quarta-feira, abril 01, 2020

12 CURTAS

COMO FERNANDO PESSOA SALVOU PORTUGAL

A história, muito divertida, eu já conhecia através de uma biografia do Fernando Pessoa. Trata-se de quando ele foi contratado para escrever um slogan para a Coca-Cola, a bebida americana, que queria encontrar espaço também em solo luso. Interessante que o filme brinca também com os heterônimos de Pessoa, sua forma de composição dos poemas (ainda que de maneira discreta), mas sempre fico feliz quando diretores estrangeiros têm esse conhecimento sobre Pessoa. Acabo achando que ele é algo que poucas pessoas não-falantes da língua portuguesa o conhecem. Quanto ao filme, tem aquele estilo característico do Eugène Green, que lembra um pouco Bresson na dramaturgia. Ano: 2018.

A ENTREVISTA

Um compilado de entrevistas de anônimas da elite carioca enquanto vemos imagens de uma jovem mulher indo à praia e se preparando para se casar. O que temos aqui tem um valor imenso, já que o filme, além de ser um dos raros dirigidos por mulheres nos anos 1960, aborda temas considerados tabus na época, como virgindade, submissão ao marido, educação dos pais etc. Assim, temos algumas opiniões conflitantes, algumas mais progressistas, como a da moça que diz que a virgindade não significa nada para ela, enquanto outra acredita que é uma forma de respeito para com o outro se casar virgem. A sociedade brasileira desse período, por mais que se quisesse acreditar que estava vivendo uma revolução, ainda parecia tímida em assumir certos posicionamentos. Talvez porque o recorte fosse da elite, apenas, não sei. Outro aspecto de destaque do filme é o quanto ele é moderno dentro do que se costumava chamar de documentário, formalmente falando. Direção: Helena Solberg. Ano: 1966.

COURO DE GATO

Nunca tinha visto este curta de Joaquim Pedro de Andrade. Adiava para vê-lo dentro do filme em segmentos CINCO VEZES FAVELA, mas fiz a opção certa ao vê-lo em separado. É brilhante. De cortar o coração. E uma demonstração do gênio do Joaquim Pedro na construção de uma narrativa com uma ausência quase total de falas, apenas imagens e sons, e uma trilha sonora maravilhosa. O que temos de falas é uma narração que conta que os tamborins dos desfiles de carnaval, por falta de material mais fácil de encontrar, eram feitos com couro de gato. A partir dessa informação e do horror disso tudo, vemos garotos em busca de gatinhos pelas ruas e casas, a fim de vender e não passar fome. A cena do garotinho perto do gato branco e dividindo a comida com ele é devastadora. E a cena final mais ainda. Foda!! Ano: 1961.

WHAT DID JACK DO?

David Lynch sabe como nos deixar desconcertados. Seu curta surpresa lançado na Netflix, no dia do seu aniversário, nem havia chegado a ser catalogado no IMDB ainda. A estranheza da situação, o próprio Lynch sendo um detetive interrogando um macaquinho suspeito de um assassinato, me deixou um pouco sem conseguir acompanhar os detalhes da investigação. Há uma cena que remete a outras obras de Lynch que metem medo, mas aqui é tudo tão experimental que essa sensação não fica tão forte como em RABBITS (2002), para citar outro trabalho bem experimental do diretor. Enquanto não temos outro longa de Lynch, não deixa de ser uma alegria ter um trabalho novo dele ganhando tanta repercussão. Ano: 2017.

A BORDO

É uma satisfação quando vemos um trabalho de um amigo e ficamos encantados e, no caso deste filme, ligeiramente assombrados com o resultado. Em A BORDO, Sylvia Prado (excelente!) é uma mulher de 40 anos que está em sua primeira gestação. Mas, como nem sempre as coisas acontecem como planejado, algo ocorre. Melhor não contar mais da trama para não estragar a apreciação de quem ainda não viu o filme, mas posso destacar duas cenas: a simulação do estar dentro do útero materno; e a planta e a chuva. As cenas da intimidade, da tristeza, da aceitação ou não da perda pela protagonista são mostradas de maneira econômica e poética. E fazer uma metáfora da vida na cena da montanha-russa é de uma beleza impressionante. Destaque também para a participação de Chris Couto. É um tipo de curta que mereceria mais burburinho, embora tenha sido premiado em variados festivais. Davi Mello é um cineasta a se prestar atenção. Ano: 2015.

AS VIAJANTES

O novo trabalho de Davi Mello segue uma linha mais de cinema fantástico, lembrando David Lynch, mas me lembra também um dos trabalhos de Juliana Rojas, O DUPLO. Optar pelo cinema fantástico e ter a honra de trabalhar com Gilda Nomacce, a rainha do gênero no Brasil, foi uma felicidade e tanto. No filme, duas amigas, atrizes, conversam, mas a personagem de Gilda está inquieta, com medo, olhando pela janela. E eis que ela conta, em flashback, o que realmente lhe perturba. E realmente é algo bem perturbador. Ótimo trabalho de montagem. E os olhos de Gilda... quanta expressividade! Ano: 2019.

NADA

Belo trabalho sobre garota que insiste em nadar contra a maré e não quer fazer Enem como os seus demais colegas de escola. O filme é até mais do que isso, existencialista. Gostei bastante. Legal ter passado em Cannes. Direção: Gabriel Martins. Ano: 2017.

SUPERDANCE

Interessante como os trabalhos de curta-metragem feitos aqui no Ceará estão cada vez mais brincando com o coletivo, com pessoas conversando de maneira bem descontraída. E ao mesmo tempo também inserindo elementos surreais na narrativa. Direção: Pedro Henrique. Ano: 2016.

MAMATA

Filme que ainda continua forte em um país cada vez mais cheio de desesperança. É um grito de indignação que ainda cala alto, mesmo com os clamores de "Fora, Temer" já tendo diminuído. (Atenção! Este minitexto está defasado, já que foi escrito no início de 2018 ainda, quando a situação não chegou a isso que está aí hoje.). Direção: Marcus Curvelo. Ano: 2017.

O VIGIA

Talvez nem precisasse da homenagem à América Vídeo no começo do filme, até porque O VIGIA tem uma construção de atmosfera muito boa, assim como o uso da música de suspense. Ainda assim, é um trabalho brilhante. Direção: Priscila Smiths e P.H Diaz. Ano: 2017.

FRANKSTEIN PUNK

Divertida brincadeira com vários filmes americanos usando animação com massinha. Uma prova do amor de Hamburger pelo cinema desde o seu primeiro trabalho. A cena que toca a música-tema de PARIS, TEXAS é sensacional. Direção: Cao Hamburger e Eliana Fonseca. Ano: 1986.

TORRE

Estupendo trabalho de narração com animação para contar uma história familiar dolorosa. Queria ter sido tocado mais pelo filme, mas é difícil reclamar de uma obra dessas. Direção: Nadia Mangolini. Ano: 2017.

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