sábado, junho 05, 2021

OS MIL OLHOS DO DR. MABUSE (Die 1000 Augen des Dr. Mabuse)



Era 13 de maio de 2020, quando iniciei minha peregrinação pela obra de Fritz Lang com a revisão de M - O VAMPIRO DE DUSSELDORF (1931), comecei por uma obra já do cinema falado para ir me preparando para o cinema mudo, com vários títulos com metragem bem longa. Elaborei uma tabelinha, de modo que, para cada três falados, eu via um mudo para ir me animando até o fim da jornada (me considero uma pessoa muito apegada às palavras). Felizmente, adorei certos filmes mudos também, como DR. MABUSE, O JOGADOR (1922), que está hoje no meu top 5 dos meus favoritos do realizador.

Eis que termino esta peregrinação justamente com OS MIL OLHOS DO DR. MABUSE (1960), terceiro e último filme de seu retorno à Alemanha do pós-guerra após um brilhante período de cerca de 20 anos em Hollywood. Curiosamente, seus três últimos filmes tentam reciclar ou aproveitar muitas dos temas de sua fase germânica. Mas tudo de uma maneira ao mesmo tempo nova e velha, com um anacronismo estranho e talvez por isso tenham sido abraçados com carinho pelos novos críticos franceses.

Depois do sucesso popular dos filmes indianos - O TIGRE DA ÍNDIA (1959) e O SEPULCRO INDIANO (1959) -, o produtor Artur Brauner propôs a Lang refilmar OS NIBELUNGOS (1924), mas o diretor achou isso um absurdo. Depois, Brauner propôs um remake de A MORTE CANSADA (1921), também rejeitado pelo realizador. Ou seja, parece que Brauner acreditava que o cineasta austríaco não conseguia mais ter uma ideia nova. Foi com a sugestão de refilmar O TESTAMENTO DO DR. MABUSE (1933) que Lang teve a ideia de trazer de volta o seu personagem mais famoso, o gênio do mal de mil faces. Em vez de uma refilmagem, porém, ele preferiu uma nova história, no mundo contemporâneo e com a questão da bomba atômica no ar. Era o novo temor e o que movia os principais filmes de espionagem de então.

E novamente foi um sucesso. Tanto que acabou gerando vários outros filmes mais populares com o personagem Dr. Mabuse, dirigido por outros cineastas e muitos deles estrelados pelo mesmo Wolfgang Preiss de OS MIL OLHOS DO DR. MABUSE no papel do gênio do mal. Aliás, é interessante o fato de Lang esconder até o final a identidade do novo Dr. Mabuse. Ele não queria estragar a surpresa. É diferente, de O TESTAMENTO, quando já sabíamos desde o começo quem era o Dr. Kramm.

No caso de OS MIL OLHOS, na verdade, há um roteiro tão intrincado que eu acredito que rever o filme seja ideal para ter uma melhor compreensão. E até para gostar mais dele também. A história é um mosaico de incidentes que se interconectam. A trama começa com o assassinato de um homem numa avenida. Ele é atingido por um dardo de metal que fura seu cérebro, enquanto o sinal está fechado.

O personagem mais próximo de um protagonista no filme é o milionário americano Henry B. Travers (Peter van Eyck), que está passando uns dias no hotel Luxor. Logo em seguida, somos apresentados a Marion (Dawn Adams), uma mulher que estaria prestes a pular do alto de uma sacada. Travers convence a jovem a mudar de ideia e ela fica em seu apartamento por um tempo. Travers se apaixona por Marion. Acontecem em seguida também atentados a um delegado de polícia e a participação de um sujeito cego que supostamente teria a habilidade de prever o futuro, um personagem tipicamente languiano.

É curioso como o filme é um resumo de muita coisa que Lang realizou desde o começo de sua carreira. A economia de música por exemplo, remete aos filmes dos anos 1930, mas há muito de Hollywood. É como se ele trouxesse o noir americano (com direito a uma femme fatale) para o thriller de espionagem europeu. Achei a trama confusa pra caramba, mas o ideal é relaxar e se deixar levar pela história meio onírica. Achei curioso o corte brusco na última cena, estranhamente sem som.

+ DOIS FILMES

O TERROR DA SERRA ELÉTRICA (Mil Gritos Tiene la Noche)

De vez em quando a gente se pega tendo que avaliar um filme por critérios bem distintos do que se poderia avaliar, no caso, um suspense americano tradicional, por exemplo, ou um filme policial sangrento. Neste O TERROR DA SERRA ELÉTRICA (1982), de Juan Piquer Simón, slasher com influência forte dos gialli, produzido na Espanha e com a história se passando em uma high school americana, temos uma sensação de estranhamento que já se apresenta desde o começo, quando uma mãe flagra seu pequeno filho brincando com um quebra-cabeças de uma mulher nua. Ela briga com a criança, que se revolta e mata e esquarteja a mãe a machadas. A história principal se passa 40 anos após o incidente do prólogo, na escola, e logo surgem novas vítimas de um assassino misterioso, que tem por hábito usar uma motosserra. É filme para se divertir com o clima, com a exploração da nudez e do exagero nos jorros de sangue e com uma trama de investigação que não importa tanto assim. O modo como o filme termina, inclusive, é mais uma prova de que o diretor pareceu não levar tão a sério assim o seu trabalho. Com certeza vale a espiada, até por ter se tornado um clássico exploitation. Filme presente no box Slashers III.

ESCOLA DA BESTA SAGRADA (Seiju Gakuen)

Eis um filme que deve ter conquistado muitos espectadores curiosos na época que foi lançado no Japão. Como estamos falando de um país não-católico, não houve problemas em fazer um nunsploitation àquela altura, com um pouco mais de liberdade para usar a nudez no cinema que só naquela década havia sido conqusitada. Junto com a nudez, que hoje em dia não deve ser motivo de muito entusiasmo, há algo que ainda incomoda, que são as cenas de tortura dentro do convento. É justamente por isso, por esse tipo de ousadia, que ESCOLA DA BESTA SAGRADA (1974), de Norifumi Suzuki, é lembrado dentro do gênero. Na trama, a heroína, depois de uma noite de sexo com um homem, se apresenta para entrar em um convento. Com o tempo vamos sabendo que ela está ali por um motivo muito particular. Filme presente no box Cinema Exploitation 2.

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