quarta-feira, junho 30, 2010

5 DOLLS FOR AN AUGUST MOON (5 Bambole per la Luna d'Agosto / Island of Terror)



E depois de nove grandes filmes de Mario Bava vistos por mim, desencantei-me com um trabalho menor do mestre, este 5 DOLLS FOR AN AUGUST MOON (1970), que aparentemente anunciava uma decadência em relação ao seu período glorioso na década de 1960. Alguns até disseram que ele estaria passando o bastão de mestre do horror italiano para o jovem Dario Argento, que no mesmo ano estreava com o clássico giallo O PÁSSARO DAS PLUMAS DE CRISTAL. Mas Bava ainda teria munição. Ainda não vi LISA AND THE DEVIL (1974), que é o trabalho dele que eu mais estou ansioso pra ver, mas ainda tem outros pela frente, já que quero seguir uma ordem cronológica. 5 DOLLS...é provavelmente um dos poucos escorregões em sua carreira.

O filme é uma variação daqueles suspenses de pessoas que ficam presas numa mansão e, aos poucos, cada uma vai sendo assassinada, criando-se um clima de paranoia ao saber que o assassino deve estar entre eles. Como era de se esperar pelo ano em que o filme foi feito, o clima de festa no início tem todo aquele ar libertino que caracterizava o espírito da época. Numa brincadeira do dono da casa, por exemplo, Edwige Fenech é amarrada e a todos na festa é oferecida uma faca numa bandeja. Se não fosse uma pegadinha, o filme poderia seguir um caminho até que bem mais sinistro e interessante. No entanto, Bava opta pelo humor negro, especialmente quando mostra os corpos das vítimas sendo dependurados como animais no frigorífico da casa.

Senti falta do clima fantasmagórico do horror gótico, que é o que mais gosto na obra de Bava, mas não poderia esperar algo do tipo de um filme que tem outra proposta. Se em PERIGO: DIABOLIK (1968), o cineasta já havia demonstrado habilidade com o humor, infelizmente em 5 DOLLS FOR AN AUGUST MOON, o humor (negro) é frustrado por uma trama fraca, pela falta de momentos de real suspense e por personagens rasos e antipáticos. A personagem mais interessante do filme é a loirinha que não faz parte do grupo, a que fica na ilha, matando as pessoas. Quase uma versão crescida da criança-diabo de MATA, BEBÊ, MATA (1966), forçando um pouco a barra.

Edwige Fenech, uma das principais estrelas do filme, foi posta novamente sob os holofotes nos últimos anos, graças à sua aparição/homenagem em O ALBERGUE 2, de Eli Roth.

terça-feira, junho 29, 2010

SEIS CURTAS (MOSTRA OLHAR DO CEARÁ)



E o Cine Ceará deste ano já acabou pra mim. Resumiu-se a um longa-metragem da mostra do Ruy Guerra - FÁBULA DA BELA PALOMERA, que deixarei para comentar em outra ocasião - e aos seis curtas vistos na Mostra Olhar do Ceará. Sequer pus os pés no Cine São Luiz, mas suspeito que o festival esteja sendo prejudicado pela Copa do Mundo. Além do mais, bem que a produção do festival podia ter colocado alguma coisa na programação da noite de sábado, que ficou ociosa, não sei por quê. O fato é que desde que o festival passou para ibero-americano que eu deixei de ter tanto interesse. Gostava quando eram só filmes brasileiros. Os filmes estrangeiros e de diretores desconhecidos são um tiro no escuro. E como eu quase sempre encarei o festival mais como um evento social, quando não tenho companhia para ficar esperando os curtas e os longas da noite, acabo me desestimulando e prefiro ficar em casa mesmo.

Foi a primeira vez que vi os curtas da Mostra Olhar do Ceará. E a razão de eu ter ido foi um filme dirigido por uma amiga, na programação de domingo. Não tinha até então prestigiado esses curtas, até por certo preconceito, já que eles são os que não passaram pelo crivo do júri para exibição na mostra competitiva, mas que conseguem espaço para exibição numa sala menor, no caso, do Espaço Unibanco Dragão do Mar. Vamos por ordem de exibição, então.

ROCHEDO DE MIM

Filmado em beta, talvez seja o tipo de filme que seria melhor apreciado se produzido numa bitola de qualidade superior. De preferência, película. Isso porque no final há um plano geral de uma casa e arredores que dura aproximadamente uns cinco minutos com a câmera estática. Como não dá pra ver direito o que está acontecendo nos mínimos detalhes, a impressão é de que não está acontecendo nada. Bom, a verdade é que eu não entendi o filme. Direção de Bárbara Villa.

NO CASO NÃO USE

Outro experimental, com duração de apenas um minuto. E com tal duração, não dá nem pra comentar nada, a não ser que é um filme sobre a visão do todo em detrimento da visão da parte. Ou não? Direção de Alex Fedox.

PRETO QUENTE COM BURACO NO MEIO

Sem dúvida, o mais engraçado da seleção. Não sei porque um filme desses não é aprovado para a mostra competitiva. Emula os filmes mudos, inclusive com o uso do preto e branco e das cartelas com diálogos. Que poderiam ter passado por uma revisão ortográfica para corrigir alguns erros. Mas o filme comunicou muito bem com a plateia, que riu e gargalhou com as piadas. No enredo, uma mulher bonita pede para um homem simples da roça reformar a sua casa, caindo aos pedaços. Ela não tem dinheiro, mas poderia pagar com outra coisa. O homem ficou logo animado com as características do pagamento: preto, quente, com um buraco no meio. Um tipo de curta que eu gostaria de ter uma cópia para mostrar para os amigos. Direção de Beto Gaudêncio.

AÉLIO CULTURA NA RUA

Típico trabalho de incentivo a pessoas que moram em periferia e que deveriam canalizar suas energias para o trabalho ou a arte. Vemos o caso de um rapaz do bairro do Barroso, em Fortaleza, que se dedica ao grafite. Um trabalho que não diz muito mais do que o óbvio, apesar das boas intenções. Direção de Ednaldo Felipe de Sousa.

O CINECLUBISMO NO BRASIL POR: FELIPE MACEDO

São treze minutos de monólogo com Felipe Macedo, estudioso dos cineclubes no Brasil. Tem o seu interesse, principalmente para os interessados na história e nos principais cineclubes do Brasil. Ele cita, inclusive, alguns cineastas que foram "formados" dentro de cineclubes e não em cursos de cinema. É um curta que começa a ficar chato antes dos dez minutos. Direção de Alex Fedox.

AS COISAS SÃO BONITAS NOS OLHOS DE QUEM ACHA

E finalmente chegou o tão aguardado curta de Juliana Chagas. Já tinha visto em sessão privada, mas ver no cinema, com um público diverso e estranho, sala lotada com gente em pé e outros sentados no chão, é outra coisa. É a prova de fogo do trabalho em relação ao público. E que bom que Dona Dica (foto), a protagonista do curta, estava lá presente. E pôde ver as reações calorosas não só dos vários amigos da diretora que estavam lá presentes para prestigiar o trabalho, mas também de outras pessoas que riram e se divertiram com essa figura tão carismática. Dona Dica é uma artesã. Faz bonecas bem fora do convencional na cidade de Guaramiranga. O curta fecha com Dona Dica cantando "Boneca Cobiçada", do repertório de Milionário e José Rico. Para eu não me repetir, quem quiser ler mais detalhes sobre o curta, é só dar uma olhada nos arquivos do mês de maio. Mas vale dizer aqui que o trabalho de Juliana Chagas foi ovacionado com o maior número de palmas, assovios e gritos de u-hú do público no final. Emocionante.

No mais, foi muito bom encontrar os amigos em comum com a Juw: Valéria, Davi, Elis, Manoel, Daniel, Max, Zezão e Deise. Babita e Erika chegaram atrasadas e não pude vê-las, pois saí de fininho com parte da turma, que estava a fim de ver o jogo da Argentina. Mas, se não vi a Babita, não tive como não reconhecer as suas gargalhadas durante os melhores momentos da sessão. :)

segunda-feira, junho 28, 2010

BRILHO DE UMA PAIXÃO (Bright Star)



Interessante a trajetória de Jane Campion. Quando o tom de seus filmes parecia se voltar para algo mais visceral e moderno, como em FOGO SAGRADO! (1999) e EM CARNE VIVA (2003), ela dá um passo atrás e volta com o andamento lento de RETRATO DE UMA MULHER (1996) e O PIANO (1993). Talvez para filmes de época ela prefira assim. E não vejo nenhum problema com isso, a não ser o fato de ela não conseguir expressar de maneira pungente a dor de suas personagens. Fica na retina uma beleza plástica, uma sutileza que lembra até alguns trabalhos de Luchino Visconti - ainda que seja até exagero ficar comparando Campion com Visconti. Independente de comparações, BRILHO DE UMA PAIXÃO (2009), o mais novo filme da diretora neozelandeza, retrata o amor de uma jovem mulher por John Keats, considerado o último e maior dos poetas românticos ingleses que, como tantos de seus contemporâneos, morreu jovem, devido à tuberculose.

Porém, diferente do que dá a entender quando se estuda o romantismo nos livros, em especial, o ultra-romantismo, John Keats não escrevia sobre o amor impossível porque achava belo, mas porque realmente vivenciava uma paixão complicada. Nas biografias de Keats encontradas nos livros conta-se de sua paixão por uma jovem chamada Fanny Brawne, no filme, vivida pela bela Abbie Cornish, que tem aqui o melhor desempenho de sua carreira. Keats (Ben Wishaw) não tinha dinheiro para casar com Fanny e, para piorar a situação, contrai tuberculose, tendo que se mudar para a Itália, onde passa os seus últimos dias. O que é interessante nos ingleses é a forma como eles conservam aquele ar de nobreza, mesmo estando sem um centavo. Pobres, mas com glamour. Por isso BRILHO DE UMA PAIXÃO lembra as adaptações para o cinema de obras de Jane Austen, a autora do período vitoriano que enfatizava os problemas financeiros de modo quase tão importante quanto as paixões.

BRILHO DE UMA PAIXÃO não traz planos longos, o que de certa forma dá mais agilidade à narrativa. Mas a impressão que fica é de houve muitos cortes, de que poderia ser um filme um pouco mais contemplativo. É como se estivesse faltando mais momentos do casal juntos ou até separados. Nem os poucos beijos que vemos entre os dois parecem carregados de paixão. Principalmente da parte de Keats. Já Abbie Cornish, principalmente nos momentos da ausência do amado, dá um show de interpretação de sua dor, embora tudo seja muito contido, exceto pelas sequências finais. Trata-se de um filme que talvez ganhe com uma revisão, gostando-se dele pelo que é e não pelo que poderia ter sido.

sexta-feira, junho 25, 2010

BRAVURA INDÔMITA (True Grit)



Acho que o tempo que mais acompanhei os trabalhos de Henry Hathaway foi quando eu ainda não tinha o hábito de baixar filmes da internet. Principalmente na primeira metade dos anos 2000, quando eu sempre checava a programação da semana das emissoras e botava o meu videocassete para funcionar durante a madrugada. Até hoje tenho guardado vários filmes gravados em fitas vhs, estragando num quarto que faz as vezes de porão, junto com livros, revistas, cacos e trecos. Evito até entrar lá, por causa da alergia à poeira. Acredito que o fim dessas fitas vai ser o lixo mesmo, já que a maioria dos filmes que eu gravei e ainda não vi, vou conseguir em cópia digital, ainda que em vhsrip.

Mas voltando a Henry Hathaway, o motivo de eu não ter dado mais tanta importância à obra dele se deve ao fato de eu ter preferido privilegiar outros cineastas. Agora posso me dar a esse luxo. O que até pode soar injusto para um dos melhores diretores do segundo escalão da "velha Hollywood". Meus planos antes de me decidir a ver BRAVURA INDÔMITA (1969) era ver outro filme. Que acabou não rolando por causa de um problema com as legendas. Aí me lembrei que o filme de Hathaway ganhará um remake dirigido pelos irmãos Coen e com Jeff Bridges no papel que foi de John Wayne. Foi então que resolvi quebrar o meu jejum de Hathaway e ainda ter o prazer de ver mais uma performance familiar e divertida do velho e bom John Wayne.

E velho é uma palavra bem comum no que se refere ao filme. É um título da "velha Hollywood", dirigido por um velho cineasta e protagonizado pelo maior caubói de todos os tempos: o velho John Wayne. No próprio filme, ele é sempre lembrado de sua idade e até do seu peso. Mas o legal é que tanto o ator quanto o personagem do xerife caolho (Rooster Cogburn) ainda fariam outro filme, chamado aqui no Brasil de JUSTICEIRO IMPLACÁVEL (1975) e dirigido por Stuart Millar. Quer dizer, John Wayne foi duro na queda. Fez filmes até mesmo quando estava muito doente e perto da morte (O ÚLTIMO PISTOLEIRO).

A trama é bastante simples e o filme não tem muitos floreios ou pretensões. Uma jovem resolve se vingar do assassino de seu pai, procurando alguém que se disponha a entrar em território indígena e aceitar a sua oferta em dinheiro. Um velho xerife caolho é o campeão em pegar foras-da-lei e levar para a forca. Um dos momentos mais interessantes e curiosos do filme é quando é mostrado a rotina de um enforcamento em praça pública. Crianças brincando em balanços, outras vendendo doces enquanto a multidão fica esperando a "diversão" do dia. É um momento em que o tão explorado enforcamento público ganha contornos mais interessantes nos westerns. A ação no filme demora praticamente uma hora para começar, mas quando começa chega a ser empolgante.

Outra curiosidade está no elenco, com a participação de Dennis Hopper e Robert Duvall no papel de vilões importantes da trama.

quinta-feira, junho 24, 2010

A SAGA CREPÚSCULO: LUA NOVA (New Moon / The Twilight Saga: New Moon)



Apesar de ter surpreendentemente gostado de CREPÚSCULO (2008), fiquei um pouco assustado com as dimensões que a franquia foi ganhando, principalmente entre o público mais jovem. Então fui adiando e adiando e acabei perdendo LUA NOVA (2009) no cinema. Às vesperas de estrear o terceiro filme, ECLIPSE (2010), resolvi ver em casa o segundo da saga de Bella e sua paixão pelo vampiro Edward. A Saga Crepúsculo tem sido motivo de chacota por muitos, inclusive pelos fãs mais radicais de filmes de horror. O problema é que vampiros e lobisomens não é o que há de mais importante nesses filmes. E sabendo disso, Chris Weitz, o diretor de LUA NOVA, enfatiza a paixão de Bella e o começo da amizade que ela nutre por Jacob, o lobisomem.

Aliás, por que será que tem que ter também lobisomem nessa história? Vampiros e lobisomens é tão ANJOS DA NOITE... Por mais que eu acredite que essa briga já deva remontar à época dos monstros da Universal, a impressão que fica é que alguém anda copiando alguém. TRUE BLOOD, por exemplo, a série de tv da HBO que já guarda várias semelhanças com a Saga Crepúsculo, também apresenta lobisomens nesta terceira temporada, que está indo ao ar há mais de duas semanas nos Estados Unidos. Comparando os filmes com a série, em alguns aspectos eu prefiro a série. Se eu considerar sexo e sangue, fico com a série. Mas se comparo, por exemplo, a protagonista do filme com a da série, prefiro Kristen Stewart a Anna Paquin. Paquin faz um tipo mais vulgar, portanto, mais interessante apenas quando se pensa em sexo, quando se pensa nela nua. Kristen já conquista pelo espírito romântico.

LUA NOVA começa com o aniversário de Bella. Por mais que o namoro com Edward esteja de pé, mesmo com o distanciamento que o próprio vampiro lhe impõe, a garota está triste por estar fazendo 18 anos enquanto o corpo de Edward continua nos seus 17. São apenas 18 aninhos, mas ela se sente uma velha. Quer muito ser transformada em vampira por Edward para juntos serem felizes para sempre. Nem a morte os separaria. Se o primeiro filme destacava a transgressão, o segundo lida com a dor da separação. Edward toma a decisão de sair da cidade, sair definitivamente da vida de Bella. A cena em que ele diz que aquele é o último momento em que ela o verá é bem dolorosa.

O que eu mais gosto no filme é justamente esse tratamento dramático, meio shakespeariano, entre Bella e Edward. Quem curte diálogos ultra-românticos e bem longe do naturalismo que impera atualmente pode gostar também. Gosto também da cena em que a câmera rodopia ao redor de Bella, mostrando a passagem do tempo, a chegada das estações. Gosto das cenas que mostram Bella chorando de dor quando acorda a cada dia. Dor da falta do amado. Que só diminui quando ela passa a se envolver mais com Jacob. Que é uma relação diferente, pelo menos da parte dela. No quesito 'ação', o filme tem poucos momentos, mas mesmo esses momentos são interessantes, como a chegada de Victoria, a vampira inimiga mortal dos Cullens. Nem os lobisomens (um clã de sujeitos que andam sem camisa o tempo todo) chegam a estragar a brincadeira. Enfim, se LUA NOVA não é um grande filme, também não faz feio. E muito do que o filme tem de bom é graças a Kristen Stewart, adorável.

Vamos ver como se sairá David Slade, o terceiro diretor diferente a comandar a franquia. ECLIPSE estreia nos cinemas no próximo dia 30.

P.S.: Hoje começa o XX Cine Ceará. Infelizmente, devido a compromissos profissionais, não vou poder estar presente à noite de abertura. No site oficial, finalmente disponibilizaram a programação.

quarta-feira, junho 23, 2010

ATA-ME! (¡Átame!)



Na lenta peregrinação pela obra de Pedro Almodóvar, finalmente cheguei ao primeiro filme que vi do diretor no cinema: ATA-ME! (1990). Foi no extinto Cine Center Um (adorava aquela sala) e eu fiquei maravilhado especialmente com o visual do filme. E fiquei encantado com Victoria Abril. A atriz, com aquele vestidinho laranja e sem calcinha, mexeu comigo. E que sacana foi Almodóvar em criar aquele submarinozinho na cena da banheira, hein! A imagem de Victoria, de quatro com o vestido, no set de filmagens, era uma das fotos de publicidade do filme. Estampava a crítica que havia saído na revista Set e era um convite tentador. Saí do cinema cheio de boas recordações dos vários pontos altos do filme, mas ainda não era o filme de Almodóvar que me encantaria de verdade.

Diferente do que aconteceu com MULHERES À BEIRA DE UM ATAQUE DE NERVOS (1988), uma obra-prima que me deixou maravilhado recentemente com a revisão, ATA-ME! permaneceu para mim um trabalho menor do cineasta. Deixando claro que qualquer trabalho menor de Almodóvar é digno de toda a atenção. A feliz parceria com o diretor de fotografia José Luis Alcaine (MULHERES À BEIRA...) continua, mas na música ele contrata os serviços do lendário compositor italiano Ennio Morricone. É o primeiro sem Carmen Maura e o começo de uma parceria com Victoria Abril, que duraria três filmes seguidos. Victoria, em ATA-ME!, está no auge de sua forma física e beleza. E teve que se adaptar aos métodos de trabalho de Almodóvar. Tendo, inclusive, que dizer que amava alguém com a convicção que o diretor queria. Almodóvar meio que desprezava o método técnico empregado pelo Actor's Studio.

No começo, achei que o alter-ego de Almodóvar no filme fosse o personagem do velho cineasta, paralisado numa cadeira de rodas, vivido por Francisco Rabal. Em certo momento, ele diz que um filme pessoal é aquele que sai do seu coração ou do seu pau. Algo do tipo. Achei bem interessante o conceito. Mas no livro de entrevistas, "Conversas com Almodóvar", o diretor confessa que é o personagem de Banderas com quem ele mais se identifica. O diretor destaca a dificuldade que ele tem de provar ao outro que o ama, a insegurança, a carência afetiva, características bem presentes em Ricki, o ladrão perturbado que recebe alta do hospital psiquiátrico e sequestra Marina (Abril), ex-atriz pornô e toxicômana. Completamente sem noção, mas com um método que até pode conquistar algumas mulheres, ele sequestra Marina e a deixa amarrada na cama, quando sai para comprar comida ou drogas para ela.

Diria que a cena mais bela do filme é o momento em que os dois fazem amor. Almodóvar prefere explorar os sentimentos, captando a expressão de alegria e prazer do casal em closes, em vez de destacar os corpos ou cenas de nudez mais explícitas. Algo me passou pela cabeça na primeira vez que Ricki e Marina dormem na mesma cama. Ela estava amarrada. Ele poderia se aproveitar disso e pegá-la contra a sua vontade. E isso é algo que é explorado de certa maneira em FALE COM ELA (2002). Mas Ricki pensa que poderia gozar. Vê isso como empecilho. [Lembrando novamente de outro filme, a ejaculação é exposta de maneira bem explícita numa das cenas mais memoráveis de KIKA (1993)]. O final feliz, dentro do carro, é outro momento antológico. Talvez o final mais memorável dos filmes de Almodóvar, justamente por ser feliz. Por não ter aquela melancolia carregada dos melodramas e das canções trágicas que tanto caracterizaram as obras anteriores.

terça-feira, junho 22, 2010

TOY STORY 3D



O primeiro TOY STORY (1995) foi histórico. Acho que poucos filmes de animação me proporcionaram tanto prazer e encantamento. Foi histórico também por ser o primeiro longa-metragem produzido pela Pixar, que definiu um novo rumo para as animações. Depois de TOY STORY, outros ótimos trabalhos foram realizados pela produtora. Inclusive uma continuação, TOY STORY 2 (1999), também dirigido por John Lasseter. Na verdade, tenho pouca lembrança desse segundo filme. Só sei que não senti a mesma magia daquela primeira aventura. A ideia de mostrar brinquedos que têm vida própria mas que fingem ser inanimados para os seus donos de alguma maneira já passava pela minha cabeça quando eu era criança.

Mas não sei o que aconteceu comigo. De uns anos para cá, filmes infantis deixaram de ter a mesma graça para mim. Fica quase impossível fugir do sono. Será que devo culpar a violência a que fiquei tão acostumado? Em animações japonesas, supostamente mais ligadas ao público juvenil, como REBUILD OF EVANGELION, para citar um exemplo recente, eu fico super-ligado. Cheguei a pensar até mesmo no fato de ter passado da idade. Na idade que estou, eu é quem deveria estar levando as crianças para assistir essas animações, pensei eu. Por outro lado, não sei se quero isso pra mim.

Bom, estou enrolando e enrolando, como se para me desculpar pelo fato de não ter gostado de TOY STORY 3D (2010). E de ter achado os efeitos 3D super-fajudos. Não sei se é culpa da sala - vi no Iguatemi e não no Via Sul -, mas o fato é que praticamente não notei diferença entre a projeção 3D para a 2D. Aliás, a diferença que senti foi para pior, pois eles cortam visivelmente as partes superior e inferior da imagem, que ainda por cima fica um pouco mais escura do que o normal. Na verdade, eu nem tinha intenção de vê-lo em 3D. Sempre vi as animações da Pixar dubladas e nunca reclamei, pois o trabalho de dublagem para a Disney é sempre mais caprichado. Foi pura falta de atenção na hora de escolher o horário das sessões. E como já estava lá, encarei o 3D mesmo, até para conhecer a sala do Iguatemi.

Quanto à trama desta terceira aventura de Woody, Buzz Lightyear e cia, a ideia é boa e tem tudo para agradar aos fãs dos brinquedos simpáticos. O dono deles, Andy, já está crescido e empacotando suas coisas para ir para a faculdade. Os brinquedos ficam em polvorosa, doidos para saber o seu destino final. Irão eles para o lixo? Ou irão parar no sótão? Entre os vários brinquedos, escolhendo qual ou quais ele levaria consigo, Andy escolhe o caubói Woody. Os demais, devido a uma confusão, vão parar acidentalmente numa não muito agradável creche. As reviravoltas ora me aborreceram, ora me agradaram, ora me deixaram indiferente. Desse jeito, vou pensar mais de duas vezes antes de ver outra animação em 3D.

Ah, e o curta de abertura da vez é o interessante NOITE E DIA.

P.S.: No próximo dia 27 será exibido o belo curta AS COISAS SÃO BONITAS NOS OLHOS DE QUEM ACHA, da minha amiga Juliana Chagas. O cartaz já pode ser conferido. O filme será exibido na Mostra Olhar do Ceará.

segunda-feira, junho 21, 2010

EM BUSCA DE UMA NOVA CHANCE (The Greatest)



O enredo de EM BUSCA DE UMA NOVA CHANCE (2009) lembra bastante o de O REFÚGIO, de François Ozon. Ambos os filmes mostram jovens mulheres lidando com o fato de ter engravidado de alguém que morreu e de encarar a família do morto, nem sempre simpática. Mas tirando essas coincidências, são filmes completamente distintos. Em qualidade e em tom. O melodrama americano até pode emocionar algumas plateias, mas a sucessão de clichês chega a incomodar. Quem sabe se o filme fosse sobre a relação dos dois namorados, antes do acidente que matou o rapaz, talvez fosse mais interessante do que ficar remoendo o luto da família e tendo que ver mais uma vez Susan Sarandon em desempenho repetitivo de mãe que perdeu o filho - vide NO VALE DAS SOMBRAS e UM OLHAR DO PARAÍSO. Por outro lado, Pierce Brosnan tem se mostrado cada vez melhor em papéis dramáticos. Seu papel, mais contido, ajuda.

No começo de EM BUSCA DE UMA NOVA CHANCE (essa turma que inventa esses títulos brasileiros faz muito bem em permanecer anônima), vemos o resultado de uma noite de amor perfeita, bem como o resultado de ficar com o carro parado no meio da estrada. Excetuando os rápidos flashbacks da garota (Carey Mulligan, o destaque de EDUCAÇÃO) pensando no rapaz, o filme é um chororô sem fim, especialmente da mãe. Duas sequências enfatizam isso: as que mostram o personagem de Brosnan esperando a hora do despertador tocar, seguido do choro da esposa. No mais, o filme não apresenta absolutamente nada de novo, nem utiliza os clichês a seu favor.

Até lembra um pouco alguns trabalhos independentes americanos dos anos 1990 e 2000, mas a família apresentada não é suficientemente disfuncional ou estranha. Ou talvez já estejamos acostumados a famílias imperfeitas. Famílias perfeitas é que são motivo de estranheza nos dias de hoje. Ainda assim, o filme fez algum sucesso de público no Festival de Sundance, e, independente disso, há um bom apelo comercial. O trailer o vende como sendo uma história de amor mais uma história de luto e superação. O que acabamos comprando é apenas metade do que o trailer vende. Mas o pouco que vemos da história de amor dos dois jovens até que é bem bonito. Não é à toa a escolha da última cena. Pelo menos souberam finalizar bem.

sexta-feira, junho 18, 2010

NA HORA DA ZONA MORTA (The Dead Zone)



Mais uma prova de que os filmes de David Cronenberg só melhoram com a revisão, NA HORA DA ZONA MORTA (1983) - que eu provavelmente não teria revisto se não me forçasse a ver e rever a sua obra desde os primeiros filmes - se mostra um dos melhores trabalhos desse cineasta que hoje pode ser considerado um mestre. NA HORA DA ZONA MORTA foi o primeiro trabalho de Cronenberg com um roteiro não escrito por ele. E é considerado por muitos a primeira grande adaptação para o cinema de um romance de Stephen King. Isso, levando em consideração que na época O ILUMINADO, de Stanley Kubrick, ainda não havia sido "canonizado" e que o melhor dos filmes baseados em King era CARRIE, A ESTRANHA, de Brian De Palma. O próprio Stephen King ficou bastante feliz com o resultado do filme, que captou o tom da obra literária, ainda que o cineasta tenha retirado elementos da narrativa, tornando-o essencialmente cronenberguiano.

Lendo o livro de entrevistas "Cronenberg on Cronenberg", fiquei sabendo de alguns detalhes interessantes dos bastidores. O que mais me chamou a atenção foi a realização do roteiro. Andrej Zulawski chegou a fazer um roteiro para o filme! Mas Cronenberg nem chegou a ler. Foi escrito em polonês, depois traduzido para inglês e italiano por Dino Di Laurentiis. Imagina só: o filme escrito pelo Zulawski! Vai ver eu ainda estou com a memória de A MULHER PÚBLICA em mente e fico imaginando um negócio bem doido. Enfim, quem acabou fazendo o roteiro foi um sujeito com pouca experiência chamado Jeffrey Boam.

O que mais destoa NA HORA DA ZONA MORTA dos filmes anteriores de Cronenberg é a falta de uma sexualidade forte. Ela aparece, mas bastante reprimida. Johnny Smith (Christopher Walken), o protagonista, prefere não dormir na casa da namorada. E, diferente do que ocorre em filmes de horror como SEXTA-FEIRA 13 e afins, não é quem faz sexo que se ferra. É justamente o contrário. Ao tentar voltar para casa, o carro de Smith é atropelado violentamente por um caminhão. Ele consegue sobreviver, mas fica vários anos em coma. Quando acorda, a mulher que ele ama (Brooke Adams) já está casada com outro, tendo, inclusive, até um filho. Para completar, ele tem que reaprender a andar e fica caminhando como o monstro de Frankenstein. Mas o mais perturbador de tudo é que ele passa a adquirir um dom (ou uma maldição): prever o futuro (ou o passado) das pessoas que estão próximas a ele.

Apesar de parecer mais convencional dentro da filmografia de Cronenberg, vários temas recorrentes se manifestam, tais como: a modificação físico-mental, a atração do diretor por acidentes automobilísticos - vide ENRAIVECIDA - NA FÚRIA DO SEXO (1977) e CRASH - ESTRANHOS PRAZERES (1996) -, a figura do médico ou cientista sempre interessado na metamorfose de um paciente. Mas vale destacar algo que o próprio Cronenberg falou na entrevista. Ele descreve Johnny Smith como um "marginal; ele se parece com um sujeito comum, mas sabe que não é". E isso me lembrou muito os filmes da fase mais recente do diretor, como MARCAS DA VIOLÊNCIA (2005) e SENHORES DO CRIME (2007).

Depois do sucesso de NA HORA DA ZONA MORTA, foi oferecido a Cronenberg A TESTEMUNHA. Ele não quis, por razões pessoais; ficou com Peter Weir. THE DEAD ZONE também se transformou numa série de tv de sucesso. Já está em sua sexta temporada.

Post dedicado a um dos maiores escritores de todos os tempos: José Saramago (1922-2010).

quinta-feira, junho 17, 2010

QUANTO DURA O AMOR?



Fui ao cinema até bem disposto. Tentando ser indiferente às várias críticas negativas que QUANTO DURA O AMOR? (2009) recebeu. O trailer é atraente. Tem "High and Dry", do Radiohead, tocando (ainda que cantada pela Danni Carlos), tem duas mulheres se beijando, tem personagens à deriva. Soma-se o fato de eu ter boas recordações de Sílvia Lourenço em CONTRA TODOS (2003), outro filme que ela fez em parceria com Roberto Moreira. E o filme até que tem um início bonito, mas isso se deve à referida canção do Radiohead (a própria banda tocando mesmo). Assim, quando vemos Danni Carlos cantando no bar, já dá aquela sensação de cover vagabundo. A cantora é a pior coisa de um filme cheio de falhas. Sua performance como a junkie bissexual porra-louca não convence nem aqui nem na China.

Filmes com várias histórias e narrativas paralelas estão se tornando uma constante. Mas dentro da cinematografia nacional em geral acaba por se confundir com as telenovelas. E é bem o caso de QUANTO DURA O AMOR?, só que sem o "padrão Globo de qualidade". Assim, temos o caso da garota do interior (Sílvia Lourenço) que se apaixona pela cantora junkie (Danni Carlos); do namorado da tal cantora (Paulo Vilhena); da jovem advogada (Anna Clara Spinneli) que guarda um segredo e começa a se relacionar com um colega de trabalho (Gustavo Machado); do homem solitário e poeta que se apaixona por uma prostituta. Basicamente isso, mas para um filme de 80 e pouco minutos de duração é muita coisa. O filme teria que ter algo de experimental ou ter algo mais do que apenas contar uma história.

Se a intenção era mostrar as desilusões da vida, o filme falha consideravelmente. Mas gosto da cena da personagem de Sílvia Lourenço vendo a Av. Paulista da sacada do apartamento com deslumbramento, já que eu sou fã do lugar. A personagem é a estranha que chega num ambiente onde você pode ter a liberdade para ser você mesmo. Livrar-se do cordão umbilical da família, dos amigos, da cidadezinha que sabe tudo sobre você. Ser uma anômina numa grande metrópole. Isso vale para outras capitais também, mas se aplica com muito mais força em São Paulo. A ideia de que a cidade é um lugar cheio de gente deprimida é que não me convence, apesar de ter ouvido alguns depoimentos de pessoas. Mas talvez até seja mesmo. Mas um filme como esse não vai melhor a situação de seus habitantes.

quarta-feira, junho 16, 2010

UM GOLPE DO DESTINO (The Doctor)



Engraçado como minha memória me trai. Não lembrava que já tinha visto este UM GOLPE DO DESTINO (1991) na televisão anos atrás. Na verdade, acho que nem cheguei a ver todo, mas vendo o filme lembrei de ter chorado em uma das sequências finais. Infelizmente, na revisão, o filme não teve o mesmo impacto em mim. Vai ver eu estou mais insensível. Ou talvez por já ter visto muitos bons episódios de HOUSE, que lidam com doenças. Talvez também por ter lido o emocionante livro "Por um Fio", de Drauzio Varella, que conta de forma sensível a experiência do médico com pacientes com doenças terminais. Que eu me lembre, nenhum outro livro me pegou com tanta força no território das emoções. E nem é um livro de um grande escritor.

Quanto a UM GOLPE DO DESTINO, não deixa de ser um belo filme. William Hurt é um cirurgião que não tem contato de proximidade com os pacientes. Meio como o dr. House, mas sem ser tão "filho da puta". Além do mais, o filme não tem tanto tempo como a série para aprofundar melhor o personagem. Mas a duração é suficiente para contar a história de forma competente. O médico tem uns pigarros e descobre que está com um tumor nas cordas vocais. O medo dele é de perder a voz. Ou talvez morrer.

Ficar sem falar é uma barra, mas é fichinha perto de outros problemas muito mais traumatizantes que a gente está mais ou menos acostumado a ver, tanto nos filmes quanto na vida real. O triste caso do crítico de cinema Roger Ebert, por exemplo, é coisa para um filme de doenças épico. Por isso, talvez eu não tenha dessa vez me comovido tanto com o drama do médico. E a subtrama da moça que ele conhece e que está com câncer no cérebro também não me pareceu tão comovente. Mas é interessante o filme ter mostrado o quanto o médico muda depois de passar por tudo isso, não apenas no que se refere à doença, mas à maneira fria como é tratado no consultório.

Lembrei agora de um ex-diretor da empresa onde trabalho. Ele estava com um tumor "benigno" detrás do globo ocular. O tumor já tinha retirado a visão de um de seus olhos. Ele teria que fazer a cirurgia imediatamente se não quisesse perder a visão do outro olho. Para a retirada do tumor tiveram que abrir a cabeça dele. Um dos médicos que trabalhava na empresa na época tinha dito para ele mesmo que as possibilidades de ele morrer eram enormes. Mas ele sobreviveu. E é impressionante como ele se tornou uma pessoa melhor. Mais atenciosa, mais amável. Antes era um sujeito arrogante que fazia questão de humilhar as pessoas, como chegou a me humilhar uma vez. Quando deixou a empresa, aposentado, se despediu de todos numa boa, me elogiou, dizendo que eu era um rapaz esforçado e inteligente. Não deixou de ser emocionante para mim.

Agradecimentos ao amigo Zezão pela cópia. Não por acaso, Zezão é médico.

terça-feira, junho 15, 2010

REBUILD OF EVANGELION 2.22 - YOU CAN (NOT) ADVANCE (Evangerion Shin Gekijôban: Ha)



Assistindo entusiasmado esta segunda parte da reinvenção para o cinema da série NEON GENESIS EVANGELION (1995-1996), me peguei perguntando se as pessoas que não acompanharam a série se interessariam pelos filmes, ainda mais com esse intervalo de tempo tão grande entre eles. É preciso ser muito fã e ficar todo o tempo revendo os episódios para lembrar de detalhes relativos às unidades Eva, às misteriosas conspirações da NERV e a diversos personagens coadjuvantes. Recentemente eu fiz uma comparação com os finais de Evangelion com LOST. Ambas as séries resolveram no último episódio deixar de lado todo os detalhes relativos à ficção científica e mostrar que o mais importante são os personagens, seus sentimentos, seus traumas. A diferença é que houve uma chiadeira geral dos fãs de Evangelion e foi produzido um longa-metragem para cinema para dar um fim de verdade para a série chamado THE END OF EVANGELION (1997). Seria o fim "oficial e defintivo".

Mas não existe nada "oficial e definitivo" no Japão. Tanto que o mangá de Evangelion toma várias liberdades em relação ao anime. Até porque, se fosse igualzinho à série, que graça teria, não é? O fato é que agora é a vez de eles reinventarem tudo de novo. Agora com mais dinheiro no caixa, com mais luxo na concepção dos filmes, e com mais liberdade para mudar o que quiserem. O primeiro filme da série de quatro, REBUILD OF EVANGELION - YOU ARE (NOT) ALONE (2007), não parecia trazer muitas mudanças na estrutura da narrativa. Era praticamente um resumo dos seis primeiros episódios da série. O mesmo não pode ser dito desta segunda parte, que traz até personagens novos, entre outras surpresas.

Para quem não sabe ainda do que se trata, Evangelion é uma série que se passa num futuro apocalíptico onde a capital do Japão já sofreu ataques brutais. Eles chamam o maior deles de 'o segundo impacto' que dizimou boa parte da população de Tóquio. A cidade agora funciona como uma tartaruga, se escondendo numa "concha" para se proteger de eventuais ataques. E esses ataques são feitos por alienígenas chamados de Anjos. Diferente dos anjos da religião judaico-cristã, os Anjos em Evangelion são monstros ou naves ou qualquer coisa de forma diversa. Os principais combatentes dos anjos são "mechas", isto é, aqueles robozões gigantes de filmes japoneses. Acontece que em Evangelion, eles não são exatamente robôs, são criaturas orgânico-robóticas controladas por jovens adolescentes cujo corpo deve ser compatível com as criaturas. Entre eles está Shinji, filho do líder da NERV. Ele sente uma atração pela jovem e estranha Rei, uma menina de cabelos azuis que parece ser despida de sentimentos. Bem diferente de Asuka, a ruivinha que chega para pilotar a unidade 02.

Há muitas sequências bem dramáticas em REBUILD OF EVANGELION - YOU CAN (NOT) ADVANCE (2009), como a de quando Rei corre perigo de vida numa luta contra um dos anjos, com destaque também para as tensões ocorrendo na sala de controle. Outro momento fantástico é quando Shinji se recusa a lutar contra um mecha comandado por Asuka e o comandante Ikari instala uma espécie de dispositivo onde o Eva controla a sim mesmo. Para desespero de Shinji e dos espectadores, que temem pela vida de Asuka. Afinal, com a reinvenção, tudo pode acontecer, até mesmo a morte de uma personagem importante da mitologia original! E esse é um dos grandes trunfos do filme. Entre outros tantos.

A cópia que eu consegui era um arquivo enorme. Mais de 4 Gb, em formato mkv. Mas depois da demorada conversão para dvd, o resultado é maravilhoso. Foi a primeira vez que eu vi Evangelion em som 5.1. E eu adianto: as seis saídas de som funcionam maravilhosamente. As caixas traseiras trazem ruídos e detalhes bem interessantes e o barulho das explosões e dos ataques dos Anjos são deliciosamente assustadores saindo do subwoofer.

Agradecimentos ao Diego Beneton, que me ajudou a encontrar essa cópia.

segunda-feira, junho 14, 2010

ESQUADRÃO CLASSE A (The A-Team)



O prólogo de ESQUADRÃO CLASSE A (2010) é animador. Lembrou-me muito o entusiasmo, o vigor e o bom humor dos dois filmes das Panteras dirigidos pelo McG. Só que no lugar da sensualidade e da graça das meninas, a adaptação para a telona da série de tv dos anos 80 resultou em muita testosterona. Afinal, acompanhamos a desenvoltura de quatro rangers, soldados de elite do exército americano, especializados em missões especiais. Na verdade, no caso desse grupo, mais do que especiais: absurdas. O que consta no cartaz do filme, de que não há plano B, se dá porque, no cinema, até colocar um tanque dentro de um helicóptero e depois sair atirando com ele em queda livre (ou quase, por causa dos pára-quedas) dá certo se o roteirista quiser. Na grande lista de produtores do filme aparecem os nomes dos irmãos Ridley e Tony Scott.

Joe Carnahan, cineasta superestimado no começo da carreira com NARC (2002), se sai bem com este barulhento e movimentado filme, que tem como vantagem o fato de nunca se levar a sério. Se o espectador entrar no espírito do filme, dá pra se divertir, conhecendo ou não a série original. O elenco está bem e o filme começa apresentando os personagens principais de maneira bem dinâmica, com rock and roll no talo, dando para sentir a cabeça dos espectadores se mexendo ao som da música. Pena que em nenhum outro momento o filme apresente o mesmo brilhantismo do prólogo.

Liam Neeson comanda o bando, no papel de John "Hannibal" Smith. Bradley Cooper é o bonitão do grupo, Templeton "Cara-de-Pau" Peck. Juntam-se a eles, logo no começo, o B.A. (Quinton Jackson), que é uma das maiores marcas da série, com seu corte de cabelo meio moicano. Ingressa no grupo em seguida o louco capitão Murdock (Sharlto Copley, de DISTRITO 9), um dos personagens mais divertidos do filme. Jessica Biel é a sensual agente do FBI que passa a perseguir o grupo, especialmente depois que eles são alvo de uma conspiração e presos, para depois fugirem. A participação de Biel é mais do que bem vinda. Ela é sempre um colírio para os olhos. A superprodução faz jus à sua beleza, especialmente na cena em que ela e Cooper estão trancados numa daquelas cabines de tirar fotos, o melhor momento dos dois. Mas esse tipo de momento é uma exceção num filme que privilegia a ação. Pena que chega uma hora que isso cansa.

sexta-feira, junho 11, 2010

O REFÚGIO (Le Refuge)



Encerrando hoje a série de posts sobre o Festival Varilux do Cinema Francês com uma obra de François Ozon. Nada mal. Como não pude ver O PROFETA por causa do horário de trabalho, O REFÚGIO (2009) era o mais aguardado por mim. Tanto que fiz minha programação praticamente em função dele. Atualmente, Ozon é o cineasta francês da geração surgida nos anos 1990 de quem eu mais vi filmes. O REFÚGIO é o nono trabalho dele que eu vejo. Falta eu ver ainda SITCOM - NOSSA LINDA FAMÍLIA (1998), LES AMANTS CRIMINELS (1999) e o ainda inédito no circuito comercial RICKY (2009). Só agora começo a me familiarizar com seus temas, com seu estilo, com seu andamento. Uma coisa que pude notar entre os trabalhos mais recentes de Ozon foi uma mudança de um cinema mais ligado ao humor e à sátira para o melodrama, que começou pra valer a partir de O AMOR EM 5 TEMPOS (2004), mas que já teve um bom ensaio com SOB A AREIA (2000). Tem-se notado uma tendência à melancolia. E ainda que o meu filme favorito de Ozon ainda seja uma comédia, tenho adorado seus últimos trabalhos.

Quanto à cópia exibida no festival, vai ser mais um lenga-lenga da minha parte. Mas o fato é que se a gente não reclamar, nada vai mudar. Aliás, pode até mudar pra pior. No caso de O REFÚGIO, pelo menos respeitaram a janela correta do filme, em scope, e o vimos em letterbox. De todo modo, a imagem pelo menos não estava tão escura e o filme tem um andamento tão agradável que logo isso deixa de ser um problema. Trata-se do drama de uma garota (Isabelle Carré) cujo namorado morre de overdose de heroína. Ela também havia se aplicado na noite anterior, mas o namorado tomou mais e veio a falecer. Ela está grávida e a família do rapaz prefere que ela tire a criança. (Interessante notar que, em países como Estados Unidos e França, o aborto, pelo que eu vejo nos filmes, é legalizado.) Acontece que ela prefere não tirar o filho. Em sua cabeça, ficar com a criança seria uma forma de perpetuar um pouco o homem que ela amava.

Quem vai visitá-la em seus momentos de barrigão é o irmão do falecido, um rapaz assumidamente gay, que, aliás, é um elemento bem comum na obra de Ozon, que em muitos momentos mostra personagens homo ou bissexuais. Inclusive, a cena do sexo entre dois homens e uma mulher em O TEMPO QUE RESTA (2005) é uma das coisas mais belas já filmadas pelo diretor. A liberdade sexual, tão presente em seus filmes, aparece no novo filme na figura de Paul (Louis-Ronan Choisy), que passa uns dias com ela na casa de praia e ainda arranja um namorado por lá. Optando desta vez por uma simplicidade temática, Ozon consegue um resultado muito mais belo e sensível. As cenas na praia são muito bonitas. E como praia lembra Rohmer, eu diria que a presença curta mas marcante de Marie Rivière soa como uma homenagem a esse que é um dos cineastas mais queridos entre os cinéfilos. E se antes Ozon me deixava um pouco com o pé atrás, agora posso dizer que sou seu fã.

quinta-feira, junho 10, 2010

O DIA DA SAIA (La Journée de la Jupe)



Quando eu vi a sinopse de O DIA DA SAIA (2008) até fiz uma brincadeira, dizendo que queria ver o filme para ver se rolava alguma identificação com a protagonista. Isso porque em mais de quinze anos de docência, eu nunca peguei uma turma tão difícil, principalmente no aspecto disciplinar, quanto a que eu peguei este ano na escola. Trata-se de um grupo de perturbadores da ordem, que parece que vêm para a escola com o objetivo de sabotar a aula, mexer com os nervos dos professores, desafiar a autoridade deles. Cheguei a ser ameaçado por um dos alunos, inclusive, quando o levei à diretoria semanas atrás. Eu sei que a vida deles não é fácil, como pude ler em algumas das redações sobre a infância que pedi pra eles redigirem. Mas a vida das crianças e adolescentes do passado também não era. E eles recebiam tratamentos de terrorismo nas escolas, com palmatória e humilhações, como ajoelhar no milho ou coisa parecida. Pelo menos é o que a minha mãe conta.

A democratização do ensino nas grandes cidades acabou por gerar esse monstro que é a instituição escolar hoje. Também tenho a mania de culpar a geração atual. Costumo dizer que o futuro é dos nerds e das mulheres, teoria que fui construindo depois de ver o ótimo documentário PRO DIA NASCER FELIZ, de João Jardim. Há também o caso da convivência com o meu sobrinho de 15 anos, que não quer saber de estudar de jeito nenhum. Abandonou completamente a escola há uns três anos. Não sei se ele vai abrir os olhos em alguns anos ou se é o modelo de escola como a conhecemos que já está vencido para as novas gerações. Mas se ao menos eles aproveitassem o seu tempo de maneira produtiva... Como Truffaut, que fugia das aulas para ir à biblioteca ou ao cinema. Em vez disso, a juventude de hoje trata de massacrar a língua portuguesa em sites de relacionamento ou em chats. Não sei se a geração dos meus pais pensava o mesmo dos mais jovens, mas pelo menos de uma coisa eu tenho certeza: a minha mãe teve muita sorte com os filhos que teve, que nunca deram trabalho para ela com os estudos, sempre tirando as melhores notas. Pena que não tivemos a sorte de estudar em escola particular. Teríamos rendido bem melhor. Mas tudo bem.

A situação caótica das escolas públicas na França, especialmente em Paris, já havia sido muito bem radiografada no premiado ENTRE OS MUROS DA ESCOLA, de Laurent Cantent. Saí da sessão desse filme com dor de cabeça. É ver a experiência frustrante de se tentar dar aula para um grupo de jovens selvagens. Mais ou menos o que estou enfrentando agora. O DIA DA SAIA, de Jean-Paul Lilienfeld, mostra Isabelle Adjani em situação semelhante. A escola é composta por muitos garotos e garotas pobres, a maioria descendentes de africanos da África árabe. O problema do filme é que mal vemos os alunos aprontando e já começa logo a situação de a professora encontrar uma arma na bolsa de um aluno, surtar e fazê-los de reféns meio que sem querer. O drama tenso começa muito cedo e se estende por tempo demais. Assim, O DIA DA SAIA se torna uma espécie de ENTRE OS MUROS DA ESCOLA encontra UM DIA DE FÚRIA. E, com a chegada da polícia, a autorreferência ao filme A NEGOCIAÇÃO se torna uma brincadeira explícita. E não digo nada disso como um elogio.

Pra encerrar, não posso deixar de reclamar - mais uma vez - do problema da cópia digital tosca. A de O DIA DA SAIA é a pior de todas. Como se já não bastasse o filme ser ruim, a cópia escura e sem nitidez dá dor de cabeça. Ainda bem que o próximo filme que eu veria na sessão dupla compensaria o desgosto.

P.S.: O curta DE VOLTA AO QUARTO 666, produzido pelo amigo Davi de Oliveira Pinheiro e dirigido por Gustavo Spolidaro, ganhou o prêmio "melhor curta-metragem documentário" no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, que aconteceu na noite do dia 8. Quem ainda não viu o curta, imperdível, com participação de Wim Wenders, pode vê-lo por inteiro no Vimeo.

quarta-feira, junho 09, 2010

COCO CHANEL & IGOR STRAVINSKY



Talvez, dentre os filmes exibidos no Festival Varilux 2010, COCO CHANEL & IGOR STRAVINSKY (2009) seja o mais prejudicado com essa escolha econômica e muitas vezes criminosa do suporte digital da Rain. A princípio, começa em formato letterbox (o filme é em scope), mas isso só dura até o final dos créditos iniciais. Depois, os lados da imagem são cortados. Mas isso pra mim incomoda menos do que a imagem escurecida e sem contraste, que piora ainda mais em superproduções que usam muitas imagens escuras. Tentando relevar esse fato - o que é difícil, pois demora um pouco para se acostumar a uma imagem que deveria ser veiculada de outra maneira, sem falar que com certeza, visto em casa, de um dvdrip, a qualidade seria muito melhor -, resta tentar aceitar e procurar gostar do filme daquele jeito mesmo.

Infelizmente eu já tenho um outro problema: das poucas superproduções de época francesas que vi, a única que lembro de ter gostado foi A RAINHA MARGOT. E isso foi lá nos anos 90. Tenho péssima lembrança de PIAF - UM HINO AO AMOR e até mesmo do relativamente elogiado drama de guerra DIAS DE GLÓRIA. Mas talvez isso seja bobagem de minha parte, acostumado que estou a produções mais modestas vindas da terra de Truffaut. Na verdade, o filme de Jan Kounen, do estiloso e violento DOBERMANN (1997), com Vincent Cassel e Monica Bellucci, até poderia tirar essa minha cisma, do mesmo modo que o ótimo FAÇA-ME FELIZ o fez em relação às comédias.

Que tal enumerar os demais problemas do filme? A começar pela atriz que faz a famosa estilista Coco Chanel (Anna Mouglalis). Deve ser bem melhor do que a chatonilda da Audrey Tatou, mas ainda assim ela faz uma personagem tão esnobe e despida de simpatia (ela dá um sorriso durante o filme em algum momento?) que só resta ao espectador a indiferença. Quase o mesmo pode ser dito de Mads Mikkelsen, que interpreta o compositor e pianista russo Igor Stravinsky. Parece que o cara ainda carrega a figura do vilão que fez em 007 - CASSINO ROYALE, de tão carrancudo que é. Não achei muito interessante ver o caso de um carrancudo com uma antipática. As cenas de sexo, então, são tão frias que chegam a causar bocejos.

Engraçado que, procurando alguma coisa sobre o relacionamento dos dois na biografia de ambos no wikipedia, em nenhuma parte os seus nomes são mencionados. E a bio de Stravinsky até que é grandinha. Quer dizer, se houve mesmo um relacionamento entre os dois, não significou muita coisa. O filme - e o livro no qual é baseado - é que tentam dar um viés mais importante a isso. Principalmente quando os mostram velhinhos caquéticos, como se a vida tivesse passado depois que eles se separaram e nada mais tivesse acontecido. O que eu imagino que seja apenas uma licença poética, com a finalidade de tornar a plateia sensibilizada e iludida. Pra mim, foi tudo em vão. Inclusive o meu tempo e o meu dinheiro gastos. Mas isso faz parte de quem arrisca em festival. O que não significa que COCO CHANEL & IGOR STRAVINSKY não vá agradar a outras pessoas, pelo que eu ouvi de comentários na sala de exibição de gente que já tinha visto o filme e gostado bastante.

terça-feira, junho 08, 2010

FAÇA-ME FELIZ (Fais-Moi Plaisir!)



Sempre tive certa resistência às comédias francesas. Exceto AS FÉRIAS DO SR. HULOT, de Jacques Tati, até a tarde do último sábado, eu nunca tinha gargalhado com tanto prazer em um filme francês antes. Sempre achei o humor dos franceses muito estranho. Não me refiro a comédias para sorrir e refletir, como as maravilhosas dirigidas por Eric Rohmer, mas a filmes feitos para fazer uma plateia inteira rachar o bico, coisa rara ultimamente até mesmo entre as comédias americanas. E eis que FAÇA-ME FELIZ (2009), do ator e diretor Emmanuel Mouret, conquista de vez os espectadores presentes no Espaço Unibanco Dragão do Mar. Primeiro, ao vermos as tentativas de Mouret de transar com a esposa assim que acorda. E ela sempre arranjando uma desculpa. Nesses momentos, o primeiro comediante que vem à mente é Jerry Lewis. Vemos o quanto Mouret bebeu na fonte do gênio da comédia americana dos anos 50 e 60.

Além de Lewis, Mouret presta tributo às screwball comedies americanas. A cena do zíper na festa remete a LEVADA DA BRECA, de Howard Hawks. Mas também remete a Charles Chaplin e a Buster Keaton. E outras cenas até ao Woody Allen da primeira fase, já que eu também me lembrei de algumas presepadas de Kramer e George em SEINFELD, que por sua vez são herdeiros do humor de Allen. Mas é importante dizer que não se trata de uma mera colagem do que de melhor se fez na comédia ocidental nas últimas décadas. Mas de uma reinvenção. Afinal, não existe bem uma fórmula para se fazer rir. Não é fácil. E Mouret conseguiu fazer isso muito bem. Não à toa que já faz um bom tempo que ele é sucesso na França. E que bom que ele está sendo descoberto no Brasil.

A própria trama de FAÇA-ME FELIZ já é, por si, só bastante divertida. Desconfiando que o marido (o próprio Emmanuel Mouret) está à beira de traí-la, a esposa (a bela Frédérique Bel) prefere que ele, a fim de salvar o casamento, transe logo com a tal mulher com quem ele trocou telefones. O personagem de Mouret é meio bobão, vai sendo levado pela maré das circunstâncias, que o levam a locais que ele jamais iria imaginar, a partir do momento em que ele encontra Elisabeth (Judith Godrèche), que mora numa mansão e é filha de um dos homens mais importantes do cenário político francês. Mas é impressionante como Aneth, a empregada da mansão (Déborah François, que fez o seu début em A CRIANÇA, dos irmãos Dardenne), rouba a cena a cada aparição sua, por mais discreta que seja. Não por acaso, ela acaba desempenhando um papel bem maior do que o esperado lá pelo final do filme.

Depois de FAÇA-ME FELIZ, acho que é o caso de ir atrás dos filmes anteriores de Mouret. E pra quem ainda tem chance de ver o filme na Mostra Varilux, não perca! Pra quem prefere esperar pelo lançamento comercial, fique de olho, pois parece ser uma dessas pérolas que poucos têm ideia do valor e que não deve passar muito tempo em cartaz.

segunda-feira, junho 07, 2010

UM NOVO CAMINHO (Le Dernier pour la Route)



Um dos poucos contemplados com a possibilidade de ser visto em película do Festival Varilux 2010, UM NOVO CAMINHO (2009), primeiro longa metragem dirigido por Philippe Godeau, é um filme que pode ser visto como uma obra destinada a passar em grupos de A.A., mas que pode ser visto também como bem mais do que isso. Só pelo fato de vê-lo logo após a cópia digital escura e mutilada de HADEWIJCH, ver um filme em película e scope já era por si só um alívio e um prazer, apesar das trapalhadas do projecionista no início da sessão. Mas eu não atribuiria o sucesso do filme a esses fatores apenas. Na verdade, tem também o fato de eu ter convivido com uma pessoa alcóolatra durante muito tempo: meu pai. Sei o quanto isso prejudicou a nossa relação e prejudicou também a ele, que terminou os seus últimos anos praticamente abandonado, pois havia se tornado um estranho. Mas não vou querer transformar isso aqui numa sessão de psicanálise. Portanto, concentremo-nos no filme.

UM NOVO CAMINHO foi o primeiro filme que eu vi exclusivamente dedicado ao tema da dependência ao álcool dentro de uma clínica. Sem pressa, sem mostrar um protagonista preso contra sua vontade. Quem estava ali, estava por vontade própria, ainda que o desejo de sair de lá e encher a cara no primeiro bar que encontre seja enorme. Deixando claro que, em nenhum momento, o filme mostra a bebida como algo maligno e que não deve ser ingerida de modo algum; mas mostra o alcoolismo como doença, algo que talvez já nem seja questionado. Digo isso para deixar claro que o filme não tem aquele ranço moralista que muitas obras trazem.

François Cluzet é Hervé, um jornalista que toma a iniciativa de se internar na clínica. A princípio, ele se sente totalmente deslocado naquele ambiente, onde as pessoas agem como se estivessem num clube social. Mas aos poucos ele vai se habituando e criando um belo vínculo de amizade com o grupo. Chega ao ponto de se interessar pela nova recém-chegada, a bela Magali (Mélanie Thierry), uma jovem de vinte e poucos anos, cujos mistérios a tornam ainda mais atraente. Talvez falte ao filme mais força em seus momentos finais. Sente-se que há uma intenção de causar emoção na plateia, mas há algo de muito racional no espírito francês. Assim, são poucos os filmes vindos de lá que fazem jorrar lágrimas. O que não quer dizer que não sejam feitos com delicadeza.

P.S.: Ontem a MTV Brasil exibiu ao vivo o MTV Movie Awards, que foi bem mais ou menos. Na verdade, foi tudo uma grande bobagem. Mas o beijo da Sandra Bullock (a homenageada da noite e que faz discursos geniais e espirituosos) com a Scarlett Johansson já valeu a festa.

domingo, junho 06, 2010

HADEWIJCH



Este é o primeiro de uma série de posts que dedicarei aos filmes vistos no Festival Varilux de Cinema Francês, que está até com uma programação boa este ano, principalmente se compararmos com a do ano passado. O ponto positivo está no fato de o festival estar acontecendo simultaneamente em nove capitais. O negativo, no fato de a maior parte das cópias estarem naquele digital não muito atraente da Rain. A única exceção parece que é UM NOVO CAMINHO, que veio em película. Infelizmente não vai dar pra ver os dez filmes do festival, mas creio que apesar disso este ano eu vou bater o meu recorde em quantidade de vistos. A sala do Espaço Unibanco Dragão do Mar não é tão confortável quanto as do UCI do Iguatemi, mas pelo menos não temos que disputar com o público e as filas dos blockbusters. O povo que frequenta o festival é um povo que está mais disposto a ver algo um pouco mais diferente. Tem também a turma que estuda francês, já que a Aliança Francesa é uma das apoiadoras.

O primeiro filme que vi foi este HADEWIJCH (2009), de Bruno Dumont. Título bem complicado de decorar, hein. Tenho que ficar vendo letra por letra para ver como se escreve. Assim como o título, o filme de Dumont não é uma obra fácil. Mas é interessante, instigante. Mais uma vez eu fico incomodado com um personagem católico radical. O que não chega a ser um demérito para o filme, pois isso aconteceu comigo em obras de gênios como Alfred Hitchcock (A TORTURA DO SILÊNCIO), Eric Rohmer (MINHA NOITE COM ELA) e Robert Bresson (DIÁRIO DE UM PADRE). Assim como os personagens desses filmes, a jovem Julie Sokolowski, que interpreta Céline, extrapola a racionalidade e a lógica comum em prol de sua fé.

Depois de ser expulsa do convento onde estava por desobedecer às ordens das madres superiores – ela fazia questão de jejuar bastante e de não se aquecer do frio -, ela vai para a rua, ver como as pessoas comuns vivem. Apesar de se mostrar bastante amistosa a um grupo de mulçumanos que a convidam para se sentar à mesa, ela se recusa a ter qualquer relacionamento mais próximo com qualquer homem. Seu corpo é de Jesus, ela diz. O filme vai ficando mais interessante quando a proximidade dela com o grupo de mulçumanos faz com que ela simpatize com a causa deles, excluídos e humilhados pela sociedade. Além disso, eles são extremistas. Utilizam bombas em nome de Alá. Aliás, uma das cenas que mais ficará forte em minha memória é a dos mulçumanos rezando para Alá naquela posição típica, enquanto ela reza à sua maneira, todos juntos no mesmo quarto.

Como não estou familiarizado com a obra de Dumont – este foi o primeiro filme que vi dele –, fiquei na dúvida se o que ele queria era uma provocação ou se há de fato algo forte ligado à fé. Essa ambiguidade, que aparece ainda mais forte no final, não deixa de ser mais um aspecto positivo, principalmente quando dizem que ele é o principal herdeiro de Robert Bresson. Pode até ser, mas está longe de chegar aos pés do mestre. De todo modo, gostei da homenagem explícita que ele fez a MOUCHETTE, A VIRGEM POSSUÍDA. Talvez seja um filme que cresça numa revisão. Mas é preciso estar bem disposto.

sexta-feira, junho 04, 2010

HOT SPOT – UM LUGAR MUITO QUENTE (The Hot Spot)



Na manhã do último sábado, 29 de maio, morreu Dennis Hopper, uma das figuras mais importantes da chamada "nova Hollywood". Seu filme, SEM DESTINO (1969), foi um dos marcos de uma nova era para o cinema americano. Sempre que morre um diretor ou até mesmo um ator ou atriz que eu gosto, procuro prestar um pequeno tributo, assistindo um de seus filmes e comentando aqui no blog. É o mínimo que eu posso fazer, em agradecimento e em respeito ao artista que partiu. Hopper não foi uma figura fácil. Tomou todas, bebeu todas, cheirou todas, bateu nas mulheres, pirou de vez. Por isso, os papéis de louco caiam como uma luva nele. Que o diga o memorável papel do vilão psicótico de VELUDO AZUL, de David Lynch, um dos diretores que mais demonstraram a tristeza da iminente partida do amigo, já sofrendo seus últimos dias de combate contra o câncer de próstata.

Mas eu não quis homenagear aqui o Dennis Hopper intérprete; preferi o Hopper cineasta, ainda que tenha uma filmografia curta de apenas oito títulos, sendo que um deles foi assinado como Alan Smithee - o torto ATRAÍDA PELO PERIGO (1990). Como não consegui uma cópia decente e com legendas do maldito THE LAST MOVIE (1971) e não estava muito disposto a revisitar COLORS – AS CORES DA VIOLÊNCIA (1988), optei por rever HOT SPOT – UM LUGAR MUITO QUENTE (1990). Nota-se que nesse período, Hopper estava ensaiando um bom retorno. Se COLORS foi bem recebido pela crítica, HOT SPOT segue o bom caminho. Não sei se é seu melhor filme, mas com certeza é o mais subestimado.

Hopper segue a cartilha do film noir, com suas loiras fatais, estranhos que chegam na cidade dando uma de gostosão, voice over do protagonista em alguns momentos, elementos de tensão, tentações perigosas, muitas cenas noturnas. Tudo está aqui neste ótimo filme, que ainda conta com a jovem Jennifer Connelly posando de top less e uma Virginia Madsen tão deliciosamente safada num papel perfeito: assim como o protagonista (Don Johnson), sentimos vontade de estrangulá-la e de fazer sexo com ela. Ou as duas coisas juntas. O personagem de Johnson é um cara de personalidade. Um estranho que chega numa cidade pequena e logo arranja emprego de vendedor de carros, com uma lábia que deixa o dono da loja de queixo caído e sem poder recusar o ousado e arrogante sujeito como o seu mais novo vendedor.

A trama do filme vai se costurando de maneira lenta e gradual, enfatizando primeiro a atração do homem pelas duas mulheres: a jovenzinha de 19 anos (Connelly), linda e precisando de alguém para protegê-la de um malandro chantagista; e uma mulher casada e atraente (Madsen), que ainda por cima é esposa do dono da loja de carros em que ele trabalha. (Vale dizer que as cenas de sexo com Madsen estão entre as mais quentes do cinema mainstream de todos os tempos.) Como se não bastasse o tamanho da encrenca, a trama maior ainda estaria por vir, quando Johnson se revela um assaltante estrategista. Mas do tipo por quem a gente torce. HOT SPOT se revelou uma das revisões mais surpreendentes e agradáveis dos últimos anos. Na minha cabeça, o filme não era tão bom quando o vi pela primeira vez em vhs.

quinta-feira, junho 03, 2010

CRIAÇÃO (Creation)



Feriado abençoado. Pude dormir bastante, descontar um pouco o sono perdido durante a semana, festejar o aniversário da minha irmã caçula com um almoço em família e daqui a pouco devo socializar um pouco com os amigos. Também fiz uma lista de coisas pendentes hoje. São mais do que eu imaginava. Isso no que se refere a terminar de ver filmes, livros, revistas, hqs, séries, minisséries e até revistas virtuais. Algumas dessas coisas podem levar meses. Por isso que às vezes é preciso ser o mais prático possível. Escrever sobre filmes que não gostamos tem essa vantagem. Não precisamos nos esforçar para escrever melhor, de modo a prestar uma pequena homenagem àquela obra que nos fascinou, através de palavras. Infelizmente não é o caso de CRIAÇÃO (2009), de Jon Amiel.

O filme tem um tema interessante à disposição mas não desenvolve de uma maneira que o torne minimamente emocionante. CRIAÇÃO não destaca os aspectos científicos da teoria evolucionista. A intenção é enfatizar os dias de crise da vida de Charles Darwin, antes da publicação do seu famoso livro, seu relacionamento com a esposa e o trauma que teve ao perder a filha mais velha e mais querida. Quer dizer, o filme tem a boa intenção de nos apresentar ao Darwin homem, marido, pai. Mais do que o homem de ciência. Um aspecto positivo é ver os métodos que a medicina da época usava.

Outra coisa que me chamou a atenção foi o fato de Darwin (Paul Bettany) ter entregue o livro "A Origem das Espécies" à esposa (Jennifer Connelly) para que ela decidisse o seu destino final: ser enviado para publicação ou ser queimado. Interessante isso, de o marido confiar à esposa esse tipo de ação. Lembro que quando li "As Valquírias", de Paulo Coelho, o autor conta que havia escrito um livro sobre a fase da magia negra em sua vida e foi a sua mulher quem resolveu que o livro deveria ser queimado. Felizmente, a esposa de Darwin, apesar de ser muito religiosa, deixou que o marido publicasse o livro, que hoje é um clássico tanto da literatura quanto da ciência.

Jennifer Connelly, uma das razões de eu ter ido ver o filme no cinema, não está em sua melhor forma. Está até um pouco apagada. Mas acredito que a intenção era essa mesmo. Ela faz o papel de uma mulher religiosa, com uma idade um pouco mais avançada (nesse caso, ela estaria até jovem demais para o papel em alguns momentos), e sem a produção de maquiagem que um filme que se passe nos dias de hoje requeriria. Mesmo para mim, fã dela que sou, sei que o seu auge no que se refere à beleza já passou. O que não significa que ela ainda não seja uma linda e especial mulher e que Paul Bettany seja um filho da puta de sorte.

quarta-feira, junho 02, 2010

THE HUMAN CENTIPEDE (FIRST SEQUENCE)



Uma das febres entre os cinéfilos que curtem filmes de horror ou com aberrações, THE HUMAN CENTIPEDE (FIRST SEQUENCE) (2009) é mesmo uma obra especial. Talvez um dos filmes mais doentios que eu já vi na vida. Pode ser incluído fácil junto a obras tão distintas quanto o italiano SALÓ OU OS 120 DE SODOMA e o francês MÁRTIRES. Trata-se de uma produção holandesa de baixo orçamento que mostra uma experiência feita por um cientista louco especializado em separação de gêmeos siameses. Ele pega duas jovens turistas americanas que deram mole e foram parar em sua casa para pedir ajuda e um rapaz japonês para compor o que ele chama de centopeia humana. Ele faz isso ligando cirurgicamente o sistema digestivo dessas três pessoas, fazendo também os devidos ajustes em seus joelhos para que eles tenham sempre que andar de quatro.

Como o filme começa do ponto de vista das duas garotas, ele lembra muito esses filmes de psicopatas, do tipo O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA. O diferencial está no fato de que o espectador, ao mesmo tempo que torce para que as meninas consigam fugir daquele absurdo que é ficar com a boca ligada ao ânus do outro até a morte, o nosso lado sádico quer ver o resultado da experiência. E se o filme é capaz de provocar tais reações no espectador é sinal de que ele é bem mais do que uma obra feita por uma mente doente. Fazer o sangue gelar e a raiva surgir de nossas entranhas através de atos violentos, vários filmes já conseguiram, mas THE HUMAN CENTIPEDE tem o seu diferencial. Vai além.

Vi gente reclamando que o filme poderia ser ainda mais pesado. E realmente poderia. Mas do jeito que ficou a obra já é suficientemente perturbadora. Suspeito que o diretor Tom Six esteja guardando munição para a continuação, agendada para 2011, com o título THE HUMAN CENTIPEDE (FULL SEQUENCE). O filme tem feito tanto sucesso nos festivais de cinema fantástico e na internet que, mesmo não tendo sido lançado em vídeo oficialmente no Brasil ainda, vários sites em língua portuguesa já têm adotado o título A CENTOPEIA HUMANA como certo.

Falando em cientistas loucos, vale conferir a bela lista de exemplos que o Leandro Caraça postou em seu blog.

terça-feira, junho 01, 2010

VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO



Com dois dos filmes mais importantes da cinematografia nacional dos anos 2000 no currículo, o cearense Karim Aïnouz e o pernambucano Marcelo Gomes têm prestígio suficiente para lançar nos cinemas uma obra experimental, mas que graças ao título atraente pode chamar a atenção até mesmo dos desavisados, que até podem curtir a experiência. VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO (2010) foi realizado ao longo de dez anos. As imagens foram coletadas de 1999 a 2009 e, juntas, formam um mosaico do sertão nordestino, dando ênfase para aquilo que parece ser mais exótico, o que para mim constitui um dos pontos fracos do filme. Não se trata aqui de esconder o que é feio, estranho ou ridículo, mas de saber também se beneficiar do belo, coisa que ambos os cineastas souberam fazer em suas obras máximas, CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS (2005), de Marcelo, e O CÉU DE SUELY (2006), de Karim.

O filme começa com a imagem noturna da estrada, do ponto de vista do motorista. No som do carro toca "Sonhos", do Peninha, canção que antecipa a situação sentimental do protagonista, nunca visto, mas onipresente através de suas falas e de suas câmeras (16 mm, 35 mm, Super-8, digital e até mesmo máquina fotográfica). Ele começa falando do quanto sente saudades de Joana, a mulher que ele ama, uma botânica que ficou em Fortaleza. Fala do quanto gostaria de estar com ela e não naquela viagem que levaria longos dias fazendo estudos geológicos para analisar a possibilidade de se fazer um canal para transposição das águas do Rio São Francisco. Um detalhe que me chamou a atenção diz respeito ao sotaque do narrador. O fato de ele chamá-la de "galega", por exemplo, também não me pareceu tão comum para um habitante de Fortaleza. Também pudera: Irandhir Santos, o dono da voz, é pernambucano. Poderiam dar a desculpa de que o personagem não é fortalezense. Mas enfim, provavelmente esse tipo de detalhe só seja percebido mesmo por quem mora em Fortaleza. Do jeito que ficou, o lirismo do filme pareceu quase como se recitado pelo personagem de João Miguel em CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS.

Vendo VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO até dá a impressão de que fazer cinema dessa maneira é muito fácil. Mas a ideia é boa. Quem fizer algo utilizando essa estrutura, estaria plagiando. E se reclamarem da estrutura fora do convencional do filme, podemos dizer: se o mundialmente aclamado Abbas Kiarostami pode fazer suas experimentações, por que também não podemos? O misto de ficção com documentário se acentua no único momento em que vemos o narrador conversando de fato com alguém, numa entrevista à Eduardo Coutinho, com uma das pessoas que encontra em sua "peregrinação" pelo sertão. Trata-se de uma prostituta que sonha em ter uma vida mais digna, uma "vida a lazer", segundo suas palavras. A expressão fica impregnada na cabeça do protagonista. E também na do público, que me pareceu bastante satisfeito ao final da sessão, a julgar pelos sorrisos. Mas será que a intenção do filme era mesmo despertar sorrisos? Era fazer rir do povo feio dançando com seus trajes vulgares? Sei que estou julgando de maneira preconceituosa o que é mostrado nas imagens, mas acredito que esse tipo de coisa distrai e diverte, diminuindo um pouco o que poderia ser um filme que tratasse da solidão e do abandono. Que seria o foco principal, não? De qualquer maneira, não deixa de ser um belo trabalho.