domingo, novembro 17, 2013

BLUE JASMINE























É curiosa a quantidade de críticas dizendo que Woody Allen se recuperou com BLUE JASMINE (2013). Mas se recuperou de quê, se ele nunca esteve ruim? Até podem dizer que o trabalho anterior, PARA ROMA, COM AMOR (2012), é um filme menor, mas o cineasta, principalmente a partir do início de sua "fase europeia", iniciada com PONTO FINAL – MATCH POINT (2005) e que prosseguirá no próximo ano com MAGIC IN THE MOONLIGHT, em fase de pós-produção e rodado na França, está em um de seus momentos mais inspiradores.

O que destaca BLUE JASMINE, o segundo retorno aos Estados Unidos dentro dessa fase atual, dos demais filmes recentes de Allen é trazer não um personagem neurótico ou hipocondríaco, como é comum de se ver em seus trabalhos, mas alguém que está verdadeiramente no fundo do poço, um caso clínico. A Jasmine do título, que ganha o adjetivo "blue", especificando o aspecto triste da personagem de Cate Blanchett, é uma mulher que perdeu o chão, não sabe o que fazer da vida, uma vez que se acostumou com uma vida de luxo, quando vivia com o marido cafajeste vivido por Alec Baldwin.

O filme se passa em São Francisco, mas Nova York está presente na pele da personagem, que, sem ter para onde ir, resolve ficar uns dias na casa da irmã Ginger (Sally Hawkins). Desprovida de luxos ou exigências com roupas e homens, Ginger é o extremo oposto da irmã, que carrega consigo ares aristocráticos. Mesmo sem ter nenhum dinheiro, veio de primeira classe para São Francisco, o que fez com que a irmã ficasse um tanto revoltada com isso.

BLUE JASMINE alterna presente e passado para ir construindo a história de Jasmine e isso funciona muito melhor do que se adotasse uma estrutura narrativa linear. Do jeito que ficou, fragmentado como a personagem, cria-se um leve suspense sobre o que aconteceu com ela antes de seu marido partir, ao mesmo tempo que estabelece uma dualidade: o mundo rico de Nova York versus o mundo pobre dos bairros populares de São Francisco.

Curiosamente, Allen traz para seu novo alter-ego uma característica que lhe é conhecida: o fato de não saber operar um computador, já que ele nunca quis largar sua velha máquina de escrever. Um fato, aliás, que deixa o filme um tanto anacrônico. Assim também é Jasmine, que vê uma possibilidade na vida profissional de ser decoradora de interiores, mas para isso teria que fazer um curso. Para fazer um curso, teria que ter dinheiro. Para ter dinheiro precisaria arranjar um emprego ainda que modesto para custear o curso de computação e futuramente o curso de decoração à distância.

Tomando comprimidos e mais comprimidos para se livrar de depressões, ansiedades, síndromes de pânico, claustrofobia etc., Jasmine é um produto dos tempos atuais, em que entrar em colapso se tornou algo comum, embora ninguém queira ficar perto de alguém que fica falando sozinha pelos cantos. Perder o controle de sua mente e ficar louco é algo que coloca o homem numa situação de pária na sociedade.

E embora Allen já tenha feito trabalhos ainda mais pesados no tempo em que era casado com Mia Farrow, como A OUTRA (1988), CRIMES E PECADOS (1989), MARIDOS E ESPOSAS (1992), e as tragédias ambientadas em Londres, PONTO FINAL – MATCH POINT e O SONHO DE CASSANDRA (2007), além de uma experiência metade comédia, metade drama com MELINDA E MELINDA (2004), é com BLUE JASMINE que o cineasta apresenta uma personagem tão desequilibrada e frágil psicologicamente. Há alguns momentos cômicos, já que não se trata de um de seus filmes bergmanianos e o bom e velho jazz parece querer animar um pouco o ambiente, mas o riso aqui é amarelo e o tom é amargo.

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