Umas das estreias mais instigantes dos últimos anos é a do jovem Andrew Patterson, que dá o pontapé inicial na direção para cinema com este A VASTIDÃO DA NOITE (2019), um filme que tem explicitamente um carinho muito grande pelos filmes de ficção científica da década de 1950, bem como pelas séries de televisão de cunho fantástico, e que faz uma homenagem ao estilo, mas com uma embalagem bem mais moderna. Afinal, filmes daquela época não teriam explorado tanto a conversa. E é o que Patterson faz, tanto que ele próprio tem lembrado da influência da trilogia de Jesse e Celine, de Richard Linklater, em seu trabalho.
Mas nem tudo é conversa em A VASTIDÃO DA NOITE. O diretor se mostra muito preocupado com o aspecto visual. Tanto é que começamos o filme um tanto tontos com o que ele tem a oferecer. A princípio, senti uma falta imensa de uma tela grande de cinema, já que boa parte das cenas da primeira parte do filme são de planos gerais. As primeiras cenas se passam em um ginásio onde acontece um jogo de basquete. Mais tarde saberemos que praticamente toda a cidadezinha de Cayuga, Nova México (uma cidade fictícia), está naquele local.
E somos meio que jogados em cena, sem uma apresentação dos personagens. Esse tipo de recurso mais moderno não é exatamente novo, mas pode estranhar pelo fato de que o diretor parece querer incomodar os espectadores em muitos aspectos, inclusive com ruídos. Há os ruídos da bola batendo no chão e do arrastar dos tênis dos jogadores, enquanto a conversa rola de maneira descontraída e realista. Os dois personagens principais são dois jovens: um radialista chamado Everett (Jake Horowitz) e uma operadora de uma central telefônica chamada Fay (Sierra McCormick). Ela parece ter uma ligeira queda por ele, mas essa relação afetiva não chega a ser algo tão essencial para a trama.
Durante uma passagem dos dois pelos carros em volta do ginásio, um ruído é visto ao fundo. E uma câmera subjetiva nos faz lembrar das experiências de Sam Raimi em EVIL DEAD - A MORTE DO DEMÔNIO. O uso da câmera é de fato um dos aspectos mais brilhantes do filme, embora seja mais alguma coisa que nos chame a atenção a ponto de atrapalhar a compreensão e a imersão na trama. E ainda há a escuridão. Deliberadamente, Patterson usa muitas cenas escuras. Uma vez que aceitamos e nos acostumamos, a experiência é muito boa. Falando no clássico de Sam Raimi, há outro momento em que a câmera vai passear pela cidade durante a noite de forma bastante impressionante que também lembra EVIL DEAD, .por mais que, mais adiante, possamos nos perguntar sobre a função dessa cena para o filme, de sua real necessidade para a narrativa.
Até porque a força de A VASTIDÃO DA NOITE acontece entre em interiores, e durante ligações entre os dois personagens, cada um em seu local de trabalho. O ponto de partida para que o filme amplifique a trama se dá quando Fay ouve estranhos ruídos pelo telefone. E resolve mostrar para seu amigo Everett aquilo que conseguiu captar. O jovem radialista, por sua vez, resolve mostrar esse ruído para sua audiência. Imediatamente, ele recebe uma ligação de um homem que diz saber o que é aquilo.
O interessante é que o ruído só ganha força e importância porque os personagens dão a ele importância. É o caso clássico de filme que brinca muito com as reações principalmente faciais de seus personagens e nos convida para entrar no jogo e ficar tão preocupado, tão interessado, tão intrigado e tão excitado quanto eles.
Em tempos pandêmicos, é uma alegria poder ver uma estreia (ainda que direto no streaming) que esteja provocando tantas reações positivas entre cinéfilos, críticos de cinema e apreciadores do gênero ficção científica.
+ TRÊS FILMES
ZOMBI CHILD
Cheguei a ver o trailer deste filme no cinema antes da pandemia. Infelizmente (ou felizmente, já que agora podemos vê-lo) foi lançado diretamente em streaming. O filme anterior de Bertrand Bonello (NOCTURAMA, 2016) também não teve muita sorte no circuito comercial e foi lançado só online. O que temos neste novo e instigante trabalho são duas histórias paralelas, uma que se passa décadas atrás, no Haiti, e que envolve a zumbificação de homens para trabalho escravo (ao que parece, isso ocorreu de verdade), e a outra história em uma escola luxuosa e destinada a meninas filhas de pessoas importantes para o governo francês. É lá que uma jovem apaixonada por um rapaz à distância faz amizade com uma moça haitiana. Confesso que alguns momentos do filme me provocaram bastante incômodo, quase gerando medo, mas no fim o que mais me incomodou foi o final. Tive até que voltar a "fita" para rever. Ano: 2019.
A TORRE NEGRA (The Dark Tower)
Pelamordedeus. Dá meia hora e a gente já fica doido pra que essa bosta acabe logo. Se eu fosse um diretor nórdico nem aceitaria proposta de Hollywood. Acho que todos que vão pra lá é só pra se queimarem. Stephen King não deve ter ficado satisfeito com essa adaptação. Direção: Nikolaj Arcel. Ano: 2017.
PASSAGEIROS (Passengers)
Muito melhor do que eu esperava e do que as críticas mornas andam dizendo por aí. Tudo bem que comparações com GRAVIDADE são inevitáveis e o filme sai perdendo se comparado, claro, mas achei uma delícia de ver. E há algumas cenas memoráveis. Acho que talvez eles não tivessem uma história bem delineada, e é possível perceber isso ao final, mas acho que a ideia era mesmo fazer uma aventura espacial intimista. E, nisso, creio que eles até que se saem bem. Claro que dá pra elencar um monte de problemas do filme, mas eu prefiro destacar o que mais funciona, principalmente pra grande audiência. Direção: Morten Tyldum. Ano: 2016.
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