Um dos cartazes mais famosos de SOB A PELE (2013) é o que mostra as pernas de Scarlett Johansson com as roupas íntimas caídas no chão. Tudo bem que Scarlett é um dos maiores símbolos sexuais da atualidade e ela resistiu muito em tirar a roupa nos filmes – nem Brian De Palma conseguiu. Aí chega um sujeito que dirigiu apenas dois longas-metragens (três com SOB A PELE) e faz com que ela aceite o papel desafiador de interpretar uma alienígena predadora em busca de presas humanas atraídos pelo corpo bonito de uma mulher. Mesmo a atriz não estando tão bela quanto em outros filmes, ninguém é de ferro para rejeitar a sua proposta e acabar caindo em sua armadilha.
O fato de ela ser uma alienígena e de o filme explorar a nudez e a sexualidade pode remeter um pouco a FORÇA SINISTRA, de Tobe Hooper, que apresentava uma mulher pelada andando por aí e sugando a energia dos incautos. Diferente do filme de Hooper, porém, SOB A PELE é mais enigmático, mais desafiador, traz mais perguntas do que respostas. É possível que o romance em que o filme é baseado ofereça algumas respostas, mas aí seriam as respostas do romance e não de sua adaptação.
Jonathan Glazer aposta pouco no enredo e mais na atmosfera. Embora haja momentos fantásticos, o fato de ele valorizar a natureza nas localidades duras da Escócia também torna o filme com um pé fincado no chão, contrastando com sequências próximas de um sonho, e fazendo com que algumas cenas sejam visualmente admiráveis como a de uma família correndo perigo em um rio revolto.
SOB A PELE começa com uma homenagem a 2001: UMA ODISSEIA NO ESPAÇO, de Stanley Kubrick. A tela preta, algo que parece ser um planeta cobrindo outro, o alvorecer de um novo ser surgindo. Depois, numa estrada, um misterioso homem leva o cadáver de uma mulher assassinada para que ela seja usada como imagem da nova predadora. Não há nomes de personagens, há apenas Scarlett dentro de uma van procurando pessoas solitárias e que vivem sozinhas. O aspecto de filme de horror se materializa na escuridão do espaço onírico em que as vítimas, totalmente excitadas, no sentido erótico mesmo, e hipnotizadas com aquela mulher, mergulham numa espécie de líquido viscoso. As imagens são impressionantes. Mas o melhor estaria por vir.
Que é quando a protagonista oferece carona a um homem com um rosto deformado. Neste momento, é até possível lembrar David Lynch. Não apenas o Lynch de O HOMEM-ELEFANTE, mas o de suas tradicionais e estranhas obras de horror mesmo, com uma trilha sonora que auxilia em diversos momentos a construção desse universo. A aparição desse homem deformado marca o momento em que a personagem começa a perceber dentro de si uma espécie de humanidade.
Aliás, hoje em dia a palavra "humanidade" é também carregada de conotações negativas, já que ser humano é também ser capaz de atos extremamente vis. Mas, no filme, a reviravolta se dá com essa consciência da personagem, que a tira do pedestal e faz com que ela mude de predadora para presa, sentindo-se confusa naquele mundo que pra ela passa a ser de descoberta espiritual.
Essa segunda parte do filme é um tanto mais arrastada em seu ritmo, mas ao mesmo tempo é também mais cheia de mistérios. Abre-se para mais perguntas. E mesmo que as perguntas sejam respondidas na superfície, resta saber também os significados por trás dos símbolos, por trás de cada ato da personagem. E também pensar nas intenções do cineasta.
Sobre o que é o filme, afinal? Sobre a vingança das mulheres contra os homens? Sobre abrir os olhos para o mundo? Sobre a beleza da natureza presente tanto nos homens quanto nas coisas? Ou sobre tudo ou nada disso? Eis a vantagem de ver um filme que levamos conosco ao voltarmos pra casa. Além de carregar também a memória fotográfica do corpo nu de Scarlett Johansson.
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