quarta-feira, março 30, 2016
PARA MINHA AMADA MORTA
A impressão que se tem ao ver uma breve sinopse de PARA MINHA AMADA MORTA (2015) é de que se trata de um filme que se arrastará em um fiapo de roteiro e que terminará de maneira previsível. Mas para a nossa sorte não é isso que Aly Muritiba oferece aos que saem de suas casas para prestigiar o seu primeiro longa-metragem. O que é preciso ter é disposição para enfrentar uma trama bem tensa, e que se mostra mais do que uma história de vingança.
O ponto de partida de PARA MINHA AMADA MORTA é bem simples e até um pouco desanimador a princípio. Na trama, Fernando Alves Pinto é Fernando, um homem que trabalha na polícia como fotógrafo e que sofre bastante a morte e a falta de sua esposa. Ele cheira as roupas dela diariamente, passa a ferro, guarda seus pertences com carinho, vê vídeos antigos para relembrá-la e contar histórias dela ao filho pequeno. E é num desses vídeos que ele encontra uma fita que denuncia que a esposa não lhe foi fiel. O vídeo a mostra transando com outro homem, alguém que ele não conhece.
Aproveitando que trabalha na polícia, consegue investigar e encontrar o tal homem, que para sua surpresa trabalha num ferro-velho. E é aí que o filme vai ficando mais interessante. Pois a partir do contato que ele tem com a família mais humilde desse homem que o enredo vai deixando de ser sobre uma simples história de vingança para se tornar também uma história sobre um homem bom que se embebeda de veneno ao mesmo tempo em que também envenena a vida daquela família de evangélicos.
E nisso o filme de Muritiba segue um caminho que passa a impressão de ser imprevisto até mesmo para o autor do roteiro (o próprio diretor). Como se o autor estivesse tateando e reconhecendo o novo e virgem território, envolvendo-se junto com o protagonista com aquela família que Fernando diz ser linda. Não sabemos, e talvez nem o personagem saiba de verdade, até que ponto, por exemplo, a aproximação dele em Raquel (Mayana Neiva), a esposa de seu inimigo Salvador (Lourinelson Vladmir) é movida por amor e desejo ou por vingança.
Os momentos de tensão do filme nos fazem pensar sempre no pior e o filme só não frustra o espectador porque ele entrega algo que vai além do óbvio, em um trabalho que intoxica o sangue. E podemos dizer isso como um baita elogio ao trabalho desse cineasta baiano radicado em Curitiba que trabalhou por sete anos em uma prisão no Paraná, o que o levou a fazer a chamada trilogia do cárcere, formada pelos curtas A FÁBRICA (2011), PÁTIO (2013) e A GENTE (2013).
E a prisão não é deixada de lado em PARA MINHA AMADA MORTA. Ela faz parte da vida de Salvador, um homem que já viveu uma vida de crime e que passou alguns anos atrás das grades. A relação que se estabelece entre ele e Fernando é um dos pontos altos do filme, rendendo algumas das cenas mais tensas do cinema brasileiro dos últimos anos. Além do mais, a prisão é uma espécie de metáfora do estado de espírito de Fernando, em sua busca por vingança e também por redenção – ainda que à sua maneira.
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