quinta-feira, abril 27, 2017

PITANGA























Uma pena quando um grande cineasta demora a lançar mais filmes para deleite de seus fãs. Beto Brant, que às vezes assina a direção com Renato Ciasca, é um desses diretores que conquistaram o seu espaço entre os maiores do Brasil (e do mundo, por que não?) já a partir de seu longa de estreia, MATADORES (1997). Sua carreira tem sido marcada por obras de narrativa impactante como O INVASOR (2001) e CÃO SEM DONO (2007) e outras de maior risco e experimentação, casos de CRIME DELICADO (2005) e O AMOR SEGUNDO B. SCHIANBERG (2010). Seu último filme na direção havia sido no longínquo 2011, com o apaixonante EU RECEBERIA AS PIORES NOTÍCIAS DE SEUS LINDOS LÁBIOS, estrelado por Camila Pitanga.

Pois é com Camila, desta vez coassinando a direção, que Brant retorna em PITANGA (2017), agora para contar a trajetória de vida de Antonio Pitanga, um dos maiores atores brasileiros de todos os tempos, tendo ganhado papéis de destaque e protagonismo em um país que tem por hábito colocar os negros em segundo plano. Para um filme coassinado pela filha, até que Camila aparece bem pouco em cena. Em compensação, o ator domina o filme, que parece correr solto a partir da alegria contagiante e da autoconfiança de Pitanga.

Em alguns momentos, chega a ser até incômoda essa rasgação de seda contínua em torno do ator, que, naturalmente, se sente muito feliz em tomar para si a fama de grande conquistador, de homem de grande magnetismo. Mas nos dois primeiros terços do filme é quase difícil não sorrir junto com esse homem que viveu a vida de maneira intensa e que conquistou o coração de muitas mulheres, sendo que várias delas aparecem em cena, reencontrando com ele: Maria Bethânia, Zezé Motta, Selma Egrei, Ítala Nandi, Elisa Lucinda...

Senti falta da presença da mãe de Camila, que nas fotos mostradas é belíssima. Não à toa a filha ter vindo ao mundo assim tão bela e especial. Segundo relatos de alguns depoimentos ao longo do filme, o casal representava uma espécie de sensualidade, sexualidade e beleza singulares na época da sua juventude.

O fato de o filme ser contado pelo próprio Pitanga a partir dos encontros com as várias pessoas (famosas), velhos conhecidos, que passaram por sua vida de forma marcante, e que contam com ele lembranças boas do passado, é algo que o distancia de outros documentários que abordam a vida de personalidades. Aqui, o ator cheio de energia e muita prosa parece ser o dono do filme, com a bênção de Brant.

Talvez o problema do filme apareça em seu terço final, quando Antonio Pitanga aparece falando de assuntos mais sérios, sobre a chegada dos negros em território brasileiro nos navios negreiros, e passando a ser também um elogio à resistência, a destacar a importância do cinema mais político produzido no Brasil, especialmente nas décadas de 1960 e 70, e ao engajamento cultural de alguém que nasceu na Bahia e respeita e é bastante envolvido com a religião de seu estado.

De uma forma ou de outra, mesmo nos deixando ainda com saudades de seus filmes de ficção, difícil negar o destaque do documentário neste momento de opressão e ao mesmo tempo de resistência das minorias, atestando o valor do negro em nossa sociedade e em nossa cultura, a partir de um registro vívido e original e pulsante. Além do mais, a vantagem desse registro todo próprio escolhido por Brant e Camila é que muita coisa é revelada nas entrelinhas: nos gestos, nas falas e nas emoções dos vários personagens que aparecem em cena. Ah, e o filme ainda traz ótimas cenas de filmes estrelados por Antonio Pitanga, hein.

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