quarta-feira, novembro 28, 2007

MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (Coeurs / Cœurs)



Decepções amorosas, seguidas de novas esperanças, seguidas de novas decepções fazem parte da vida. E mesmo assim, é comum nos apegarmos à esperança de um novo amor. E quando isso acontece pensamos: agora vai! Só que nem sempre o resultado é positivo. E essa série de frustrações vai se acumulando e fazendo com que as pessoas se tornem com freqüência amargas, retraídas ou preferindo se isolar do mundo exterior. Esse filme de Alain Resnais trata dessas pessoas. Eu poderia fazer uma comparação - um pouco ruim, já adianto -, dizendo que MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (2006) seria um negativo de SIMPLESMENTE AMOR, aquela comédia romântica onde quase todo mundo termina feliz e que serve para aquecer um pouco os nosso corações, muitas vezes carentes de afeto na época natalina, que coincide com o inverno no hemisfério norte - o que deve piorar ainda mais o sentimento de solidão nessa época do ano. O filme de Alain Resnais, ao contrário de SIMPLESMENTE AMOR, é frio como a neve que cai constantemente no inverno parisiense. E diferente do filme americano, a obra de Resnais contém bem menos personagens principais (apenas seis). Talvez se fossem mais, Resnais não teria conseguido dar a profundidade necessária para o sucesso de seu trabalho. Se bem que eu falo sucesso, mas por mais que eu respeite o seu trabalho, em momento algum eu me senti na pele ou sensibilizado de verdade com os problemas e as dores desses seis personagens.

Aviso, desde já, que sou um leigo na obra de Alain Resnais. O único filme do diretor que eu vi foi o essencial HIROSHIMA, MEU AMOR (1959), mas já faz muito tempo, e eu não tinha maturidade suficiente para assistí-lo. Portanto, não tenho familiaridade com o seu universo e não sei o quanto de seu estilo ou de seus traços autorais se apresentam nesse novo filme, adaptado da peça “Private Fears in Public Places”, do inglês Alan Ackynbourn. Talvez a minha tendência a não gostar muito de adaptações de peças teatrais para o cinema tenha contribuído um pouco para o fato de eu não ter me juntado ao grupo dos adoradores do filme.

Em MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS, como já disse, temos seis personagens, todos eles, almas solitárias, em busca de afeto, ou ao menos de companhia. Logo no início, conhecemos um senhor idoso e corretor de imóveis, mostrando um apartamento para uma jovem mulher. Ele mora sozinho com a irmã mais nova, também solitária, e que finge que sai com as amigas, quando na verdade vai até um barzinho com uma rosa na lapela, sozinha, à procura de alguém, um encontro às cegas (blind date), que dificilmente funciona. Quanto à mulher que procurava o apartamento, ela está tendo problemas com o seu atual companheiro, um sujeito que está desempregado e que passa os dias dormindo ou bebendo. Completando o mosaico, temos a secretária do agente imobiliário, que por trás de sua fachada de beata (ou evangélica), se esconde uma mulher que gosta de se fantasiar de stripper e de gravar suas performances em fita. Tem também um senhor que trabalha como barman num hotel e que cuida do pai, moribundo.

Claro que em se tratando de um diretor como Resnais, o filme não é apenas enredo, estória. Há os detalhes na construção dos ambientes, nos discretos movimentos de câmera e na maneira como ele nos mostra o quanto o mundo pode ser frio, mesmo no aconchego de um apartamento com aquecedor de ambiente, em especial na cena do diálogo entre o barman e a secretária, com a neve caindo em cima deles como se eles estivessem do lado de fora.

terça-feira, novembro 27, 2007

HONKYTONK MAN



E finalmente consegui ver HONKYTONK MAN (1982), tão famoso entre os cinéfilos mais antenados, dentro da filmografia de Clint Eastwood. E uma coisa que eu mais notei foi a semelhança desse filme com o meu favorito do diretor, UM MUNDO PERFEITO (1993). Ambos mostram crianças aprendendo a lidar com a vida, seguindo os passos de um homem rebelde, um sujeito um pouco avesso às convenções sociais. Não que o cantor de música country interpretado pelo próprio Clint Eastwood seja um crimonoso como o protagonista do filme de 93, mas alguém um pouco mais moralista obviamente não o consideraria um modelo ideal de figura paterna para a formação de uma criança. Roubar galinhas, beber muito e resistir a um tratamento médico de tuberculose crônica não é bem um exemplo a se seguir, alguns diriam. Mesmo assim, o sobrinho do honkytonk man Red Stoval, interpretado por um dos filhos de Clint, Kyle Eastwood, tem um respeito e uma fascinação por esse homem que se recusa a seguir às tradições e a permanecer em seu lugar de origem, como os seus pais, para alcançar o sonho de vencer o Gran’Ole Opry, um concurso de música country de Nashville. O garoto também não quer passar o resto da vida recolhendo algodão numa fazenda empoeirada e decadente em Oklahoma e vê a chance de seguir o tio como uma oportunidade de ouro. A estória se passa nos anos 30, durante a Grande Depressão e isso acentua o clima de melancolia que perpassa toda a obra.

O gosto do diretor por personagens rebeldes e uma mórbida atração pela tragédia humana está presente de maneira forte em HONKYTONK MAN, tornando o filme, talvez, o mais arquetípico e sintetizador de toda sua obra. Além do exemplo do supracitado UM MUNDO PERFEITO, lembremos também dos velhos astronautas de COWBOYS DO ESPAÇO (2000) e dos militares japoneses do recente CARTAS DE IWO JIMA (2006). Se a vida é curta, principalmente para quem está com os pulmões corroídos pela tuberculose e mal consegue cantar uma canção inteira sem tossir sangue, ela é para ser aproveitada ao máximo. Vendo a cena de Clint se esforçando para cantar e deixar o seu legado em disco, não pude deixar de me lembrar de Renato Russo gravando o seu disco testamento, "A Tempestade", também em condições físicas e emocionais extremamente delicadas.

Quanto à comparação com o cinema de John Ford, HONKYTONK MAN estaria mais próximo dos filmes que Ford fez sobre a Grande Depressão, no início dos anos 40, como VINHAS DA IRA, COMO ERA VERDE O MEU VALE e CAMINHO ÁSPERO. Mas uma coisa que não pode deixar de ser mencionada em relação a HONKYTONK MAN é a música e o seu poder de - assim como o cinema, a literatura e as artes em geral - de representar o espírito da época e de eternizar os sentimentos e pensamentos de quem compõe ou canta. No caso da música do filme, em particular, ela fala de amores perdidos, ou deixa nas entrelinhas, pelo menos, depois que ficamos sabendo, ainda que de maneira superficial, da mulher que Red Stovall amou no passado, na cena em que seu sobrinho lhe pergunta se ele um dia já foi casado. E por mais que essa melancolia esteja presente em praticamente o filme inteiro, até mesmo nas seqüências que se pretendem cômicas, como no roubar galinhas ou em ser perseguido por um touro, o filme mal nos dá tempo para chorar. E esse é o jeito rústico e fordiano de ser de Clint Eastwood em toda a sua glória.

segunda-feira, novembro 26, 2007

O PASSADO (El Pasado)



Os últimos dias estão sendo difíceis em todas as áreas da minha vida. Aliás, o ano de 2007 está, como bem disse o Marcelo V. em alguma caixa de comentário da blogosfera, muito "estranho", pra não usar um adjetivo negativo. Quero sempre acreditar que tudo que acontece com a gente, por mais doloroso que seja, seja um mal necessário para um final feliz. E por falar em dor, o que é que dói mais do que o amor, que já até compararam com dor de dente? E quantas vezes eu mesmo não quis fugir desse sentimento, embora nos dias atuais ande querendo entrar de cabeça nesse "negócio"? Acho que porque percebi que no fim das contas o amor e os relacionamentos acabam sendo muito mais importantes em nossa memória do que qualquer outra coisa, além de ser também fundamental para o nosso bem estar físico e espiritual.

O PASSADO (2007) mostra as conseqüências do fim de um casamento na vida de Rímini (Gael García Bernal), um jovem tradutor. Depois de 12 anos casado com Sofia (Analía Couceyro), sua primeira namorada, eles terminam o relacionamento. A separação é tranqüila, pelo menos até onde é mostrado no filme, mas Sofia insiste em manter contato com o ex-marido, principalmente quando ele começa um relacionamento com uma modelo fotográfica um tanto quanto possessiva e mais adiante com outra mulher. Ele faz de tudo para evitá-la, mas ela sempre aparece para perturbá-lo, como um fantasma. Para Rímini, o passado é como um cadáver enterrado e esquecido, deixado para trás. Para Sofia, Rímini ainda é o homem de sua vida.

O filme é angustiante - eu fiquei com um aperto no peito durante toda a projeção - e por mais que eu goste do outro filme argentino de Hector Babenco - CORAÇÃO ILUMINADO (1996) -, acredito que O PASSADO é ainda mais incômodo e perturbador, até por ser menos enigmático que o supracitado, por não ser cheio de metáforas. Ambos os filmes são extremamente pessoais para o diretor. Se CORAÇÃO ILUMINADO serviu para exorcizar o período em que ele quase morreu de leucemia, O PASSADO também tem relação com sua vida particular. Numa entrevista, o diretor comentou ter vivido recentemente uma situação semelhante: "Em março me separei de minha mulher e percebi que ainda tinha suas fotos em minha casa. Senti a necessidade de jogá-las fora. Ou seja, a vida real estava imitando meu filme", afirmou Babenco. A clara referência à obra de Victor Hugo, "A História de Adèle H.", me fez ficar ainda mais interessado em assistir a adaptação homônima de François Truffaut.

O PASSADO é talvez o mais pesado, mais denso, filme sobre separação já produzido. A seqüência da separação das fotos pelo casal é uma das mais belas da carreira multi-nacional do cineasta. Não que o filme não tenha outras seqüências também bastante marcantes. É que contar mais pode estragar a surpresa de quem ainda não viu o filme, que também conta com a última participação de Paulo Autran no cinema, já com uma aparência bastante debilitada. Além do mais, o filme mostra o poder da mulher numa relação. A mulher já nasce com essa tendência de organizar e de manter as relações, desde criança, brincando de boneca, tendo, portanto, uma tendência a ter mais poder numa relação. Já o homem costuma evitar o famoso "discutir relações", talvez por ser mais imaturo nesse sentido e é aí que a mulher se aproveita. Claro que o fato de que quem ama mais dentro de uma relação também contribui para o peso de quem tem mais "poder". Quem ama mais é sempre o mais fragilizado, o mais preocupado com o possível fim de um relacionamento e quem sofre mais no final.

Top 5 Babenco:

1. BRINCANDO NOS CAMPOS DO SENHOR (1991)
2. CARANDIRU (2003)
3. O PASSADO
4. PIXOTE: A LEI DO MAIS FRACO (1981)
5. CORAÇÃO ILUMINADO

Filme fundamental de Babenco ainda não visto: LÚCIO FLÁVIO, O PASSAGEIRO DA AGONIA (1977).

quinta-feira, novembro 22, 2007

O GATO PRETO (The Black Cat)



Aproveitando a oportunidade que eu tive de baixar uma cópia deste O GATO PRETO (1934), da série de filmes de terror da Universal dos anos 30, resolvi assistí-lo antes de ver A NOIVA DE FRANKENSTEIN, por razões cronológicas. Sem falar que quando eu for ver A NOIVA... vou querer ver também logo depois os extras e os comentários em áudio, o que necessitaria de mais tempo disponível. E tempo para o lazer é uma coisa que anda faltando pra mim. O que tenho feito mesmo é trabalhar. Sorte que esses dias estão menos conturbados e pelo menos estou conseguindo atualizar o blog no horário do almoço.

Mas não é apenas por ser um terror da Universal que O GATO PRETO me atraiu. Existem pelo menos outras três razões: 1) foi o primeiro filme em que os dois "monstros sagrados" da Universal, Bela Lugosi e Boris Karloff, trabalharam juntos; 2) o filme foi dirigido por um mestre do cinema B: Edgar G. Ulmer; e 3) seria mais uma adaptação da famosa obra de Edgar Alan Poe que eu passaria a conhecer. Acontece que o filme não tem nada a ver com o conto de Poe. O nome do escritor aparece nos créditos provavelmente por pura picaretagem. Se por um lado, eu fiquei desapontado, por outro, havia a vantagem de assistir uma estória totalmente nova, original, ainda que, no final, o filme em si não tenha me agradado tanto. Quanto a um gato preto, pelo menos tem um no castelo do personagem de Karloff. E o bichano aparece umas duas ou três vezes.

A estória parece ter sido criada meio que "na coxas", mas Ulmer conseguiu se virar muito bem com o material que dispunha. Na trama, jovem casal americano em lua-de-mel na Hungria conhece um estranho (Bela Lugosi) num trem (ou seria um ônibus?, não lembro bem). Em certo momento, acontece um acidente e o motorista morre. Como eles já estavam perto da casa onde Lugosi ficaria, eles aceitam ir a pé até o castelo onde o personagem de Lugosi ficaria para se acomodarem por lá durante uma noite. O tal castelo, construído em cima de um campo de batalha, pertence ao personagem de Karloff, cujo grande hobbie é matar e colecionar corpos, que ficam imóveis feito estátuas em redomas de vidro, escondidos numa sala secreta em seu castelo. Logo, o casal estaria correndo grande perigo naquele lugar.

O filme tem o mesmo espírito das tradicionais produções de horror da Universal daquele período, inclusive, com direito àquela mesma música romântica que abriu filmes como A MÚMIA nos créditos de abertura. Quanto aos dois astros rivais, lendo a entrevista de Edgar G. Ulmer no livro "Afinal, quem faz os filmes", o cineasta conta que gostou muito de Karloff, que era um sujeito de muito bom humor. Já Lugosi, segundo ele, dava muito trabalho, sendo necessário mantê-lo sempre na linha pra ele não exagerar muito na dramatização. Lembro que em ED WOOD, de Tim Burton, Lugosi era mostrado não apenas como um velho decadente, mas Burton também escancara a inveja que ele tinha de Karloff. Lugosi era revoltado, achava-se um ator muito melhor, dizia que Karloff só sabia grunhir, devido às várias vezes em que o astro interpretou a criatura de Frankenstein.

Um dos maiores méritos de O GATO PRETO se deve ao seu visual, influenciado pelo expressionismo alemão. O filme é muito rico no uso das sombras. Na entrevista, Ulmer conta que a força visual do filme se deve ao período em que ele freqüentou a Bauhaus, a escola de design, arquitetura e artes que funcionou na Alemanha, do final da década de 1910 ao início dos anos 30. Apesar de seus méritos, a melhor fase de Ulmer aconteceria mesmo nos anos 40, quando ele faria obras-primas do cinema noir como CURVA DO DESTINO (1946).

quarta-feira, novembro 21, 2007

TRÊS CURTAS



Acho difícil avaliar curtas-metragens. Talvez pela curta duração, vários deles necessitem de revisões para que suas qualidades sejam melhor apreciadas e detalhes que passam desapercebidos sejam notados. O destaque desse post é, sem dúvida, AMOR SÓ DE MÃE (foto), mas o curta do Balagueró também é muito legal.

AMOR SÓ DE MÃE

Esse é um filme que sempre ansiava assistir, desde as notícias das primeiras repercussões, nos bons tempos de atividade da lista de discussão Canibal Holocausto. Esperava que um dia o filme passasse numa daquelas sessões de curtas patrocinadas pela Petrobrás, mas infelizmente não rolou. E talvez por causa de toda essa expectativa, talvez por isso, eu tenha me decepcionado um pouco. Gostei muito de NOCTURNU (1998), o primeiro curta de Dennison Ramalho, que recentemente co-escreveu o novo filme do Mojica, A ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO, e fiquei feliz ao ver disponibilizada na internet uma cópia em divx em excelente qualidade e com direito a áudio-extra, trazendo comentários (em inglês) de Ramalho e de André Kapel, técnico responsável pelos efeitos visuais, de maquiagem etc. Ainda assim, apesar dessa pequena decepção, que se deve também ao pouco impacto que eu senti vendo o filme, é inegável o talento de Ramalho com as imagens, fotografadas com capricho pelo craque José Roberto Eliezer, e com a construção de uma atmosfera sinistra. Junte-se a isso, o auxílio valioso de Débora Muniz, atriz que trabalhou em vários filmes pornôs da Boca do Lixo, e de Everaldo Pontes (o São Jerônimo no filme homônimo de Julio Bressane). AMOR SÓ DE MÃE (2003) conta a trágica estória de um homem que vive dividido entre ter que cuidar de sua mãe idosa e católica fervorosa e sua paixão pela prostituta Formosa, que lhe dá um ultimato: ou ele abandona a mãe e vai com ela pra longe daquele lugar ou ela o deixa. Por influências maléficas (demônios, macumba?), ele é levado a matar a própria mãe. Do jeito que é mostrado, com direito a seqüências gore e muito sangue, o filme não é recomendado para todas as audiências. Mas se a intenção de Ramalho é também chocar ou dar uma chacoalada no cinema brasileiro, ele foi bem sucedido. Perfeita a cena de Formosa toda banhada em sangue andando de maneira esquisita. No áudio, Ramalho explica que essa cena foi filmada "de trás pra frente", daí ter ficado tão sinistra. Soube através do blog do Leandro Caraça que Dennison Ramalho está com um longa-metragem "na agulha", baseado numa obra de Lourenço Mutarelli (O CHEIRO DO RALO). Aliás, foi lá do blog do Leandro que eu baixei o arquivo em divx. Aproveitem enquanto o link ainda está funcionando e confiram AMOR SÓ DE MÃE!

VISTA A MINHA PELE

Joel Zito Araújo, diretor de FILHAS DO VENTO (2005) e A NEGAÇÃO DO BRASIL (2000), parece ter a intenção de ser o Spike Lee brasileiro. Pelo menos, no sentido de querer tocar na ferida do preconceito racial no Brasil. Não vi os seus longas, mas a julgar por VISTA A MINHA PELE (2003), curta institucional educativo que ele fez e que está sendo exibido nas escolas com o objetivo de provocar a discussão sobre racismo e preconceito, não levo muita fé em seu trabalho. Vi o filme na escola em que trabalho e ele mostra uma realidade alternativa. Como seria se os papéis dos brancos e dos negros fossem invertidos na história da sociedade brasileira? É mais um trabalho para discutir em escolas mesmo. A idéia nem é tão original assim, já que existe um filme americano, A COR DA FÚRIA (1995), que já havia mostrado um mundo em que os negros são os privilegiados e os brancos são os discriminados e de posição social inferior. Pena que ficou muito parecido com MALHAÇÃO. :(

DÍAS SIN LUZ

Segundo curta-metragem do catalão Jaume Balagueró, DÍAS SIN LUZ (1995) consegue em apenas oito minutos construir imagens poderosas. Até pela curta duração, o filme é para ser revisto para ser melhor assimilidado. É como se Balagueró tivesse centenas de idéias e quisesse colocar tudo num único curta. Sou interessado na obra do diretor desde A SÉTIMA VÍTIMA (2002), e estou me preparando para ver qualquer dia desses FRAGILE (2005), um de seus últimos trabalhos. O filme é narrado pelo personagem principal, que conta do dia em nasceu, numa noite de intensa tempestade. Ele perdeu os seus pais ainda cedo e foi criado por um casal praticante de sadomasoquismo. Ele era freqüentemente torturado e a sua madrasta vestia roupa preta de dominatrix(!). Depois, vemos imagens dele adulto, numa cena bem produzida na qual ele corta o próprio braço, infestado e destruído por uma espécie de vírus. O curta teria tudo pra se transformar num longa dos bons. Quem sabe um dia, Balagueró resolva estendê-lo. Nacho Cerdà foi produtor do curta.

terça-feira, novembro 20, 2007

CRIMES DE AUTOR (Roman de Gare)



Com quase cinqüenta títulos nas costas, Claude Lelouch não desfruta do mesmo prestígio de alguns de seus colegas contemporâneos e conterrâneos. Mesmo assim, ganhou uma retrospectiva de oito filmes na última edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, tendo conquistado alguns fãs, como o Michel e a Alê, por exemplo. Como sou totalmente leigo no cinema de Lelouch - não vi nem mesmo o famoso UM HOMEM, UMA MULHER (1966)-, minha porta de entrada pelos seus filmes foi com o seu trabalho mais recente, CRIMES DE AUTOR (2007), que assisti em cópia digital no último domingo no Espaço Unibanco Dragão do Mar. A vantagem da instalação desse equipamento digital aqui na cidade é a possibilidade de ter filmes mais alternativos como esse estreando às vezes simultaneamente com o circuito paulista. Mas sem querer reclamar e já reclamando, achei que o filme ficou um pouco escuro nesse tipo de exibição. Mas tudo bem. Deu pra curtir assim mesmo, já que a trama é intrigante o suficiente para manter o espectador interessado até o final.

A primeira personagem de CRIMES DE AUTOR que conhecemos é a escritora de best-sellers Judith Ralitzer, interpretada por Fanny Ardant. Ela é uma das convidadas de um programa de entrevista. Logo em seguida ficamos sabendo que um perigoso assassino serial fugiu da prisão. Seu modus operandi é fazer sempre uma mágica, um truque, momentos antes de dar cabo de sua vítima. Dentro de um carro, numa noite chuvosa, um casal briga. Depois da briga, ele a abandona num posto de gasolina. Ela (Audrey Dana) fica desesperada e chorando e encontra um sujeito cabeçudo e suspeito, cujas descrições batem com a do assassino serial procurado pela polícia. Bom, pelo menos, ele fica fazendo truques de mágica na Loja de Conveniência. Ele oferece carona à ela. Ficamos esperando sempre o pior, mas um dos maiores méritos do filme é contrariar todas as nossas expectativas. Por isso, é bom ver CRIMES DE AUTOR sem saber ou ler nada sobre o filme.

Eu diria que o que eu menos gostei foi da segunda parte, onde a escritora interpretada por Fanny Ardant mais aparece. Não que eu não goste da atriz, longe disso, só acho que um vez que descobrimos quem realmente é o personagem de Dominique Pilon, o filme perde um pouco da graça, do mistério e do suspense. Sem falar que eu adorei a personagem de Audrey Dana, a tal moça abandonada pelo noivo no posto de gasolina. Pra mim, o melhor do filme está no meio, no momento em que o então misterioso Dominique Pilon se instala na casa da família de Audrey. E por mais que o final seja bem bolado, Pilon é feio demais para fazer par romântico com Audrey. Pra mim, isso quase estragou o que poderia ser um filme quase perfeito. Acho que eu não fui com a cara do ator, foi isso.

P.S.: Já está no ar a Zingu! de novembro, que conta como destaque o dossiê do crítico Paulo Perdigão - de quem nunca ouvi falar. Merece destaque um artigo do amigo e especialista em "western feijoada" Rodrigo Pereira, um dos autores do livro sobre Anthony Steffen. O artigo, dividido em duas partes, intitula-se "Faroestes Made in Brazil". Tem outras coisas legais na revista pra conferir. Mas o que eu mais recebi com alegria foi a sessão Musas Eternas, onde Matheus Trunk homenageia a adorável Denise Dumont. Ah, que saudade que eu tenho dos filmes em que ela aparecia. E até hoje não esqueci da câmera subjetiva de Khouri se aproximando de seu corpo nu em EROS, O DEUS DO AMOR. Valeu, Matheus!!

segunda-feira, novembro 19, 2007

OS DONOS DA NOITE (We Own the Night)



Interessante como muitas vezes o início de um filme já nos conquista de imediato. Claro que há filmes que começam muito bem e perdem o rumo lá pelo meio, mas a cena inicial de OS DONOS DA NOITE (2007), o novo trabalho de James Gray, com a sensualíssima Eva Mendes masturbando-se para o namorado (Joaquin Phoenix) ao som de "Heart of Glass", do Blondie, é de mexer com o coração até do mais insensível dos homens. (Aliás, vale lembrar que essa canção foi muito bem utilizada num comercial recente de televisão que David Lynch dirigiu para a Gucci e que está no youtube para quem quiser conferir.) A inclusão da canção também serve para nos situar temporalmente, embora a data e o lugar já tenham sido destacados logo no início.

Estamos em Nova York no ano de 1988 e Joaquin Phoenix é Bobby Green, gerente de um clube noturno que, como era comum na época, aceitava com facilidade o consumo de cocaína e outras drogas. A princípio, há uma certa semelhança com O PAGAMENTO FINAL, de Brian De Palma, por causa do clube noturno e da ambientação, mas aos poucos notaremos que o OS DONOS DA NOITE tem cara própria. Principalmente a partir do momento em que ficamos conhecendo a família de Bobby Green, tradicionalmente ligada à polícia de Nova York. Seu pai (Robert Duvall) é um respeitado chefe de polícia e seu irmão (Mark Wahlbergh) acabou de ser condecorado capitão da instituição. Muitos policiais estão sendo assassinados pela máfia russa e o pai e o irmão de Bobby pede a ele uma ajuda no sentido de destruir os planos dos líderes da quadrilha de traficantes. Como ovelha negra da família e preferindo manter distância dos assuntos da polícia, por razões óbvias, já que ele também é consumidor de drogas, Bobby nega o apoio nessa missão. A coisa começa a mudar de figura quando seu irmão sofre um atentado dos mafiosos.

OS DONOS DA NOITE é um sopro de alívio dentro dos dramas policiais que recentemente vêm sofrendo de uma mediocridade sem precendentes na história do cinema, perdendo feio para os seriados televisivos policiais. James Gray comete o tipo de filme que faz com que os estudiosos de cinema passem a querer reavaliar a sua obra de tão impactante que foi o seu trabalho. Seria James Gray um cineasta realmente subestimado pela crítica? Seus filmes carregariam uma autoralidade? Pelo visto, esse é o momento ideal para fazer essa reavaliação. Mas o que há de tão bom assim nesse novo filme que mexeu de tal maneira com as estruturas da crítica e dos cinéfilos?

Além de ser um eletrizante drama policial, o filme trabalha as emoções de seus personagens, em especial de Bobby Green, interpretado magistralmente pelo cada vez melhor Joaquin Phoenix. E além de possuir seqüências de alta combustão, como a da perseguição de carros, de deixar a gente com o coração na mão, o filme é ao mesmo tempo intimista, cheio de sutilezas na construção dos personagens e suas relações. Eva Mendes talvez nunca tenha encontrado um papel tão bom em sua carreira e Mark Walhberg nunca esteve tão bem nas telas. Além do mais, a presença do veterano Robert Duvall, ator que esteve presente numa das mais importantes e "mágicas" cenas da história do cinema - refiro-me à cena da "revelação" de Michael Corleone em O PODEROSO CHEFÃO -, sua presença funciona como um aval, como uma maneira simbólica de mostrar aos mais céticos que OS DONOS DA NOITE é cinema excepcional. E apesar de o filme terminar de uma maneira um pouco estranha e anticlimática, o que fica mais forte em nossa memória é a perseguição de carros na chuva, o som dos limpadores de vidro e o desespero de um filho.

domingo, novembro 18, 2007

CLINT EASTWOOD EM TRÊS FILMES



Acho que já devo ter falado isso aqui, que quando eu crescer, quero ser que nem o Clint Eastwood. Acredito que na história do cinema não exista uma persona que tenha um apelo tão forte tanto em relação ao público masculino quanto ao feminino. Os homens o admiram, querem ser iguais a ele, talvez por quererem ter a mesma auto-confiança de seus personagens; as mulheres suspiram por ele, tanto dentro quanto fora das telas. E como diretor, se hoje ele é considerado um dos grandes até pela Academia, nos anos 80, as coisas não eram bem assim. Ao que parece, essa "canonização" surgiu a partir de BIRD (1988) ou de CORAÇÃO DE CAÇADOR (1990), mas a verdade é que Clint Eastwood, o diretor, já começou arrebentando. Afinal, qual outro cineasta tem o talento e a sorte de mandar uma obra-prima já em seu segundo trabalho de direção? Em sua carreira de diretor constam 27 filmes até o momento e mais dois sendo produzidos ou preparados. Poder ver filmes dos primeiros momentos de sua carreira é bom para ajudar a enaltecer tanto o carisma do ator quanto o talento e a sensibilidade do autor.

O ESTRANHO SEM NOME (High Plains Drifter)

Bebendo da fonte de Sergio Leone e do western spaghetti em geral, Clint retoma aqui a figura do pistoleiro sem nome que chega numa cidade estranha. O clima sinistro, inclusive com aquela música que mais parece saída de um filme de terror, também lembra bastante os melhores westerns realizados na Itália. Em O ESTRANHO SEM NOME (1973), Clint é um pistoleiro que chega numa cidade que carrega sobre si um clima opressor. Ele, na maior tranqüilidade do mundo, pede para lhe fazerem a barba e oferecerem-lhe um banho. Mas é só ele chegar na cidade que três sujeitos mal encarados mandam o homem cair fora do lugar. E ele se protege dos caras armados, mandando bala nos três. Logo após esse incidente, ele fica logo famoso na cidade e o xerife, meio covarde, lhe oferece uma proposta: ajudá-lo a matar três pistoleiros perigosos que estão prestes a sair da prisão. De tão desesperados que estão com a chegada dos três bandidos, os cabeças da cidade acabam oferecendo tudo de graça para o estranho, em troca de seus serviços. Inacreditável o que acontece em seguida. O ESTRANHO SEM NOME é provavelmente o filme mais explicitamente sombrio da carreira de Clint e lida com a temática da culpa como sentimento coletivo como poucos. E o bom é que o dvd da Universal valoriza a janela original do filme, em scope, e fica aquela imagem linda, de dar gosto. Pra quem curte a trilogia dos dólares de Leone, esse filme é essencial e talvez até tão bom quanto os do mestre italiano. Obra-prima.

ESCALADO PARA MORRER (The Eiger Sanction)

Esse eu já vi faz tempo. Esperava a oportunidade de ver outros filmes de Clint para resenhá-lo junto, mas o tempo foi passando e só agora rolou a chance. Trata-se de um trabalho menor do diretor/ator, mas ainda assim é um bom filme. Em ESCALADO PARA MORRER (1975), Clint interpreta um professor de arte e colecionador que também trabalha como agente secreto do governo americano. Um dos velhos amigos dele morreu ao escalar uma montanha e a agência secreta sabe que uma pessoa do grupo dos escaladores foi o responsável. Daí, "convidam" Clint a apanhar o responsável, se infiltrando no grupo. Há realmente pouca coisa que eu lembro do filme, o que acaba não sendo um ponto muito positivo, mas é, com certeza, ao menos um bom entretenimento. Gravado da Globo.

O CAVALEIRO SOLITÁRIO (Pale Rider)

Nos anos 80, o western havia "saído de moda", mas ainda assim O CAVALEIRO SOLITÁRIO (1985) foi um dos mais bem sucedidos filmes do gênero na época. Clint faz novamente um estranho sem nome que aparece como salvador de um grupo de pessoas necessitadas, mas dessa vez sem os tons sombrios de O ESTRANHO SEM NOME. Por usar um daqueles acessórios brancos ao redor do pescoço, o povo acredita que ele é um padre, tratam-no como um padre. Mas um padre muito estranho, desses que enfrentam três homens sozinho e com habilidades no gatilho invejáveis. Destaca-se também no filme Michael Moriarty, como o líder do grupo de mineradores de ouro que são constantemente atacados por um rico proprietário de terras local. Uma cena em particular me emocionou: a cena em que a jovem de quinze anos (Sydney Penny) declara-se apaixonada pelo "padre". O clímax final - um tiroteio, claro - é também muito bom, mas a cena de Moriarty ajudando a salvar Clint me pareceu copiada do final de O ESTRANHO SEM NOME. Mas são clichês do gênero que acabam sendo difíceis de evitar. O CAVALEIRO SOLITÁRIO homenageia o clássico OS BRUTOS TAMBÉM AMAM, de George Stevens (1953).

Agradecimentos especiais à amiga Socorro Araújo, que fez a gentileza de me emprestar os dvds de O ESTRANHO SEM NOME e O CAVALEIRO SOLITÁRIO.

sexta-feira, novembro 16, 2007

THE WHIP AND THE BODY (La Frusta e il Corpo / Le Corps et le Fouet)



Meio que influenciado pelo debate que rolou no blog do Heráclito, notei que precisava começar a ver alguns filmes do Mario Bava que tinha comigo. Comecei, então, com o belo THE WHIP AND THE BODY (1963), estrelado pelo inglês Christopher Lee e pela palestina Daliah Lavi. Trata-se de uma estória de amor sinistra, que já começa a encantar a partir dos créditos, com um vermelho forte e a bela música tema de Carlo Rustichelli, o que acaba remetendo um pouco aos melodramas de Douglas Sirk. E que também me fez lembrar obras de David Lynch como VELUDO AZUL e TWIN PEAKS - OS ÚLTIMOS DIAS DE LAURA PALMER. O estranho é ver todos os envolvidos no filme com pseudônimos "americanizados". A intenção era vender a obra para o mercado internacional como se fosse um filme americano. Até o próprio Bava aparece com o pseudônimo de John M. Old. A presença de um astro internacional e conhecido mundialmente pelo papel de Drácula nas produções da Hammer ajudava a "enganar" o público preconceituoso com produções estrangeiras. Naquela época, apenas diretores mais respeitados como Fellini, Antonioni ou Visconti conseguiam abertura no mercado americano mesmo com seus filmes dublados em italiano. Por sorte, consegui, em divx, uma cópia dublada em italiano de THE WHIP AND THE BODY, com legendas em inglês.

Christopher Lee já havia trabalhado antes com Bava, no peplum HÉRCULES NO CENTRO DA TERRA (1961) no papel de um feiticeiro. Em THE WHIP AND THE BODY, ele é o filho pródigo e maligno que retorna ao castelo de sua família para buscar o que acredita ser seu de direito. Ele não é bem vindo por seus familiares, já que ele seria o responsável pela morte de uma pessoa da casa. A mãe da moça assassinada, inclusive, guardava dentro de uma redoma de vidro o punhal ainda ensangüentado, esperando o dia em que ela poderia se vingar de Kurt (esse é o nome de Lee no filme). Kurt tem uma atração pela sua cunhada, Nevenka (Daliah Lavi). E apesar de a mesma dizer que o odeia, na verdade ela também é apaixonada por ele. São sentimentos contraditórios que a perturbam. E ela é daquelas mulheres que gostam de apanhar, de sentir dor. E quando ele a chicoteia até sangrar, ela parece gozar de prazer numa cena ao mesmo tempo excitante e perturbadora num praia, que acabou gerando polêmica na época. Não era comum assistir uma cena tão explícita de sadomasoquismo.

A ambientação de THE WHIP AND THE BODY lembra muito "Il Wurdulak", o segmento mais marcante do meu filme favorito de Bava: BLACK SABBATH (1963), ainda que não consiga ser tão apavorante quanto. Talvez por dar mais ênfase à relação romântica e doentia de Kurt e Nevenka. Em certa altura do filme, Kurt é assassinado e depois reaparece para assombrar todos da casa, principalmente sua amada Nevenka. E tome mais chicotadas. O filme também é um dos mais ricos de Bava no que se refere à direção de arte, com o uso de cores estranhas ao usual. Um diretor qualquer não teria, por exemplo, usado tantos tons esverdeados e azulados em cenas dentro de um castelo. Outros momentos marcantes acontecem sempre que vemos Nevenka ao piano, como que convidando o amado morto a se fazer presente naquela casa. São detalhes como esse que não nos deixa dúvida que estamos vendo uma obra especial.

P.S.: E PRISON BREAK entrou em hiato, deixando um gancho que pode mudar todo o rumo dos acontecimentos da série. O que me faz admirar essa série é a maneira como ela se mantém viva quando todos acreditam que ela está pra morrer.

quarta-feira, novembro 14, 2007

LEÕES E CORDEIROS (Lions for Lambs)























Nessa semana consegui emendar quatro bons filmes no cinema em quatro dias seguidos. De sábado a terça. Hoje acho que vou tirar uma folguinha, por que ninguém é de ferro, certo? O filme de ontem, com a sala quase vazia, foi LEÕES E CORDEIROS (2007), reflexão sobre a atual situação dos Estados Unidos em relação ao Iraque e aos Talibãs, dirigida por Robert Redford, que também atua como um dos protagonistas. Não é de hoje que Redford é envolvido em causas políticas. Ele foi produtor de um dos filmes políticos mais importantes dos anos 70, TODOS OS HOMENS DO PRESIDENTE (1976), de Alan J. Pakula, sobre o escândalo watergate. Em LEÕES E CORDEIROS, o atuante ator, diretor, produtor e mentor do Festival de Sundance faz um filme bem estranho ao tipo de cinema "espetáculo" que Hollywood se acostumou a produzir nos últimos anos. Boa parte da ação, por exemplo, são conversas entre quatro paredes e com diálogos nebulosos sobre responsabilidades, ações políticas, coisas do tipo.

Num lugar, temos a jornalista vivida por Meryl Streep no gabinete de um Senador da República, interpretado por Tom Cruise, em sua habitual persona mista de arrogância com simpatia. O político anuncia uma ação estratégica e militar que estaria acontecendo naquele exato momento. Ao convidar a jornalista, ele estaria dando um generoso "furo de reportagem" para ela, embora ela suspeite que se trata, no mínimo, de mera propaganda do Governo. Em outro local, temos um professor universitário (Robert Redford) oferecendo a um de seus alunos uma chance de mudar de vida e fazer algo importante. Ambas as conversas, tanto a do gabinete do Senador, quanto a da sala do professor são nebulosas, pouco claras e por isso mesmo intrigantes. Talvez seja esse o motivo de esse filme não ter me feito dormir, coisa que eu sinceramente suspeitava que iria acontecer. Os diálogos são muito bem escritos e o responsável por isso é Matthew Michael Canahan, também roteirista de O REINO, outro filme político que deve estrear no Brasil nos próximos dias. Mas nem tudo no filme são salas com ar condicionado e cadeiras confortáveis. Vemos também os esforços de dois soldados que caem feridos em pleno território talibã e esperam resgate do exército.

Dá pra notar que o filme foge do lugar comum. Por isso, ter a chance de ver LEÕES E CORDEIROS no cinema é até um privilégio, diante de tanta produção burra passando nas telas. A impressão que se tem é que a temporada de candidatos ao Oscar já começou. Agora, como sou muito ingênuo para entender os jogos e artimanhas políticas, além de pouco informado com o que acontece na mídia - essa minha mania de só ler os cadernos de cultura dos jornais está me deixando cada vez mais alienado -, fiquei sem entender muita coisa do filme. Mesmo assim, trata-se de uma obra intrigante e elegante. E aquela cena perto do final, com a Meryl Streep passando de carro em frente ao cemitério onde foram enterrados os soldados mortos nas últimas guerras é uma bofetada nos governantes americanos.

P.S.: Vi ontem o trailer de O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA e por mais que digam que o filme é ruim e que a trilha é da Shakira (so what?), ver a Giovanna Mezzogiorno, ainda que só por alguns minutos, fez o meu coração bater mais forte.

terça-feira, novembro 13, 2007

MANDANDO BALA (Shoot'Em Up)



Uma bela surpresa este MANDANDO BALA (2007), principalmente pra quem entra no clima bem humorado e cheio de excessos do filme. A primeira cena já entrega uma homenagem a Sergio Leone, com um grande close dos olhos de Clive Owen enchendo a tela scope. Depois, close no seu rosto de Owen, comendo uma cenoura, como o Pernalonga. Lá pelo meio do filme, percebemos que essa semelhança não é gratuita, já que as cenouras continuarão a ser uma marca - e um "utensílio" - para o personagem. Além do mais, a clássica pergunta "what's up, doc?" ("o que é que há, velhinho?") também será mencionada em certa ocasião. Isso de colocar um protagonista imitando o coelho da Warner não é novidade. Já vimos isso antes em ESSA PEQUENA É UMA PARADA, de Peter Bogdanovich, mas a intenção aqui é outra, já que apesar de ser um filme digno de ser classificado como uma comédia, trata-se de um filme de ação tão ou mais eletrizante e nervoso quanto o recente ADRENALINA, só que ainda mais absurdo e com menos respeito às regras da física. Aliás, "verossimilhança" é uma palavra que deve ser riscada do dicionário no momento em que entramos na sessão de MANDANDO BALA.

Na trama, Clive Owen está sentado num banco de uma rua deserta à noite, quando vê passar uma mulher grávida chorando e apavorada. Em seu encalço, um homem armado. Owen - até então, ainda não o conhecemos como "Mr. Smith" - dá de ombros, liga o botão do "foda-se" e vai lá proteger a pobre mulher das garras daquele covarde. O que não se espera é que no momento do quebra-pau dele com o bandido, a mulher esteja prestes a dar a luz e que outros homens apareçam e ele tenha que se defender e atirar em todos, ao mesmo tempo em que ajuda a mulher a parir, com direito a corte do cordão umbilical na bala. No meio do tiroteio, a mulher morre e Mr. Smith carrega a criança em seus braços. Ele sai em busca de uma mulher que possa amamentar a criança e lembra de uma prostituta que poderia ajudá-lo nessa tarefa, uma italiana interpretada pela gostosíssima Monica Bellucci. O grande vilão do filme é Paul Giamatti, no papel de um caricato gângster que tem estranhas razões para querer a criança morta. E a brincadeira está apenas começando.

Durante as cenas de tiroteio, ouvimos muito rock pesado e barulhento. No primeiro tiroteio, ouvimos "Breed", do Nirvana, o que fez meu espírito noventista (alguém já está usando esse adjetivo?) vibrar de entusiasmo. Ouvir "Breed" no cinema não tem preço. Ainda mais assistindo as façanhas de um herói invencível com o Sr. Smith de Clive Owen. O engraçado é que o bebezinho fica tão acostumado com a barulheira, que só consegue dormir ou descansar ouvindo heavy metal ou um rock mais pesado. Em certa altura do filme, a platéia urrava de alegria, misturada com gargalhadas com os aburdos de certas cenas, como aquela em que Owen pula de pára-quedas de um avião e sai atirando em seus inimigos em pleno ar. E quando o filme termina, senti no ar uma euforia poucas vezes vista numa sessão. Parecia show de rock. Trata-se de um filme totalmente desprensioso e cuja única função é divertir. E tenho impressão que todo mundo saiu do cinema com um sorriso de satisfação no rosto.

segunda-feira, novembro 12, 2007

ANTES SÓ DO QUE MAL CASADO (The Heartbreak Kid)



Levei sorte no cinema esse final de semana. Além de me divertir a valer com PLANETA TERROR, tive o prazer de ver mais uma pérola de Peter e Bobby Farrelly, esses sim os verdadeiros mestres da comédia americana contemporânea. Não tem pra ninguém. Nem a turma de Judd Apatow nem o "Frat Pack" conseguem fazer comédias melhores que esses dois irmãos. Claro que a cada filme que passa eles vêm se mostrando mais suaves, mais românticos, o que tem sido motivo de algumas reclamações por parte de alguns críticos ou fãs mais radicais da primeira fase da dupla, mas eu não me importo. Pelo contrário, eu adoro comédias românticas e os Farrellys, ainda que continuem exercitando suas piadas "nojentas" ou de "mau gosto", já conseguiram me fazer chorar em pelo menos duas ocasiões: na cena da garotinha de pele queimada em O AMOR É CEGO (2001) e no clímax de AMOR EM JOGO (2005). O novo filme, ANTES SÓ DO QUE MAL CASADO (2007) quase me pegou de novo. É bastante envolvente, principalmente pra quem é solteiro e se identifica ao menos um pouco com o personagem.

O filme é uma refilmagem de CORAÇÕES EM ALTA (1972), de Elaine May. Como não vi o original, não sei o quanto os Farrellys modificaram, mas acredito que muita coisa foi mexida, já que o nome dos dois irmãos aparecem nos créditos de roteiro. Uma cena, por exemplo, como aquela do close da genitália da noiva do protagonista escondida por uma tarja preta não devia estar no filme original. Talvez nem mesmo as piadas relativas ao desvio de septo da moça, que tanto renderam momentos engraçados ao filme. Enfim, apesar de ser um remake, ANTES SÓ DO QUE MAL CASADO é um autêntico Farrelly movie.

O filme já me conquistou logo na seqüência inicial, com Ben Stiller passeando na rua ao lado de seu pai, Jerry Stiller. (E só agora eu soube que Jerry Stiller, mais conhecido pelo papel do pai de George Constanza em SEINFELD, é pai de Ben Stiller! Pra mim foi uma surpresa!) E não tem como não gostar desses dois atores, cada um à sua maneira. O pai chega para o filho e pergunta sobre as "novidades". Na verdade ele quer saber se o filho anda "traçando" alguém. Ele desconversa e diz que está apenas saindo com algumas moças de vez em quando. Mas na verdade, ele está mesmo é sozinho e ainda por cima vai para a cerimônia de casamento de sua ex-noiva em pleno Dia dos Namorados (Valentine's Day). E só pra passar vergonha. Mas o destino tem planos para o rapaz de quarenta anos. Sua vida muda quando ele conhece uma bonita loira (Malin Akerman) e os dois começam a namorar. Devido a uma eventualidade, ele acaba antecipando o casamento e os dois vão passar a lua-de-mel em Los Cabos, México. Mas aos poucos, ele vai percebendo que a mulher é meio louca e que acabou se precipitando com o casamento. Ela toma uma insolação violenta e, em plena lua-de-mel, ele acaba se descobrindo apaixonado por outra mulher, vivida pela encantadora Michelle Monaghan.

ANTES SÓ DO QUE MAL CASADO é muito bem equilibrado, tanto nas cenas escatológicas - se é que o termo se aplica ao filme - quanto nas cenas mais ternas e românticas. Eu diria que é um dos filmes mais redondos e bem acabados dos Farrellys, embora seja também o que mais se utiliza dos clichês mais básicos das comédias românticas para conquistar o público comum. Uma das cenas mais bonitas do filme é aquela em que Stiller e Monaghan estão sentados na praia, dividindo um baseado e conversando sobre discos voadores. Na verdade, pouco importa sobre o que eles estão conversando. Estarem juntos e sentindo-se bem um ao lado do outro é que é o importante. É esse tipo de relação que todos buscam e que não existe apenas nos filmes. Ainda bem. Os Farrellys acabam fazendo, mais uma vez, um filme sobre a força do acaso, ou do destino, como elo de união para aqueles que procuram alguém. E de bônus, garante muitas risadas, coisa rara na comédia atual americana. Salve os Farrellys!

sábado, novembro 10, 2007

PLANETA TERROR (Planet Terror)



Fico feliz em notar a evolução de Robert Rodriguez na direção com esse belo trabalho que ele fez ao lado do amigo e parceiro Quentin Tarantino. No começo, quando soube que GRINDHOUSE não passaria no Brasil como programa duplo e sem aqueles trailers falsos e divertidos no meio, como aconteceu nos Estados Unidos, fiquei desapontado, mas depois, quando soube da possibilidade de ver os dois filmes em separado, mas em versões estendidas, fiquei um pouco mais tranqüilo. E é bom notar que, apesar de ser a versão estendida, PLANETA TERROR (2007) não tem "gorduras". É um filme que passa rápido, diverte e é extremamente bem sucedido no que se propõe a ser, isto é, uma homenagem aos filmes de gênero de baixo orçamentos dos anos 70.

E por mais que Rodriguez esteja longe de ser um cineasta da excelência do seu amigo Tarantino e de ter uma filmografia bastante irregular, ele é um diretor que tem o seu talento. Assim como John Carpenter, além de escrever e dirigir, ele ainda compõe a trilha sonora do filme. Pra começar, já fiquei satisfeito ao ver que, no início do filme, passa ao menos um dos trailers falsos incluídos na versão GRINDHOUSE: o de "Machete", que tem potencial para virar filme de verdade. Aliás, vi agora no IMDB que o próprio Rodriguez está providenciando MACHETE e que a julgar pela data de lançamento do filme no site, MACHETE deve sair antes mesmo que a continuação de SIN CITY (2005). Deve ser um projeto rápido e barato, talvez com uso de câmera digital, que ele tanto gosta.

Comparado com À PROVA DE MORTE, do Tarantino, que ainda não vi, mas que faço questão de esperar pra ver no cinema em 2008, por mais ridículo que isso seja, o filme do Rodriguez já tinha a vantagem de ser mais atraente. Afinal, não é todo dia que a gente vê um filme em que a protagonista tem uma metralhadora no lugar de uma perna. O filme começa com a Rose McGowan dançando sensualmente num bar ao som de uma música contagiante numa fotografia cheia de riscos, falsamente envelhecida, causando uma agradável sensação de deslocamento temporal. Algo parecido com o que acontece em alguns filmes do Tarantino, como PULP FICTION ou JACKIE BROWN. É como se estivéssemos ao mesmo tempo nos anos 70 e no momento atual. E antes que me esqueça: não posso deixar de elogiar a beleza, a gostosura e o desempenho de Rose McGowan. Aliás, Rodriguez é talvez o diretor que mais aproveita a beleza das mulheres no cinema atual.

A trama envolve a explosão de uma arma biológica que transforma pessoas em zumbis canibais raivosos. McGowan é uma ex-go-go girl que resolve largar a vida de dançarina e encontra um ex-namorado (Freddie Rodríguez) pelo caminho. Há também o casal de médicos interpretados por Josh Brolin e Marley Shelton. Ele suspeita que a esposa o está traindo e depois acaba revelando seus instintos psicóticos. E ela acaba revelando sua preferência por mulheres. Depois da explosão dessa arma biológica, começam a aparecer no hospital pessoas com feridas e bolhas bem estranhas e gosmentas. E haja gosma e gore oitentista à medida que o filme vai se aproximando do final. Tudo muito divertido. Mas o que me empolgou mesmo foi quando o grupo de resistência liderado por Freddie Rodríguez e Rose McGowan se junta para matar os zumbis canibais. Só a cena da Rose pulando o muro com o auxílio de sua perna-metralhadora já torna o filme imperdível. De bônus, Bruce Willis aparece sem seu nome nos créditos e Naveen Andrews, o Sayid, de LOST, faz o papel de um sujeito que tem como diversão preferida arrancar os testículos de seus adversários. Rodriguez soube aproveitar a fama de torturador que Andrews ganhou na série.

Pra completar, meu top 5 do "tex-mex".

1. PLANETA TERROR
2. PROVA FINAL (1998)
3. UM DRINK NO INFERNO (1996)
4. ERA UMA VEZ NO MÉXICO (2003)
5. REVANCHE REBELDE (1994)

sexta-feira, novembro 09, 2007

PONTE PARA TERABÍTIA (Bridge to Terabithia)



Eu meio que esnobei PONTE PARA TERABÍTIA (2007) quando o filme passou nos cinemas daqui. Culpa do trailer que vendia um filme exclusivamente de fantasia e bastante juvenil, valorizando mais os efeitos especiais do que o aspecto humano. E culpa também das cópias dubladas que acabam me afastando dos filmes, como aconteceu com STARDUST recentemente. Mas depois vi que alguns blogueiros de respeito começaram a levantar a bola do filme e comecei a ficar interessado em assistí-lo. Aí um dia desses um amigo aqui do trabalho apareceu com uma cópia do filme em dvd e me emprestou. E realmente trata-se de um belo filme sobre amor, amizade, fuga e fantasia. Mas aquela fantasia que a gente inventa porque a vida nos maltrata ou porque a gente acha a realidade no mínimo tediosa. Não que eu tenha me identificado com o tipo de fantasia que a garotinha criava, já que eu nunca tive o menor interesse por trolls ou fadas ou coisas do tipo. No entanto, há uma beleza toda particular no modo como as brincadeiras daquele casal de crianças vai se tornado cada vez mais real em suas mentes.

O filme conta como um garoto (interpretado por Josh Hutcherson, o garotinho de ABC DO AMOR, dois anos mais velho) tem a sua vida mudada no momento em que conhece uma menina (Anna Sophia Robb, do recente A COLHEITA DO MAL). Como ambos eram solitários e pouco populares na escola, ela acaba fazendo amizade com o menino e inventando lugares mágicos para eles passarem suas horas vagas brincando. Eles inventam Terabítia, um lugar que fica depois de um riacho perto da casa onde eles moram e que para chegar lá é preciso atravessar com a ajuda de um cipó, pois não existe uma ponte.

PONTE PARA TERABÍTIA, baseado no livro homônimo de Katharine Paterson, é a estréia do húngaro Gabor Csupo na direção de longas-metragens e a julgar pelo seu próximo trabalho, THE SECRET OF MOONACRE, ainda em fase de filmagem, parece que ele vai se especializar em filmes ligados à fantasia. E como seu trabalho em PONTE PARA TERABÍTIA foi bem bonito e por vezes tocante, acho que ele é um cineasta que merece atenção. Os efeitos especiais foram encomendados pela WETA, a produtora de Peter Jackson.

P.S.: E a greve dos roteiristas já chegou nas nossas séries preferidas. THE OFFICE, por exemplo, só vai ter mais uns três episódios e depois só Deus sabe quando voltará. Felizmente, DEXTER está com a segunda temporada toda prontinha e garantida. Já não sei como ficará PRISON BREAK. E LOST e 24 HORAS já estão com a data de estréia das próximas temporadas do inicio de 2008 adiadas pra não se sabe quando.

quarta-feira, novembro 07, 2007

MY SASSY GIRL (Yeopgijeogin Geunyeo)



Há quem pense que a indústria cinematográfica da Coréia do Sul é boa apenas em filmes de ação (filmes de vingança, de guerra, de monstros), mas vendo MY SASSY GIRL (2001), do cineasta Kwae Jae-yong, vi que eles estão bem mais evoluídos do que a gente imagina, inclusive, dentro também do gênero "comédia romântica". O grau de encantamento que MY SASSY GIRL proporciona é impressionante. Só sinto falta dos beijos e dos abraços. Para nós, ocidentais, namoro sem beijo não é namoro. Mas o povo oriental parece que é asssim mesmo, arredio no que se refere a demonstrações de afeto, especialmente em público.

Na estória de MY SASSY GIRL, Gyeon-woo, um garoto meio bobalhão, conhece uma garota numa estação de metrô. Acontece que a menina está tão bêbada que mal consegue se sustentar em pé na linha amarela de segurança do metrô e ele salva a vida dela segundos antes da chegada do trem. Durante o trajeto, a menina bêbada, briga com um rapaz que não oferece o assento para um senhor de idade e depois acaba vomitando na cabeça de um senhor que estava sentado. Como o homem "vomitado" acha que Gyeon-woo está com ela, o garoto acaba tendo que limpar toda a sujeira e, sem ter como saber onde a menina mora, leva-a para um motel, o que acaba gerando uma série de confusões para o pobre rapaz. Mas a menina é uma graça e quando está sóbria é apaixonante. E os dois acabam criando um vínculo especial, algo entre o namoro e a amizade.

O filme é dividido em dois atos. O primeiro é mais centrado na comédia e lembra bastante os animes japoneses. A menina, por exemplo, tem o hábito de bater no garoto, muitas vezes sem razão nenhuma e chega a fazer com que ele troque de calçados com ele - sendo que o calçado que ela estava usando era um sapato de salto alto. Mas com o tempo ele começa a gostar até de quando ela bate nele, que seria uma espécie de demonstração estranha de afeto. Mas o bonito mesmo acontece no segundo ato, quando o filme vai ganhando mais seriedade e mais emoção. A "cápsula do tempo", inventada pela garota - o filme nunca menciona o nome dela -, me fez lembrar ANTES DO AMANHECER, de Richard Linklater, no sentido de mostrar a fé no amor resistindo depois de um longo tempo de ausência. Uma das cenas mais bonitas é uma lá do final, quando a garota encontra um velho sentado debaixo da árvore, a escolhida para ser a árvore deles, localizada no topo de um monte. De arrepiar esse momento.

E como o pessoal de Hollywood não é bobo, já existe um remake na agulha, estrelado pela Elisha Cuthbert, a exemplo do que aconteceu com A CASA DO LAGO, que também é a adaptação de um filme coreano e que curiosamente também conta com a mesma bela e adorável atriz de MY SASSY GIRL, Jun Ji-hyun - ou Gianna Jun, como aparece no IMDB e deve ser o seu nome artístico internacional. Ela também está no filme seguinte do diretor de SASSY GIRL: WINDSTRUCK (2004).

Agradecimentos especiais ao amigo Renato, que me enviou a cópia em divx. Se ele não tivesse elogiado tanto o filme eu provavelmente não teria assistido tão cedo. Curiosamente, MY SASSY GIRL é o filme de destaque no blog dele também. :-)

terça-feira, novembro 06, 2007

PIAF - UM HINO AO AMOR (La Môme / Edith Piaf / The Passionate Life of Edith Piaf )



Uma vez disseram aqui no blog: - acho que foi o Bruno Amato - "o Ailton gosta de tudo". Bom, se vocês verem os últimos posts, excetuando COISAS SECRETAS, até que eu ando bem "ranzinza" com quase tudo que tenho visto. Mas acho que não se trata de ser ranzinza. São os filmes recentes que vi que não são lá muito bons mesmo. Não recebi com bons olhos nem mesmo os últimos vistos de Hitchcock e Ford. Querem ver textos sobre filmes ótimos, visitem o blog do David, que anda vendo cada filmão na Mostra. Querem ver textos sobre filmes ruins, sintam-se em casa, pois hoje eu estou aqui pra falar de mais uma experiência desagradável: a cinebiografia PIAF - UM HINO AO AMOR (2007), de Olivier Dahan, diretor de RIOS VERMELHOS 2 - ANJOS DO APOCALIPSE (2004) e do clipe de "Salvation", dos Cranberries.

Vendo o filme e não sentindo absolutamente nada além de tédio, sono, impaciência ou vontade de ir embora - ainda por cima que são 140 minutos de duração -, me peguei pensando: acho que os franceses são bons mesmo é em filmes modernos, filmes de vanguarda. Dificilmente eles acertam quando fazem filmes clássico-narrativos à moda hollywoodiana. Tudo bem que o filme não é inteiramente francês - é uma co-produção com a Inglaterra e a República Tcheca - mas como o elenco principal e o diretor são franceses eles são os responsáveis por esse xaropada, por desperdiçar a chance de se fazer um bom filme para contar a vida trágica e passional de Edith Piaf, a cantora mais conhecida da França, cujos hits "La vie en rose" (1945) e "Non, je ne regrette rien" (1956) são tão conhecidos no mundo quanto as canções dos Beatles ou como "Garota de Ipanema", de Tom e Vinicius.

Inclusive, eu comecei a ficar interessado na vida de Piaf assistindo ao filme inglês MEU AMOR DE VERÃO, onde a personagem de Emily Blunt chega a dizer que Piaf chegou a matar um de seus amantes, mas que não foi presa, pois na França crime passional é tratado de maneira diferente. Mas pelo visto ela estava inventando estórias. Pelo que eu vi no filme, não teve nada disso. Na verdade, se ela matou o amor de sua vida foi de forma indireta, já que ele morreu num acidente de avião quando vinha se encontrar com ela.

O filme é narrado com idas e vindas no tempo. Começa com Piaf já velha (Marion Cotillard) caindo no palco durante uma apresentação. E com esse vai-e-vem temporal, vemos momentos da sua infância, quando foi abandonada pela mãe e foi criada num prostíbulo, passando pelo início da carreira, cantando pelas ruas por alguns trocados, até a fama internacional em grandes casas de espetáculos. Emmanuelle Seigner aparece como uma das prostitutas que cuidaram de Edith. Ela aparece distante da beleza e da voluptuosidade dos bons tempos de LUA DE FEL. E o grande Gérard Depardieu, em sua generosidade, faz uma participação pequena, como que para dar apoio ao filme.

P.S.: Legal foi na fila pra comprar o ingresso para o filme. Um velhinho pediu ingresso para a pré-estréia de VIRA-LATA, aquele filme do cachorro que imita o Super-Homem. Ele perguntava para a moça da bilheteria: "esse filme é bom mesmo? o cachorro vira a lata mesmo?". E ela dizia algo como: "não sei lhe informar, senhor". Ele devia estar tirando onda com a moça e saiu rindo. E deve ter se divertido bem mais do que eu.

segunda-feira, novembro 05, 2007

1408



Fiquei desapontado com 1408 (2007), adaptação de um conto de Stephen King dirigida pelo sueco Mikael Håfström. Diferente de grande parte da crítica e do público, eu fui um dos que gostaram do menosprezado thriller anterior do diretor, FORA DE RUMO (2005), que prendia muito mais a atenção e mexia muito mais com nossos nervos do que esse terror psicológico que depende demais do carisma de John Cusack para conseguir se manter. Isso porque a maior parte do filme se passa dentro do assombrado apartamento 1408 do Hotel Dolphin, em Nova York. (Alguém sabe se existe mesmo esse hotel?)

1408 começa bem. O personagem de Cusack é um escritor que ganha a vida compondo livros do tipo "Os dez cemitérios mais assustadores do país" ou algo do tipo. Atualmente ele prepara um livro chamado "Dez Noites em Quartos de Hotel Mal-Assombrados" e o filme começa em clima hitchcockiano, emulando PSICOSE. A chuva, o quarto de hotel, a expectativa quanto ao que poderá acontecer naquele quarto contribuem para criar um clima ao mesmo tempo amedrontador e agradável. Mas apesar de todo esse clima - já falei que adoro chuva em filmes? - não vai ser esse o apartamento que abalará o ceticismo do escritor.

Sim, ele é cético e simplesmente inventa as assombrações de seus livros, já que ele mesmo nunca viu fantasma nenhum em toda sua vida. Até o dia em que ele recebe em sua caixa postal um cartão com os dizeres "não visite o quarto 1408 do Hotel Dolphin". Mas a palavra "não" não tem o poder de nos impedir de fazer certas coisas, muito pelo contrário, como podemos ver no documentário O SEGREDO. Além do mais, como minha parceira de sessão muito bem lembrou: as crianças também não absorvem o "não". Assim, o personagem de Cusack ficou obviamente instigado a visitar o tal quarto.

O filme ainda conta com Samuel L. Jackson como o gerente do hotel, que tenta a todo custo evitar que o seu teimoso hóspede entre naquele quarto amaldiçoado que já deixou um bom saldo de mortes e outros tantos de traumas naqueles que por lá passaram. Como se percebe, o começo do filme é promissor. Mas talvez o problema de 1408 esteja no fato de que ele estende muito o material original, uma short story, além de frustrar as expectativas do espectador no quesito "sustos". Não tomei um susto sequer o filme inteiro, apesar das tentativas do filme de assustar através do som. Nem mesmo as referências claras a O ILUMINADO valorizam o trabalho de Håfström. Aliás, referência a bons filmes não é sinal de qualidade quando o trabalho em si não é digno o suficiente. Ainda assim, além do início promissor, 1408 tem os seus momentos. Sem falar que ele consegue driblar o final falso que faria qualquer espectador odiar o filme com todas as suas forças.

P.S.: Ontem, depois de um bom tempo longe dos shows - aquele de blues com o guitarrista do Sepultura não conta - , fui a um show de um artista que nem curto: o Frejat. Fui mais pela vontade de ver os amigos e de sair de casa. Aceitei o convite do amigo Clauber, que iria com suas primas e outras meninas, todas solteiras. :-) Só que eu era o único sem ingresso, que pelo preço baixo era muito provável de que já tivesse se esgotado. Mas não tinha importância. Sair de casa e voltar pra casa sem ver o show era algo que eu estava disposto a aceitar na boa. Chegando lá, como esperado, os ingressos estavam esgotados. Aí eu encontrei uma amiga minha, a Jamie, que estava com o seu marido, dispostos a vender os dois ingressos que haviam comprado. Mas eu não queria dois ingressos, apenas um. E eles não me venderiam só um, já que é mais fácil vender dois e as pessoas costumam ir a shows juntos. Senti-me como o personagem do Steve Martin em O RAPAZ SOLITÁRIO. Lembram desse filme? Pois bem. Sorte que uma outra senhora estava vendendo também e eu comprei dela, mesmo tendo que pagar preço de inteira. Pra mim, o show foi frio e sem graça com alguns poucos momentos razoáveis, como quando ele fez cover de "Ainda é cedo" ou quando cantava uns clássicos do Barão. Mas ter que ouvir "Carinhoso" na voz do Frejat foi quase uma tortura. Mas foi uma noite boa e agradável ao lado do Clauber, da Kelvilene (ainda encaramos um sanduba no final) e das outra meninas que acabei não conhecendo direito. Encontrei também a Valéria, a Elis e a Juliana. Mas o importante pra mim é estar me sentindo confortavelmente bem nesses ambientes cheios de gente, coisa que não acontecia comigo há tempos.

domingo, novembro 04, 2007

CREPÚSCULO DE UMA RAÇA (Cheyenne Autumn)



E com o cansativo épico de três horas de duração CREPÚSCULO DE UMA RAÇA (1964), eu finalizo por aqui a minha peregrinação pela obra de John Ford. Ainda tornarei a falar dele em breve assim que assistir o documentário de Peter Bogdanovich, mas devo passar um tempão sem ver outro filme do diretor. Faltaram alguns filmes importantes a serem vistos como O JUIZ PRIEST (1934), O DELATOR (1935) e CARAVANA DE BRAVOS (1950), mas acredito que pela quantidade de filmes que vi (33, no total), tornou-se possível entender um pouco do homem e do cineasta John Ford. Pena que, diferente de seu amigo Howard Hawks, Ford não tenha encerrado sua carreira com obras-primas.

CREPÚSCULO DE UMA RAÇA foi seu último western e uma espécie de pedido de perdão aos índios, que sempre foram mostrados em seus filmes como os vilões, os inimigos perversos dos brancos. Depois desse filme, Ford ainda faria O REBELDE SONHADOR (1965) e SETE MULHERES (1966), que eu infelizmente não consegui cópias e que devo ver, quem sabe, em outra oportunidade. O tom épico de CREPÚSCULO DE UMA RAÇA já se percebe de início, já que antes do filme temos um overture, como era comum nos épicos produzidos nos anos 60 e que meio que envelheceram. O overture é uma forma de preparar os espectadores para o clima do filme, ouvindo-se durante alguns minutos apenas música. Como o filme é longo, há também uma pausa lá pelo meio, chamada de intermission e um retorno, também com música por alguns minutos, enquanto o público volta aos seus lugares, chamada de entr'act. O filme foi fotografado em technicholor e em scope 70 mm. Todo esse luxo, além da presença de coadjuvantes do porte de James Stewart e Edward G. Robinson, dá uma dimensão da grandiosidade e da pretenção do projeto.

O protagonista é Richard Widmark, que se comporta e fala no filme como se estivesse imitando John Wayne. Ele é o Capitão Thomas Archer, encarregado de tomar de conta de uma reserva indígena de uma tribo Cheyenne. Como naquela época, boa parte dos índios haviam sido mortos pelos brancos, esses cheyennes viviam sob os cuidados desses militares, além de receberem aulas de inglês e matemática de uma professora quaker, interpretada pela bela loira Carroll Baker, sex symbol nos anos 60 que chegou a trabalhar em alguns gialli na Itália também. Mas voltando aos índios, o problema é que eles estavam passando fome e completamente insatisfeitos com o tratamento dado pelos militares. Por isso, eles resolvem sair de lá. E é aí que começam os problemas, já que o Capitão Archer tem ordens de mantê-los lá e vai ao encalço dos danados. Pra completar, como os índios ainda eram vistos como inimigos em grande parte do território americano, mesmo mendigando pão, eles acabam recebendo bala de alguns caubóis.

Suspeito que se o filme legendasse as falas da língua indígena, teríamos uma melhor visão do pensamento deles. Por isso, apesar da tentativa de equilibrar os pontos de vista dos brancos e dos índios, a narração em tom solene de Widmark não nega que o ponto de vista é mesmo dos brancos. Vai ver a idéia foi mesmo essa, pois logo no começo do filme Widmark diz que o objetivo do filme é mostrar um acontecimento que aparecia apenas como nota de rodapé nos livros de História. De todo modo, apesar de um atraso de 14 anos em relação a FLECHAS ARDENTES, de Delmer Daves, o filme de Ford, ainda que com certo esforço, homenageia a bravura de uma raça. No mais, o filme é bem irregular e o personagem de James Stewart, no papel de Wyatt Earp, parece não ter função na trama, apesar de roubar a cena quando aparece, dando um sopro de alegria ao filme, que no geral é bem triste. Mas o que se podia esperar de um filme crepuscular de um diretor como John Ford?

sábado, novembro 03, 2007

O ESTRANHO DE CINCINNATI (John from Cincinnati)



Série de tv é uma coisa que a gente só acompanha quando gosta. É diferente de um filme que, quando é ruim, agüenta-se até o final pois só tem cerca de duas horas de duração. Série, não. Quando a série é ruim, ou melhor, quando a gente não está mais curtindo a série, o melhor a fazer é parar de acompanhá-la. Como eu fiz com essa segunda temporada de HEROES, por exemplo. Dois episódios foram suficientes pra eu ver que não dava mais. O ESTRANHO DE CINCINNATI (2007) é um belo exemplo de série chata. Mas como ela começou a ficar muito chata lá pela metade e eu sabia que ela iria durar apenas dez episódios, resisti bravamente e fui até o final, devagarinho, até porque estava curioso para saber como aquela confusão toda ia acabar.

Confusão, eu digo no pior sentido, já que a série não faz o menor sentido. Deve fazer sentido para o criador da série, David Milch, também criador de DEADWOOD (2004-2006), série que eu, "coincidentemente", desisti de ver depois de alguns poucos episódios. Achava-a chata e monótona, apesar de ter personagens lendários da história americana e de mostrar o velho oeste de uma maneira original. Mas de que adianta ser original se a estória se arrasta como uma lesma e as coisas parece que não chegam a lugar nenhum? No caso de O ESTRANHO DE CINCINNATI, então, Milch quis dar uma de David Lynch e se ferrou legal. Só existe um David Lynch. E lá pelo final, Milch e sua turma parece que resolveram chutar o pau da barraca de vez. Se no começo, ao menos os diálogos familiares tinham algum sentido, lá pelo final, nada mais fazia sentido. Talvez eles tenham feito isso depois que souberam que a série seria cancelada e quiseram se vingar dos executivos da HBO, fazendo episódios que todos iriam odiar.

No começo, até que a série era intrigante. Tinha esse John (Austin Nichols), um rapaz que apareceu do nada e ficava dizendo que o fim estava próximo e coisas como "some things I know, some things I don't". Inclusive, eu até gostei dessa frase, deu até pra adotar em algumas ocasiões. Esse tal John repetia frases que os outros diziam feito um papagaio. Butchie Yost (Brian Van Holt), um junkie cuja carreira de surfista profissional havia ido para o brejo, logo o adotou como amigo da família e passeava pelos cantos com ele. A influência de John nas pessoas que o rodeavam começava a ser sentida. Butchie perdeu o vício na heroína, seu pai (Bruce Greewood) passou a levitar (!) e o filho de Butchie, Shaun, adquire a estranha capacidade de ressucitar passarinhos (!). A matriarca da família e primeiro nome nos créditos é Rebecca De Mornay. Quem diria que ela já estaria fazendo papel de avó. Mas uma avó jovem, encrenqueira e briguenta, é bom esclarecer. Tem mais uma série de outros personagens, mas a maioria deles são muito chatos, como aqueles dois carecas que moram juntos, ou aquele milionário gay, ou o advogado, ou o latino (Luiz Guzman). Até o personagem de Luke Perry é chato pra cacete. Uma das poucas personagens que eu gostei foi a videomaker Cass, interpretada por Emily Rose. Ela aparece sempre com aquele olhar de inocência ou de tristeza que me faz lembrar a Carolina Dieckmann. A personagem da mãe de Shaun também é interessante, talvez por ser uma atriz pornô.

A grande quantidade de personagens sem função e que vão aumentando com os episódios dá a impressão de que a intenção inicial de David Milch era de criar uma série que durasse mais temporadas. Não faz sentido criar um monte de personagens - a maioria deles, muito chatos - numa trama nonsense para durar apenas dez episódios de uma hora de duração. Um detalhe interessante é que dificilmente eu conseguia ver um episódio inteiro sem dar uma cochilada. Mas bastava eu trocar de programa, colocando um episódio do HOUSE ou de BIG LOVE no lugar que logo eu acordava. Tudo leva a crer que Milch queria fazer uma espécie de TWIN PEAKS na praia, no sentido de que havia um mistério e haviam muitos personagens e muitas coisas pareciam não ter sentido algum. Mas é isso aí, importante é que eu consegui chegar ao final dessa série chata e modorrenta. Eu merecia uma medalha.

P.S.: Tem link novo na lateral esquerda: o Sweet Shirts, da Socorro Araújo, fotolog com várias estampas para camisetas. Eu já providenciei duas pra mim. :)

sexta-feira, novembro 02, 2007

COISAS SECRETAS (Choses Secrètes)



Tem coisa mais excitante do que ver duas mulheres se beijando, se acariciando? E tem coisa mais bonita do que ver uma mulher tendo um orgasmo, mesmo que ela esteja fingindo? Pode até ter mas ao se pensar nessas duas coisas fica difícil - para os homens - imaginar algo mais belo. Digo, do ponto de vista mundano, carnal. E nesse sentido, COISAS SECRETAS (2002) é um dos filmes mais "elevadores" que eu já assisti - se é que vocês me entendem. Mais até do que os filmes de Tinto Brass, já que Brass é meio "bagaceira" e Jean-Claude Brisseau é um cineasta sofisticado, com movimentos de câmera elegantes, travellings deslumbrantes e as atrizes são apaixonantes. O filme ganhou fama por causa de um processo judicial sofrido por Brisseau. Ele havia contratado outras duas atrizes, que começaram a se sentir usadas, como se estivessem participando de um filme pornô degradante. As atrizes, ele despediu. E talvez tenha sido melhor assim, já que as duas que ele conseguiu para o filme são maravilhosas.

Coralie Revel, a morena, é Nathalie. O filme começa com ela dançando nua de maneira muito sensual. Vez ou outra ela toca sua genitália como se estivesse se masturbando. Com a câmera se posicionando para a direita, notamos que ela está num bar e aquilo ali é um espetáculo. Sabrina Seyvecou é Sandrine, a loira, que trabalha como barwoman e admira Nathalie, tanto pelo seu belo corpo, quanto pela sua coragem em se expor de maneira tão explícita para uma multidão de homens tarados e famintos por sexo. Depois de uma confusão no bar, as duas são expulsas do lugar e Sandrine passa a conhecer melhor Nathalie. Durante uma conversa na casa de Nathalie, ela lhe conta que algumas vezes chegou a gozar durante as apresentações, de tão excitada que ficava com o fato de estar sendo observada. E a partir daquela noite, Nathalie se torna uma espécie de professora para Sandrine. A primeira lição é masturbar-se em frente a ela. A cena é de alta voltagem. Mas isso é só o começo. Uma das minhas cenas preferidas que viria logo a seguir é a cena do metrô.

O filme muda de rumo quando as duas, sabendo de seu potencial de encantar - leia-se "enlouquecer" - os homens, passam a trabalhar numa empresa com o objetivo de seduzir os donos. A partir daí, tanto o filme quanto o destino dessas duas mulheres muda de forma radical, com direito lá pelo final a uma cena de orgia equivalente àquela mostrada por Stanley Kubrick em DE OLHOS BEM FECHADOS. Mas é sempre bom avisar que não se trata de um filme apenas sobre sexo, mas sobre dominador e dominado, sobre sujeito e objeto.

COISAS SECRETAS foi eleito pela revista Cahiers du Cinéma como o melhor de 2002. Foi meu primeiro filme de Brisseau, cineasta que já havia mostrado seu talento em obras como BODA BRANCA (1989) e ANJO NEGRO (1994). Não sei se esses filmes também trazem essa forte carga erótica ou sequer se chegaram a ser lançados no circuito comercial, mas tenho certeza de que se trata de cinema de primeira grandeza. Baixei COISAS SECRETAS para ir me preparando para o filme seguinte do diretor, OS ANJOS EXTERMINADORES (2006), e fiquei encantado. Infelizmente, por causa do processo judicial citado no primeiro parágrafo e que se arrastou até 2005, o diretor demorou esse tempo todo entre um filme e outro. Agora é esperar que OS ANJOS EXTERMINADORES ao menos passe num dos cinemas da cidade. Pode ser que aos poucos, vendo outros filmes do diretor, eu comece a identificar traços entre um filme e outro e assim passe a conhecer melhor o cinema de Brisseau.

P.S.: Cadê PLANETA TERROR, do Rodriguez, que estava prometido para estrear hoje? O que houve?