sexta-feira, setembro 15, 2006
CRIME DELICADO
Difícil falar de uma obra que eu não entendi direito. Ao mesmo tempo, CRIME DELICADO (2005) é o tipo de filme que me fez ficar pensando nele durante um bom tempo, sem ainda conseguir encontrar respostas para as várias perguntas. A primeira delas pode resumir todas as outras: afinal de contas, CRIME DELICADO é sobre o quê? Sobre amor, sobre arte, sobre crítica? Daí surgem as outras perguntas, mais específicas: o crítico é maluco?, o pintor é um charlatão?, sua obra é pornográfica?, a modelo está sendo usada como objeto ou alcançando a libertação? E mais: qual o objetivo principal daquelas cenas de peças teatrais?
Mas é melhor eu parar com tantas perguntas, senão isso aqui vai ficar parecendo uma entrevista que conta com a participação apenas do entrevistador. Assim, ainda confuso em estabelecer o que senti ou pensei sobre o filme, vou aos poucos tentando descrever minhas impressões.
Antes de mais nada, não custa lembrar que CRIME DELICADO foi durante muito tempo um dos filmes mais aguardados do ano pra mim. Isso porque eu sou daqueles que consideram O INVASOR (2002) o melhor filme brasileiro dos últimos, sei lá, dez ou quinze anos. Por isso que não deixa de ser um pouco frustrante perceber que o novo filme de Beto Brant é totalmente diferente dos seus três primeiros filmes, mais parecidos com thrillers policiais. Dessa vez, Brant abandona os travellings e utiliza mais câmera parada, abandona os espaços abertos e se fecha em quatro paredes, abandona o modelo clássico-narrativo para ingressar nas experimentações da vanguarda.
Antes mesmo de eu ver o filme, já havia ficado impressionado com a coragem de Lilian Taublib, a moça que, na adolescência, perdeu uma perna por conta de um câncer e que aceitou fazer o papel de Inês, uma modelo que mora num ateliê de um pintor (Felipe Ehrenberg) que explora o seu corpo para produzir suas obras, que se apoiam no fetichismo, no corpo incompleto da moça.
Pra mim, o melhor momento do filme é o do primeiro encontro de Inês com o crítico Antonio Martins (vivido por Marco Ricca). Ela está sozinha num bar bebendo e Antonio se encanta com sua beleza e seu senso de humor. Outro grande momento vem logo em seguida, quando os dois vão para a casa de Inês e ele fica parado sem saber o que fazer. Depois disso, o filme vai ficando cada vez mais estranho e fragmentado, meio que um misto de teatro, cinema, artes plásticas e documentário.
A improvisação fica mais explícita nas cenas do bar, quando Antonio, já sentindo a paixão forte por Inês, começa a prestar atenção na vida ao seu redor. Dessa vez, sentindo-se também um participante, não apenas um observador. Inclusive, na cena em que aparece o cineasta Cláudio Assis, Ricca não passa desapercebido quando olha para a briga do casal de bêbados. Outro convidado ilustre que participa do filme é o escritor cearense Xico Sá - inclusive, não deixem de ler esta entrevista dessa figura.
Numa entrevista para a revista Teorema (edição nº 9), Beto Brant afirmou que uma chave de compreensão para o filme está no discurso final de Felipe Ehrenberg. Engraçado que como eu tomei partido desde o início do personagem do Marco Ricca, eu tive a tendência de vilanizar o personagem de Ehrenberg. Eu, erroneamente, estava vendo o filme como uma obra maniqueísta. Assim, eu via o personagem do crítico como vítima, talvez por me identificar um pouco com sua dificuldade de se socializar. E como ele é o protagonista, essa identificação se torna ainda mais fácil.
Mais agradável de ver que o próprio filme é o documentário com o making of, que vem presente no DVD da Videofilmes. O documentário é também uma maneira de ver o quanto Marco Ricca foi importante para o projeto (quase um segundo diretor), o ponto de vista do diretor de fotografia Walter Carvalho, e, principalmente, de conhecer um pouco mais sobre essa pessoa fascinante que é Lilian Taublib. Imperdível.
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