sábado, maio 30, 2015
KURT COBAIN – MONTAGE OF HECK (Cobain – Montage of Heck)
Ver o documentário KURT COBAIN – MONTAGE OF HECK (2015), de Brett Morgan, além de ter sido uma experiência intensa e um tanto perturbadora, ativou muito minha memória dos anos 1990, que eu guardo com carinho por terem sido anos muito mais ativos e cheios de aventuras, mas também anos de mais angústias nos sábados à noite quando não conseguia sair. Mas isso é coisa da idade e é natural e é necessário para que a gente faça maiores esforços para tornar a vida mais interessante e suprir aquele caos interior.
Eu lembro do dia em que ouvi pela primeira vez “Smells like teen spirit”, numa tarde de 1991, lembro das tantas vezes que eu saí de casa para trabalhar de manhã logo depois de ter tomado a minha dose de veneno de In Utero. Sentia-me mal ouvindo aquele disco, mas não conseguia parar de ouvi-lo. Algo semelhante aconteceria anos depois com A Tempestade, da Legião Urbana. Ambos os discos eram despedidas dolorosas de seus realizadores de alma atormentada. E as flores no cenário do Unplugged do Nirvana não podiam ser outra coisa senão uma espécie de funeral prévio do astro. Só que a gente não sabia disso na época.
MONTAGE OF HECK nos apresenta à infância de Kurt, seu constante sentimento de rejeição dos pais, que se tornou ainda mais forte depois da separação, quando ele ficou pulando de casa em casa – casa da mãe, casa do pai, casa do avô. E esse sentimento se tornaria ainda mais intenso com a adolescência, quando o elo entre pais e filhos começa a se partir e o jovem procura o seu próprio mundo, sua própria identidade. No caso, o que de mais positivo Kurt conseguiu para liberar suas energias foi o rock, em especial o punk rock.
E é interessante ver o início da banda, antes do boom de Nevermind, quando eles tocavam para plateias de duas pessoas, depois começaram a aumentar mais e mais o público, até gravar o seu primeiro disco por um selo pequeno. E é de arrepiar o momento em que a mãe ouve pela primeira vez o Nervermind, numa fita remasterizada que um Kurt só de cueca traz para lhe mostrar. Ela ficou muito assustada. A música era boa demais e ela sabia que o filho não estaria preparado para o que viria.
De fato, o disco foi uma bomba que destruiu e reconstruiu o mundo do rock da época. Para o bem e para o mal. Eu diria que mais para o bem, já que o rock passou a ser mais catártico, menos de diversão escapista, mais sincero, mais intenso. Mais do que o Achtung Baby, do U2, e o álbum preto do Metallica, foi Nevermind o disco que inaugurou a década de 1990.
Pelo menos mais duas coisas se destacam em MONTAGE OF HECK: as sequências com desenho animado que recriam determinados momentos do passado de Kurt e as filmagens caseiras, principalmente as feitas durante o período em que Kurt e Courtney Love estavam casados.
Os desenhos são lindos e trazem uma melancolia que combina muito bem com o espírito do documentário. Destaque para o momento em que Kurt transa com uma moça com problemas mentais. Quanto às filmagens da intimidade do casal junkie mais famoso do mundo naquela época, eles são tão fortes que sentimos até um pouco de culpa em estar invadindo aquele terreno tão íntimo. Porém, eles funcionam como uma luva para tornar o documentário ainda mais especial.
Achei estranho não haver nenhuma entrevista com Dave Grohl, que nem mesmo é creditado, já que aparece apenas em imagens de arquivo, mas Krist Novoselic aparece impressionantemente abalado, como se ainda não tivesse saído do luto. As declarações de Courtney Love também servem para pintar a sensibilidade de Kurt de forma ainda mais intensa, reforçada pela música, pelos desenhos e os escritos que ele deixou. Os seus últimos rabiscos, então, são de rasgar a alma.
Não tive como não lembrar do documentário brasileiro A PAIXÃO DE JL, de Carlos Nader, que também apresenta um artista pisciano em sua trajetória para a morte e sua intensa sensibilidade. No caso de MONTAGE OF HECK, as emoções de Kurt, somadas ao uso excessivo de drogas e às suas tendências suicidas, levaram-no a um ponto que parecia inevitável. E no fim escolheram uma canção perfeita e arrepiante para encerrar e, por que não?, celebrar a passagem deste ser único por nosso planeta. A música do Nirvana está viva e jamais será esquecida. Nem o sorriso tímido de Kurt, nem sua atitude explosivamente bela no palco.
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