sábado, dezembro 01, 2012
CORAÇÕES SUJOS
Finalmente chega a Fortaleza CORAÇÕES SUJOS (2011), de Vicente Amorim. Ainda que com poucas sessões disponíveis, oferece chance ao espectador local de poder conferir um trabalho tão bem produzido na telona, que é onde ele merece ser apreciado. Trata-se do retorno de Amorim ao Brasil, depois de filmar UM HOMEM BOM (2008), uma produção anglo-alemã com Viggo Mortensen, que teve boa recepção no exterior. E tudo começou por causa do sucesso do belo melodrama CAMINHO DAS NUVENS (2003), no Brasil e no mundo.
O que diferencia CAMINHO DAS NUVENS de CORAÇÕES SUJOS é justamente um certo distanciamento do diretor neste segundo, provavelmente por procurar não tomar partido, e em não conseguir emocionar talvez como poderia, com tanta beleza nas imagens e na trilha sonora. Assim, é um filme mais amargo e de causar indignação do que de causar lágrimas no espectador.
Porém, é um belo filme de um assunto pouco conhecido, cujo próprio autor do livro que inspirou a adaptação, Fernando Morais, foi responsável por desencavar dos porões os documentos que falavam sobre a seita nacionalista Shindo Renmei (ou Liga do Caminho dos Súditos), que aterrorizou a colônia japonesa no Brasil logo após o final da Segunda Guerra Mundial.
Esse grupo negava a derrota do Japão e a rendição do Imperador Hiroíto. Na época, os imigrantes japoneses no Brasil eram proibidos tanto de darem aulas de japonês, como de receberem jornais do país. Assim, havia essa organização que tinha como um dos objetivos matar os "corações sujos", ou seja, aquelas pessoas que duvidavam de que o Japão havia vencido a guerra. Eles eram tidos como traidores e logo eram assassinados a mando de um coronel reformado do exército japonês.
A sequência mais dolorosa é, sem dúvida, a da morte do amigo do protagonista, Takahashi (Tsuyoshi Ihara, de CARTAS DE IWO JIMA). Depois dessa, o espectador até pode ficar "escaldado" para as demais sequências dramáticas que virão. Gostei também, particularmente, da luta daqueles que não aceitavam serem mortos por não terem feito nada de errado.
O filme lida com sentimentos que para os brasileiros talvez possam ser estranhos, como o sentimento exacerbado de honra que os japoneses têm, bem como sua veneração pela bandeira e por seu país. Como, segundo um dos personagens, o Japão nunca perdera uma guerra, não seria dessa vez que isso aconteceria. O fato é que depois da guerra, o povo japonês enfrentou a derrota, sem precisar de ter que se matar. Perder também faz parte da vida. E é preciso aprender a perder.
CORAÇÕES SUJOS também lida com a situação das mulheres diante dos absurdos cometidos pelos homens, especialmente os envolvidos com a Shindo Renmei, nome que não é dito no filme, mas que pode ser visto tanto no livro quanto em resenhas e críticas sobre o filme. O sentimento de culpa é outro que atravessa essa soma de emoções que o filme proporciona: honra, culpa, amor, desespero, tristeza e mais uma série de outros sentimentos complexos que pode ter sido demais para um cineasta distante da cultura nipônica tão bem desenvolver. No entanto, o filme foi muito bem recebido pelos japoneses que o viram, bem como pelo próprio Fernando Morais, autor do livro.
Vale destacar também a performance de Takako Tokiwa, que faz o papel de Miyuki, a esposa de Takahashi, que pelo menos a princípio tenta conviver com o marido, que se torna um assassino confuso e com sentimento de culpa. Takako é bela, gentil, sensível e inteligente, um exemplo perfeito de uma companheira e isso faz a diferença nos rumos que o filme toma em seu desenvolvimento.
Dentro dos aspectos técnicos, o que mais chama a atenção é a bela música de Akihiko Matsumoto e a fotografia muito especial de Rodrigo Monte, com predominância de cores quentes e de às vezes mostrar imagens distorcidas que criam um quê de expressionismo. Esses dois elementos em especial contribuem para tornar a narrativa, além de interessante, bem prazerosa.
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