIRL (2006), feito para a antologia MASTERS OF HORROR, Lucky McKee tem uma queda por personagens femininas. Essa teoria é confirmada com o novo A FLORESTA (2006), ainda inédito no Brasil, mas que pode ser puxado facilmente nos sites de torrent ou no e-mule. Pra quem preferir ver em DVD, o filme tem previsão de lançamento para o mês de novembro pela Sony. A parceria com Angela Bettis nos filmes anteriores se repete mas de maneira um pouco mais sutil. Angela é "apenas" a voz da floresta no novo filme. E curiosamente ela está estreando na direção com ROMAN (2006), cujo roteiro foi feito por McKee. E o engraçado é que em ROMAN, os papéis dos dois se invertem e é McKee quem aparece atuando. (Adoro o IMDB.)
A FLORESTA é filme-irmão de A ÁRVORE DA MALDIÇÃO, de William Friedkin. A não ser em títulos como esses, os filmes de terror em geral mostram florestas e bosques perigosos porque algo está escondido detrás das árvores e não porque as árvores em si podem atacar as pessoas. A FLORESTA não chega a ser assustador, mas é intrigante e misterioso. Na trama, a jovem Heather (Agnes Bruckner) vai para um colégio interno de garotas. Ao que parece, ela tocou fogo na própria casa e sua mãe decidiu colocá-la em regime de internato. A diretora da escola é interpretada por Patricia Clarkson e Bruce Campbell faz uma participação pequena mas importante como o pai de Heather. Com o tempo, a garota irá notar que o clima hostil da escola não se deve apenas às meninas malvadas que a perturbam, mas que há algo de realmente maligno naquele lugar.
A trama e a atmosfera lembram bastante SUSPIRIA, de Dario Argento, e isso não deve ser apenas uma coincidência. Trata-se de uma homenagem mesmo. Que é explicitada na cena em que aparecem as três bruxas. Além da bela fotografia que acentua a cor verde, o filme ainda tem uma interessante trilha sonora com música incidental (de suspense) e canções com voz feminina. Aliás, tirando a participação de Bruce Campbell e de um ator que interpreta um policial e que aparece um par de vezes, o filme é delas. Dois momentos memoráveis: o ataque no carro e os galhos invadindo a escola.
Agradecimentos ao Leandro Caraça que (sem querer) me incentivou a ir atrás do filme, postando a respeito em seu blog.
sábado, outubro 14, 2006
LEO McCAREY EM TRÊS FILMES
Leo McCarey é um dos cineastas entrevistados no livro "Afinal, Quem Faz os Filmes", de Peter Bogdanovich. E já fazia um tempão que eu estava devendo pra mim mesmo o fechamento da mini-peregrinação que eu pretendia fazer com seus poucos filmes disponíveis em vídeo no Brasil, a fim de ler com mais prazer a entrevista. Infelizmente, procurei na locadora O DIABO A QUATRO (1933) e não consegui encontrar. Mas eu juro que eu vi o DVD desse filme por lá. Depois de ter desistido da procura, resolvi fechar de vez esse capítulo dedicado a Leo McCarey, alugando OS SINOS DE SANTA MARIA (1945) e TARDE DEMAIS PARA ESQUECER (1957), sendo que esse último eu já tinha visto em VHS, na época da redescoberta do filme, graças a SINTONIA DE AMOR, de Nora Ephron. Coincidentemente, justamente no dia em que eu aluguei esses dois filmes de McCarey, encontrei no balaio de 9,90 do Extra o clássico DUAS VIDAS (1939), só que com um título diferente: POEMA DE AMOR. Se eu não tivesse olhado a contracapa, não teria notado o nome do diretor e o título original. Fiquei super-feliz.
DUAS VIDAS / POEMA DE AMOR (Love Affair)
Leo McCarey preferia esse original à refilmagem mais famosa e de maior sucesso, o TARDE DEMAIS PARA ESQUECER. Pesando os dois filmes na balança, por pouco eu gosto mais do remake, mas esse original é uma beleza também. É mais enxuto, com menos canções, mais próximo da comédia. A década de 30, talvez para fugir da tristeza da Grande Depressão, se caracterizou principalmente por suas comédias malucas. O próprio McCarey já havia realizado uma dessa comédias: o ótimo CUPIDO É MOLEQUE TEIMOSO (1937). Outro ponto a favor de LOVE AFFAIR: eu simpatizei mais com a Irene Dunne do que com a Deborah Kerr, apesar dessa última ser bem mais elegante. Pra quem não conhece a estória: um homem (Charles Boyer) e uma mulher (Irene Dunne), ambos solteiros mas comprometidos, conhecem-se num navio. Como ambos estão sós e há uma atração mútua, eles passam muito tempo juntos. Ele é um homem famoso, uma celebridade. Quando o navio está chegando em casa, ela sugere que os dois se encontrem novamente em seis meses, no topo do Empire State. É o tempo de ambos resolverem suas vidas e se casarem. Acontece que o destino não foi muito gentil com o casal de apaixonados. No dia do encontro, ela é atropelada e fica paralítica. Apesar do enredo ser bem pesado, esse filme tem uma leveza impressionante, coisa que só os americanos parecem conseguir fazer.
OS SINOS DE SANTA MARIA (The Bells of St. Mary's)
Engraçado que o filme que eu imaginava ser o mais fraco dos três de Leo McCarey foi justamente o que eu mais gostei, o que mais me emocionou. OS SINOS DE SANTA MARIA é uma espécie de continuação do premiado O BOM PASTOR (1944). Bing Crosby retoma o papel do Padre Chuck O'Malley do filme que lhe valeu um Oscar. Interessante que o filme foi feito de encomenda pois a Igreja e as pessoas gostaram muito do tratamento que McCarey deu aos padres no primeiro filme e queria que ele fizesse o mesmo com as freiras. Assim, o filme apresenta a mais linda freira que eu já vi: Ingrid Bergman, no papel de Madre Superiora e líder do grupo que coordena uma escola para crianças. O prédio da escola está em ruínas e o dono de um grande edifício ao lado quer comprar o terreno da escola para fazer um estacionamento. Em vez disso, as freiras rezam para que o dono ranzinza doe o prédio dele para que, no lugar, seja construída uma nova escola. O filme flui com uma delicadeza impressionante. E o interessante é que o padre e as freiras não são mostrados de modo muito religioso, mas são tratados com respeito, ainda que o padre tenha cara de malandro e a Ingrid Bergman, vestida de freira, inspire as mais variadas fantasias do espectador. Não pude conter as lágrimas no final. Esse filme, junto com O BOM PASTOR, são os filmes de maior sucesso de McCarey e o que mais lhe deu prazer de filmar. Uma pequena obra-prima.
TARDE DEMAIS PARA ESQUECER (An Affair to Remember)
A intenção de McCarey quando fez esse remake foi apresentar para as novas audiências uma das mais belas estórias de amor que o cinema já produziu. O filme se pretende uma versão melhorada do original. TARDE DEMAIS PARA ESQUECER (foto) começa muito bem, com a bela canção-tema e o título do filme em cor de rosa, com a fotografia em cinemascope e technicolor. Pra mim, a grande vantagem desse filme em relação ao original é a presença de Cary Grant, que eu considero um dos melhores atores de sua época. Já McCarey, na entrevista, disse que gostava mais da performance de Charles Boyer no filme original. A desvantagem de ver esse filme imediatamente após o outro é que perde-se o fator surpresa, já que poucas coisas foram realmente mudadas. Por outro lado, podemos ver pequenos detalhes adicionados com inteligência pelo diretor. A cena em que os dois vão até a casa da avó do protagonista ganhou e muito na versão em cores, já que o lugar, cheio de flores, fica com uma aura mágica ainda maior. O que eu não gostei foi de uma cena de música do final que poderia ser retirada tranqüilamente. No mais, é um belo filme e que merece a fama que recebeu. Depois, ainda fizeram um outro remake nos anos 90, LOVE AFFAIR - SEGREDOS DO CORAÇÃO, com Warren Beatty e Annette Bening nos papéis principais. Dizem que é bem fraca essa nova versão.
sexta-feira, outubro 13, 2006
AS TORRES GÊMEAS (World Trade Center)
Essa semana de folga está me permitindo me atualizar com os filmes em cartaz nos cinemas. Depois de algumas tentativas, consegui ver ontem AS TORRES GÊMEAS (2006), de Oliver Stone. É um belo complemento para VÔO UNITED 93, de Paul Greengrass, embora não seja tão bom quanto. A chave que Stone escolheu é bem diferente, mais tradicional e mais próxima do melodrama. Eu, como fã do gênero, não vejo isso como um problema. E nem acho que Stone pesou a mão e fez um filme muito choroso. Aliás, pode até ter feito, mas não há porque lhe tirar a razão, já que o que aconteceu naquele 11 de setembro foi uma tragédia sem igual na história dos Estados Unidos. Não há nada de errado em chorar. É importante prantear pelos mortos para levar a vida adiante sem o coração pesado.
No entanto, AS TORRES GÊMEAS é um filme sobre sobreviventes, não sobre os mortos. Não deixa de ser interessante ver um filme em que os dois heróis da história não conseguem fazer nenhum ato verdadeiramente heróico e passam praticamente o filme inteiro presos nos destroços dos prédios do World Trade Center. Esses heróis são os policiais John McLoughlin e Will Jimeno, interpretados respectivamente por Nicolas Cage e Michael Peña. Há também um enfoque nas esposas desses policiais, interpretadas por Maria Bello e Maggie Gyllenhaal. As duas atrizes se sairam bem melhor no filme que os protagonistas. Michael Peña, aliás, não é um bom ator - como foi possível conferir em CRASH. A cena em que Nicolas Cage pergunta quem vai com ele resgatar algumas pessoas presas nos andares de cima e ele diz "I go, sarge", ficou parecendo teatro amador. Já Maggie Gyllenhaal é uma beleza. É uma das atrizes da atualidade que eu mais gosto, tanto pelo seu rosto, belo, estranho e expressivo, quanto por sua competência nos mais diferentes filmes em que atua. A cena em que ela fica sabendo que o marido está vivo é uma das mais emocionantes do filme. Maggie passa uma alegria e uma emoção comoventes.
Interessante o fato de Oliver Stone dirigir um filme que evita mensagens polêmicas ou políticas. O único momento mais ou menos polêmico é quando o fuzileiro que sai de sua cidade para ajudar os sobreviventes diz que quem fez isso vai ter que pagar pelo que fez, ou algo do tipo. Aliás, muito interessante esse personagem do fuzileiro (Michael Shannon), que foi realmente inspirado numa pessoa de verdade, por incrível que pareça.
Ainda que o filme não seja uma obra-prima, acredito que Oliver Stone atingiu o seu objetivo de fazer uma homenagem à coragem e ao senso de fraternidade dos americanos (ou da humanidade em geral), em momentos de dificuldade. Falando de filmes sobre desastres, estou ansioso para conferir o documentário que Spike Lee dirigiu sobre o furacão Katrina. Chama-se WHEN THE LEVEES BROKE: A REQUIEM IN FOUR ACTS (2006). Parece que, ao contrário de Stone, Spike Lee procura os verdadeiros culpados pela morte de milhares de pessoas pobres que não puderam sair a tempo de Nova Orleans. Uma vergonha para a nação mais rica do mundo.
quinta-feira, outubro 12, 2006
MUITO GELO E DOIS DEDOS D'ÁGUA
Lembram daquele episódio de SEINFELD em que a Elaine diz para o George: vocês, homens, gostam de qualquer porcaria que apresente uma mulher tirando a blusa. E o George diz: "so, what's the point?". Pois é. Talvez a presença deslumbrante de Paloma Duarte em MUITO GELO E DOIS DEDOS D'ÁGUA (2006) tenha prejudicado meu senso de julgamento. Só assim para entender a razão das tantas críticas negativas que o filme está recebendo. O povo está usando adjetivos como "pavoroso" para o filme, o que eu acho no mínimo um exagero para um filme tão simpático. Na verdade, minha intenção na última terça-feira era ir ver AS TORRES GÊMEAS, mas fui levar a minha mãe ao médico e perdi o horário da sessão. Pra não ficar esperando muito, resolvi encarar esse filme do Daniel Filho.
O trailer até que tinha me agradado, diferente do anterior do diretor, SE EU FOSSE VOCÊ (2006), que eu fiz questão de passar longe. Comparando com os outros filmes de Daniel Filho, esse mais novo trabalho talvez seja o que mais se aproxima de cinema. Temos que lembrar que a experiência do diretor é muito maior na televisão. Desde a década de 60 que Daniel Filho dirige novelas, mini-séries, especiais de tv, seriados, programas humorísticos. Em seu currículo de mais de 50 títulos, menos de dez são de produções para o cinema. Além do mais, MUITO GELO... possui elementos que o afastam um pouco do horário nobre da televisão: cenas de nudez, consumo de maconha e outras drogas, alguns palavrões e falta de respeito com os mais velhos. Se bem que esse último quesito é mostrado bastante nas novelas.
Mas a principal observação que eu quero fazer aqui, se eu não tiver feito ainda, é: como a Paloma Duarte está gostosa, hein! Ela está com uma pele diferente, mais bronzeada e um pouco mais cheinha. Uma delícia. E a câmera de Daniel Filho é muito generosa ao mostrar não apenas a sua beleza física como sua sensualidade explosiva. Como na cena em que ela faz sexo oral com o personagem de Thiago Lacerda, ou quando ela troca de roupa dentro do carro, ou quando ela e Mariana Ximenes tomam banho peladas na praia, ou quando elas fazem strip-tease para Ângelo Paes Leme. (Tenho certeza que depois disso que eu falei, um monte de marmanjos vai querer ver o filme agora.)
A estória, escrita pelo casal Alexandre Machado e Fernanda Young, apresenta duas irmãs (Mariana Ximenes e Paloma Duarte) que seqüestram sua avó (Laura Cardoso) e planejam se vingar da velha, de todas as humilhações que elas sofreram na infância. Elas acabam levando junto um sujeito que não tinha nada a ver com a história (Ângelo Paes Leme). Enquanto isso, Thiago Lacerda, sai à procura da esposa e se mete também em confusões com a polícia.
Pelo que eu entendi, nas críticas negativas ao filme, as pessoas reclamam de falta de consistência na história, que não leva a lugar nenhum. Mas não vejo isso como um problema. Ao contrário, do jeito que ficou, o filme me pareceu bastante anárquico, lembrando aquelas mal comportadas produções brasileiras dos anos 70 e 80 que hoje deixam saudade. Além do mais, um filme que mostra o potencial lisérgico da canção "Nosso Lindo Balão Azul", da Turma do Balão Mágico, não pode ser de todo ruim.
quarta-feira, outubro 11, 2006
A SETE PALMOS - A QUARTA TEMPORADA COMPLETA (Six Feet Under - The Complete Fourth Season)
A quarta temporada de A SETE PALMOS (2004) já começa arrebentando. A terceira temporada tinha terminado com a revelação da morte de Lisa (Lili Taylor), a esposa de Nate (Peter Krause) que havia desaparecido nos episódios finais. O primeiro episódio foca a atenção no impacto que a morte dela causou em Nate e naqueles que estão ao seu redor. Um dos momentos mais memoráveis é aquele em que Nate e David (Michael C. Hall) vão até o necrotério pegar o cadáver de Lisa, que já está num estado difícil de identificar. O final do episódio, com Nate enterrando a esposa no deserto de Mojave, próximo a uma joshua tree, é de arrepiar.
Apesar desse começo tão impactante, até que essa temporada foi um pouco mais tranqüila de emoções do que a anterior. Exceto, claro, com o que acontece com David no episódio "That's My Dog". Esse é um episódio atípico da série. Parece um filme de suspense, desses de dar taquicardia e falta de ar. E isso acaba funcionando mais forte na gente já que o personagem é nosso conhecido de vários anos. Não é um personagem que a gente acabou de conhecer, de poucos minutos. Aliás, esse é um dos grandes trunfos das séries em relação aos filmes. Estabelece-se uma aproximação maior entre o personagem e o espectador. Claro que vai depender também de um bom roteirista, um bom diretor e um bom elenco por trás. Pois bem, no citado episódio, David sofre abusos de um louco a quem ele oferece carona. Se eu não me engano, a meia hora final é dedicada somente ao que acontece com David e o maníaco.
"Parallel Play" é um dos meus favoritos. É o episódio que termina com a família Fisher ao redor de uma fogueira ao som de "Lucky", do Radiohead. Acho esse final sensacional, não só pela bela canção escolhida, mas por significar talvez a morte e o renascimento de uma etapa da vida daquelas pessoas. Pelo menos, é essa a sensação que fica quando o episódio acaba.
Quem ganha maior visibilidade nessa temporada é Federico (Freddy Rodriguez), que começa a trair a esposa (Justina Machado) com uma stripper de boate. Por mais que no começo as coisas sejam boas, as conseqüências serão amargas para o rapaz. Talvez por causa da fragilidade do personagem, é nessa temporada que simpatizei mais com o Rico. Enquanto isso, George (James Cromwell), o novo marido de Ruth (Frances Conroy) vai se mostrando um homem misterioso e difícil de decifrar.
Tem um momento que A SETE PALMOS quase se transforma de vez numa série GLS. É quando Claire (Lauren Ambrose) tem um relacionamento homossexual com uma loirinha linda, lésbica assumida. Não deixa de ser muito excitante ver as duas se beijando. Nessa temporada, Claire tem uma recaída e começa a experimentar todo tipo de droga. Brenda (Rachel Griffith) também tem uma recaída quando trai o namorado com o ex (Nate).
A temporada termina ainda sob a sombra de Lisa, quando uma forte revelação nos pega de surpresa. É nesse último episódio que é mostrado o prólogo mais sangrento da temporada, quando um homem morre partido ao meio por um elevador com defeito. Não achei a temporada tão depressiva quanto a terceira. Nem mesmo tão melancólica quanto, mas não dá pra dizer que houve uma queda de qualidade. A SETE PALMOS talvez seja a única série que se manteve regular e ótima durante toda a sua existência. Mal posso esperar pra começar a ver a quinta e última temporada, que dizem ser a melhor de todas. Como pode, meu Deus?
terça-feira, outubro 10, 2006
VÔO UNITED 93 (United 93)
O dia 11 de setembro ficou marcado na memória da gente. Quase todo mundo se lembra onde estava no momento em que dois aviões colidiram com o World Trade Center. Já aconteceram tragédias piores em outras partes do mundo, mas poucas cenas ficaram tão fortes em nossa mente. Talvez isso aconteça porque nos acostumamos com os Estados Unidos de tal forma que é como se o país fosse quase um lar. É de lá que vem a maioria dos filmes que a gente assiste, é de lá que boa parte da melhor música do mundo é produzida. Por mais que acusem os americanos de serem porcos imperialistas que exploram os países pobres - e isso não deixa de ser verdade -, lá moram pessoas como a gente, que só querem viver as suas vidas em paz, que valorizam suas famílias, tanto que precisam dizer no último momento de suas vidas o quanto amam seus familiares. Quem me vê falando assim até fica com a impressão de que VÔO UNITED 93 (2006) é desses filmes pra se levar lenços. Não é. A tensão é tão grande, que nem dá tempo de chorar. E o curioso é que, por mais que a gente saiba do destino final daqueles passageiros, a gente torce pra que eles consigam tomar o avião dos terroristas e salvar suas vidas.
Paul Greengrass, com seu estilo semidocumental de filmar com câmera na mão, fez o seu melhor trabalho. Também pudera, com um material desses e com o seu talento, não tinha como não sair um grande filme. O primeiro acerto de Greengrass foi fazer um primeiro ato focado no que acontecia paralelamente no dia do maior atentado que os americanos já sofreram. Na cabine dos controladores de vôo era uma confusão dos diabos, com notícias de que vários aviões haviam sido seqüestrados. Quando os terroristas do vôo 93 se apresentaram para os passageiros, um deles com uma possível bomba atada ao corpo, as Torres Gêmeas já haviam sido alvejadas e já havia ocorrido aquela misteriosa explosão no prédio do Pentágono. Sobre o Pentágono, alguns sites até comentam que os americanos desapareceram com um boeing inteiro. Não me aprofundei no assunto, mas fica claro que tem algo estranho por aí.
VÔO UNITED 93 é um dos filmes mais nervosos que eu já vi. Talvez o mais nervoso. Isso porque, além do assunto quente, o estilo de filmagem e montagem contribui para que o espectador fique com os nervos à flor da pele. Basta se colocar no lugar das pessoas que estavam naquele avião para entender o que aquilo pode ter significado. E outro ponto a favor é que em momento algum Greengrass mostrou os terroristas como vilões, mas como seres humanos com suas crenças e pontos de vista. No entanto, torna-se difícil tomar partido de suas ações. E o mais incrível é saber que aquilo tudo foi real, aconteceu de verdade. Comparado com isso, podem fazer filmes com serpentes, leões ou até elefantes a bordo que o impacto nunca vai se equiparar ao desse filme. Os minutos finais são de deixar o espectador sem fôlego. Só podemos respirar novamente quando a tela fica preta e vemos aquelas frases explicativas características de filmes baseados em fatos reais e um sentimento de frustração nos envolve.
Nas locadoras, está chegando um filme com o título VÔO 93, que deve enganar muita gente que acredita se tratar do filme de Paul Greengrass. Trata-se de uma produção para a tv (A&E Mundo), que também deve ser interessante, mas duvido que seja tão bom quanto esse.
segunda-feira, outubro 09, 2006
MENINA MÁ.COM (Hard Candy)
Estréia de David Slade na direção de longas-metragens, MENINA MÁ.COM (2005) é um suspense intimista: trabalha com planos fechados, muitos closes, poucos personagens e poucas locações. Muito da força do filme está nas interpretações de Ellen Page e Patrick Wilson. O filme começa com um chat. Um homem mais velho marca encontro com uma adolescente de 14 anos, depois de vários contatos anteriores. Durante o encontro, a menina se mostra bastante desinibida e até se oferece para ir à casa do sujeito, que trabalha como fotógrafo de modelos. Não dá pra contar mais nada sob o risco de estragar a trama pra quem ainda não viu o filme.
Mesmo assim, quem quer que tenha lido algum texto sobre o filme, já deve ter alguma idéia do que se trata. Quem odeia filmes de tortura, como O ALBERGUE, JOGOS MORTAIS ou WOLF CREEK, deve passar longe desse MENINA MÁ.COM. Não que o filme tenha cenas gore. Ao contrário, o forte do filme é a carga emocional, de tensão. Não há sangue. E suspeito que o filme deve perturbar mais os homens do que mulheres.
Pode-se até elogiar o filme por saber trabalhar com tensão e suspense utilizando poucos recursos, mas me pareceu covardia mexer com algo tão delicado quanto a virilidade do homem. Além do mais, o filme tem um moralismo meio doentio, já que a menina é uma espécie de anjo vingador. No entanto, em nenhum momento, eu tomei partido dela. Por mais que o sujeito tenha tido um passado negro, o filme o mostra como a vítima. Logo, eu estava torcendo pra que ele escapasse.
Ellen Page é a gracinha que fez a Kitty Pride em X-MEN: O CONFRONTO FINAL. Mas depois desse filme muita gente vai pensar duas vezes antes de levá-la para o seu apartamento. Já o diretor David Slade atualmente está filmando uma adaptação da graphic novel de vampiros 30 DIAS DE NOITE, de Steve Niles.
domingo, outubro 08, 2006
DÁLIA NEGRA (The Black Dhalia)
Ainda bem que eu havia assistido À BEIRA DO ABISMO, do Hawks, poucos dias antes de ver DÁLIA NEGRA (2006). O mais novo filme de Brian De Palma bebe bastante na fonte desse clássico do cinema noir, principalmente no quesito estória complicada. Eu diria que, assim como acontece com o filme de Hawks, a trama de DÁLIA NEGRA não tem mesmo muito sentido. Ou então tem uma lógica interna meio bizarra. Assim como OLHOS DE SERPENTE (1998) e SÍNDROME DE CAIM (1992), o filme pertence a essa leva de obras depalmianas que necessitam de revisão para melhor assimilação. Conseqüentemente, é um filme que deve ser mais respeitado com o passar dos anos. Isso costuma acontecer com freqüência com De Palma. A crítica desce o cacete no filme e depois de algum tempo fala que é obra-prima.
DÁLIA NEGRA não está entre os meus dez De Palmas favoritos, mas é com certeza mais um de seus grandes trabalhos e a prova de que sua maestria continua intacta. Algumas coisas, porém, me incomodaram. A começar pela presença de Hilary Swank como uma femme fatale. Nem com muita maquiagem isso é possível. E outra coisa ainda pior é nos fazer acreditar que ela é uma sósia da Mia Kirshner, que interpreta a Dália do título, a moça que é brutalmente asassinada. Inclusive, essa história é baseada num caso real, quando nos anos 40, uma aspirante a atriz foi assassinada e uma investigação revelou que havia uma conspiração na própria polícia de Los Angeles. Se na vida real, o crime não foi solucionado, no filme tudo parece ainda mais confuso.
A obsessão pelo duplo, presente em praticamente todos os filmes de Brian De Palma, aparece explicitamente tanto na parceria dos dois amigos policiais (Josh Hartnett e Aaron Heckart), quanto nas já citadas atrizes (Hilary Swank e Mia Kirshner). O jogo de espelhos também aparece, mas em menor grau. A citação a filmes de Hitchcock já começa pelo próprio nome "Madeleine", a personagem de Hilary Swank - não acho que isso seja coincidência. Porém, não se trata aqui de um filme cheio de auto-referências, como o anterior FEMME FATALE (2002). DÁLIA NEGRA até poderia ser dirigido por outro cineasta, já que foi baseado num romance policial de James Ellroy. Claro que um outro diretor faria um filme completamente diferente. E para maravilhamento dos fãs, o talento de De Palma para realizar grandes seqüências rende momentos impressionantes. Como na cena em que o corpo de Dália é encontrado na estrada. Aquela cena é uma festa para os olhos.
Ainda não falei de Scarlett Johansson. Bom, pra começo de conversa, ela não está tão bela quanto poderia estar. Não gosto daquele corte de cabelo da década de 40, prefiro os cabelos curtinhos dos anos 20 ou o jeitão mais desleixado dos anos 70. Mas tenho certeza que outra atriz poderia ficar bonita com o mesmo visual de Scarlett. Além do mais, ela não está tão expressiva. E também não sei porque cargas d'água De Palma foi escalar a Hilary Swank, pelo amor de Deus. Ao menos, os dois marmanjos - Josh Hartnett e Aaron Eckhart - estão bem no filme. Hartnett não é um grande ator, mas tem presença de cena e combina com o estilo do filme. Já Eckhart, é um grande intérprete, como pode-se notar recentemente em OBRIGADO POR FUMAR. A violenta luta de boxe dos dois no começo do filme é um dos pontos altos. Ainda no que se refere ao elenco, impressionante a personagem de Fiona Shaw, que está assustadora. Parecendo até que acabou de sair de um pesadelo de David Lynch.
De Palma aproveita a maior liberdade que se tem hoje (em comparação com os anos 40 ou 50) para apimentar mais o seu filme com sexo e violência gráfica. Um dos momentos memoráveis do filme é quando Josh Hartnett adentra um bar de lésbicas e De Palma usa uma grua para mostrar k.d.lang interpretando "Love for Sale", de Cole Porter, e um monte de dançarinas seminuas dançando e beijando-se na boca. Lindamente bizarro. Por outro lado, De Palma prefere mostrar o triângulo amoroso Hartnett-Johansson-Eckart de forma bastante sutil. Ou então, a intenção do cineasta era fornecer algo mais que pudesse ser escondido, já que DÁLIA NEGRA é basicamente sobre coisas ocultas.
sexta-feira, outubro 06, 2006
GHOST WORLD - APRENDENDO A VIVER / MUNDO CÃO (Ghost World)
Já assisti DÁLIA NEGRA, mas ainda estou em processo de digestão e prefiro falar agora de um filme mais leve e despretensioso. Se bem que nem tão despretensioso assim, já que estamos falando de pessoas que sentem dificuldade de se relacionar normalmente com a sociedade, de pessoas outsiders - o termo "marginais" fica muito pesado. GHOST WORLD (2001) tem em comum com o citado filme de Brian De Palma a presença de Scarlett Johansson, que cinco anos atrás ainda parecia uma adolescente.
Não conheço a obra em quadrinhos de Daniel Clowes, mas a julgar pelos poucos desenhos que vi, e comparando principalmente com a personagem Enid, interpretada no filme por Thora Birch, ao que parece Terry Zwigoff fez uma adaptação brilhante. Antes de GHOST WORLD, Zwigoff havia realizado CRUMB (1994), um documentário sobre a vida e a obra do mestre dos quadrinhos Robert Crumb. E pra não deixar nenhuma dúvida de que ele é um grande fã de quadrinhos, o novo filme do diretor é ART SCHOOL CONFIDENTIAL (2006), novamente baseado numa história de Daniel Clowes.
Eu diria que é impossível assistir GHOST WORLD e não gostar de Enid, a garota sem turma que tem como melhor amiga Rebecca (Scarlett Johansson). As duas acabaram de terminar o segundo grau e não tem o menor interesse em ingressar na faculdade. Na verdade, elas ainda não sabem o que querem da vida. Na falta do que fazer, elas prestam atenção em algumas pessoas que encontram na lanchonete e começam a seguir essas pessoas. É quando elas conhecem Seymour (Steve Buscemi, em seu papel mais simpático), um sujeito que também tem dificuldade de se socializar e vive em seu mundinho de colecionador de discos raros. Em certo momento, Seymour fala para Enid: "eu não consigo me relacionar com 99% da humanidade." Enid começa a achar interessante o jeitão diferente de Seymour e os dois começam uma interessante amizade.
O barato do filme é que ele vai ficando meio depressivo quando se aproxima do final, tendo inclusive, uma música mais triste que acentua a solidão dos personagens. E é justamente quando eu estou começando a curtir pra valer o filme que ele acaba. Mas as quase duas horas de filme são suficientes para que simpatizemos bastante com Enid e Seymour, esses dois amáveis seres criados pela mente de Daniel Clowes. Thora Birch pode não ser bonita, mas ela incorpora a personagem estilosa e cínica tão bem que não conseguimos imaginar outra atriz para o papel. Steve Buscemi também ficou perfeito como o sujeito que tem uma relação de amor e ódio consigo mesmo. Outro momento memorável é quando Enid diz pra Seymour que ele precisa encontrar mulheres que compartilham com os mesmo interesses dele. E ele diz que não sabe se quer encontrar tal pessoa, já que ele odeia os seus próprios interesses. Muito legal isso.
Tem outra cena do filme muito boa. Enid está numa locadora quando aparece um sujeito e pergunta ao balconista: "você tem o filme 8 E 1/2?". O atendente responde: "É um lançamento recente?" "Não, é um clássico". "Então deixa eu ver no computador. Ah, achei. Aqui está: 9 E 1/2 SEMANAS DE AMOR. Na sessão de dramas eróticos." Pior que isso é bem comum mesmo em locadora. Impressionante como tem gente que não sabe absolutamente nada de cinema trabalhando nesses lugares. Dia desses perguntei se tinha O TERROR DAS MULHERES e a moça fez cara de quem nunca tinha ouvido falar no filme. E da vez que eu perguntei sobre O PROFESSOR ALOPRADO (o do Jerry Lewis), a moça perguntou: "o 1 ou o 2"?
P.S.: Ontem eu galguei mais um degrau na escada da fama. :>) Dei uma pequena entrevista para uma rede de televisão local (TV Assembléia) que estava fazendo uma reportagem sobre blogs. Acho que não me saí muito bem - não estou acostumado com um microfone e uma câmera na minha frente - e tenho minhas dúvidas se eu vou conseguir ver o programa algum dia. Se não tiver sido exibido hoje, deve rolar na próxima semana no jornal das sete da noite.
quinta-feira, outubro 05, 2006
PAULINE NA PRAIA (Pauline à la Plage)
Uma das melhores surpresas da semana passada foi um envelope que eu recebi enviado pelo sumido ex-blogueiro Hugo Leonardo com quatro filmes em divx. Fiquei logo feliz quando vi que PAULINE NA PRAIA (1983), de Eric Rohmer, estava incluso no pacote. Maravilha. Eu adoro os filmes do Rohmer. Depois de Truffaut, talvez seja o cineasta francês que eu mais aprecio.
PAULINE NA PRAIA é o terceiro filme da série "Comédias e Provérbios" que Rohmer dirigiu na década de 80. Dos filmes do diretor, é o mais sensual entre os sete que eu vi, com direito até a cenas de nudez. Na trama, Marion (Arielle Dombasle, que também esteve em UM CASAMENTO PERFEITO) é uma loira gostosona - ela de biquini é um espetáculo! - que aprecia jogos de sedução. Ela está se divorciando do marido e passa as férias na praia com a prima Pauline (Amanda Langlet, que apareceria em CONTO DE VERÃO, 1996). Pauline só tem quinze anos, pouca experiência de vida, mas muita vontade de ter suas aventuras amorosas. Mal chegam na casa de praia, ela já confessa para a prima que está louca pra fazer novas amizades e conhecer alguns rapazes. Quando as duas vão à praia, elas vêem Pierre, um velho amigo de Marion. E com Pierre, Henri, que despertará o interesse de Marion. Contar mais do que isso é estragar as surpresas do filme, mas já posso adiantar que Pauline também conhecerá um rapaz na praia e que uma série de mal entendidos ocorrerá.
Dos filmes de Rohmer que vi, PAULINE NA PRAIA é mais parecido com CONTO DE VERÃO. Tanto pela locação numa região ensolarada, quanto pela opção por personagens jovens. Se bem que esse segundo aspecto é quase uma constante nos filmes do diretor das décadas de 80 e 90. Quem aprecia Rohmer deve apreciar também as muitas conversas que rolam entre os personagens, muitas vezes de cunho filosófico. Como no caso desse filme, o papo diz respeito a relacionamentos amorosos, o filme não me cansou em momento algum. Ao lado de CONTO DE INVERNO (1992), PAULINE NA PRAIA talvez seja o Rohmer que mais me envolveu. Algumas situações são de causar gargalhadas. O filme é uma obra-prima e se eu fizesse hoje o ranking de filmes dos anos 80, com certeza ele entraria no top 20.
Os filmes do ciclo "Comédias e Provérbios" são: A MULHER DO AVIADOR (1981), UM CASAMENTO PERFEITO (1982), PAULINE NA PRAIA, NOITES DE LUA CHEIA (1984), O RAIO VERDE (1986) e O AMIGO DE MINHA AMIGA (1987). Já estou doido pra ver os outros. Agradecimentos especiais ao Hugo.
quarta-feira, outubro 04, 2006
TREVAS (Tenebre / Tenebrae / Tenebræ)
Tem uma história interessante por trás de TENEBRE (1982). Não sei se é verdade ou se é lenda. Conta-se que Dario Argento estava nos Estados Unidos quando recebeu uma ligação de um sujeito que disse ter adorado SUSPIRIA (1977) e que queria se encontrar pessoalmente com o diretor. Argento recusou o encontro. Depois, o sujeito ligou de novo, dessa vez, o ameaçando de morte. Parece que mesmo depois que Argento foi até a polícia, o sujeito ainda ligou mais algumas vezes. Desse incidente, nasceu TENEBRE, o retorno de Argento aos giallos, depois de duas bem sucedidas incursões pelos filmes de bruxaria - SUSPIRIA e A MANSÃO DO INFERNO (1980).
Na trama de TENEBRE, Anthony Franciosa é um escritor de romances de mistério que está em Roma para promover o seu mais novo best-seller. Assim que ele chega lá, começa a acontecer uma série de assassinatos semelhantes aos mostrados em seu livro. Inclusive, durante o primeiro assassinato, o maníaco enche a boca de sua vítima com páginas do livro do autor.
TENEBRE é um dos filmes mais violentos de Argento e conta com algumas seqüências antológicas. O melhor exemplo dessa violência gráfica é a cena em que o assassino decepa o braço de uma de suas vítimas e o sangue esguicha feito tinta sobre a parede. Mas a minha seqüência favorita é aquela em que uma jovem é perseguida por um dobermann. Talvez por se aproximar do clima surreal dos dois filmes anteriores de Argento. O curioso é que, para se livrar do cão, que pula incansavelmente cercas para pegá-la, a moça, ironicamente, esconde-se na casa do serial killer. Melhor seria se ela encarasse o cachorro mesmo, hein. Outra seqüência memorável é a do segundo ataque do maníaco, na casa do casal de lésbicas. Nessa cena, há um belo travelling, que poderia ser o ponto de vista do assassino. Ou do próprio diretor.
Se em PRELÚDIO PARA MATAR (1975), Argento já havia passado um prazer quase sádico nas cenas de assassinatos, dessa vez, ele problematiza essa situação quase contraditória que envolve horror e prazer. Não é um filme perfeito - algumas mortes e efeitos especiais não são convincentes e o desfecho da trama chega a ser engraçado -, mas é uma delícia de se ver. Argento mostra poucos momentos de conversa e investigação do crime - Giuliano Gemma é um policial no filme -, preferindo dar ênfase às cenas de assassinato.
TREVAS foi o título que o filme recebeu quando passou num canal por assinatura.
P.S.: Para os fãs de LOST, hoje é um grande dia. É a estréia nos Estados Unidos da terceira temporada da série. Na madrugada de hoje, já vai ser possível fazer o download desse episódio e amanhã mesmo o pessoal do Lost Brasil deve providenciar as legendas em português. Maravilha!
terça-feira, outubro 03, 2006
ELEIÇÃO - O SUBMUNDO DO PODER (Hak Se Hui / Election)
Quando assisti BREAKING NEWS - UMA CIDADE EM ALERTA (2004), fiquei imaginando o impacto que deveria ser ver no cinema aquele plano-seqüência inicial. Foi o primeiro filme de Johnny To que eu vi e deu pra notar nele um exemplo de mais um cineasta virtuosista vindo do oriente. Aos poucos, To está ganhando fama, com participações em importantes festivais de cinema. Não demorou para que um de seus filmes recentes fosse lançado em circuito comercial. O que decepciona um pouco aqui é que ELEIÇÃO - O SUBMUNDO DO PODER (2005) pouco conta com o virtuosismo do diretor. Há muita câmera parada, muita conversa em lugares escuros e muita (da minha parte) confusão em entender trama tão intrincada. Suspeito que eu sou demasiado ingênuo para entender filmes políticos e que trazem personagens que não demonstram de fato de que lado estão.
Na trama, vemos a organização criminosa Wo Shing promovendo uma eleição para o novo líder do grupo. Há dois candidatos que disputam a eleição: o calmo e sereno Lok (Simon Yam, que esteve no citado BREAKING NEWS e em VINGANÇA, thriller estrelado pelo Van Damme) e o semi-psicopata e agressivo Big D (Tony Leung Ka Fai, de DUMPLINGS). De cara, é mais fácil simpatizar com Lok, já que Big D parece uma versão ainda mais insana de um gângster saído de um filme de Martin Scorsese. Pra se ter uma idéia da perversidade do sujeito, para conseguir o bastão de líder, ele coloca dois capangas de Lok dentro de caixas de madeira e faz com que eles rolem montanha abaixo. Não apenas uma única vez, mais seguidas vezes, até que os corpos desses homens fiquem totalmente arrebentados e feridos. Um detalhe interessante é que, em ELEIÇÃO, os criminosos não usam armas de fogo, usam facas, paus, pedras ou os próprios punhos. A própria polícia, em vez de prender os bandidos, o faz, mas com a intenção de fazer com que os candidatos inimigos cheguem a um acordo para que, assim, haja menos violência nas ruas.
Vendo esse filme, em alguns momentos eu me senti como um menino entendiado que fica feliz quando aparece uma briga na rua. A violência que expulsou algumas pessoas da sala de projeção daquela manhã de sábado me ajuda a acordar, intoxica o meu corpo, me faz sentir vivo. Como To fez um filme com muita conversa, isso funcionou como estratégia para facilitar o ingresso nos festivais internacionais, que por mais diversificados que sejam ainda são bem preconceituosos com filmes de gênero. Porém, os melhores momentos do filme surgem nas cenas de ação, especialmente a última, que me pegou de surpresa e fechou com chave de ouro o filme.
O que me deixou de orelha em pé com o filme foi a ambigüidade. A música no pianinho que toca no momento em que os dois inimigos se unem, o que é aquilo? É como se estivéssemos vendo um melodrama interpretado por sujeitos íntegros e bonzinhos que fazem as pazes e não assassinos de sangue frio que lidam com drogas pesadas. A cena que mostra o código de honra da organização, que tem raízes na Dinastia Ming, também me confundiu. É como se toda aquela violência fosse justificada e a organização fosse quase sagrada. Tem senso de humor que eu custo a entender.
P.S.: Para a coluna dessa quinzena no CCR, graças à falta de idéias, tomei a liberdade de usar de picaretagem, reciclando as listas de melhores das décadas. Pra quem é leitor do blog, não tem nada de novidade, mas ainda assim, quem quiser conferir será bem vindo.
segunda-feira, outubro 02, 2006
MALDIÇÃO (An American Haunting)
Mais um filme de terror entra em cartaz nos cinemas brasileiros, através da distribuidora independente California Filmes. MALDIÇÃO (2005) pode não ser tão bom quanto ABISMO DO MEDO, mas ainda assim vale a ida ao cinema para recebermos mais uma boa dose de sustos semanais. O filme, dirigido por Courtney Solomon, do pouco apreciado DUNGEONS & DRAGONS (2000), é inspirado numa história real, a famosa lenda da bruxa dos Bell. Mais de vinte livros foram escritos sobre o caso, conhecido como o único da história americana em que um espírito matou uma pessoa.
Na trama de MALDIÇÃO, que se passa em Red River, Tenessee, no início do século XIX, uma família é atormentada por um espírito ou entidade. Donald Sutherland (ótimo, como sempre) é um pai de família e negociante cuja filha mais nova está sendo atacada por uma entidade sobrenatural. Ele acredita que a maldição que aflige sua família está acontecendo por obra de uma mulher que muitos afirmam ser uma bruxa. No começo do filme, essa mulher o ameaça. Além de Sutherland, outro destaque do filme é a jovem Rachel Hurd Wood, no papel de Betsy Bell, a filha.
O filme tem o mérito de modernizar com sucesso o filme de horror gótico, subgênero que estava um pouco fora de moda. Solomon utiliza câmera subjetiva do ponto de vista do espírito, recurso utilizado por Sam Raimi em seu A MORTE DO DEMÔNIO. Não é algo novo, mas é muito bem utilizado no filme. Uma das seqüências mais memoráveis é aquela em que o espírito sai à procura de Betsy e não a encontra em casa.
O roteiro foi escrito a quatro mãos pelo diretor Solomon e por Brent Monahan, autor do livro "The Bell Witch: An American Haunting". Como o autor do livro é um especilista no caso, o filme ganha mais credibilidade. O único porém é a grande quantidade de perguntas que ficam no ar ao final da sessão. Mas para algumas delas, pesquisando pela internet, eu até já encontrei respostas. Algumas dessas respostas são um tanto quanto difíceis de engolir, mas isso faz parte do charme do filme.
P.S.: Está no ar mais uma revista virtual: a ZINGU, dirigida pelo jovem Matheus Trunk e que conta com colaboradores de peso. A intenção é que a atualização seja mensal. Um mês é tempo mais do que suficiente pra que a gente aproveite o conteúdo da revista.
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