quinta-feira, outubro 31, 2013

SERRA PELADA























E finalmente Heitor Dhalia mostrou que pode dirigir um grande filme. Depois de uma experiência não muito agradável nos Estados Unidos, com o thriller 12 HORAS (2012), ele retorna ao Brasil para realizar o seu ambicioso projeto dos sonhos: SERRA PELADA (2013), uma mistura de western com filme de gângster à brasileira, com direito a muita música quente feita especialmente no Pará no início dos anos 1980, dando um tempero especial à história de dois amigos que resolvem largar tudo em São Paulo e partir para o formigueiro que estava chamando a atenção de gente de todo o Brasil, situado no sul do Pará.

Os amigos são interpretados por Juliano Cazarré e Júlio Andrade, vivendo os personagens Juliano e Joaquim, respectivamente. Como o filme é também uma espécie de fábula sobre a ambição e a degradação do caráter, há que se parabenizar ambos os atores pela excelente composição. De Júlio Andrade já sabemos de seu talento, mas Juliano Cazarré surpreendeu como o sujeito cujo poder lhe sobe à cabeça, à ponto de seu personagem ser bastante parecido com o Tony Montana de SCARFACE, de Brian De Palma.

É o caso de filme em que tudo parece ter dado certo. O elenco de apoio também é sensacional, com Wagner Moura roubando a cena como uma espécie de mafioso psicótico. A cena do bar, em que ele é mandado embora, é antológica, remetendo ao personagem de Joe Pesci em OS BONS COMPANHEIROS, de Martin Scorsese. Matheus Nachtergaele, também está muito bom, mas seu papel é bem pequeno. E Sophie Charlotte como a prostituta que ganha o coração de Juliano está linda e compõe a personagem muito bem. Deveria fazer cinema mais vezes. Foi a sua estreia na telona, depois de ter feito algumas telenovelas. Aliás, impressionante como ainda tem lindas e talentosas atrizes que ficam relegadas a novelas e muitas vezes perdemos a chance de conhecê-las ou de vê-las desempenhando um papel mais intenso.

Destaque também para a excelente fotografia do filme, em tons marrons, como a terra que suja os garimpeiros. Há uma sujeira que lembra alguns dos melhores westerns (americanos ou italianos). A sujeira também está nas ruas, especialmente na cidade onde os garimpeiros passam as noites, cheias de inferninhos e bordéis. Sem falar nos frequentes tiroteios, resultados de brigas e bebedeira. A trilha sonora ajuda a nos colocar naquele ambiente inóspito, mas perfeitamente agradável de ver do lado de cá da tela, ao longo da narrativa, tão bem amarrada.

No fim das contas, a experiência de Dhalia em Hollywood, com um cinema mais convencional, talvez o tenha ajudado a fazer um filme menos indie e mais clássico-narrativo. Em se tratando de sua filmografia, é, muito provavelmente, o seu grande acerto.

terça-feira, outubro 29, 2013

KICK-ASS 2























Uma coisa que tem cansado ultimamente em se tratando de filmes de super-heróis é a "disneyficação", no caso dos filmes da Marvel, e a "nolificação", com os filmes da DC. Não sei o que seria o mais nocivo. Daí o alívio e o prazer ao ver um filme de heróis mascarados (ainda que seja uma comédia e eles não possuam nenhum superpoder) que ainda tem a coragem de juntar a violência gráfica e até um pouco de escatologia no pacote. Aí é um ver pessoas levando a mão à boca sem acreditar no que está vendo durante a sessão. O que é muito bom. Afinal, precisamos mesmo de coisas que nos surpreendam, que arrisquem. Por isso, vejo KICK-ASS 2 (2013), agora com Matthew Vaughn apenas como produtor, como uma das melhores surpresas da temporada.

Mas nada disso funcionaria se o novo diretor, Jeff Wadlow, do horror CRY-WOLF – O JOGO DA MENTIRA (2005), que também assume o roteiro adaptado dos quadrinhos, não fosse tão cuidadoso com seus personagens, que ganham mais profundidade nesta sequência. Aaron Taylor-Johnson, que faz o Dave/Kick-Ass continua ótimo, mas o que garante realmente o sucesso do filme é a presença de Chloë Grace Moretz, novamente no papel de Mindy/Hit-Girl. E como Chloë cresceu. De uma criança no primeiro filme, agora é uma bela adolescente que cada vez mais tem conquistado ótimos papéis nas telas, assim como os corações de muitos espectadores.

Hit-Girl, depois da morte do pai no primeiro filme, passa a morar com o amigo policial, que cuida dela como um pai e faz com que ela prometa abandonar a vigilância. Obediente, ela acaba sofrendo muito sem poder fazer aquilo de que mais gosta. Mas é nesse momento que o filme aproveita para apresentar a evolução física da personagem, que agora lida com seus primeiros impulsos hormonais, com a chegada da libido.

Enquanto isso, Kick-Ass, solitário, resolve se juntar a um grupo de vigilantes mascarados liderados por um sujeito de extrema direita vivido por Jim Carrey. Em um papel pequeno, mas talvez até mais brilhante do que o de Nicolas Cage no primeiro filme.

Ah, e como esquecer o vilão, que responde por alguns dos momentos mais deliciosamente divertidos do filme? Red Mist (Christopher Mintz-Plasse) agora é o Motherfucker! E a cada vez que ele grita o seu novo nome o cinema vem abaixo.

Com tudo isso, KICK-ASS 2 é provavelmente o filme mais subestimado da temporada. Rejeitado até pelos poucos fãs do primeiro filme, já que não rendeu tão bem assim. De todo modo, do jeito que ficou, Mark Millar e John Romita Jr. devem ter ficado orgulhosos.

segunda-feira, outubro 28, 2013

CLASSIC ALBUMS – LOU REED: TRANSFORMER























O meu primeiro contato com Lou Reed foi lá pelos idos de 1991, quando um amigo me apresentou ao álbum New York (1989). Na época não sabia direito se tinha gostado ou não, mas era um momento da minha vida de apresentação de novidades musicais, seja daquela década, seja de décadas anteriores. O mesmo amigo trouxe anos depois o vinil de Magic and Loss (1992). Esse sim me tocou profundamente e até hoje está entre os meus discos favoritos e tenho guardado comigo. Fiquei fascinado com as várias perspectivas que Reed tratou a morte, tema desse disco fúnebre, de perda de amigos.

Nesse meio tempo, costumava comprar de vez em quando os discos indicados pela revista Bizz, entre eles The Velvet Underground and Nico (1967), o primeiro da seminal banda e que até hoje nunca deixou de tocar aqui em casa. É um dos discos que eu cada vez gosto mais. Em 1994, agora na faculdade, outro amigo me apresentou a um clássico de Reed: Berlin (1973), que é outro disco que eu não sei se gostei. Pelo menos, não assim de cara. Hoje é dos favoritos da casa, embora ainda prefira Transformer (1972), o anterior e objeto de análise deste documentário da série Classic Albums. Aliás, eu tenho dois discos dessa série: um do Nirvana; outro dos Sex Pistols, mas foi preciso Lou Reed morrer para que eu visse um vídeo dessa série.

CLASSIC ALBUMS – LOU REED: TRANSFORMER (2001) é uma delícia e creio que deve funcionar até para quem não conhece o trabalho do músico. Mostra tanto detalhes de mixagens e dos acordes, como os deliciosos baixos melódicos que introduzem "Walk on the Wild Side", ou a participação nos vocais de David Bowie (um dos produtores do disco) em "Satellite of Love". Mostra também um pouco dos bastidores das canções, como as homenagens a Andy Warhol e ao grupo de transformistas em Nova York.

Gravado em Londres, Transformer é o disco com mais hits de Reed. Além dessas duas, ainda tem "Perfect Day", "Vicious", e se encerra com uma banda de metais na melancólica "Goodnight Ladies". Aliás, a canção nem é tão melancólica assim, mas ouvi-lo dizendo adeus, na atual circunstância, nessa canção com jeitão de fim de festa é muito triste.

Ontem, domingo, dia de sua partida, foi um dia pesaroso para o rock. Creio que a gente se apega a artistas como ele por vê-lo desnudado em canções de amor tão lindas como "Pale Blue Eyes", a já citada "Perfect Day", "Oh! Sweet Nuthin’", entre outras. E também um sujeito sensível aos drogados, travestis e outras figuras marginais mostrados sem qualquer julgamento.

Ouvir "Waiting for the Man" e não se sentir nos sapatos do dependente químico é ser um pouco insensível. Ouvir a devastadora e última estrofe de "Pale Blue Eyes" e não se emocionar, também. E tudo isso cantado com sutileza vocal. Até porque, cada vez mais, Lou Reed foi perdendo sua capacidade de cantar com diferentes timbres de voz. Mas teve a sorte e o talento de saber criar grandes melodias e grandes poemas cantados (ou falados) e saber adequá-los aos seus álbuns.

domingo, outubro 27, 2013

SALVO – UMA HISTÓRIA DE AMOR E MÁFIA (Salvo)























Mais um exercício de estilo do que um acerto, SALVO – UMA HISTÓRIA DE AMOR E MORTE (2013), o filme de estreia da dupla Fabio Grassadonia e Antonio Piazza tem os seus méritos, mas me deixou um tanto aborrecido. O filme teve como ponto de partida o curta RITA (2009), que mostra uma menina cega que lida com um mafioso que invadiu sua casa e matou um familiar. A história de SALVO é bem parecida, mas Rita agora está bem crescidinha e é responsável por alguns dos melhores momentos do filme.

O início é bem instigante: vemos apenas os olhos de Salvo, o protagonista, que, ao serem vistos em scope, lembram as primeiras experiências de Sergio Leone. Aliás, há muito do western leoniano neste filme, inclusive pela preferência dos silêncios às falas. Até porque quando há falas o filme cai um pouco. O roteiro não é dos melhores nesse sentido e isso fica explícito no momento em que os chefes de Salvo dão-lhe um ultimato. Nota-se a fragilidade do roteiro.

Por isso SALVO está bem longe de ser um filme de roteiro. Há uma preocupação bem maior com a direção, com a estilização dos planos, com o excelente uso do som, com o olhar ou a falta do olhar, já que, assim como a moça cega, muitas vezes sabemos o que está acontecendo apenas pelo som, já que muita coisa não é mostrada, fica fora do campo. E esse jogo do olhar, dos olhos de Salvo e de Rita, dos seus olhares, é bastante aproveitado durante a primeira parte do filme.

Logo depois, Grassadonia e Piazza parecem perder um pouco a mão, já que os momentos que mostram o protagonista na pensão em que mora são bem pouco interessantes, por mais que sejam importantes no sentido de querer mostrar uma máfia pra lá de desglamorizada. Ao contrário, todos parecem muito pobres e decadentes.

Pode até ser representativo deste atual momento do cinema italiano, tão carente daquela grandiosidade de suas produções sessentistas. Os poucos cineastas jovens que têm surgido não têm metade da graça daqueles grandes que fizeram a cinematografia italiana uma das melhores do mundo, décadas atrás. Mesmo assim, SALVO é um caso de estreia que mostra o potencial desses jovens realizadores, que podem vir a fazer mais e melhores filmes. E por isso mesmo merecem atenção especial.

sábado, outubro 26, 2013

O CONSELHEIRO DO CRIME (The Counselor)























Se um grande filme pode ser descrito como sendo a junção de grandes cenas/sequências, temos, sem dúvida, um grande filme em O CONSELHEIRO DO CRIME (2013), o mais recente e um dos mais inspirados trabalhos de Ridley Scott. A ajudinha de Cormac McCarthy, autor do romance que deu origem à obra-prima ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ (2007), dos irmãos Coen, foi inestimável. Sua tendência a criar histórias cheias de desesperança combinou perfeitamente com a direção segura de Scott, que costuma fazer filmes com pouco ou quase nenhum alívio cômico. No caso de O CONSELHEIRO DO CRIME, há um alívio cômico: a antológica cena de Cameron Diaz e o carro.

Curiosamente o título ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ se aplicaria perfeitamente a este filme de Scott. Muito mais do que O CONSELHEIRO DO CRIME, já que o "counselor" do título original talvez fosse melhor traduzido como "advogado". Essa é a profissão do personagem de Michael Fassbender, que curiosamente não tem um nome no filme, é sempre chamado de "counselor", traduzido como "doutor" nas legendas. Na verdade, ele está até longe de ser um conselheiro, principalmente em seu primeiro investimento com tráfico de drogas. Seria uma maneira de ele manter o padrão de vida e dar o melhor para sua amada, vivida por Penélope Cruz. Em certo momento do filme, ele diz que viver é estar na cama com ela, tudo o mais é apenas espera.

Por mais que Scott seja pouco afeito a excesso de sentimentalidades em seus filmes, o amor que o advogado sente por ela é perfeitamente crível e tocante. A começar pela primeira cena do filme: um momento de intimidade entre o casal que poucos filmes americanos costumam apresentar. E essa apresentação da intimidade dos dois, que é tão boa de se ver, é só o começo de um filme que vai mudando de cenário a todo instante e criando uma intrincada teia de intrigas envolvendo o advogado, o traficante vivido por Javier Bardem, sua companheira pouco confiável vivida por Cameron Diaz, o verdadeiro conselheiro vivido por Brad Pitt, entre outros personagens secundários mas também bem importantes.

Aliás, tudo no filme parece importante, cada detalhe. Até a única cena em que vemos Bruno Ganz, no papel de um vendedor de diamantes, é um primor. A conversa que ele trava com Fassbender sobre tipos de diamantes é hipnotizante, assim como várias outras, em especial as duas com Brad Pitt, que interpreta um personagem cheio de carisma, mas que traz para o protagonista uma sensação de desconforto crescente em relação àquilo que ele está prestes a fazer. O segundo encontro, então, quando o filme já chegou a um crescendo de angústia e desespero, é ainda mais perturbador. E ao mesmo tempo fascinante para nós, apreciadores de um texto de qualidade, uma direção segura e um elenco afiado.

Há dois momentos que se destacam pelo aspecto filosófico e existencial: a conversa de Fassbender com um advogado mexicano, que contou de um poeta que perdeu a amada; e a conversa final da personagem de Cameron Diaz, sobre a natureza dos caçadores e da caça, da beleza de tudo. Soa perverso diante de toda a violência que o filme mostra em sequências bem gráficas inclusive, mas ao mesmo tempo é belo do ponto de vista da narrativa. Como se o próprio McCarthy descrevesse o seu prazer em montar narrativas e personagens que eventualmente serão caça e caçador e a maneira elegante como tudo isso é descrito.

sexta-feira, outubro 25, 2013

KICK-ASS – QUEBRANDO TUDO (Kick-Ass)























Muito provavelmente por não ter chegado aos cinemas de Fortaleza, até então não havia visto KICK-ASS – QUEBRANDO TUDO (2010), de Matthew Vaughn. Inclusive, a julgar pela classe com que o o diretor conseguiu sair da mesmice dos filmes de super-heróis Marvel com X-MEN – PRIMEIRA CLASSE (2011), já comecei a ver com bons olhos o seu trabalho. A partir da graphic novel de Mark Millar e John Romita Jr., Vaughn fez uma das mais interessantes histórias de heróis fantasiados dos últimos anos. Talvez por não serem super-heróis de verdade e haver uma liberdade maior para cenas de violência e uso de palavrões e ter um colorido todo especial, KICK-ASS tenha se tornado bastante querido por muitos. O motivo de eu ter visto o primeiro filme agora foi a estreia da continuação, que inclusive ainda nem vi.

Mas falemos do filme de Vaughn. Uma de suas vantagens é situar a ação em um suposto mundo real, em que não há pessoas fantasiadas de heróis para lutar contra bandidos, como nos quadrinhos. E é por causa disso que o protagonista, Dave Lizewski (Aaron Taylor-Johnson), fã de HQs, vive tão insatisfeito. Mesmo não tendo habilidades físicas para peitar bandidos armados ou não armados em becos escuros, ele resolve comprar uma roupa de herói na internet e vai à luta, escondendo de todos a sua identidade secreta.

Sua identidade secreta, aliás, é semelhante à de Peter Parker antes de se tornar o Homem-Aranha, isto é, ele é um sujeito praticamente invisível para as garotas, nível de popularidade zero, e ainda sofre bullying. Paralelamente, acompanhamos a história da garotinha que seria conhecida por Hit-Girl, vivida por uma ainda muito jovem Chloë Grace Moretz, que na época ainda não era muito conhecida e tinha apenas 13 anos. Agora, com papeis de destaque em filmes como DEIXE-ME ENTRAR (Matt Reeves), A INVENÇÃO DE HUGO CABRET (Scorsese), SOMBRAS DA NOITE (Burton) e prestes a estrear no Brasil com a nova versão de CARRIE, A ESTRANHA, até já se pode falar no sex appeal da garota.

Mas, naquela época, deve ter sido muito estranho ver uma garotinha tão jovem matando sem dó nem piedade os bandidos (ela foi treinada pelo pai, vivido por Nicolas Cage) e com um arsenal em casa. É ela quem salva a pele do desastrado Kick-Ass. A personagem fez tanto sucesso que, ao que parece, no segundo filme ela se destaca ainda mais.

Destaque também para o mini-vilão interpretado por Christopher Mintz-Plasse, o McLovin', de SUPERBAD – É HOJE, no papel de Red Mist. Filho de um mafioso cujos homens estão sendo mortos supostamente por Kick-Ass, o fenômeno da internet, e o grande defensor dos oprimidos da mídia, Red Mist sabe como entrar em contato com o novo herói fantasiado, para, então, colocá-lo em uma cilada.

Com um ritmo muito agradável, cores lindonas, personagens muito divertidos (muito boas as cenas de Dave com o seu objeto de desejo, uma garota que pensa que ele é gay), e a segurança na direção de Vaughn, é até natural imaginar que a continuação, a cargo de outro diretor, não estará à altura do original. Enquanto isso, há outro elogiado filme de Vaughn que permanece inédito para mim, STARDUST – O MISTÉRIO DA ESTRELA (2007). Qualquer dia eu compenso essa falha.

quinta-feira, outubro 24, 2013

DEIXE A LUZ ACESA (Keep the Lights On)























A falta de mais filmes sobre relacionamentos homoafetivos dentro do circuito comercial não deixa de ser um fato curioso. A grande maioria desses filmes fica restrito ao gueto dos festivais que abordam esses temas. Aliás, tive oportunidade de ir a uma edição do For Rainbow uma vez e fiquei admirado com a qualidade dos filmes. No caso, eram apenas curtas-metragens. No circuito mainstream tem sido raro ver ultimamente um filme de grande visibilidade sobre o tema. Talvez o último caso tenha sido mesmo o de O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN, de Ang Lee, cineasta que já havia feito um filme com essa temática em 1993, O BANQUETE DE CASAMENTO.

No final do ano passado, a conceituada revista francesa Cahiers du Cinéma selecionou entre seus dez melhores filmes do ano uma produção independente gay: DEIXE A LUZ ACESA (2012), de Ira Sachs. Trata-se de um filme de inspiração autobiográfica. O diretor passa para o seu filme um relacionamento de dez anos que teve com um rapaz viciado em drogas. O roteiro ficou a cargo de Sachs e do brasileiro Maurício Zacharias, o mesmo de MADAME SATÃ e O CÉU DE SUELY, ambos de Karim Aïnouz.

O resultado é irregular, mas Sachs dá a cara a tapa ao mostrar homossexuais preocupados com o vírus da AIDS, à procura de vários parceiros e com comportamento hedonista. Felizmente, essas sequências funcionam principalmente como uma espécie de prelúdio para a história de Erik (Thure Lindhardt), um documentarista alemão que conhece e se apaixona por Paul (Zachary Booth), um editor de livros. E é na aproximação da relação entre os dois, principalmente dentro de ambientes fechados, que o filme cresce emocionalmente e ganha características universais. Afinal, quem nunca amou mais do que a outra pessoa e acabou sofrendo por isso?

O filme também tem algo de diferente, ao trazer um tipo de dramaturgia mais seca, com pouca utilização de música, lembrando inclusive em alguns momentos o trabalho dos dinamarqueses do Dogma 95. Senti falta de uma maior participação do pequeno elenco feminino, especialmente da amiga de Erik que deseja desesperadamente ter um filho e pede para que ele seja o pai biológico. Mas provavelmente isso faria com que o filme perdesse um pouco o foco, que é justamente a história de amor de Erik e Paul.

Um detalhe interessante é que Erik, como documentarista, está trabalhando na vida e obra de um fotógrafo chamado Avery Willard, que ajudou a definir, através de seu trabalho, a iconografia gay de Nova York, mas que morreu praticamente desconhecido. Esse documentário que Erik trabalhava no filme foi feito simultaneamente ao longa de ficção de Sachs e se chama IN SEARCH OF AVERY WILLARD, em formato de curta-metragem. Assim, o que parece faltar de militância política gay em DEIXE A LUZ ACESA existe nas entrelinhas e nos bastidores.

quarta-feira, outubro 23, 2013

OS MONKEES ESTÃO SOLTOS (Head)























O caso de Os MONKEES ESTÃO SOLTOS (1968) é bem representativo do período e da vontade de alguns realizadores e produtores da chamada Nova Hollywood. Derivado de uma série de TV de sucesso chamada THE MONKEES (1966-1968), o filme é uma mistura de OS REIS DO IÊIÊIÊ, de Richard Lester, com 8 e ½, de Federico Fellini. Mas com a desvantagem de que os Monkees não chegavam perto do carisma dos Beatles e Bob Rafelson era cineasta de primeira viagem querendo fazer cinema autoral em Hollywood, tentando imitar o que estava sendo feito na Europa.

Ele acreditava que o velho sistema de estúdios, com os produtores ditando as regras, era algo que deveria ser deixado para trás. Os diretores deveriam ser tratados como autores e totalmente donos de sua arte. Por isso, amigo que era de Bert Schneider, o produtor executivo do filme, teve total liberdade para fazer o seu extravagante filme. Que não tem uma história, por assim dizer, apenas os rapazes correndo e aparecendo em lugares estranhos, como num sonho.

A crítica à Guerra do Vietnã, tão importante na época, também aparece no filme, mas o que mais se destaca é o psicodelismo, com muitas cores, muitos efeitos, muitas luzes e a intenção de emular uma viagem de ácido. Fica a impressão de que ou o filme foi feito com total desleixo ou Bob Rafelson (e Jack Nicholson, um dos roteiristas) estavam mesmo muito doidões.

Assim, há diversas vinhetas, como os Monkees fazendo uma cena em um western, ou a sequência do deserto, ou a propaganda de remédio para caspa. A semelhança com Alice no País das Maravilhas surge quando eles mudam de tamanho, começam a ver coisas e não conseguem mais distinguir a realidade da ficção. Se bem que em particularmente nenhum momento o filme finca os pés na realidade. Do começo ao fim, OS MONKEES ESTÃO SOLTOS é uma viagem que está mais para uma bad trip do que para algo prazeroso, satisfatório.

No livro Como a Geração Sexo-Drogas-e-Rock’n’Roll Salvou Hollywood (EasyRiders, Raging Bulls), de Peter Biskind, conta-se que Rafelson, em certo momento do programa dos Monkees na televisão, estava insatisfeito. Chegou a odiar tudo o que os Monkees representavam. Daí o porquê de o seu primeiro projeto para o cinema parecer algo ao mesmo tempo muito pretensioso e um meio de matar a própria criação. Coisa que ele não conseguiu, pois os Monkees continuaram vivos e cultuados após o filme, tendo gravado discos até a década de 1990.

terça-feira, outubro 22, 2013

OS SUSPEITOS (Prisoners)























Quem quiser ter a sensação de ter a sua respiração e sua atenção em sintonia com a de outras pessoas ao mesmo tempo é só arriscar uma sessão de OS SUSPEITOS (2013), estreia do canadense Denis Villeneuve em Hollywood, que já havia mexido com os nervos dos espectadores em outro belo trabalho de suspense, INCÊNDIOS (2010).

Nos Estados Unidos, o diretor foi às raízes do American way of life, instalando-se em uma comum rua de subúrbio em pleno Dia de Ação de Graças para apresentar os aspectos mais sombrios daquela sociedade, não necessariamente pintando heróis e vilões, apesar de termos, no final, um culpado pelo desaparecimento das duas crianças que saem da casa sem a presença de seus irmãos mais velhos.

O grande elenco é formado por Hugh Jackman e Maria Bello, como o casal que leva os dois filhos para a celebração anual na casa dos amigos vividos por Terrence Howard e Viola Davis, que por sua vez também têm filhos na mesma faixa etária dos filhos do primeiro casal. O clima de harmonia se destaca também pelo fato de as duas famílias serem de etnias diferentes. Harmônico, pelo menos do ponto de vista americano, que raramente mostra grupos miscigenados.

Com o desaparecimento das duas meninas, que, naturalmente, deixa todos os familiares completamente abalados, entra em cena o detetive de polícia vivido por Jake Gyllenhaal, que com seus tiques nervosos tão particulares já é um dos personagens mais interessantes da carreira do jovem ator.

Assim, a trama segue em duas linhas: de um lado, o policial, um sujeito obcecado pelo seu objeto de investigação; do outro, o personagem de Jackman, que não se conforma quando a polícia solta, por falta de evidências, o primeiro suspeito, vivido por Paul Dano. Ambas as linhas que a narrativa segue são muito interessantes e o filme vai além do mero whodunit, também explorando os aspectos mais dramáticos e perturbadores de seus personagens.

O desenlace da narrativa também é bastante feliz e há pelo menos uma cena de deixar o espectador segurando os braços da poltrona no cinema. Trata-se da cena envolvendo o carro de polícia do detetive. Resta saber se as expectativas para o Oscar serão confirmadas, tanto para o elenco, quanto para o cineasta e o tantas vezes indicado diretor de fotografia Roger Deakins, que aqui faz uma exploração do cinza bastante condizente com o sentimento dos personagens. Uma pena que o título brasileiro tenha sido tão genérico, deixando de lado o aspecto múltiplo do original.

segunda-feira, outubro 21, 2013

TABU























Um dos elementos mais recorrentes na cultura portuguesa é a melancolia. Até mesmo sua maior obra épica literária, Os Lusíadas, de Luis de Camões, se encerra em tom de tristeza. E se esse elemento está presente na poesia, também aparece muito frequentemente no cinema. Faz parte do espírito português e talvez por isso eles sejam melhores poetas do que nós, brasileiros.

O caso de TABU (2012), um dos mais incensados filmes dos últimos anos pela crítica cinematográfica ocidental, é bem representativo dessa melancolia. A palavra, que é tão presente também no cinema português (vide UM FILME FALADO, de Manoel de Oliveira), surge como elemento lírico, em especial na segunda parte de TABU, intitulada "Paraíso". Ao contrário do homenageado TABU (1931), de F.W. Murnau, há na produção de Miguel Gomes uma inversão na ordem dos títulos das duas partes que dividem a obra.

No filme português, a primeira parte se entitula "Paraíso Perdido" e nos apresenta inicialmente três senhoras. Uma delas, Pilar (Teresa Madruga), mora sozinha e é católica fervorosa (aparece sempre rezando). Sua vizinha é uma senhora idosa de nome Aurora (Laura Soveral), que é cuidada por Santa (Isabel Cardoso), uma senhora cabo-verdiana que recebe ordens da filha ausente de Aurora.

Vale destacar o catolicismo como outro elemento bastante presente no cinema português, e que contribui para oferecer a imagem de um país velho, com um peso imenso do tempo a carregar sobre os ombros. Como se fosse um país que não acompanhou a modernidade dos séculos. Paradoxalmente, a segunda parte do filme, um longo flashback em forma de cinema mudo e que volta no tempo para a juventude de Aurora, é carregado de frescor e modernidade, tanto por causa dos personagens jovens quanto por suas aventuras ousadas.

No caso, uma dessas aventuras seria ousada demais: o caso de amor entre a jovem Aurora (Ana Moreira) e o músico Ventura (Carloto Cotta), quando Aurora já estava casada e grávida, no tempo em que vivia com o marido em uma colônia portuguesa na África, em um monte chamado Tabu. Toda esta segunda parte em forma de cinema mudo conserva os ruídos dos carros e da natureza, por exemplo, e é narrada pela voz do velho Ventura (Henrique Espírito Santo). Sua voz suave e frágil destoa do sentimento intenso daqueles tempos e que é muito bem representada pelas imagens.

O sentimento de paixão avassaladora é tanto que é possível dizer que nunca a canção "Be My Baby", de Phil Spector e das Ronettes, aqui em versão em espanhol, pareceu tão bela e dolorosa. A canção aparece nas duas partes do filme. Duas partes bem distintas entre si, quase como se fossem dois filmes diferentes. Pode-se dizer que a segunda parte é a que mais importa, a que mais homenageia o filme de Murnau e que é mais carregada de emoção, mas a primeira é também um trabalho lindo de composição, de construção de uma atmosfera de solidão que personagens mais velhos e sozinhos enfrentam.

domingo, outubro 20, 2013

BASTARDOS (Les Salauds)























Vendido como "o verdadeiro filme punk do Festival de Cannes", BASTARDOS (2013), de Claire Denis, é de fato um filme intenso, embora seja um tanto exagerada a propaganda. Os espectadores já acostumados com obras mais extremas nem vão achar assim tão pesado, já que a própria cinematografia francesa tem trazido cada vez mais obras dos gêneros horror e suspense que trafegam por caminhos que poucos cinemas ousaram. A própria Claire Denis já havia feito uma obra bastante sangrenta em DESEJO E OBSESSÃO (2001).

Em BASTARDOS, a diretora inclusive omite as cenas de violência gráfica, deixando-as mais na imaginação do espectador, através de elipses, ou mostrando só o final brusco de determinadas cenas. Tanto é que chega a ser desnecessária a cena final, até porque o que é ocorrido ali já havia sido muito bem captado pelo espectador mais esperto. Aliás, o espectador tem de estar bem atento ao ver BASTARDOS, pois não é um filme tão fácil em se tratando de thrillers. Mas isso faz parte de seu charme; torna-o diferente das produções de suspense hollywoodianas, que acabam por adotar modelos.

Em BASTARDOS, Vincent Lindon, que pôde ser visto este ano nos cinemas brasileiros no excelente UMA PRIMAVERA COM MINHA MÃE, de Stéphane Brizé, aqui desempenha um papel mais ativo. Ele é um capitão da marinha que larga tudo para resolver os problemas de sua irmã e sobrinha. O cunhado havia se suicidado, a irmã estava na pior financeiramente, a sobrinha havia sido violentada sexualmente. Não por acaso, o nome da sobrinha, vivida por Lola Créton, é Justine, célebre personagem criada pelo Marquês de Sade. Toda a trama é passada de maneira muito fragmentada, de modo que formam peças de um quebra-cabeças, que ainda inclui a personagem de Chiara Mastroianni, uma mulher casada com um velho magnata (Michel Subor), e que acaba por ter um caso com o personagem de Lindon.

A opção de Denis por uma estrutura fragmentada e cheia de elipses deixa o espectador ora confuso, ora instigado. Há também um uso da câmera e da música capaz de deixar muita gente com vertigem. A cena do acidente de carro, por exemplo, é perturbadora, assim como outras cenas envolvendo carros. Por outro lado, as cenas de intimidade dos personagens de Lindon e Mastroianni remontam a alguns filmes noir americanos. Porém, o sexo no filme nunca é mostrado como um elemento de prazer, mas como um aspecto incômodo de uma história sombria.

Independente de se gostar ou não de BASTARDOS, é um filme mais que bem-vindo, especialmente em um circuito tão carente de obras da diretora, sempre presente nos melhores festivais internacionais e que já garantiu seu nome entre os mais interessantes do cinema contemporâneo. No caso de BASTARDOS, trata-se de uma obra com uso de edição rápida, sem muitas tomadas longas, o que contribui para um trabalho tenso e de desfecho surpreendente.

sábado, outubro 19, 2013

O CINEMA E OUTRAS MÍDIAS EM DOIS FILMES



Falar em interferência de outras mídias nos filmes é até irônico e um tanto ultrapassado, já que o cinema é uma soma de todas as outras artes que o precedeu, principalmente o teatro e a literatura, e até hoje se utiliza das mais diferentes formas de arte para se compor. Porém, ao ver o teatro aparecer de maneira tão explícita num filme ou ver uma obra cinematográfica que se apoia tanto na dança fez com que eu tentasse falar sobre estes dois filmes brasileiros em uma única postagem. Mas acho que nem estou sendo tão ultrapassado assim, já que grupos de teatro e de dança são geralmente encorajados a entrar em contato com esses filmes. Outra razão de estarem juntos numa só postagem é que eu não gostei de nenhum dos dois, embora veja neles algumas qualidades e imensas possibilidades de reflexão. Aí quis matar logo dois coelhos com uma só cajadada.

NO LUGAR ERRADO 

Quase um teatro filmado, NO LUGAR ERRADO (2011), assinado por quatro pessoas, Pedro Diogenes, Guto Parente, Luiz Pretti e Ricardo Pretti,é um projeto até bem interessante. E barato, já que só vemos quatro atores em um palco totalmente escuro representando situações de atrito. São dois casais em uma festa na casa de um deles. A ideia de também deixar que os atores improvisem é interessante, mas o problema é que, nesse improviso, o filme vai cada vez mais despencando. Se era para ocorrer uma situação perturbadora em determinado momento, quando este momento acontece, os improvisos criados já haviam acabado por levar o filme por água abaixo. De todo modo, havia uma marcação: a peça Eutro, de Rodrigo Fischer. Só não sei até que ponto essa peça foi seguida ou se foi deixada de lado em algum momento. Um grupo cearense que tem sido pródigo em projetos interessantes atualmente está entre as produtoras do filme, a Alumbramento Filmes.

ESSE AMOR QUE NOS CONSOME

Se UM LUGAR ERRADO é visto como uma obra falha por muitos, ESSE AMOR QUE NOS CONSOME (2012), de Allan Ribeiro, por sua vez, tem recebido vários elogios. Afinal, trata-se de um filme que dialoga com amantes da geografia de cidades, de cultos afrobrasileiros, de danças contemporâneas e de relacionamentos homossexuais. Não deixa de ser também um bom exemplo de filme de resistência, em um momento em que todos esses temas são parte importante de discussões acirradas. No entanto, ESSE AMOR QUE NOS CONSOME não me deixou sequer incomodado. Quando você não se encanta com o que está vendo na tela, como as danças apresentadas, aí fica complicado de comprar a ideia do filme, de somar ao grupo dos que o amaram. Creio que o que eu mais gostei no filme foram os diálogos entre um dos personagens e moradores de rua. Eles soaram autênticos, embora a ficção e o documentário estejam bastante embaralhados no filme. Isso, aliás, é outro fator positivo do filme, de pegar cenas supostamente documentadas, do casal Gatto Larsen e Rubens Barbot em casa, discutindo vários assuntos com a maior tranquilidade, e tornar essas cenas próximas da de uma narrativa ficcional. As discussões acerca dos orixás, por exemplo, me fizeram lembrar minhas discussões sobre os signos do Zodíaco, como quando um dos personagens fala sobre o quanto fulano é mais parecido como filho de Iansã do que filho de Oxum, ou algo do tipo. Como não entendo de candomblé, acabo por olhar tudo com certo distanciamento. E foi assim que também vi ESSE AMOR QUE NOS CONSOME.

quinta-feira, outubro 17, 2013

É O FIM (This Is the End)























Um dos filmes mais divertidos do ano, É O FIM (2013), porém, pode sofrer de um possível desconhecimento de parte da audiência das piadas internas envolvendo os vários atores presentes no elenco, seja o principal, seja o de apoio. É mais ou menos como ver a série ENTOURAGE, com a diferença que aqui há uma necessidade maior de se conhecer pelo menos a parceria de Seth Rogen com James Franco, principalmente na recente comédia de maconheiros SEGURANDO AS PONTAS, de David Gordon Green. É deste filme, aliás, que vem as piadas que sugerem a amizade quase homossexual entre os dois atores.

Aliás, pode-se dizer que eles popularizaram o "bromance com maconha", ou pelo menos, elevaram o subgênero a um novo patamar. A parceria dos dois, porém, vem de bem antes: vem da série FREAKS AND GEEKS (1999-2000), que também traz no elenco Jason Segel, em papel pequeno em É O FIM. As correlações de Rogen com outros atores vêm principalmente de filmes mais recentes, como SUPERBAD – É HOJE (2007), que conta com as participações de Jonah Hill e Michael Cera e é um filme que foi roteirizado por Rogen e Evan Goldberg, os diretores de É O FIM.

Enfim, são tantas as ligações que tentar falar de tudo e de todos seria criar uma teia tão intrincada quanto a de uma aranha. E é nesse clima de brodagem, descontração, piadas sobre filmes, maconha e fim do mundo, que se desenrola esta comédia apocalíptica que acontece durante uma festa na casa de James Franco. Como todo mundo adota o próprio nome, algumas personas são mostradas de maneira bem curiosas, tanto que ficam algumas perguntas no ar. Como por exemplo: será que Michael Cera é tão porra-louca como é mostrado no filme?

Curiosamente, o personagem que se sente menos à vontade na festa é um dos atores menos conhecidos do filme, Jay Baruchel, amigo pessoal de Rogen, e que aparece no elenco de LIGEIRAMENTE GRÁVIDOS (2007). Ele é o sujeito que não se sente bem na casa de James Franco, não suporta Jonah Hill e quer ir embora dali. O que eles não esperavam é que o mundo começasse a desabar, como num apocalipse de proporções bíblicas, com direito à abdução das pessoas boas para o céu enquanto as más ficam comendo poeira na Terra.

Pena que justamente quando o filme deixa de ser uma comédia à ENTOURAGE e passa a ser uma comédia apocalíptica, a coisa desande um pouco. Mas só um pouco, já que algumas piadas estão reservadas justamente para essa segunda parte, como as participações de Emma Watson e Channing Tatum, para citar dois astros de primeiro escalão que aparecem em situações interessantes. Não por acaso, diante de tanta descontração, Quentin Tarantino elegeu o filme dos amigos entre os seus favoritos de 2013. Claro que não é pra levar muito a sério, mas É O FIM nunca se leva a sério mesmo.

terça-feira, outubro 15, 2013

ROTA DE FUGA (Escape Plan)























Eis o verdadeiro encontro de Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger. Esqueçamos os dois OS MERCENÁRIOS, pois ali eles mal tiveram tempo de trocar ideias, com tantos outros marmanjos e tantas piadas internas para administrar. Nada melhor do que numa prisão de segurança máxima para que isso seja possível. Em ROTA DE FUGA (2013), de Mikael Håfström, Stallone interpreta um especialista em fugas de prisões de segurança máxima. Ele é até autor de um livro sobre o assunto, descrevendo as falhas de segurança, no que elas têm de melhorar etc. O filme já começa com seu personagem, Ray Breslin, finalizando uma fuga, depois de meses de planejamento. Porém, ele terá muito mais dificuldade em sair de outra prisão, em um lugar totalmente desconhecido e sem ter ninguém lá fora para ajudá-lo.

Se ROTA DE FUGA parece um filme convencional e apenas divertido, há motivos para vê-lo como algo mais. Além de termos as interpretações dos dois maiores ícones dos anos 1980 – ou o mais próximo de uma interpretação, pois todo mundo é canastrão no filme –, há alguns momentos que chamam a atenção, como a participação do personagem árabe (Faran Tahir), que acaba por se aliar à dupla, formando um trio. A julgar pelo destino do árabe e as tendências ultradireitistas dos dois astros na década de 80, trazer esse personagem para si pode significar uma tentativa de fazer as pazes com o inimigo. Ainda que o inimigo aqui seja outro. Não mais um russo, como era nos tempos da Guerra Fria.

Além do mais, como não ficar com um sorrisão no rosto ao ver o velho Schwarza com uma metralhadora na mão, como nos tempos de COMANDO PARA MATAR, e feliz feito pinto no lixo ao segurar aquele trabuco? Só faltou um charuto na boca para completar a festa. Embora esta sequência aconteça perto do final, e, portanto, traga alguns clichês de thrillers de perseguição, em ROTA DE FUGA é possível ver esta cena com a tranquilidade de quem está vendo uma comédia.

Assim, por mais que esteja longe de ser tão bom quanto o sensacional e geralmente subestimado O ÚLTIMO DESAFIO, de Kim Jee-woo, o retorno pra valer do "Governator", ROTA DE FUGA o deixa invicto neste ano de 2013. Quanto à Stallone, também continua bem na fita. Teve a coragem de fazer um filme de ação ultraviolento com um diretor às portas da aposentadoria, ALVO DUPLO, de Walter Hill, e tem aproveitado seus momentos maduros para se divertir com os amigos e compartilhar isso com os espectadores.

Quanto a ROTA DE FUGA, curioso ver Jim Caviezel, que interpretou Jesus em A PAIXÃO DE CRISTO, como o maléfico diretor da penitenciária. Nem sempre ele convence, mas isso nem vem ao caso no que se refere a este filme. Vale destacar também as boas performances de Amy Ryan, Sam Neill e 50 Cent, ainda que curtas. Podemos destacar mais duas coisas: a generosidade de Schwarzenegger em deixar o amigo brilhar como protagonista e mente intelectual da fuga e ser sempre o segundo em cena; e o fato de encontrarmos mais um personagem de Stallone a engrossar a lista dos heróis solitários e atormentados pelo passado, tão caros ao ator/diretor/roteirista.

segunda-feira, outubro 14, 2013

O INVENTOR DE SONHOS























Filmes históricos brasileiros são sempre bem-vindos. Afinal, temos uma escassez de filmes desse gênero, em comparação com outras cinematografias. É como se houvesse uma falta de interesse dos brasileiros por sua própria História. Nem tanto os anos de chumbo, que já foram fartamente abordados em diversos filmes, mas a História dos primórdios do Brasil é carente de mais registros.

Daí entra em cartaz um filme pouco ou nada divulgado chamado O INVENTOR DE ILUSÕES (2013), de um diretor também pouco conhecido, Ricardo Nauenberg, que foi diretor da Rede Globo durante o período de 1980 a 1990, dirigiu alguns curtas-metragens e estreia seu primeiro longa para cinema agora. Sua formação em design pode ter sido fundamental para que ele optasse por fazer um filme utilizando muito a computação gráfica para construir o Rio de Janeiro do ano de 1808, época em que a Família Real aportou na cidade, fugida das tropas de Napoleão Bonaparte.

A história, vista pelo ponto de vista da própria realeza, até foi contada em parte e de maneira divertida em CARLOTA JOAQUINA - PRINCESA DO BRASIL, de Carla Camurati, filme que já desmistificava a realeza, que chegou aqui cheia de piolhos e com as roupas aos trapos, depois de uma viagem bem cansativa. O INVENTOR DE SONHOS oferece uma visão de fora, da porta dos fundos. Assim, a Família Real é pouco vista, a não ser por uma aparição simpática de D. Pedro I.

O filme procura ser didático, e isso o prejudica bastante, já que, no cinema, até para ser didático tem que saber fazer direito. Peguemos por exemplo o caso do dinamarquês O AMANTE DA RAINHA, que pode ser visto e entendido por plateias do mundo todo, e ainda ser admirado por suas qualidades visuais e dramatúrgicas. Não é bem o caso de O INVENTOR DE ILUSÕES, que, apesar de ser uma amostra interessante da sociedade brasileira da época, traz também muitos detalhes políticos que certamente só serão entendidos por nós, brasileiros.

Mas esse não é o maior de seus problemas. Embora haja uma narrativa que até começa interessante e envolvente, os personagens nunca são suficientemente fortes para que nos importemos com eles. Nem mesmo o protagonista Trazimundo, vivido por Ícaro Silva em sua fase adulta. Talvez por ele ser um personagem por demais autoconfiante. Não quiseram fazer um herói mestiço que come o pão que o diabo amassou e leva várias chibatadas, como os escravos que aparecem no filme, até para diferenciá-lo dos demais. Ele, por ser mulato e por não ter um feitor, é criado com uma liberdade que os demais negros não têm. Principalmente os recém-chegados dos navios negreiros, tratados como burros de carga.

O excesso de computação gráfica é até compreensível, como algo necessário para baratear os custos, afinal não dá para construir cidades cenográficas com pouco dinheiro. Isso mexe com a estética do filme, que adota também uma fotografia que fica granulada nas cenas de closes ou imagens mais aproximadas, provavelmente por não ter sido filmado com câmeras digitais de última geração. Em certos momentos, parece uma minissérie feita para a televisão de um canal como a Record, por exemplo.

Há uma grande quantidade de rostos conhecidos e que contribuem como podem para elevar ao filme a uma melhor condição, no aspecto da dramaturgia: Stênio Garcia, como um comerciante velhaco; Luiz Carlos Vasconcelos, como um mercador de escravos e latifundiário decadente; Ricardo Blat, como um funcionário corrupto da alfândega; Guilhermina Guinle, como a mulher do personagem de Vasconcelos e que tem um amante; Emilio Orcilio Netto, como seu amante e militar do exército português; Roberto Bonfim, como um cocheiro descendente de índios; Debora Nascimento, como a servente da taberna e responsável por uma das cenas mais sensuais do filme; entre outros.

Pena que, mesmo com tanta gente boa e com um interesse romântico para o protagonista, o filme vá perdendo o pouco da força que aparenta ter no início e vai se tornando cada vez menos interessante. A fotografia do filme, inspirada em fotografias do século XIX e com tonalidades marrons, é curiosa, mas é outro elemento que distancia o espectador. A trilha sonora de Dado Villa-Lobos é discreta, tão discreta que chega a ser genérica. Ainda assim, O INVENTOR DE ILUSÕES vale a espiada, principalmente pelo retrato da sociedade daquela época em raro registro cinematográfico.

sábado, outubro 12, 2013

GRAVIDADE (Gravity)























E eis que mais um filme de primeira grandeza chega ao nosso circuito para mexer com nossas listas de melhores de 2013. Que bom. E que alívio poder contar com o retorno de Alfonso Cuarón, que desde 2006, com FILHOS DA ESPERANÇA, que não lançava nenhum longa seu nos cinemas. Mas o longo parto de GRAVIDADE (2013) valeu a pena, pois o resultado é desses de deixar o espectador não apenas aflito e tenso durante toda a projeção, mas também maravilhado.

Pra começar, o filme não mostra nenhuma prévia dos personagens de Sandra Bullock, que interpreta a Dra. Ryan Stone, uma engenheira em sua primeira missão no espaço, e de George Clooney, como o experiente e bem-humorado astronauta Matt Kowalsky. O filme entra de cara com os dois no espaço, tentando consertar algo em um satélite. A sensação de solidão naquela vastidão já começa presente desde o início.

E a tendência é piorar, já que destroços de outro satélite passam pela tripulação e causam resultados catastróficos na missão e na vida daqueles poucos personagens. Os rodopios que eles dão no espaço, à deriva, são também de impressionar e foram momentos muito difíceis para Sandra Bullock e George Clooney durante as gravações, em que eles usaram cabos para simular a falta de gravidade no espaço.

Uma coisa que foi enfatizada em 2001 – UMA ODISSEIA NO ESPAÇO, de Stanley Kubrick, foi que no espaço o som não se propaga. E por isso é tão importante a trilha sonora do inglês Steven Price, que fez um trabalho excepcional. Tanto que quando seu nome surge nos créditos finais, fica-se pensando: quem é este homem? Como compositor de trilhas, ele tem pouquíssimos trabalhos, sendo o mais conhecido deles o horror de baixo orçamento ATAQUE AO PRÉDIO, de Joe Cornish.

Seu trabalho em GRAVIDADE funciona nos momentos de impacto dos objetos em outros objetos como um substituto do som, que no espaço não se propaga. Mas não apenas isso: acentua a aflição, a solidão, o medo, a angústia, todos esses sentimentos tão carregados que os personagens, principalmente Ryan Stone, passam, ao longo do filme. Trata-se de uma trilha também grandiloquente no sentido de mostrar o quão insignificantes somos diante do universo.

Há também um interesse em trazer à tona uma reflexão sobre o sentido da vida, de como ela pode ser uma dádiva, e não um estorvo. Inicialmente, pelo menos, é um tanto assim que a personagem de Bullock vê a vida, devido a uma perda na família. Essa visão amarga da engenheira é fundamental para que haja um conflito existencial nos momentos finais do filme.

Algumas sequências são dignas de nota, como o momento que ela adentra uma câmara e se posta como um feto, que pode ser tanto uma maneira de elogiar a obra-prima de Kubrick, como de mostrar o quanto a personagem se sentia ali, no espaço, apesar de sozinha, distante das dores da vida na Terra, por mais que aquelas circunstâncias no espaço também não fossem tão favoráveis. Outro momento tocante é o das lágrimas sem gravidade, que se aproximam de nós com os ótimos efeitos em 3D.

Outro aspecto belo está na questão da religiosidade, que é tratada sem dogmas, mas buscando a transcendência. Comovente o momento em que a protagonista confessa que nunca rezou pois nunca a ensinaram, numa situação em que sente a necessidade de entrar em contato com o divino. Aparecem imagens icônicas de Jesus e Buda, em diferentes estações, em alguns desses momentos. E, claro, há as palavras finais da personagem, que saem do fundo de seu coração, mas que também funcionam como alento para nossos corações tão aflitos depois de tão doloroso percurso.

P.S.: Que bom que o cinema UCI Ribeiro do Iguatemi finalmente substituiu aqueles horríveis e toscos óculos escuros por óculos de lentes mais claras, que oferecem mais conforto e não dão aquela incômoda dor de cabeça.  

sexta-feira, outubro 11, 2013

APOSTA MÁXIMA (Runner Runner)























Uma pena que o novo filme de Brad Furman, do ótimo O PODER E A LEI (2011), tenha sido tão decepcionante. Em APOSTA MÁXIMA (2013), o filme vazio impera. Sair da sessão deste filme é ver uma dupla de atores até bons participando de uma obra que não vai a lugar algum. Ou até vai, mas depois de passados os 91 minutos, nada do que é mostrado na tela parece ter valido a pena, por mais que hoje em dia Justin Timberlake e Ben Affleck sejam atores melhores e Gemma Arterton seja uma das revelações entre as novas beldades de Hollywood. Nada disso importa, pois a trama envolvendo jogos online e trambicagem se torna logo esquecível.

Talvez valha a pena ver o filme já esperando algo ruim, como um desses passatempos feitos para a tevê comumente exibidos no Supercine. Nesse sentido, até que não é de todo ruim. Até porque temos a oportunidade de ver Affleck desempenhando um sujeito bem malvado e maquiavélico, que não tem pena de jogar seus inimigos para os crocodilos. Ou seriam jacarés? Outro elemento interessante está no país onde se passa a história, Costa Rica, por mais que saibamos da mania que os americanos têm de apresentar apenas estereótipos dos países estrangeiros. Mesmo assim, não deixa de ser uma mudança de ares e, em certos momentos, criamos uma empatia com o personagem de Timberlake, que parece estar mesmo preso àquele país estranho.

É possível ver APOSTA MÁXIMA como uma espécie de conto moral, em que o herói encara um desafio, depois de passar por dificuldades (no caso, pagar as mensalidades do seu mestrado), demonstra seu domínio e inteligência com o computador e a matemática no mundo dos jogos online, e sai do conforto relativo de seu país para enfrentar um sujeito estranho e possivelmente perigoso (Affleck) que lhe tirou, de maneira inescrupulosa, todo o dinheiro que ele apostara no jogo por computador. Aliás, não deixa de ser também uma novidade para muitos esse tipo de jogo e o quanto eles podem estar escondendo redes de crimes, entre outros delitos inimagináveis.

Porém, mesmo como conto moral, a história de APOSTA MÁXIMA acaba se tornando boba e vazia. Curiosamente, a dupla de roteiristas do filme é a mesma de O JÚRI, um thriller forense até bem inteligente. Provavelmente por causa do texto de partida. E falando em moral: não dá mesmo para confiar em diretores que nos impressionaram com apenas um filme nem em roteiristas que tiveram sorte uma ou outra vez. Isso mostra que cada filme tem o seu valor, independente de seus realizadores.

quinta-feira, outubro 10, 2013

BOA SORTE, MEU AMOR























De dar gosto entrar na sala 2 do novíssimo Cinema do Dragão e dar de cara com uma cópia em DCP 4K e em scope em tão excelente qualidade. E a fotografia e o som de BOA SORTE, MEU AMOR (2012) são perfeitos para se testar o equipamento. Afinal, a fotografia e o som são dois elementos não apenas importantíssimos para o filme, mas são dois grandes destaques. E isso já é motivo mais do que suficiente para que o espectador fortalezense vá conferir essa experiência.

Se vai gostar ou não do filme de Daniel Aragão, aí é outra história, muito embora seja um trabalho dos mais interessantes dessa fervilhante fase que o cinema produzido em Pernambuco está vivendo atualmente. Inclusive, há sim semelhanças com O SOM AO REDOR, de Kleber Mendonça Filho, principalmente no que se refere a tratar tanto do crescimento desordenado de Recife, quanto de problematizar o ambiente rural do estado, que ainda conta com um coronelismo cujas raízes ainda são profundas demais para ter desaparecido nos dias de hoje.

Para tecer esta sinfonia que envolve tanto arranha-céus, máquinas de escavação, apartamentos luxuosos e casebres semiabandonados no interior, com pessoas que mais parecem zumbis, Daniel Aragão nos apresenta uma história de amor entre Dirceu (Vinícius Zinn), funcionário de uma empresa de demolição, e Maria (Christiana Ubach), uma estudante de piano. Se por um lado, ele é conivente com a situação social, até por pertencer a uma classe mais abastada, Maria é mais revoltada com a atual hierarquia existente, já que sente na pele o que é dar duro na vida para sobreviver.

Uma cena bastante representativa desse abismo social e que chega a incomodar e a deixar o nosso coração pesado é uma em que Maria avista a mulher que conheceu numa festa de amigos do namorado, vivida por Maeve Jenkins (a inimiga do cão e amiga da máquina de lavar roupa de O SOM AO REDOR), e vai até lá cumprimentá-la. A recepção da mulher rica a ela, até por Maria estar vestida com trajes de quem está trabalhando nas ruas para promover alguma empresa, é fria e cruel.

Dividido em três atos, o filme dá mais atenção a Maria nos dois primeiros atos, chegando ao ponto de ela deter o ponto de vista da narrativa, para nos deixar sem chão no terceiro ato, que é provavelmente o melhor, com um sentimento de mal estar constante, ao acompanharmos a descida aos infernos de Dirceu. Quase como uma alegoria ao mito de Orfeu.

Essa história de amor um tanto cruel, se é que dá pra chamar de história de amor, é emoldurada por uma fotografia que, ao enfatizar os contrastes, funciona como metáfora para a própria história, para as diferentes condições sociais dos personagens; e por uma música que, com seus timbres muitas vezes dissonantes, contribui para aumentar o impacto das sensações desagradáveis que seus personagens vivenciam. Vale destacar também a participação de Carlo Mossy, em papel pequeno mas poderoso.

quarta-feira, outubro 09, 2013

MUITO BARULHO POR NADA (Much Ado about Nothing)























Começo a suspeitar de que não gosto dos trabalhos de Joss Whedon. Senão vejamos: comecei a ver FIREFLY (2002-2003) e não consegui ir até o fim, de tão chata que achei; não gostei de OS VINGADORES – THE AVENGERS (2012); não gostei do piloto de AGENTS OF S.H.I.E.L.D. (2013), embora tenham dito que o segundo episódio foi melhor. E, finalmente, não embarquei na brincadeira despretensiosa (ou quase) de filmar Shakespeare na própria casa, com os amigos e sem usar figurino de época que é MUITO BARULHO POR NADA (2012).

Em conversa com amigos ontem, soube que fãs de BUFFY (1996-2003) e ANGEL (1999-2004) tendem a gostar, talvez pela familiaridade com o elenco e com o estilo do diretor. Para não dizer que não gostei de nada dele, adoro o trabalho que ele fez na série Surpreendentes X-Men, especialmente o primeiro volume, lançado pela Panini há algum tempo. Mas aí já estamos falando de quadrinhos.

Voltando a MUITO BARULHO POR NADA, não é que o filme seja ruim. Na verdade, é que leva algum tempo para superarmos a estranheza do texto de Shakespeare naquele universo e são muitos personagens envoltos na trama de amor e intriga. Só aos poucos é que vamos sabendo quem são os protagonistas, qual a importância de cada um. E até dá para simpatizar com o verdadeiro casal de protagonistas, aqueles que só se juntam por causa dos amigos cupidos, os personagens Beatrice (Amy Acker) e Benedick (Alexis Denisof).

A opção pela fotografia em preto e branco parece uma chamada para o mundo indie, para a exibição em cinemas alternativos. Em certos momentos, passa a impressão de que falta ao filme respiro, com diálogos tão rápidos. Tanto é que, em certo momento, quando o filme deixa um pouco de lado o texto do bardo e mostra imagens de uma festa, dá até um certo alívio, dá pra relaxar um pouco o cérebro.

Quando o filme termina, por mais que seja bem desenvolvido o desfecho, tanto pelo texto original quanto pelos atores, resta apenas a impressão de ter visto uma obra um tanto descartável, que se utiliza do prestígio de Shakespeare e de uma fotografia mais usada em filmes "de arte" para disfarçar sua falta de força e graça.

terça-feira, outubro 08, 2013

AS BEM-ARMADAS (The Heat)























Na expectativa da estreia de GRAVIDADE, de Alfonso Cuarón, é interessante poder conferir mais uma vez o talento de Sandra Bullock no terreno da comédia, desta vez ao lado de Melissa McCarthy, que já havia trabalhado com o diretor Paul Feig no mais bem-sucedido MISSÃO MADRINHA DE CASAMENTO (2011) e está ensaiando tentativas de chegar ao estrelato através de comédias.

Não deixa de ser interessante ver essa série de comédias estreladas por mulheres e perceber o quanto elas podem ser tão boas quanto os homens no quesito humor, por mais que se espere quase sempre delas mais suavidade. AS BEM-ARMADAS (2013) é uma comédia que chega a ser ingênua diante de tantas outras: é uma pequena história sobre amizade usando o tão conhecido tema da dupla de policiais de personalidades diferentes que são obrigados a trabalhar juntos.

No caso de AS BEM-ARMADAS, tanto a agente do FBI Ashburn, que não tem muita moral com seus subordinados, vivida por Sandra Bullock, quanto Mullins, a policial pouco sociável vivida por Melissa McCarthy, representam algo de losers, até pelo que a própria sociedade exige das pessoas: que elas consigam conviver em harmonia em um ambiente profissional. Quanto ao aspecto familiar, é comum vermos policiais solitários e com famílias esfaceladas por causa de seu trabalho. No filme de Feig isto não é exceção.

Assim, essas duas mulheres solitárias se juntam, inicialmente contra a vontade delas, para desmascarar a identidade de um chefe das drogas de Boston. Um dos obstáculos é que o irmão de Mullins está envolvido com o grupo de mafiosos e já esteve preso. A própria irmã, inclusive, foi quem o prendeu, o que lhe rendeu o ódio de toda a família.

Apesar de não ser um filme de se dar tantas gargalhadas, é uma obra leve e agradável, com bons desempenhos de Bullock e McCarthy, além da boa mão na direção de Feig. AS BEM-ARMADAS tem um ritmo despreocupado, deixando claro que a trama policial não tem muita importância. O que há de importante é sim a progressão da amizade das duas parceiras, especialmente quando elas resolvem tomar todas num bar.

Há espaço para o politicamente incorreto, quando as duas são frequentemente confrontadas por um policial albino, que acaba sendo motivo de algumas das melhores piadas do filme. O jeito desastrado de ser de Ashburn e Mullins também garante bons momentos. Destaque para uma cena em que um sujeito fica engasgado numa lanchonete e Ashburn resolve tomar uma atitude bem drástica.

Assim, AS BEM-ARMADAS não é a bobagem que o trailer prenuncia mas também está longe de ser a melhor comédia do ano. Porém, vale conferir, especialmente quem acompanha a trajetória das duas atrizes e do diretor, que ainda hoje é lembrado como o criador da cultuada série FREAKS & GEEKS (1999-2000).

segunda-feira, outubro 07, 2013

METALLICA – THROUGH THE NEVER























O musical METALLICA – THROUGH THE NEVER (2013) é definitivamente para quem gosta da banda. Para fãs e apreciadores. O pouco que tem de ficção, a historinha um tanto boba estrelada por Dane DeHaan (de PODER SEM LIMITES), funciona em alguns momentos, mas não diz a que veio. Serve mesmo apenas para dar um ar de novidade ao que seria "apenas" o concerto do Metallica. O "apenas" está entre aspas pois é pelo concerto da banda que o filme vale a pena.

Trata-se de uma versão compacta de seus atuais shows, que privilegiam as canções dos cinco primeiros discos, mas não deixam de lado duas do sétimo (Reload, 1997): "Fuel" e "The Memory Remains". Esta última, inclusive, fica até difícil de imaginar os shows sem ela, já que aquele coro cantado pelo público é um momento bem emocionante. O fato de o show ser bem compacto e de as canções serem razoavelmente longas faz com que haja poucas faixas – cerca de uma dúzia. De qualquer forma, até por causa dos desconfortáveis óculos 3D, é possível sair bem satisfeito com o setlist.

O namoro do Metallica com o cinema não é de hoje. Já em 1988, quando lançaram o clipe de "One", aproveitaram cenas de JOHNNY VAI À GUERRA, de Dalton Trumbo. A canção fala de um homem que foi à guerra e voltou sem seus membros e seus sentidos. Uma história trágica que rendeu uma das melhores canções da banda, com a bateria de Lars Ulrich emulando o som de metralhadoras.

Outro exemplo desse namoro está também nas já famosas guitarras que Kirk Hammett usa com os desenhos de dois filmes de horror dos anos 30: A MÚMIA e ZUMBI BRANCO. Para completar, os shows atuais da banda estão se iniciando com "The Ecstasy of Gold", composição de Ennio Morricone para o clímax de TRÊS HOMENS EM CONFLITO, de Sergio Leone.

Começar o show com "Creeping Death" é outro grande acerto e a câmera em cima do palco nos apresenta alguns efeitos que combinam com o tema. No caso, durante essa canção especificamente, as luzes brancas do palco vão ficando banhadas de vermelho, como sangue. A canção fala da sétima praga de Moisés ao Faraó, aquela que trouxe morte aos primogênitos do Egito. Sem falar que o refrão é emocionante. Talvez o melhor de toda a carreira da banda.

Mas outros grandes momentos viriam: outra excelente do segundo disco, "For Whom the Bell Tolls", depois "Fuel", depois "Ride the Lightning", que apresenta cenas de um homem condenado à cadeira elétrica. Há, inclusive, uma grande cadeira elétrica na parte de cima do palco. Outro efeito especial fantástico acontece em "...And Justice for All", com a imagem-símbolo da Justiça montada para depois ser totalmente destruída, como na amarga canção ("Justice is lost / Justice is raped / Justice is gone”).

"Master of Puppets" e "Battery" representam bem o terceiro e aclamado álbum da banda e "Nothing Else Matters" e "Enter Sandman" representam o quinto e mais popular disco do quarteto. Inclusive, difícil não se arrepiar com cada acorde de "Nothing Else Matters", com a harmonia das guitarras de James Hetfield e Kirk Hammett, com a melodia de uma canção que beira à perfeição. Fechar com a quase punk "Hit the Lights", do primeiro disco, é uma boa, mas fica aquele gosto de quero mais. Muito pouco para um repertório tão rico.

Ainda assim, acaba sendo o melhor trabalho de Nimród Antal, mais conhecido como o diretor do horror TEMOS VAGAS (2007) e da sci-fi PREDADORES (2010). E o maior trabalho para que o resultado saísse bom nem foi dele, mas da banda.

P.S.: Uma pequena reclamação com relação à cópia da H2O Films: as legendas não mostram as letras com acentos. Tudo bem que quase não há diálogo no filme, mas uma gafe como essa poderia ser evitada. 

domingo, outubro 06, 2013

O AMANTE DA RAINHA (En Kongelig Affære)























Antes de mais nada, não custa destacar a exuberância visual de O AMANTE DA RAINHA (2012) como um atrativo para que este filme seja visto no cinema, não importando o fato de ele ter chegado em nossas telas com certo atraso – trata-se de um candidato ao Oscar de filme estrangeiro, lançado em circuito nacional em fevereiro. As primeiras imagens, suntuosas, já conquistam o espectador. A narrativa fluida e agradável também é um elemento que cativa a audiência.

O início do filme lembra MARIA ANTONIETA, de Sofia Coppola, ao mostrar uma nobre estrangeira, no caso, Caroline Mathilde, da Grã-Bretanha, chegando a um país estranho para casar com um rei desconhecido e louco, Christian VII, rei da Dinamarca em 1766, intepretado por Mikkel Boe Følsgaard, vencedor do prêmio de melhor ator em Berlim-2012.

Ainda assim, por mais que a beleza de Alicia Vikander, que interpreta Caroline, seja um dos destaques, não há como não notar o carisma de Mads Mikkelsen, hoje não mais um ator apenas de filmes escandinavos, mas um ator internacional. Ele é o personagem-título, um médico de província que consegue chegar ao posto de médico oficial do rei, e que, numa consulta à rainha, acaba por se envolver afetivamente com ela. Inicialmente porque ela se interessa pela biblioteca do médico, que traz alguns livros de filósofos iluministas, livros que eram proibidos na Dinamarca, um país resistente a um período em que várias monarquias absolutistas se dissolviam na Europa.

O AMANTE DA RAINHA é, portanto, uma bela chance de sabermos um pouco mais sobre um país cuja História é pouco contada em filmes lançados no Brasil. Claro que o diretor Nikolaj Arcel (um dos roteiristas da versão escandinava de OS HOMENS QUE NÃO AMAVAM AS MULHERES, 2009) tomou suas liberdades, e uma ficção, ainda que baseada em fatos reais, nunca deixará de ser uma ficção. Mas trata-se de uma porta aberta para que o espectador conheça parte importante da História daquele país. Caso queira saber mais, fontes não faltam.

O AMANTE DA RAINHA, embora enfatize principalmente o romance proibido entre Struensee (Mikkelsen) e Caroline, também destaca o aspecto político e social, tão fundamental para aquele momento. Afinal, Struensee e Caroline foram essenciais para a construção de uma nova Dinamarca, um país mais justo, muito embora isso tenha lhes custado muito caro.

Quanto à estrutura narrativa, O AMANTE DA RAINHA não se distingue tanto do cinemão hollywoodiano em sua estrutura clássica e romanesca. Mas isso em nada diminui o valor do filme, que empolga por diversos motivos, sejam relacionados à narrativa, sejam técnicos, com direção de arte, fotografia e figurinos de encher os olhos. Talvez o que falte um pouco seja um maior sentimento de catarse em seus momentos finais, algo que torne aquela conclusão de fato impactante para o espectador. O diretor, no entanto, preferiu um registro um pouco mais distante, embora não seja isento de carinho e empatia por seus personagens. Quem puder ver o filme no cinema, que é o lugar mais adequado para apreciá-lo, aproveite a oportunidade.

sexta-feira, outubro 04, 2013

GRITOS MORTAIS (Dead Silence)























Depois de INVOCAÇÃO DO MAL (2013), fica difícil não ter vontade de ver os outros filmes ainda não vistos da filmografia de James Wan. Que, aliás, é bem curtinha. Depois do sucesso estrondoso de JOGOS MORTAIS (2004), que deixou muita gente com taquicardia no cinema e acabou gerando umas continuações não tão agradáveis, Wan partiu para algo do gênero sobrenatural. Aqui no Brasil, GRITOS MORTAIS (2007) foi parar em vídeo, mas a distribuidora acabou não resistindo e repetiu o mesmo adjetivo do filme de sucesso do diretor. Na verdade, o filme foi parar em vídeo em parte porque não era muito bom. Não que isso seja regra, claro.

Dá pra notar uma forte ligação entre GRITOS MORTAIS e INVOCAÇÃO DO MAL. Principalmente pelo prólogo de INVOCAÇÃO, pela sinistra boneca Anabelle. Neste filme de 2007, o terror inicialmente vem em um boneco também bastante assustador, e por isso a primeira parte do filme é muito boa, com o surgimento do boneco em um pacote deixado na casa do protagonista (Ryan Kwanten, um ano de se tornar famoso como o Jason, de TRUE BLOOD).

Há uma construção de clima de terror muito boa, chegando a dar medo mesmo em alguns momentos, apesar de essa construção não ser assim tão original. Assim como em INVOCAÇÃO DO MAL, o que Wan faz é aproveitar os clichês e usá-los com eficiência. Uma pena que esse início promissor não se estenda ao longo do filme, que vai se tornando até um tanto chato, principalmente à medida que a verdadeira vilã, uma entidade maligna chamada Mary Shaw, que criava bonecos para shows de ventriloquismo, cujo fantasma não apenas assombra, mas mata as vítimas, arrancando suas línguas. Sua lenda acaba sendo um tanto boba e difícil de comprar.

No mais, há o detetive de polícia que não acredita no herói e que o segue, atrapalhando o caminho, as pessoas que sabem da história e contam para que saibamos o início da assombração, e um clímax que poderia ter sido muito bom, num teatro abandonado e alagado. Infelizmente, GRITOS MORTAIS só serviu como ensaio para grandes filmes de horror que Wan faria em seguida, como SOBRENATURAL (2010) e o já citado INVOCAÇÃO DO MAL.

quarta-feira, outubro 02, 2013

OS CURTAS DA MOSTRA COMPETITIVA DO 23º CINE CEARÁ

 

São doze curtas, mas que ocupam o mesmo espaço de longas na minha lista de filmes a comentar. Então, vamos logo escrever um pouco sobre cada um desses pequenos e significativos trabalhos que representaram alguns dos melhores momentos do Cine Ceará. Como eu falei durante a reunião final do júri, diferente de Gramado-2012, não achei que o Cine Ceará tenha trazido curtas que eu considere realmente excelentes. Nada de coisas do porte de MENINO DO CINCO, A MÃO QUE AFAGA ou O DUPLO. Mas talvez fosse querer demais. No entanto, em sua maioria, são bons títulos, e que crescem na memória afetiva à medida que me lembro deles.

AU REVOIR

A diretora Milena Times é estreante, mas só em ter sido assistente de direção de Kleber Mendonça Filho em O SOM AO REDOR já a deixa numa posição de prestígio. Seu curta é de uma delicadeza comovente. AU REVOIR (2013) conta a história de uma moça brasileira que mora na França e que tem como vizinha uma senhora idosa que cria um gato. Aliás, ela também tem um gato. Diria que os gatos roubam a cena do filme, sem fazer muito esforço. Mas AU REVOIR é sobre a solidão e sobre relações de proximidade e distância. O fato de ser falado em sua maior parte em língua francesa pode dar ao filme boas chances no mercado internacional. AU REVOIR foi exibido na última edição do Festival de Brasília também.

EM CARTAZ

Um trabalho bem interessante, tanto do ponto de vista humano quanto cinematográfico, já que é um pequeno documentário sobre o trabalho de pintura que vários artistas faziam no tempo em que os cartazes eram difíceis e caros. Assim, acompanhamos o trabalho progressivo, a partir de uma foto original de CLEÓPATRA, a versão de 1963, do artista A. Silveira, no subsolo de um prédio. EM CARTAZ (2013), de Fernanda Teixeira, tem um ar saudosista por excelência.

ED.

Uma das duas animações presentes na mostra competitiva, o que mais salta aos olhos em ED. (2013), de Gabriel Garcia, é o capricho no visual, que foi pensado para ser exibido em 3D. Assim, o filme talvez seja um pouco prejudicado ao não ter sido exibido nesse formato. Apesar de ter no júri da crítica um grande fã, não vejo ED. como um bom filme. É mais o caso de forma (ou efeitos especiais e técnica de animação) acima do conteúdo. Ou quase isso. É a história de um coelho que passou por muitas aventuras e que agora quer acabar com tudo.

QUINHA

Uma das coisas que pode incomodar em QUINHA (2013), de Caroline Oliveira, é o fato de parecer por demais nordestino, de trabalhar muito com os estereótipos. É o trabalho de conclusão de curso da diretora, que é de São Paulo e estuda em Nova York, e que, durante o processo de edição, fez tudo por skype com João Maria, responsável pelo trabalho de montagem de O SOM AO REDOR e de outro curta também presente no festival, O MELHOR AMIGO. QUINHA se beneficia da presença sempre bem-vinda de Hermila Guedes, que interpreta uma mãe abandonada pelo marido e que leva sua filha para um batismo. Quinha é o nome da garota que acredita em milagres.

JESSY 

Confesso que é o meu favorito desses curtas. JESSY (2013, foto 1) foi dirigido por Paula Lice, Rodrigo Luna e Ronei Jorge, e pelos próprios transformistas que aparecem no filme também, já que os diretores disseram que deixaram a coisa rolar durante as filmagens. No divertido documentário (se é que dá pra classificar como documentário), um grupo de transformistas prepara uma mulher (uma das diretoras, Paula Lice) para se tornar uma drag queen. Assim, há desde detalhes simples e divertidos como momentos em que o espectador fica impressionado com o processo. Sem falar que o final é sensacional. JESSY, se não foi aprovado na contagem de votos da crítica, foi o vencedor pelo júri de curtas-metragens.

O QUE LEMBRO, TENHO 

Depois do impacto de JESSY, ficou difícil entrar no clima deste O QUE LEMBRO, TENHO (2012), de Rafhael Barbosa, que conta a história de uma senhora idosa que vive num apartamento aos cuidados de sua filha. Tendo chegado à senilidade, ela joga milho no chão, como se lá houvesse galinhas. Trata-se de um filme lento e com um tema delicado, mas que parece faltar pulso para tornar sua melancolia contagiante para o público. Do jeito que está, provoca mais indiferença mesmo. O QUE LEMBRO, TENHO ganhou o prêmio de melhor roteiro.




O PAI DO GOL

Eis um curta que parece ter sido feito para quem gosta de futebol. O PAI DO GOL (2012), de Luiz Ferraz, é centrado na figura do veterano locutor esportivo José Silvério, que é chamado de "O Pai do Gol" devido ao fato de ter sido ele, segundo o curta, o homem a primeiro injetar emoção e adrenalina às locuções dirigidas aos ouvintes dos jogos pelo rádio. Há bem pouco espaço para jogadores em cena; a câmera se concentra e atenta principalmente para a performance de Silvério. Não é um grande curta, mas é bem simpático.

O PACOTE

Interessante notar que há três curtas nestes 12 que cabem muito bem em festivais de diversidade sexual. O já citado JESSY é um. O PACOTE (2013) é outro. Mas o tema aqui é um tanto mais pesado, embora o filme tenha uma leveza que parece ser mérito do diretor, Rafael Aidar, que com boa condução dos atores, conta a história de um rapaz que se apaixona por outro e tem a difícil tarefa de contar a ele que é soropositivo. O filme tem passado por diversos festivais do redor do mundo.

MAURO EM CAIENA 

Que sorte que eu consegui uma cópia de MAURO EM CAIENA (2012), através do próprio diretor, Leonardo Mouramateus. Da segunda vez, é mais fácil gostar do filme, entrar no seu espírito intimista. O curta começa com imagens de um dos filmes japoneses do Godzilla para, depois, mostrar um pouco de imagens da rotina da família do narrador, que em voice-over dá um ar poético ao filme, auxiliado pelas imagens em bonito preto e branco. É uma espécie de carta endereçada ao tio Mauro, o sujeito da família que foi embora para a Guiana Francesa e nunca mais deu notícias. É também uma crítica à construção acelerada de prédios em bairros que outrora eram tranquilos. MAURO EM CAIENA ganhou o prêmio especial de temática nordestina concedido pelo Banco do Nordeste e o prêmio Olhar Universitário.

PINTAS 

Outro filme que tive o prazer de rever, graças a uma cópia em DVD de PINTAS (2013), de Marcus Vinicius Vasconcelos, que a simpática produtora, Nádia Mangolini, me forneceu. Tinha falado pra ela que gostaria muito de rever, pois é de fato uma animação muito viajante. Com a segunda vez, é possível perceber mais detalhes e atentar pela beleza das cores e dos traços. As explosões de aquarela são lindas. Na história, uma mulher colorida traz cor para três namorados com suas vidas preto e branco. Quando ela some, eles voltam a perder a cor. O colorido representaria a felicidade, provavelmente, mas o filme oferece uma abertura para interpretações. O importante mesmo é se deixar levar pela viagem que é PINTAS, outro de meus favoritos do festival.

O MELHOR AMIGO 

Já sou fã do trabalho de Allan Deberton desde que vi o encantador DOCE DE COCO (2011), ambientado no sertão. Em O MELHOR AMIGO (2013, foto 2), o jovem diretor se volta para a cidade, no caso, uma praia na região metropolitana de Fortaleza. O filme acompanha os sentimentos de paixão que um rapaz (Jesuita Barbosa) nutre pelo amigo (Victor Souza). O ciúme surge quando os dois vão a uma barraca que tem telefones nas mesas para que facilite a paquera com alguma outra pessoa que está lá. O filme tem um colorido lindo (cores quentes), um andamento narrativo muito gostoso e uma edição acertada, novamente de João Maria, o mesmo de QUINHA. O MELHOR AMIGO ganhou o prêmio de melhor produção cearense no festival.

SANà

O escolhido pelo júri da crítica da Abraccine, SANÃ (2013, foto 3), de Marcos Pimentel, já tinha sido exibido em Gramado, não tendo sido agraciado com prêmios. Mas caiu nas graças do júri e é um filme que merece ser visto com calma, para acompanhar o seu andamento lento, em que documentário e ficção parecem se confundir, já que é um filme que se beneficia muito de seu personagem, que fica muito à vontade diante da câmera. No caso, o personagem é um garoto albino que vive nos lençóis maranhenses, encarando com coragem aquele sol forte da região, mesmo já tendo feridas no corpo. SANÃ traz um contraste entre a imensidão da paisagem e a necessidade de se interiorizar, como os caranguejos que aparecem no mangue. SANÃ ainda ganhou o prêmio de melhor direção e o prêmio Aquisição Canal Brasil.