quarta-feira, agosto 13, 2008

A ÚLTIMA AMANTE (Une Vieille Mâitresse)



Acredito que desde ROMANCE X (1999) que um filme de Catherine Breillat não é distribuído nos cinemas brasileiros. O filme aproveitava a polêmica em torno da inclusão no elenco de um ícone pornô, o italiano Rocco Siffredi. O resultado foi apenas mediano, mas valeu a intenção. Por mim, haveria com mais freqüência uma maior interação entre atores do mainstream e performers da indústria pornográfica, que continua existindo à margem, mesmo na Europa, um continente cujas cinematografias são em geral mais liberais que as de Hollywood.

No intervalo entre o filme que deu fama à Breillat, a diretora foi se tornando aos poucos mais respeitada pela crítica. Tanto que eu fiquei realmente admirado com a qualidade e a sensibilidade presentes nesse novo trabalho, entitulado no Brasil A ÚLTIMA AMANTE (2007), e estrelado por Asia Argento, que cada vez mais tem escolhido projetos interessantes e desafiadores, vide os recentes TRAIÇÃO EM HONG KONG, de Olivier Assayas, e TRANSYLVANIA, de Tony Gatlif. Sem falar que ela está também em RETORNO DA MALDIÇÃO – A MALDIÇÃO DAS LÁGRIMAS, do papai Argento. Mesmo nos Estados Unidos, pode-se ver que ela tem selecionado trabalhos mais alternativos, como ÚLTIMOS DIAS, de Gus Van Sant, MARIA ANTONIETA, de Sofia Coppola, GO GO TALES, de Abel Ferrara, e TERRA DOS MORTOS, de George Romero. Quer dizer: a menina costuma andar muito bem acompanhada, além de ter demonstrado ser também uma ótima diretora, com o chocante e sensível MALDITO CORAÇÃO.

E Asia domina o filme de Breillat, ainda que o ponto de vista não seja dela, mas do amante, o andrógino estreante de nome esquisito Fu'ad Ait Aattou, que a diretora descobriu num café parisiense. Ele é um rapaz com boca de mulher, mas que tem a fama de ser um dos maiores conquistadores da aristocracia parisiense – o filme se passa no século XIX, no momento em que o livro "As Relações Perigosas", de Choderlos de Laclos, estava fazendo muito sucesso no país.

Na trama, dessa vez sem sexo explícito, A ÚLTIMA AMANTE mostra um jovem de coração balançando entre sua noiva, Hermangarde, uma linda mas pudica jovem da aristocracia, interpretada pela bela Roxane Mesquida, que aparece na cena de maior beleza plástica do filme: o momento em que ela se mostra nua na cama, com Ryno de Marigny (o personagem de Fu'ad Ait Aattou). Aliás, Roxane também aparece no anterior SEX IS COMEDY (2002), da mesma diretora, cuja cópia em divx, já tenho uma comigo aqui (oba!). A beleza do corpo nu de Roxane me deixou encantado.

Curiosamente, por mais que Asia Argento tenha explorado bastante a nudez e a sensualidade desde o início de sua carreira, ela é mostrada no filme como uma mulher feia– é assim que Ryno a vê quando a encontra pela primeira vez -, além de execrada pela sociedade por seus modos (aquele charuto que ela fuma lembra uma mãe de santo). De ascendência espanhola e com um ar de cigana, Vellini, a personagem de Asia, aos poucos vai se mostrando cada vez mais enigmática e atraente, de modo que o próprio Ryno vai se tornando crescentemente obcecado por ela, chegando ao ponto de duelar com armas de fogo com seu marido. Isso o espectador vai acompanhando a partir das declarações que Ryno dá à avó da jovem, a marquesa de Flers, como prova de confiança de que ele está de fato disposto a se desligar de sua antiga amante para se dedicar a um casamento comportado com uma dama da alta sociedade. O filme tem um aspecto que às vezes remete aos mais tradicionais e acadêmicos filmes de época mas às vezes também lembra, principalmente nos momentos de conversa entre Ryno e a velha senhora – que se delicia com os detalhes mais íntimos da história da relação entre Ryno e Vellini -, os melhores trabalhos de Eric Rohmer. No entanto, por mais que transpareça esse academicismo, o filme vai se revelando bem mais especial e com soluções narrativas que fogem do lugar comum.

P.S.: Soube através do Filipe que entre ROMANCE X e A ÚLTIMA AMANTE dois filmes de Breillat foram distribuídos no Brasil: PARA MINHA IRMÃ (2001) e seu primeiro trabalho, UMA ADOLESCENTE DE VERDADE (1976). De qualquer maneira, esses filmes não entraram em cartaz em Fortaleza.

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