domingo, novembro 01, 2020
O DIABO FEITO MULHER (Rancho Notorious)
Vamos de Fritz Lang mais uma vez para dar uma pausa nos filmes da Mostra, pelo menos aqui no blog. Fico com saudade dos filmes antigos, embora esteja vendo muita coisa boa dos novos e inéditos. O DIABO FEITO MULHER (1952) era um dos filmes de Lang que eu mais ansiava ver, justamente por ter gostado muito dos outros dois westerns que ele realizou, A VOLTA DE FRANK JAMES (1940) e OS CONQUISTADORES (1941). São tão deliciosos que eu fiquei me perguntando o motivo de o cineasta austríaco não ter realizado mais filmes do gênero. De todo modo, sua especialidade no que hoje chamam de film noir foi um presente para fãs de cinema.
O retorno ao western é com este filme que traz uma das maiores musas europeias a se estabelecer em Hollywood e que já havia passado de seu auge físico - ela já passava da casa dos 50. Marlene Dietrich teve sua década de glória nos anos 1930, especialmente com a série de filmes dirigidos por Josef von Sternberg. Fritz Lang gostava dela, sempre quis trabalhar com ela. Surgiu finalmente esta oportunidade.
Diferente dos outros dois westerns de Lang, este aqui é menos romântico e mais amargo. Já começa com um choque: a namorada de Vern Haskell, um criador de gado da pequena Wyoming, é estuprada durante um assalto e logo em seguida assassinada. Como em M - O VAMPIRO DE DUSSELDORF (1931), não vemos nada do estupro. Vern, sem conseguir ajuda do xerife da cidade nem de outros habitantes, que temem atravessar a reserva dos índios, segue sozinho nessa tarefa de encontrar o criminoso, sem nada saber sobre ele.
A chave do filme gira quando, no meio do caminho, em uma barbearia, ele houve falar de uma mulher chamada Altar Keane (Marlene Dietrich) e fica um tanto fascinado com a descrição que lhe é dada, a história de quando ela literalmente cavalgava os homens em torneios em que os sujeitos eram cavalos e as mulheres, do tipo livre, eram as jóqueis.
Percebe-se que temos ao mesmo tempo um filme de vingança com um história de investigação com grandes chances de se tornar uma história complicada de amor. Ou algo parecido. O caminho para chegar a Altar Keane e ao famoso refúgio dos bandidos faz com que ele entre em contato com o namorado de Altar, um pistoleiro de meia idade chamado Frenchy Fermont (Mel Ferrer). Frenchy e Vern se tornam amigos e vão parar no tal abrigo, onde ele vê pessoalmente Altar e vários bandidos residentes. Um deles deve ser o criminoso que violou e matou sua namorada. O filme ganha novos contornos a partir da presença de Marlene finalmente fora dos flashbacks. Ela agora é dona deste lugar e recebe um percentual dos lucros dos assaltos em troca de abrigo e segurança para esses homens.
Um dos destaques de O DIABO FEITO MULHER é a canção-tema, algo inédito até então em um western. A canção-tema dá um ar de mitologia ao enredo e Lang se antecipou em um ano ao tema musical de MATAR OU MORRER, de Fred Zinnemann.
E outro diferencial do filme é o amadurecimento da figura da femme fatale, que aqui surge não como uma mulher que arruína a vida de um homem, mas que a salva. Quanto à violência como meio de vingança, desde FÚRIA (1936) que Lang já denunciava a vaidade do ato.
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