segunda-feira, julho 21, 2014

AMAR, BEBER E CANTAR (Aimer, Boire et Chanter)



E AMAR, BEBER E CANTAR (2014), o último filme de Alain Resnais (1922-2014), é novamente uma homenagem ao teatro. Ou ao menos uma prova da alta estima que o cineasta tinha por essa arte, a ponto de teatralizar o que já era teatral. O que não quer dizer que não seja também mais uma amostra do talento de seu realizador com o cinema, com rigor formal, cores lindas na fotografia, cenografia toda teatral e utilização de desenhos das casas para mudar de uma cena para outra.

Em certo momento, porém, o que começa como uma forma dinâmica de construção narrativa acaba por se tornar monótona. Além do mais, o humor nem sempre funciona, embora se possa dizer que é um tipo de humor que tem um público todo próprio, tão peculiar quanto seu diretor. Chega uma hora que parte do público prefere desistir do filme, dentro da sala quase lotada. Infelizmente o filme-testamento do cineasta tem cheiro de naftalina, assim como já tinha também BEIJO NA BOCA, NÃO! (2003), outra de suas comédias teatrais.

No caso de AMAR, BEBER E CANTAR (aliás, qual a razão desse título mesmo?), a peça que deu origem ao filme é do inglês Alan Ayckbourn, mesmo dramaturgo de SMOKING/NO SMOKING (1993) e MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (2006), dois trabalhos bem mais incensados de Resnais. Mais do que o título não combinar com o enredo, o que chama a atenção de muitos é a enigmática e até divertida aparição de uma toupeira de fantoche em meio a algumas cenas. Qual seria o seu significado?

Na trama, três casais com a vida conjugal um tanto infeliz têm suas vidas mexidas com a notícia de que George, um amigo em comum de todos, está com câncer e tem apenas cerca de seis meses de vida. Como George é muito querido por todos, a notícia abala geral e posteriormente acaba revelando para o espectador alguns segredos relacionados ao passado de George e alguns personagens.

O principal detalhe é que George não aparece em momento algum, o que acaba sendo um dos charmes da peça (e do filme). E George passa de grande amigo dos homens a provável inimigo quando começa a ser suspeito de estar se divertindo com suas três esposas. Assim, de doente terminal, o invisível George vira objeto de desejo das mulheres. No fim, é possível interpretar como sendo positiva sua intervenção na vida dessas pessoas. Por isso é uma pena que o filme pareça tão anacrônico (no pior sentido do termo), e, o pior de tudo, de narrativa tão arrastada, apesar dos esforços de parecer dinâmico.

O que acaba sendo um diferencial em AMAR, BEBER E CANTAR, dentre tantos outros filmes no circuito, inclusive o alternativo, é sua necessidade em ser excessivamente teatral, com exageros propositais no tom de voz dos personagens, enquanto saem das cortinas estilizadas que funcionam como fachadas para seus quintais. Resnais quer provar mais uma vez que o teatro cabe no cinema, mas acaba mais aborrecendo do que agradando boa parte da audiência. Ainda assim, ver o filme não deixa de ser uma boa oportunidade para se ver na telona uma obra, ainda que menor, de um dos diretores mais importantes do século XX.

P.S.: Deixo claro que Resnais está longe de estar entre os meus diretores favoritos. Prefiro ver um Godard bem hermético do que um filme seu. Mas talvez eu ainda aprenda a gostar de seus trabalhos. Há muitos que ainda não vi. Por enquanto, meu favorito continua sendo, de longe, o impactante documentário em curta-metragem NOITE E NEBLINA (1955).

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