segunda-feira, março 03, 2025

OSCAR 2025



Dei uma pausa em O REFORMATÓRIO NICKEL para tentar escrever este texto sobre o Oscar. Acho que foi a primeira vez em muito tempo que fiquei sem ver um dos indicados à categoria principal antes da premiação. Gosto sempre de estar em dia. Mas o tempo anda raro, problemas não faltam e acabei não conseguindo fechar os 10 principais. Se bem que o fato de o número agora ser 10 e não cinco, como era antes, colabora um pouco para a maior dificuldade, mesmo para quem é cinéfilo e costuma acompanhar os lançamentos. Mas, confesso: agora mesmo estou um pouco cansado dos filmes do Oscar. Mal posso esperar para voltar a ver os clássicos, filmes antigos menos badalados e também filmes de terror (de preferência antigos).

Não me levem a mal. Essa temporada de premiações é ótima, principalmente para ir ao cinema, já que é nesta época que temos a oportunidade ver certos filmes em cinemas populares (e em cópias legendadas) que jamais entrariam em cartaz se não fossem as indicações. No ano passado, foi o caso de ZONA DE INTERESSE. Neste ano, talvez o representante mais hermético, por assim dizer, é O BRUTALISTA. Se bem que O REFORMATÓRIO NICKEL é o mais experimental dos 10, mas esse não chegou aos cinemas: foi direto para o Amazon Prime.

Pois bem. O Oscar 2025. Trata-se do Oscar mais badalado que eu já tive a sorte de acompanhar. Não me refiro a um evento específico da premiação, como a noite do tapa ou a noite da entrega errada do prêmio: refiro-me a toda a temporada, principalmente para nós, brasileiros, com a presença de AINDA ESTOU AQUI, de Walter Salles, em três categorias, inclusive melhor filme, e com chances reais para melhor atriz para nossa querida Fernanda Torres (o nome mais comentado dos últimos meses, sem dúvida, pelo menos no Brasil) e para filme internacional. 

Também foi uma temporada polêmica por causa de uma personagem que até então quase ninguém fora do México ou da Espanha conhecia: Karla Sofía Gascón, que interpreta a personagem-título de EMILIA PÉREZ, controverso filme da Netflix que, graças principalmente a coisas ditas pela atriz (a primeira mulher trans a concorrer ao prêmio de atriz), mas também às besteiras do próprio diretor Jacques Audiard, acabou sendo alvo de cancelamento. Ainda assim, conseguiram ganhar em duas categorias, as duas por causa de Zoe Saldaña, que conseguiu sair sem muitos arranhões de todo esse processo. Hoje mesmo a vi respondendo a uma jornalista mexicana sobre o quanto o filme os ofende. 

A cerimônia em si não foi tão leve, curta e divertida quanto a do ano passado, mas certamente foi muito mais especial para nós, brasileiros. Nunca na história da Academia um filme brasileiro havia sido indicado a tantos prêmios. Ou seja, a visibilidade que conseguimos, a bolha que foi furada, a campanha que foi a maior já feita de um filme brasileiro (pela Sony Classics), tudo funcionou perfeitamente. Talvez ainda tenha faltado mais trabalho, já que a distância de qualidade entre AINDA ESTOU AQUI e os demais concorrentes ficou clara. Mas sabemos que há a barreira da língua e o fato de que, até o prêmio de Fernanda Torres no Globo de Ouro, poucos no Hemisfério Norte sabiam quem era a atriz.

E olha que o próprio Walter Salles já havia furado a bolha vários anos atrás, com CENTRAL DO BRASIL e a indicação de Fernanda Montenegro. Mas gosto de pensar que a vitória de AINDA ESTOU AQUI na categoria de filme internacional e todo a repercussão nas redes sociais vão trazer interesse do público estrangeiro para o cinema brasileiro, um dos melhores do mundo. Mesmo assim, não podemos culpar o esforço de Salles e Torres, que estiveram desde a premiação de roteiro no Festival de Veneza nessa campanha incrível, que se intensificou depois do Globo de Ouro. 

Agora há pouco até a minha mãe, que não se liga muito nisso, estava vendo a repercussão nos telejornais (Globo, Record, talvez SBT) e comentou comigo. É o assunto do dia. Ou dos próximos dias. Espero que a nossa querida Fernanda consiga descansar ao chegar em sua casa depois de passar por tudo isso, que deve ser tão gostoso quanto exaustivo. Mas sei que estando no Brasil haverá não apenas a presença dela em desfile numa escola de samba, como também uma batelada de entrevistas por todos os lados. A história foi feita, podem reclamar que o diretor é bilionário e não um artista do povo, mas não dá para reclamar de um posicionamento político bem mais à esquerda e do quanto Walter e Fernanda tiveram a coragem de falar da culpa dos Estados Unidos no golpe militar de 1964 em programas de televisão americanos. 

Outro prêmio muito querido da noite veio também de um país que não faz parte de Hollywood. Foi para a animação FLOW, de Gints Zilbalodis, uma produção de baixo custo de uma país de que poucos lembram, a Letônia. O filme é lindo, sensível e muito bem realizado. Quase um milagre em sua criação. Outro país que também ganhou visibilidade no Oscar foi o Irã, através do curta de animação IN THE SHADOW OF THE CYPRESS. Os diretores, ao receberam o prêmio, disseram que só conseguiram o visto para entrar nos Estados Unidos na véspera da festa. Os iranianos e suas histórias de sofrimento e resistência merecem o nosso respeito. Assim como os palestinos, que também estiveram presentes na cerimônia: o documentário SEM CHÃO, feito no território ocupado da Palestina, foi o escolhido da categoria, o que deixou muita gente surpresa, dada a grande quantidade de judeus na academia. Felizmente a academia tem essa tendência mais progressista, o que muito pode nos ajudar nestes quatro anos de governo Trump.

No mais, a festa contou com alguns números musicais não muito felizes: a homenagem à franquia James Bond, recém-adquirida pela Amazon, não contou com um número musical tão bom assim, mas teve os seus bons momentos, e as canções lembradas foram boas, ao menos. Lá perto do final da premiação, ainda houve uma apresentação musical em homenagem a Quincy Jones. A premiação também começou com música: Ariana Grande e Cynthia Erivo abriram a festa com um belo dueto, tanto remetendo a O MÁGICO DE OZ original quanto às canções de WICKED. Destaque para a bela “Defying Gravity”. Revendo as duas cantando a canção meu respeito pela fantasia musical de Jon M. Chu até cresceu.

Quanto às premiações, a maioria já era esperada: Adrien Brody (que fez um discurso tão demorado que bateu o recorde), os prêmios para DUNA – PARTE 2 e para WICKED, o prêmio de maquiagem e cabelos para A SUBSTÂNCIA, os de roteiro para ANORA e CONCLAVE, os dois prêmios técnicos para O BRUTALISTA etc. A surpresa mesmo foi o “abraço” que a Academia deu em ANORA. Já era o filme favorito a ganhar a categoria principal, mas não se esperava um prêmio de montagem (que não é tão boa assim) e para Mikey Madison, uma jovem atriz de 25 anos que surgiu quase que do nada para o estrelato, como a personagem-título do filme de Sean Baker, que já havia ganhado a Palma de Ouro em Cannes – repetindo o feito de PARASITA.

Sorte que Madison não tem redes sociais, pois os brasileiros poderiam importunar a moça, que não tem culpa de ter sido a escolhida. Acredito que houve uma divisão de votos e tanto Demi Moore quanto Fernanda Torres foram prejudicadas no final. Venceu a terceira favorita das apostas. E também tem muita gente dizendo que o filme não merece ganhar o Oscar e tal, mas o Oscar não é bem uma premiação de justiça. Pelo menos, raras vezes os meus favoritos ganharam. Se bem que, falando isso, estaria falando dos meus favoritos e não dos eleitos pelos votantes, que têm suas preferências, suas tendências. O que achei curioso foi que no ano passado, quando Emma Stone ganhou o Oscar de atriz por POBRES CRIATURAS, muita gente também não esperava, por causa das várias cenas de sexo do filme. Agora a história se repete. E ao menos podemos dizer que a academia não é careta. Ou não tanto assim. 



Os Premiados

Melhor Filme – ANORA
Direção – Sean Baker (ANORA)
Ator – Adrien Brody (O BRUTALISTA)
Atriz – Mikey Madison (ANORA)
Ator Coadjuvante – Kieran Culkin (A VERDADEIRA DOR)
Atriz Coadjuvante – Zoe Saldaña (EMILIA PÉREZ)
Roteiro Original – ANORA
Roteiro Adaptado – CONCLAVE
Fotografia – O BRUTALISTA
Montagem – ANORA
Trilha Sonora Original – O BRUTALISTA
Canção Original – “El Mal”, por Zoe Saldaña (EMILIA PÉREZ)
Som – DUNA – PARTE 2
Efeitos Visuais – DUNA – PARTE 2
Direção de arte – WICKED
Figurino – WICKED
Maquiagem e cabelos – A SUBSTÂNCIA
Filme Internacional – AINDA ESTOU AQUI (Brasil)
Longa de Animação – FLOW
Curta de Animação – IN THE SHADOW OF THE CYPRESS
Curta-metragem (live action) – I’M NOT A ROBOT
Documentário – SEM CHÃO (Noruega/Território ocupado da Palestina)
Curta Documentário – A ÚNICA MULHER NA ORQUESTRA



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