sábado, março 11, 2023

PÂNICO VI (Scream VI)



As últimas semanas (na verdade, os últimos meses) foram marcadas por muito trabalho, muita preocupação, muitos afazeres e, além de tudo, pouca energia para me dedicar ao blog, o que me deixa um pouco frustrado. Mas não posso reclamar, pois houve motivos nobres e positivos para minha dificuldade de conseguir mais tempo para o que gosto de fazer. Por conta disso, houve um acúmulo altíssimo de filmes vistos e apenas comentados brevemente no calor do momento. Logo, vou voltar, pelo menos neste mês de março, a colocar mini-textos de três e não de dois filmes, de modo a diminuir essa pilha. Geralmente tomo cuidado para colocar filmes que tenham um pouco a ver com o texto principal, mas nem sempre isso é possível.

Falemos então de PÂNICO VI (2023), o mais novo exemplar da franquia criada por Wes Craven e Kevin Williamson em 1996 e que foi marcante por trazer um senso de humor muito próprio e um sentimento de autoconsciência dos personagens de estarem dentro de um slasher em que eles são suspeitos e vítimas. Dois anos antes, Craven havia brincado com metalinguagem no genial O NOVO PESADELO – O RETORNO DE FREDDY KRUEGER (1994), em que a maior parte do elenco e da equipe técnica interpretava a si mesmos e eram também potenciais vítimas do assassino dos sonhos. (Se bem que esse tipo de brincadeira, o nosso querido José Mojica Marins já havia feito em EXORCISMO NEGRO, em 1974.) 

Com a morte de Craven em 2015 e um quarto filme de PÂNICO tendo surgido em 2011, num espaçamento maior de tempo com os demais exemplares que trazia tanto a sensação de cansaço, quanto de alegria, parecia quase impossível alguém conseguir fazer algo tão bom quanto os trabalhos do mestre. Alguns fãs mais radicais nem olhavam (nem olham) com bons olhos o trabalho da dupla Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillet de assumir a dura tarefa de continuar o legado do mestre. E por isso PÂNICO (2022), o quinto filme da franquia, recebeu críticas divididas. Não se poderia esperar algo diferente deste novo filme, ainda mais por ter sido feito com tanta rapidez, aproveitando evidentemente o sucesso comercial do anterior.

O novo filme, com “sede” agora em Nova York, mantém a tradição de começar com um prólogo em que uma garota recebe uma ligação do assassino e é brutalmente morta. Aqui há algo que chama mais a atenção dos fãs mais atentos de slashers, que é a menção explícita aos gialli, os charmosos filmes de matança italianos que influenciaram o surgimento dos slashers a partir do final dos anos 1970. A garota da vez é interpretada por Samara Weaving, protagonista de CASAMENTO SANGRENTO (2019), o filme que deu maior visibilidade à dupla de diretores. Mas há algo que foge à regra, pelo menos aparentemente, no prólogo: o assassino tira a vestimenta e vemos seu rosto. Além disso, quando ele chega em casa, ele usa uma camiseta com o título de um filme cult de Dario Argento, QUATRO MOSCAS SOBRE VELUDO CINZA, terceiro filme do maestro do terror. E há outro detalhe muito importante que será a cara deste novo filme: ao chegar em casa, esse rapaz falará sobre o quanto foi prazeroso para ele matar aquela mulher. Quase como um orgasmo.

Essa questão do prazer nas mortes lembra bastante os filmes de Argento, que trazem o prazer associado à beleza visual das cenas gráficas de morte e violência, e também associadas a uma excelente trilha sonora. Não temos uma excelente trilha sonora aqui, mas o tema do prazer de matar está presente. Inclusive, eu diria que o fato de termos uma heroína que carrega o sangue de um dos assassinos do primeiro filme, Billy Loomis (Skeet Ulrich), e de ter contato com seu fantasma – ou seriam alucinações? –, ajuda a tornar a personagem mais sombria. Aliás, a classificação indicativa 18 anos do filme no Brasil deve ter mais a ver com essas questões do que com as cenas de assassinatos em si. Falando na moça, Melissa Barrera já é uma das melhores musas do gênero. Por outro lado, acho a personagem de Jenny Ortega fraca. E como o tempo é cruel, já se percebe uma falta de interesse em dar maior importância à personagem de Courtney Cox, a única do trio original que volta para o novo filme.

Uma das coisas que senti falta neste novo exemplar da franquia foi a falta de um humor mais eficiente. E foi algo que não entendi, pois a dupla de diretores conseguiu direitinho no filme anterior, que me deixou com um sorriso de orelha a orelha do início ao fim. De todo modo, PÂNICO VI ainda é um bom filme e os novos autores não deixam a peteca cair e mantêm o legado de Wes Craven bastante relevante. Talvez só precisem pensar melhor o próximo projeto e não fazer as coisas de maneira tão apressada. E o que é aquela personagem da Hayden Panettiere? Uma participação infeliz ou apenas uma personagem mal construída? Ela foi a “primeira garota” de PÂNICO 4 (2011) e agora volta como uma agente do FBI. Pelo menos a rápida conversa dela sobre filmes de terror com a personagem de Jasmin Savoy Brown é divertida.

Mudar as regras e as repetições é outro desafio que é conseguido pelos diretores, assim como trazer questões de tempos de pós-verdade. A violência segue bem gráfica e enaltecendo alguns mestres do horror italiano, mas não acho que nenhuma cena tenha o mesmo impacto daquela antológica dos assassinos se esfaqueando do primeiro filme. Mas fazer isso seria muito difícil. Uma pergunta que me faço: o fato de o filme deixar a gente com vontade de ver um slasher “raiz” (dos anos 1980) ou um bom giallo (dos anos 1970) seria um bom ou um mau sinal?

PÂNICO VI foi o primeiro filme da franquia a ganhar lançamento em 3D. Não sei como foi o resultado pois quase sempre o 3D mais atrapalha do que ajuda. Se alguém viu em 3D, me diga se há algum ganho no entretenimento.

+ TRÊS FILMES

PEARL

A prequel de X – A MARCA DA MORTE (2022) é um filme mais ousado que seu anterior em aspectos formais. Há um tempo mais estendido, com direito até a um monólogo muito mais longo do que estamos acostumados em filmes do gênero. Podemos chamar de slasher também, já que há a figura do assassino e várias mortes, mas é uma obra mais interessada na personagem de Mia Goth do que em trazer diversão ou medo com as mortes. Ao que parece a atriz contribuiu bastante com os diálogos, já que é corroteirista junto com Ti West. O diretor também tem se mostrado muito habilidoso em homenagear determinados períodos do cinema usando uma direção de arte muito criativa. Seus melhores filmes fazem essa homenagem - incluo A CASA DO DIABO (2009) entre eles. Aqui ele homenageia os filmes do cinema mudo, já que a história se passa em 1918. Aguardemos MAXXINE, a verdadeira continuação de X, novamente com Mia Goth, e com uma pegada oitentista.

O PÁSSARO SANGRENTO (Deliria/StageFright)

A revisão de O PÁSSARO SANGRENTO (1987), de Michele Soavi, me ajudou não apenas a refrescar a memória, afinal vi o filme pela primeira vez há vinte anos, mas a perceber melhor o interesse de Soavi em fazer um slasher com um cuidado muito maior na direção de arte, seguindo os passos de seu mestre, Dario Argento. Este foi o primeiro filme do realizador e demoraria mais uns poucos para que ele mostrasse ao mundo sua obra-prima (PELO AMOR E PELA MORTE, 1994). Na trama, um assassino psicopata entra dentro de um teatro onde um grupo de artistas pouco famosos está ensaiando uma peça. As cenas de violência não são exatamente violentas. Elas parecem procurar uma espécie de beleza transcendental e isso faz com que a obra se distancie bastante dos exemplares do gênero lançados com bastante frequência na década de 1980. A trilha sonora é bem oitentista, mas remete mais às produções italianas (aos gialli, principalmente) do que às americanas. Visto no box Slashers (o primeiro).

A PRAIA DO PESADELO (Nightmare Beach / La Spiaggia del Terrore)

Quando estou muito estressado ou cansado ou me sentindo um tanto sem energia, minha vontade é ver um filme de décadas passadas, de preferência de gênero, para relaxar. Recorri ontem a este slasher de Umberto Lenzi, diretor a que sempre tive uma relação de achar menor ou de menor importância, mas isso é um preconceito bobo de que preciso me livrar. Este A PRAIA DO PESADELO (1989) é bem divertido, com a beleza da praia de Palm Beach, das mulheres lindas em roupas de banho, e há um visual muito interessante do assassino, um cara com roupa de motoqueiro com um capacete em que não se vê o rosto, e durante as mortes vemos a imagem dos últimos momentos de vida das vítimas. A trilha sonora de Claudio Simonetti ajuda a dar um ar gostoso ao filme, assim como as canções que pendem para o hard rock e o heavy metal. Na trama, motoqueiro vai injustamente para a cadeira elétrica e promete se vingar. Logo em seguida, aparece esse motoqueiro misterioso que mata suas vítimas queimadas ou eletrocutadas, em geral. O filme explora a beleza dos corpos na juventude da mesma maneira que flerta com a morte, o que é uma coisa muito comum no slasher. Esse aqui, porém, tem um quê de giallo, mas isso se dá mais pelo estilo do diretor e pela questão da investigação do assassino. Filme visto no box Slashers VII.

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