terça-feira, novembro 15, 2005

MONSTROS (Freaks)

 

Meu interesse pela obra de Tod Browning aumentou exponencialmente a partir da leitura dos artigos escritos por Daniel Camargo para duas edições da saudosa Cine Monstro. Seu texto sobre O MONSTRO DO CIRCO (1927) me despertou uma vontade enorme de conhecer esse e outros filmes de Browning. Acredito que O MONSTRO DO CIRCO deve ter sido uma espécie de preparação para MONSTROS (1932), seu quarto filme falado - os três primeiros foram THE THIRTEENTH CHAIR (1929), O FORA DA LEI (1930) e DRÁCULA (1931). Após ter feito DRÁCULA por encomenda para a Universal, Browning foi contratado pela MGM para realizar o seu polêmico filme sobre pessoas com deformidades físicas, tratadas como aberrações de circo. 

Se em DRÁCULA já se notava um despreparo do diretor com as novas técnicas do cinema falado, com muito falatório e câmera estática, em MONSTROS percebe-se uma evolução. Há um uso maior de movimentos de câmera e dos mais variados ângulos. Mas os responsáveis pelo sucesso do filme foram mesmo os anões e as pessoas deformadas, contratadas para interpretarem os freaks do título. Quer dizer, o filme não foi bem um sucesso de bilheteria no ano em que foi produzido. Na verdade, ele foi um fracasso retumbante, já que foi boicotado pelas ligas de decência do país inteiro, sendo logo recolhido. Dizem que nas exibições teste, muita gente saiu correndo da sala com poucos minutos de filme. Mas eu considero o resultado final do filme um sucesso. 

A história envolve os temas favoritos de Browning: deformidades físicas e morais e mutilação. Essa obsessão do diretor por esse tipo de tema, dizem que pode ter nascido de um acidente de carro sofrido por ele. Em 1915, Browning e seus amigos estavam voltando de uma festa. Por causa de uma forte neblina, o carro de Browning colidiu com o vagão de um trem que passava pelo cruzamento. O diretor Allan Dwan, que vinha num carro atrás do seu, dizia se lembrar com horror daquela noite, quando teve que recolher pedaços dos amigos pela estrada. Browning sobreviveu ao acidente, mas a tragédia marcou a sua obra. 

Na trama de MONSTROS, um anão se apaixona por uma trapezista. Cego pela paixão, ele não percebe o quanto está sendo ridicularizado por ela, que só se interessa pelo seu dinheiro, ainda pretendendo matá-lo envenenado. Os dois fazem parte de um circo que contém muitas pessoas com defeitos físicos: um homem cujo corpo terminava nas costelas e usava as mãos como se fossem pés, um outro sem braços nem pernas que consegue acender um cigarro sozinho, um hermafrodita, uma mulher barbada, uma outra que não tem braços e usa as pernas para comer, as irmãs siamesas, pessoas com cabeças "de alfinete" e anões. Muita gente ficou admirada se perguntando do porquê de Irving Thalberg ter topado produzir um filme como esse. Mas, se por um lado, muita gente achava que Browning estava explorando essas pessoas, por outro, notava-se o carinho que ele tinha para com elas. 

O filme contém apenas 61 minutos de duração e é um belíssimo trabalho. Há pelo menos três seqüências antológicas: a das bodas da trapezista com o anão, com todos os freaks gritando "one of us!" (cena que foi citada em OS SONHADORES, do Bertolucci); a cena da tempestade, que traz a cruel vingança dos "monstros"; e a chocante cena final, mostrando o destino da trapezista. O DVD do filme, lançado pela Magnus Opus, contém uma galeria de fotos de várias "aberrações" e alguns textos sobre assuntos relativos ao filme, sendo que o melhor deles é sobre o filme em si, escrito pelo crítico Luiz Nazário. 

P.S.: Está no ar, no CCR, coluna nova falando de meu primeiro ano como cinéfilo.

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