sexta-feira, fevereiro 10, 2017
CLARISSE OU ALGUMA COISA SOBRE NÓS DOIS
Terceiro longa-metragem de Petrus Cariry, CLARISSE OU ALGUMA COISA SOBRE NÓS DOIS (2015) finaliza a chamada "Trilogia da morte", iniciada com O GRÃO (2007) e MÃE E FILHA (2011). O rigor formal apresentado nos trabalhos anteriores, bem como o cuidado com a beleza das imagens, que desde o primeiro filme tem sido comparadas a pinturas clássicas, se manifesta ainda mais forte neste novo trabalho, que conta a história de uma jovem mulher que vai até a casa do pai doente passar uns dias.
Não é um filme fácil. É propositalmente lento e com um tipo de dramaturgia que se distancia do naturalismo, por mais que a estranheza nas interpretações não nos impeça de admirar a excelente performance de Sabrina Greve, premiada na edição do Cine Ceará do ano passado. A atriz já havia aparecido em outro filme ainda mais ligado ao gênero horror, O DUPLO, marcante curta-metragem de Juliana Rojas. CLARISSE... pode até frustrar um pouco quem espera um filme explicitamente de horror, assim como pode desagradar quem não aprecia o gênero. Por isso mesmo deve ser apreciado como ele é e não como deveria ter sido, conforme o gosto pessoal de cada espectador.
Há, portanto, uma dificuldade de alcançar um público mais amplo, mas, uma vez que o espectador resolva se abrir a esse tipo de cinema mais hermético e cheio de signos a decifrar, a experiência é bastante recompensadora. Até porque a beleza das imagens (a direção de fotografia também a cargo de Petrus) e dos movimentos de câmera são de encher os olhos. Inclusive, é possível perceber isso a partir do pouco que é mostrado no trailer.
Sabendo da dificuldade de penetração de um filme como esse em um mercado cada vez menos tolerante a experimentações e invenções, devemos agarrar esta oportunidade de ver uma obra que pede para ser vista na tela grande. Não apenas pelos planos gerais (alguns mostram os personagens bem à distância mesmo), mas também pela força das imagens mais próximas.
O clima onírico dá o tom e mesmo aquilo que não é um sonho da protagonista acaba misturando-se com os nossos próprios sonhos e pesadelos. O que dizer da cena em que Clarisse carrega consigo o pai moribundo nas costas? Esse tipo de sensação que essa cena em especial traz chega a remeter a uma cena que acontece em uma noite clara de A MORTA-VIVA, de Jacques Tourneur.
O tempo narrativo no filme é um caso especial. Lembra os anteriores, mas as elipses parecem maiores nos blocos de cenas relativamente longas. A enigmática história, que se passa bem longe de um lugar típico de filmes cearenses, também é contada com o auxílio de sons e ruídos, que são incorporados à obra de maneira orgânica. Aliás, o cuidado com o som é outro aspecto admirável de CLARISSE...
Quanto ao sangramento da protagonista, trata-se de outro elemento não só muito curioso e intrigante, mas parte fundamental da trama. Vemos que o sangramento se manifesta muitas vezes quando a personagem está vivenciando algo intenso. Isso inclui também o desejo sexual, que aparece em duas sequências marcantes. O sangue, que simboliza a vida no seu aspecto mais violento, mas também a feminilidade da protagonista. E é nesse contraste, entre o delicado e o violento, que se forma o estranho e enigmático CLARISSE...
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