terça-feira, outubro 02, 2012
O SOM AO REDOR
A tão esperada estreia na direção de longas de ficção de Kleber Mendonça Filho não deixou ninguém decepcionado. Ao contrário, O SOM AO REDOR (2012) é um filme que quanto mais se pensa a respeito, mais se gosta. É claramente uma obra que traz o background do diretor curta-metragista. Há até uma sequência praticamente retirada de ELETRODOMÉSTICA (2005). Quando o entrevistei em Gramado, lembrei que David Lynch havia feito algo parecido em IMPÉRIO DOS SONHOS, aproveitando trechos de sua série de curtas arrepiantes e bizarros RABBITS. Ele parece ter achado curiosa a comparação. Mas se há um cineasta a quem KMF faz questão de homenagear e de declarar amor ao trabalho é John Carpenter. E ele até chega a batizar uma escola de "João Carpinteiro" numa das sequências do filme.
O SOM AO REDOR tem, inclusive, alguns elementos do cinema fantástico, que ajudam a tornar a sua narrativa tensa. Não se sabe para onde a história se encaminhará, com os vários e interessantes personagens e o suspense que surge de pequenas coisas. É a mulher que odeia o cachorro do vizinho (Maeve Jinkings); o dono da maior parte das casas do bairro, que age como um velho coronel (o sensacional W.J. Solha); o sujeito que aparece querendo ser um vigilante do bairro (Irandhir Santos); o rapaz que trabalha como corretor de imóveis (Gustavo Jahn); entre outros.
Neste filme-coral, em que cada bloco e cada subtrama é tão instigante e tão importante para o quadro geral, o diretor ainda encontra tempo para enfatizar um elemento que geralmente é negligenciado, principalmente no cinema brasileiro: o som. E de fato o trabalho de som do filme justifica o título, embora eu acredite que deva haver um lugar ideal, com acústica adequada, para que ele seja melhor apreciado. No Palácio dos Festivais, em Gramado, o som estava indo bem até o momento em que estourou a caixa média e todos tivemos que voltar para nossos hotéis. Triste ironia. Felizmente, no dia seguinte, foi possível rever o filme integralmente.
Apesar de haver vários personagens e de haver um mistério, um suspense no ar mesmo em momentos de rotina na vida dos personagens, O SOM AO REDOR não é necessariamente um filme de ações e reações. O que há principalmente de comum entre seus personagens é que eles transitam o mesmo espaço privilegiado, próximo à Praia de Boa Viagem. O fato de haver a figura de Clodoaldo (Irandhir Santos, em grande atuação) trazendo sua vigilância particular para o lugar ajuda a enfatizar a falta de segurança e a paranoia, que é vista até mesmo nos pesadelos de uma garotinha.
É preferível não dizer muita coisa sobre O SOM AO REDOR. Tanto que o teaser trailer feito ou encomendado pelo diretor mostra apenas algumas poucas imagens, com o som e a tensão em destaque. A chamada invasão pernambucana que assaltou o Festival de Brasília em setembro tem na figura de Kleber Mendonça Filho e seus excepcionais curtas VINIL VERDE (2004) e NOITE DE SEXTA, MANHÃ DE SÁBADO (2006) um de seus maiores expoentes. É ao mesmo tempo um alívio e um prazer poder vê-lo estreando na direção de longa-metragem de ficção com um trabalho próximo a uma obra-prima.
O SOM AO REDOR ganhou os prêmios de direção, melhor filme pelo júri popular, prêmio da crítica e melhor desenho de som no Festival de Cinema de Gramado.
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