quarta-feira, maio 08, 2024

LOVE LIES BLEEDING – O AMOR SANGRA (Love Lies Bleeding)



Para uma semana que se pretendia normal, acabo não indo trabalhar nesta quarta-feira por perder a hora. Ontem cheguei tão exausto, que o desgaste do dia  provocou um cansaço enorme o bastante para que eu não acordasse nem com o som do despertador. Deve ser ainda efeito das enxurradas de viroses que tive no mês de abril e das crises alérgicas mais intensas e que ainda seguem incomodando. Odeio quando isso acontece, até porque morro de vergonha em dar essa notícia (tarde demais) aos gestores da escola e em procurar explicar o ocorrido, embora saiba que é uma questão de saúde, sim.

Aproveito esta manhã um tanto tensa e tento escrever um pouco sobre um dos filmes que mais ficou em minha memória afetiva nos últimos dias, o segundo longa-metragem de Rose Glass, LOVE LIES BLEEDING – O AMOR SANGRA (2024), que tem causado uma repercussão boa no circuito alternativo – eu vejo este filme como um claro exemplar de obra que poderia se sair bem também no circuitão, mas infelizmente esse tipo de produção que saia um pouco mais da casinha tem cada vez menos espaço no circuito de shopping. Estive conversando sobre o filme com o meu amigo personal trainer, que não tem hábito de ir a sessões mais arthouse, e ele achou interessante as cenas que descrevi, pelo caráter fantástico e singular. Inclusive, perguntei a ele sobre os efeitos de muitas injeções de anabolizantes no corpo. 

O fato de a diretora Rose Glass vir do terror faz toda a diferença na hora de construir esta história de amor cheia de sangue e violência (e body horror) e que opera numa chave próxima da comicidade, embora esses elementos cômicos também possam ser vistos com seriedade, pois funcionam como representações dos sentimentos das personagens femininas, como é o caso da última cena, do agigantamento.

O filme já me ganhou nas primeiras imagens, com a fotografia em cores vivas e estouradas numa tela scope, remetendo às fitas mais baratas dos anos 1980 – inclusive, até achei que o filme havia sido filmado em película, mas foi em digital mesmo, mas com um tratamento que deixa as cores e os tons mais quentes. Além do mais, como a história se passa nessa década, e muito dela dentro de uma academia de musculação, há uma valorização dos corpos vestidos no tipo de roupa mais curta da época.

O filme não é sutil nem quer ser. Assim que começa, o olhar de tesão de Kristen Stewart por Katy O'Brien é evidente, assim como é evidente o que acontecerá entre as duas, pelo menos do ponto de vista do romance. Mas surpresas acontecem e, por causa de uma situação de violência doméstica, a história delas tomará novos rumos. O filme faz referência à série O INCRÍVEL HULK (aquela com o Lou Ferrigno) e traz uma atuação ótima de Ed Harris, como um líder do tráfico de armas que tem a polícia da cidadezinha nas mãos. Pode não ser a perfeição que queríamos que fosse, mas é uma obra singular. E só por isso merece ser exaltada. (Aliás, sobre a Kristen Stewart, que currículo de respeito que ela está construindo, hein!)

Também vale destacar o fato de termos uma cineasta mulher brincando com os padrões e clichês dos filmes de gênero e virando isso do avesso. Aqui vemos mulheres que representam a força bruta e que agem através da ação para a dinâmica da trama. Os homens seguem sendo figuras tóxicas, mas não há nenhum que represente um herói ou salvador ou algo do tipo. Essa apropriação feminina de filmes de gênero é um fenômeno que merece ser estudado com atenção.

+ DOIS FILMES

MALÍCIA (Malice)

É ao mesmo triste e curioso como a década de 1990 foi a que pior fez uso da tradição do filme noir. E não me refiro, claro, à obra-prima INSTINTO SELVAGEM, de Paul Verhoeven, ou a um outro exemplar bem-sucedido. Aliás, o filme de Verhoeven acabou por fazer nascer um monte de thrillers eróticos baratos, alguns lançados direto em vídeo, e outros que eram bem a cara do Supercine. MALÍCIA (1993) não é dos mais baratos, do ponto de vista do orçamento. Tem até gente que virou estrela em papel mínimo (Gwyneth Paltrow) e outras estrelas do passado (Anne Bancroft, George C. Scott) fazendo bons papéis pequenos. Mas o filme é mesmo de Nicole Kidman, que na época estava decolando com sua bela pele pálida e seus olhos azuis. A trama é uma grande bagunça, envolvendo uma mulher casada (Kidman) que está supostamente tentando uma gravidez de risco. Ela vive com um professor (Bill Pullman) e o casal acaba conhecendo o cirurgião mulherengo vivido por Alec Baldwin (na verdade, ex-colega de escola de Pullman). Enquanto isso, rola uma subtrama de um assassino e estuprador, talvez para tirar a atenção da trama principal, ou talvez tenha sido resquício de algo que foi deixado na sala de montagem. O diretor Harold Becker vinha do ótimo VÍTIMAS DE UMA PAIXÃO (1989) e é lamentável que tenha caído tanto. Mas ao menos MALÍCIA é um filme que surpreende, que tem suas viradas de roteiro bem interessantes. Só não sabe o que fazer com elas. Gosto da música de Jerry Goldsmith, que remete às vezes à sua composição para INSTINTO SELVAGEM.

O FUGITIVO SANGUINÁRIO (Autostop Rosso Sangue)

Há uma infinidade de filmes de gênero italianos ainda a serem melhor conhecidos. Minha opção por este O FUGITIVO SANGUINÁRIO (1977), de Pasquale Festa Campanile, veio de um cansaço mental ocasionado por uma gripe. Ou seja, não adiantava eu pegar um filme que requeresse um pouco mais de meu intelecto. Na trama, um casal de turistas italianos (Franco Nero e a francesa Corinne Cléry) viaja pelo deserto da Califórnia levando consigo seu trailer. O erro deles é dar carona a um psicopata (David Hess) que vem colecionando assassinatos pelo caminho e transforma a vida dos dois num inferno. O filme de Campanile é cheio de crueldade e cinismo, principalmente por parte dos personagens masculinos, e de sensualidade natural por parte de Corinne, advinda do sucesso de A HISTÓRIA DE ‘O’. De uma beleza estonteante, fico admirado que essa moça não tenha sido erguida à categoria de estrela de primeira grandeza no cinema europeu. Filme visto no box Cinema Exploitation 3.

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