sexta-feira, setembro 06, 2013
QUATRO CURTAS BRASILEIROS
Fazer curtas é uma arte que guarda semelhanças com escrever contos. Não se trata apenas da questão envolvendo a duração e o tempo, mas também o tipo de experimentação, a capacidade de síntese de trazer uma ideia e há também uma chance de aplicar experimentalismos que para um longa-metragem seria complicado tanto mercadologicamente quanto, em algumas situações, cansativa. O cinema brasileiro tem cada vez mais se enriquecido com curtas-metragens de ótima qualidade. A vantagem de serem curtos é que a gente pode rever logo em seguida. E caso não tenhamos captado algo, pode ser visto na revisão e até com mais prazer. Vejamos quatro exemplares de novos curtas produzidos em terras brasileiras.
DÉCIMO SEGUNDO
O meu preferido desses quatro curtas, DÉCIMO SEGUNDO (2008), de Leonardo Lacca, trabalha com a atmosfera como poucos. Um filme que lida com os silêncios, aqueles silêncios bem perturbadores entre conversas. O início do filme é bem interessante, com a história da mala que vai pelo elevador e é recebida pela amiga do personagem de Irandhir Santos. Percebe-se a diferença de vida dos dois: ela totalmente habituada com a rotina de cidade grande (São Paulo?); ele, vindo do Nordeste, talvez do interior, ou de alguma outra cidade. O elo que os unia parece ter fenecido com o tempo, a julgar pela conversa dos dois. E isso é um dos trunfos desse filme. Adoraria ver um longa de Leonardo Lacca. Vale ler, depois de ter visto o filme, claro, uma excelente crítica de Rodrigo de Oliveira, publicada na Contracampo, em que o curta é esquadrinhado e visto com muita sensibilidade.
ALGUÉM NO FUTURO
Este é um filme de um amigo (ou pelo menos um conhecido meu, já que ainda não paramos pra conversar melhor e nos conhecemos no Aeroporto de Porto Alegre, depois do Festival de Gramado de 2012). Fiquei sabendo este ano mesmo deste projeto, que chegou a ser exibido em uma espécie de restaurante na Praia de Iracema, mas só agora, que caiu na rede, que pude ver este trabalho de Salomão Santana, de título bonito, ALGUÉM NO FUTURO (2013). É um filme que aproveita belíssimas imagens em preto e branco e em scope (no início em forma de fotos) e depois há uma sequência maior em que o próprio Salomão participa como ator (na minha opinião, poderia ter colocado outro, mas Woody Allen nunca foi também um grande ator e nunca deixou de ser brilhante). Nas cenas com Salomão e a amiga, ele reclama da vida, do vazio da existência. Confesso que foi um filme que me deixou um tanto confuso, mas já gostei da narração em voice-over da personagem Estela. Em seguida, imagens de CASABLANCA, enfatizando os olhos de Bogart e Ingrid. Faz lembrar Alain Resnais. Há, então, essa ligação com o passado constantemente. Gosto de muita coisa do filme. Só não gosto do diálogo na rua. Mas é, sem dúvida, um filme a ser conferido e revisto para descobrir mais coisas.
O MENINO JAPONÊS
Caetano Gotardo hoje é mais conhecido como o diretor do longa O QUE SE MOVE (2012), mas antes disso ele já vinha trilhando um caminho de sucesso no curta-metragem, feito juntamente com o talentoso pessoal do Filmes do Caixote. O MENINO JAPONÊS (2009) não me pegou de primeira. Tive de rever e entrar no clima, principalmente tentando lembrar o quanto O QUE SE MOVE me comoveu. Na trama, o próprio Gotardo conversa com um amigo na sacada de um apartamento, visualizando as pessoas do prédio ao lado. O fazer filmes também está presente, já que o amigo está preparando um vídeo, que não chega a ser apresentado para nós. A vida real aqui, que por sua vez é tornada em ficção para tornar a ser real, é que importa. O filme também lida com sentimentos de amor. No caso, o amor entre os dois amigos. Da importância de estar junto de quem se ama. Acredito que é o tipo de filme que depende muito do estado de espírito para ser apreciado. De preferência no cinema e com o espírito quieto – ou inquieto, mas em sintonia com a obra.
FANTASMAS
É o caso de ideia tão boa e fácil de fazer que eu me peguei pensando: por que não pensei nisso antes?. É sensacional! É mais ou menos a sensação que tive ao ver o longa experimental VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO, de Marcelo Gomes e Karim Aïnouz. Quer dizer: trata-se de uma ideia barata e inteligente posta em prática com precisão. No caso de FANTASMAS (2009), André Novais Oliveira coloca a câmera parada olhando em frente a um posto de gasolina enquanto, em off, ouvimos a voz de dois amigos conversando sobre assuntos da vida. A pergunta que fica e que depois é respondida: por que aquela câmera posicionada daquela maneira? E depois a resposta para o título dúbio do curta, que só cresce, à medida que o revemos.
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