Um alívio poder ver um filme nacional com sabor de década de 80, parecido com aqueles distribuídos pela extinta Embrafilme. Ultimamente eu ando um pouco enjoado de filmes com cara de novela da Globo. E por mais que BRASÍLIA 18% (2006) tenha os seus problemas, o filme de Nelson Pereira dos Santos é uma delícia de se ver. Muita gente anda reclamando de uma certa ingenuidade do diretor em relação à política brasileira. Dizem que ele foi pouco sutil também. Pode até ser, mas que bom que Nelson não fez um thriller político e chato. Que bom que ele fez um filme ambíguo, alucinatório, generoso (no quesito nudez feminina) e divertido.
Uma das diversões do filme está nos nomes que o diretor deu para os seus personagens, a maioria com nomes de escritores brasileiros. (Será que tem algo a ver com o fato de Nelson Pereira dos Santos ter sido escolhido como membro da Academia Brasileira de Letras?) Assim, o personagem de Carlos Alberto Riccelli chama-se Olavo Bilac; o homem acusado de ter matado a assessora parlamentar é Augusto dos Anjos. Outros nomes conhecidos, como os de Machado de Assis, Gregório de Matos, Rui Barbosa, Jean-Paul Sartre, também são citados. Castro Alves, o poeta favorito de Nelson, foi poupado dessa brincadeira. Outra coisa: posso estar viajando, mas tenho impressão que o nome dado à personagem de Malu Mader (Georgina Romero) foi uma homenagem ao cineasta George Romero.
Na trama, Riccelli é um médico legista chamado de Los Angeles para elaborar o laudo de um corpo encontrado. Suspeita-se que o corpo seja de Eugênia Câmara (Karine Carvalho), uma jovem assessora parlamentar desaparecida e que, dizem, estaria prestes a denunciar fraudes envolvendo políticos poderosos. A intenção dos políticos é "comprar" o médico para que ele assine logo o laudo implicando a culpa no cineasta namorado da moça, que a teria matado depois de ter visto um vídeo em que ela fazia sexo com dez homens num inferninho. Nesse sentido, o filme até se assemelha a TWIN PEAKS, a série de David Lynch. Enquanto isso, Olavo Bilac tem alucinações com sua falecida esposa (Bruna Lombardi) e com a tal moça. Um detalhe interessante é que Karine Carvalho, sempre que aparece para ele, aparece como veio ao mundo.
Quando o filme se aproxima do final, em vez de obtermos as respostas para nossas perguntas, ficamos ainda mais sem chão, especialmente na cena final dentro do avião. Não que ela seja de natureza fantástica, mas do ponto de vista da ironia. Independente do que Nelson Pereira dos Santos tenha intencionado dizer com esse filme, sua narrativa é prazerosa o suficiente para me deixar feliz ao sair do cinema. Também fiquei feliz de ter tido a chance de ver no cinema um filme inédito de um lendário e importante cineasta, um homem que mereceria ser mais respeitado. Torço para que alguma distribuidora lance em DVD sua filmografia de mais de vinte títulos.
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