quinta-feira, julho 20, 2006
O CINEMA INDEPENDENTE AMERICANO EM 4 FILMES
Quando estava na noite de abertura do I Festival Latino de Cinema, em São Paulo, não lembro quem foi que falou, acho que o João Batista de Andrade, que o nosso cinema precisava brigar por um espaço dentro do pouco espaço que o cinema americano deixava. E que dentro desse espaço pequeno, que abrigam filmes de todas as partes do mundo, haviam também filmes americanos, pertencentes ao cinema independente. Sei que é realmente uma luta desleal, mas diante de filmes tão interessantes vindos da cinematografia americana, eu não consigo vê-los como inimigos. Até porque uma das principais características desse cinema é o fato de que ele é simpatizante dos tipos marginais, das pessoas rejeitadas, das pessoas estranhas. Pode-se dizer que o que há de mais ousado no cinema americano hoje se encontra nessas produções de menor orçamento e nas produções das televisões por assinatura. Da semana que eu estive em Sampa, tive a oportunidade de ver três filmes independentes e quando retornei para Fortaleza, vi que estava passando A LULA E A BALEIA (2005) no Espaço Unibanco daqui. Como estou com uma quantidade enorme de filmes pra comentar aqui no blog, vou ter que fazer de vez em quando esses posts "coletivos".
FACTOTUM - SEM DESTINO (Factotum)
Foi o terceiro filme que eu vi inspirado na vida do escritor maldito Charles Bukowski. Como já era de esperar, não falta bebedeira, sarjeta e falta de rumo na vida. Se comparado com CRÔNICA DE UM AMOR LOUCO, de Marco Ferreri, e BARFLY - CONDENADOS PELO VÍCIO, de Barbet Schroeder, FACTOTUM (2005) sai perdendo. Há mais coisas em comum na trama com o filme de Ferreri, mas uma das principais diferenças é que FACTOTUM foca mais nas tentativas do protagonista de conseguir um emprego normal, enquanto tenta arranjar um editor para o seu livro. O problema é que ele rapidamente fica entediado ou aborrecido com o trabalho e sai para o bar mais próximo tomar umazinha. Talvez um dos problemas do filme seja a escolha de Matt Dillon para o papel. Ele, em nenhum momento, parece estar na pior, por mais que a maquiagem tente. Quem desempenha muito melhor essa função é Lili Taylor, que interpreta uma das amantes de Henry Chinaski. Senti falta de uma mulher linda como a Ornella Muti, mas nem sempre se pode ter tudo. E, se tivesse, aí que o filme não ia funcionar mesmo.
EU, VOCÊ E TODOS NÓS (Me and You and Everyone We Know)
Um dos filmes mais belos a aportar nas telas. Há uma ternura neste EU, VOCÊ E TODOS NÓS (2005) que não se vê mais nos filmes de hoje. Fiquei curioso para saber quem é essa simpatia chamada Miranda July, que debuta na direção de filmes e também comparece como uma das personagens principais. Pois bem, antes de fazer sucesso no circuito alternativo, Miranda era uma artista performática e uma escritora de contos. Soube também que ela escolheu o sobrenome "July" porque esse é o mês que mais facilita a sua vida. Até achei que ela fosse canceriana por causa disso, mas não: ela é aquariana. O filme apresenta um grupo de quatro pessoas que se conectam por alguma razão. Tem a artista solitária interpretada por Miranda, o recém-separado vendedor de sapatos que tem dois filhos; os dois garotos também têm importância fundamental na trama. Inclusive, o mais novo é responsável por um dos momentos mais engraçados do filme, quando ele e o irmão estão no chat com uma estranha, na internet. Já a seqüência do peixe em cima do carro em movimento é tão cheia de amor que faz com que uma energia toda especial contamine toda a sala de exibição. Magia pura.
BUBBLE - UMA NOVA EXPERIÊNCIA (Bubble)
Steven Soderbergh é talvez o principal nome surgido no cinema independente americano nos últimos vinte anos. Com o tempo ele foi sugado para o cinemão hollywoodiano, mas ele conseguiu reverter a situação e hoje faz o que bem entende na indústria. Nada como ter amigos na praça. E ele tem muitos, entre eles, astros do primeiro escalão, como Brad Pitt, George Clooney e Julia Roberts. Apesar disso, ele preferiu voltar às origens nesse BUBBLE (2006), que nos Estados Unidos foi lançado simultaneamente em cinema, DVD e tv a cabo. O elenco é formado por atores não profissionais. Como é um projeto menor, o próprio Soderbergh foi responsável pela fotografia e pela edição do filme, embora não tenha sido creditado. BUBBLE é desses filmes que causam angústia no espectador. A trama gira em torno de duas pessoas, um rapaz e uma senhora de meia-idade que trabalham numa fábrica de bonecas. Sua rotina triste é modificada com a chegada de uma jovem na fábrica. Não dá pra dizer muita coisa para não estragar o filme. Mas adianto que ver BUBBLE é entrar triste e sair deprimido.
A LULA E A BALEIA (The Squid and the Whale)
Qualquer filme que tenha a Laura Linney já vale a pena ser visto. Taí uma atriz extraordinária. A LULA E A BALEIA trata da repercussão de uma separação na vida de um casal e seus dois filhos adolescentes. O filme foi baseado nas experiências de vida do próprio Noah Baumbach (o diretor) quando adolescente. Tanto que o filme até se passa no começo dos anos 80, ficando, assim, mais próximo do que realmente pode ter acontecido. Mas, independente de ser ou não baseado em fatos reais, trata-se de um belo filme e que tem personagens cativantes e cheios de defeitos e problemas. Jeff Daniels é o pai mão-de-vaca e dominador que se separa depois de levar uns pares de chifre da esposa (Laura Linney). O filho mais velho é um dos personagens mais interessantes. Ele é o exemplo de uma pessoa que não busca suas próprias experiências. Ele copia uma canção do Pink Floyd e diz que é sua para participar de um concurso de música na escola; ele pergunta ao pai sobre as principais obras de determinados autores, para não "perder tempo" lendo. Hilária a cena dele discutindo "A Metamorfose", de Kafka, com uma garota. Pior que existe mesmo pessoas assim. Dia desses, estava esperando ônibus lendo "O Código Da Vinci" quando um sujeito estranho se aproxima para debater o livro comigo. Detalhe: ele nunca leu o livro. Interessante que, no filme, quem mais parece saber o que quer da vida e que tem mais sabedoria é a personagem de Laura Linney. A mulher traidora é quem sai melhor na fita.
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