segunda-feira, maio 31, 2010

O ESCRITOR FANTASMA (The Ghost Writer)























É um prazer poder estar numa sala de cinema com pessoas interessadas no novo trabalho de um dos diretores mais importantes surgidos na geração da contracultura. Roman Polanski, apesar de ter começado a carreira em seu país natal, a Polônia, tornou-se um cidadão do mundo. O fato de não poder pisar em solo americano não impede que seu filme se passe nos Estados Unidos, em particular numa ilha próxima de Nova York, numa luxuosa casa de praia do ex-primeiro ministro britânico inspirado em Tony Blair, odiado por muitos, por sua participação, junto com o presidente americano, na invasão ao Iraque, levando à morte muitos soldados ingleses e americanos.

Polanski volta a flertar com o film noir, território que lhe é familiar, como podemos lembrar em trabalhos memoráveis como CHINATOWN (1974) e BUSCA FRENÉTICA (1988). O ESCRITOR FANTASMA (2010) foi realizado em circunstâncias bem especiais. Devido ao fato de o cineasta estar preso, ele deu as instruções finais de pós-produção da prisão na Suíça.

Como um bom exemplar do gênero, a trama funciona como um labirinto, com o protagonista (Ewan McGregor) sendo arrastado para situações estranhas e perigosas. O filme começa com um carro sendo rebocado no meio de uma avenida. Logo depois, vemos um corpo morto na praia. É do ghost writer (a expressão em português ainda me é estranha) do Primeiro Ministro. Entra em cena o personagem de McGregor, um homem que ganhou fama por terminar suas obras rápida e eficientemente. Precisando do dinheiro, ele aceita a oferta tentadora de dar continuidade ao trabalho iniciado pelo escritor recém falecido: escrever as memórias do ex-Primeiro Ministro Britânico, vivido por Pierce Brosnan. Achando tudo muito estranho, o escritor vai em busca de detalhes da vida do controverso político. É quando entram em cena coadjuvantes de luxo, como Tom Wilkinson e Eli Wallach. Completando o elenco estelar, Kim Cattrall, como a secretária e amante do político, e Olivia Williams como a esposa.

Curiosamente, o personagem de McGregor não tem nome. Aliás, o seu nome nunca é citado, o que pode passar desapercebido pelo espectador. Há uma sensação de desorientação geográfica e psicológica, o que talvez seja proposital. Outra curiosidade diz respeito à construção da Nova York. Não chegou a ser tão bem cuidada quanto a de Stanley Kubrick em DE OLHOS BEM FECHADOS, em Londres. Aqui, o cuidado foi mais com coisas menos complicadas, como carros americanos, fios de telefone e casas de madeira, que pelo que li não são tão comuns na Alemanha, o verdadeiro local das filmagens.

Ainda no terreno das curiosidades, embora goste de Hugh Grant, creio que ele não faria o personagem tão bem quanto McGregor. E não deixa de ser curioso e triste o fato de Polanski não ter podido receber um prêmio pela segunda vez por causa de um caso de polícia: o Oscar de direção por O PIANISTA (2002) e agora o prêmio na última edição do Festival de Berlim, quando ele já estava em prisão domiciliar. A prisão, porém, meio que pôs Polanski novamente sob os holofotes e talvez isso signifique mais dinheiro no caixa, já que o filme passa longe de ser uma produção luxuosa como seus trabalhos anteriores.

sexta-feira, maio 28, 2010

FÚRIA DE TITÃS (Clash of the Titans)



Definitivamente, filmes de fantasia têm me dado cada vez mais sono e desinteresse. Depois da trilogia O SENHOR DOS ANÉIS, nada me parece minimamente interessante. E olha que FÚRIA DE TITÃS (2010) lida com algo do meu interesse: a mitologia grega. E eu gostei de O INCRÍVEL HULK (2008), o trabalho anterior de Louis Leterrier. Resultado: acabei saindo logo no começo do filme, depois de lutar heroicamente contra as cochiladas, para comprar um daqueles pacotes de pipoca caríssimos que os cinemas UCI vendem. Mas até que ajudou. E como ultimamente eu andava sentindo náuseas e tontura quando comia pipoca - o desgraçado do meu (ex)-neurologista ficou rindo quando eu falei isso pra ele - e dessa vez, nada senti, foi muito bem vinda aquela pipoca, que ajudou a me manter acordado e até a achar o filme divertido.

Na verdade, é possível encontrar qualidades nesta refilmagem do clássico da sessão da tarde de 1981. Não há mais espaço para aquele stop-motion em filmes em live-action. Mesmo naquela época, os efeitos especiais já estavam um pouco datados. Mas o trabalho de Ray Harryhausen me deixava babando quando criança. Não me lembro se vi todo ou só partes desse filme de 81, mas me lembro com muito carinho que ficava espantado (no bom sentido) com os efeitos visuais dos filmes do Sinbad, que, ao lado dos de Jerry Lewis, eram os meus favoritos.

As principais qualidades do novo FÚRIA DE TITÃS - que eu comecei a falar no segundo parágrafo e não desenvolvi - estão no visual meio brega, que lembra os filmes de aventuras sessentistas - a luz das vestes de Zeus são o melhor exemplo disso - e no bom desempenho de Sam Worthington, que tem se tornado o novo action hero do cinema contemporâneo. O ator tem carisma e personalidade e praticamente leva o filme nas costas. Quer dizer, ele e a penca de efeitos digitais que constrói hárpias, uma medusa bem interessante que garante a melhor sequência do filme, escorpiões gigantes e aquele monstrão megagigante, o mascote de Hades (Ralph Fiennes, canastrão, mas perfeitamente coerente com o tom da obra).

Na trama, Perseu (Worthington), filho de Zeus com uma mortal, é criado por um pescador, mas depois da morte dos pais lidera um exército de homens que tomam a decisão de não mais adorar Zeus e resistir aos ataques de Hades, que pede a vida de Andrômeda (Alexa Davalos), a mais bela mulher da Terra, como sacrifício. Tudo parece acontecer rápida e desajeitadamente, mas pelo menos passa rápido.

É filme para ver, comer pipoca, comentar com o amigo ao lado alguma presepada que aparece na tela, comer mais pipoca e esquecer no caminho de volta pra casa.

quinta-feira, maio 27, 2010

BIG BANG: A TEORIA - A TERCEIRA TEMPORADA COMPLETA (The Big Bang Theory - The Complete Third Season)



Mais do mesmo (o que é bom) mas sem o mesmo brilhantismo da segunda temporada (o que não é muito bom). Na temporada passada, os roteiristas estavam mais inspirados e o elenco, bastante afinado. A terceira temporada de BIG BANG: A TEORIA (2009/2010) foi bem irregular, tendo alguns episódios de destaque, claro, mas a maioria, meia-boca. A série explorou bastante o namoro de Leonard e Penny e talvez isso tenha prejudicado um pouco o andamento - a relação de amizade e de desejo por parte de Leonard era um dos aspectos mais interessantes nas pequenas tramas da sitcom.

Se Sheldon foi o grande foco de atenção na temporada passada, a terceira dá mais espaço para Howard e Raj. As cenas de dor-de-cotovelo de Howard quando Raj arranja uma namorada e ele fica sozinho e desconsolado são ótimas. Mas Sheldon continua sendo o grande trunfo de BIG BANG. Afinal, se olharmos para os melhores e mais engraçados episódios, lá estará ele, desempenhando uma função importante dentro da trama. Mas o que eu senti falta nessa temporada foi mesmo de dar boas gargalhadas. Lembro que isso aconteceu bastante na temporada passada. E muito raramente nesta terceira.

Porém, ainda que não tão engraçados, houve alguns momentos históricos. Caso da participação especial de Stan Lee, o bom velhinho simpático e ídolo de dez entre dez fãs dos heróis Marvel. Interessante também notar a evolução da Penny, que ao lado do grupo pôde crescer intelectualmente, como se pode ver no episódio que fecha a temporada, "The Lunar Excitation". E como também se pode ver em outro momento importante da temporada, que é aquele crucial, quando, depois que Penny fala na cama uma citação a STAR WARS, Leonard diz "I love you", com resultados catastróficos e dolorosos para o jovem cientista nerd.

Meu top 5 da temporada

1. "The Excelsior Acquisition". O episódio da famosa participação de Stan Lee, que estará na comic shop frequentada pelo grupo, dando autógrafos. Sheldon perde a chance, pois tem que prestar contas num tribunal por causa de uma multa de trânsito.

2. "The Staircase Implementation". BIG BANG brincando de LOST. O episódio é quase todo um flashback de como Leonard conheceu Sheldon e os outros. E ficamos sabendo porque o elevador do prédio está com defeito até hoje.

3. "The Athens Recurrence". Penny se esforça para tentar aprender um pouco de física, ao sentir ciúmes de Leonard conversando com uma cientista. Ela pede a ajuda de Sheldon. Outra coisa legal desse episódio é a tristeza de Raj, quando Howard começa a namorar.

4. "The Large Hadron Collision". Num evento científico de grande importância a acontecer em Genebra, Suíça, Leonard é convidado e pode levar apenas um acompanhante. Como o evento acontece no Valentine's Day, ele quer levar Penny, mas Sheldon não fica nada satisfeito com isso. Afinal, ir para esse evento era seu sonho e Penny nada entende de física de partículas.

5. "The Lunar Excitation". Leonard dá de cara com um antigo namorado de Penny e ela vê o quanto o rapaz é idiota com suas observações sobre o experimento lunar do grupo. O episódio também se destaca pela tentativa de Howard e Raj arranjarem uma namorada para Sheldon pela internet.

quarta-feira, maio 26, 2010

24 HORAS - OITAVA TEMPORADA (24 - Season Eight)



Foram longos nove anos de uma série que foi bem representativa dos anos 2000. Foi inclusive antecipadora dos eventos de 11 de setembro de 2001. A paranoia dos americanos diante dos ataques terroristas e o trabalho de uma equipe especializada, em especial de seu melhor agente, Jack Bauer, eram o mote da série. Dar sinais de cansaço depois de tantos anos no ar, seguindo uma fórmula, é natural. Mas apesar das várias repetições (sempre há um agente infiltrado na CTU, sempre há mais vilões por trás de outros vilões, sempre há mortes de personagens queridos ou importantes), a série só teve um momento ruim mesmo durante a sexta temporada. A temporada passada foi excepcional e a oitava e última (2010) começou muito bem, teve os seus momentos de menor brilho lá pelo meio e fechou de maneira brilhante.

No começo, eu me interessava mais pelas mulheres da série, principalmente Renee Walker (Annie Wersching) e Dana Walsh (Kate Sackhoff, conhecida de quem acompanha a série BATTLESTAR GALACTICA). Renee foi uma personagem de destaque da temporada passada. Uma agente do FBI que teve um dia de cão ao lado de Jack Bauer. Os estragos na moça foram grandes. Ela abandonou o trabalho e teve sequelas, tornando-se uma mulher violenta e suicida. Ela é convidada a participar de uma missão para se infiltrar num grupo de terroristas. O que Jack não sabia era que o tal sujeito que ela vai encontrar a violentou brutalmente na última vez que ela se infiltrou no grupo. E ela agora quer sangue.

Quanto à Dana Walsh, no início da temporada ela encabeça uma subtrama que não tem relação com a trama principal, de um ataque ao presidente de uma fictícia república islâmica, que está nos Estados Unidos para assinar junto com a presidente Allison Taylor e o presidente da Rússia um acordo de paz. Descobrimos que Dana usa uma identidade falsa e que agora está sendo perseguida por um sujeito do passado, que descobre o seu paradeiro e começa a fazer chantagem para ganhar dinheiro. A subtrama parece saída de uma film noir B dos anos 50 e isso dá um ar delicioso à narrativa. Quem também dá as caras nessa temporada e se sai muito bem, inclusive nas cenas de ação, é Freddy Prinze Jr, no papel de um agente novo da CTU e namorado de Dana.

Mas o que tornou esta temporada de despedida realmente especial foi a grande virada que os roteiristas e produtores deram à série em sua reta final, transformando Jack Bauer numa espécie de Frank Castle, o Justiceiro dos quadrinhos. Em busca de vingança, Jack é capaz de estripar um sujeito só para retirar um cartão de memória e vestir uma armadura e sair atirando num túnel em busca do ex-presidente Charles Logan, em momento antológico. Logan, aliás, é muito provavelmente o grande vilão de toda a série. Ele destila veneno como o Iago de "Othelo" e influencia as decisões da presidente Taylor, de modo que ela se encrenca mais e mais. Só assim para tornarem a personagem mais interessante.

Impressionante como a busca de vingança de Jack, inicialmente encarada com surpresa pelo espectador, nos deixa com sede de vingança também. O que eles fizeram com o personagem foi histórico. Não se trata aqui de fazer uma apologia à violência, mas de tornar Jack Bauer um sujeito não apenas um salvador da pátria incompreendido, mas também um homem que é capaz de atos brutais, que são coerentes no momento em que também estamos contaminados por esse sentimento de vingança. Claro que a Fox não ia levar esse massacre às últimas consequências no episódio final, mas ainda assim as decisões dos roteiristas foram acertadas. E, puxa, aquela cena final, do Jack conversando com a Chloe, sua fiel escudeira, me levou às lágrimas. Bauer foi, sem dúvida, o personagem da vida de Kiefer Sutherland. E o fim de 24 HORAS, junto com o de LOST, marca o fim de uma era. O que virá a seguir?

terça-feira, maio 25, 2010

LOST - A SEXTA TEMPORADA COMPLETA (Lost - The Complete Sixth Season)



E eis que uma das séries mais importantes da história da televisão chega ao seu fim. Por mais que se critique as escolhas dos roteiristas e os rumos que LOST tomou ao longo de suas seis temporadas, não dá para negar o impacto que ela teve, não apenas do ponto de vista da audiência, mas como ela foi essencial para a mudança dos hábitos de quem acompanha uma série de televisão. Claro que ainda há quem acompanhe via tv a cabo ou espere mais um tempo pela boa vontade da Rede Globo, mas o grosso dos fãs da série aderiram mesmo aos downloads. Nos dias de hoje não há espaço para esperas. Pra que esperar meses se eu posso ver hoje? LOST foi o carro-chefe nesse momento delicado e crítico da televisão. Mas não falemos de mídias ou audiências, falemos desse acontecimento tão esperado. Talvez tão esperado desde que a série começou. Quando todo mundo começava a se perguntar: como será que esses caras vão conseguir resolver tantas intrigas, subtramas, enrolações, personagens que vêm e vão, numa mistura de ficção científica, aventura, romance e elementos do surreal e do sobrenatural?

E a julgar pelos tropeços da terceira temporada, tudo indicava mesmo que Damon Lindelof e Carlton Cuse estavam numa sinuca de bico, realmente perdidos, como os seus personagens. E eis que começa a sexta temporada (2010). Na anterior, uma bomba havia sido detonada para matar a todos na década de 1970 e fazer com que todos os acontecimentos que levaram às tragédias deixassem de existir. Jack, o homem de ciência que se transformou no homem de fé depois da morte de Locke, acredita nisso com todas as suas forças. Mas nem sempre o que ele acredita está certo. Ele comete erros fatais. Sawyer, por exemplo, custaria a perdoá-lo, depois do que acontece com Juliet.

Engraçado como o final louco da quinta temporada, regado a muito melodrama, adianta o tom da temporada seguinte. Mas nada nos prepararia para as sequências no templo de um mestre japonês que parece saído de filmes de samurais. Novamente, fica a impressão de que a série perdeu seu rumo. Ilana, a nova personagem, é outra que desaparece tão rápido quanto aparece. Provavelmente por não ser suficientemente carismática. E isso acontece num momento que eles têm tanto o que explicar. O "samba do japonês doido" termina em alguns episódios, mas demora um pouco para que a série entre nos eixos e nos brinde com episódios realmente empolgantes, especialmente quando Desmond entra em cena novamente. Já falei aqui que Desmond é um dos meus personagens favoritos. Ele não é apenas "the constant", ele é o grande herói romântico da série. Na sexta temporada, ele se torna meio que um guia espiritual, um anjo. Aliás, lembrando bem, ele sempre desempenhou esse papel, não?

A mudança de idas e vindas no tempo mudou para 'acontecimentos na ilha' versus 'acontecimentos na realidade alternativa'. Felizmente, a tal realidade alternativa teve uma razão de existir, como se pôde ver no emocionante e belo episódio final. Que mostrou que, mais importante do que qualquer teoria louca sobre viagens no tempo ou fantasia mitológica, o foco da série são os relacionamentos. O final de LOST me fez sorrir de satisfação. Fiquei feliz ao ver novamente Shannon, Boone, Charlotte (que, aliás, estava linda), Daniel, Juliet. Como romântico que sou, gostei dos reencontros, dos beijos, dos abraços, das demonstrações de afeto, por mais cafona que seja a maneira como foram mostrados. Estamos nos despedindo de personagens que estiveram conosco por seis anos. O melhor a fazer é relevar certas coisas, abraçar as emoções e agradecer aos roteiristas por não estragarem o final de sua obra.

segunda-feira, maio 24, 2010

THE OFFICE - SEXTA TEMPORADA (The Office - Season Six)



O fundo do poço da série. Nem mesmo disposição para capricharem num episódio final, com cara de especial, os produtores e roteiristas tiveram. Uma pena. THE OFFICE era uma série tão boa no início. Dessas em que a gente começa a ver um episódio e quer ver outro e outro, logo em seguida. Durante a sexta temporada (2009-2010), eu já não tinha nem metade do ânimo. Às vezes passava mais de uma semana para ver o episódio baixado. Mas, afinal, o que aconteceu com a série? Eu diria que já foi explorada ao máximo. Só se tivessem coragem de mudar tudo e contratar uma nova equipe de roteiristas, quem sabe ainda se pudesse salvá-la. As primeiras temporadas se sustentavam muito no romance de Jim e Pam, mas também no frescor e na graça daquela novidade que era Michael Scott, o chefe sem noção e que encabeçava os momentos de vergonha alheia mais famosos da televisão.

Ainda assim, apesar de já bem resolvidos, foram de Jim e Pam os momentos mais legais desta sexta temporada. Tanto que renderam dois episódios especiais com uma hora de duração. "Niagara" mostra a ida da turma da Dunder Mifflin para o casamento de Jim e Pam nas Cataratas do Niágara, o que gerou uma série de situações engraçadas, como o caso de Michael com a mãe da Pam. O outro episódio duplo, "The Delivery", lida com o parto de Pam e também teve aquele toque especial. Mas são dois casos bem particulares numa longa temporada (25 episódios) onde predominou a mediocridade de ideias.

No aspecto da reestruturação da empresa, a filial de Scranton da Dundler Mifflin foi a única que sobreviveu à queda, por misteriosamente ter tido melhores resultados. Assim, ela foi comprada por uma empresa que vende impressoras e agora eles vendem não só papel. O episódio onde Michael descobre que vendedor ganha mais que gerente também ganha certo destaque. Kathy Bates, que vive aparecendo em várias séries de tv agora, é a chefona que estabelece novas regras. Mas como sempre, as coisas mudam para permanecerem praticamente do mesmo jeito. No território dos romances, o caso de Andy e Erin também foi interessante, mas não tem metade da graça do que foi Pam e Jim no passado. Tanto que não ganhou muito destaque. Por mim, a série acabaria agora mesmo, sem direito a sétima temporada.

Meu top 5 da temporada:

1. "Niagara". O belo final feliz, a imagem do casal Jim e Pam molhados nas Cataratas do Niágara, Kevin sem sapatos na festa, Michael sem quarto para dormir, Dwight dando em cima, com sucesso, da dama de honra.

2. "The Delivery". Pam tenta adiar o parto o máximo de tempo possível para não pagar muito no plano de saúde. Não deixa de ser uma denúncia velada ao caríssimo sistema de saúde americano.

3. "Double Date". Michael desiste da mãe de Pam, Helene, depois que descobre a idade dela. Destaque para o tapa que ele recebe de Pam no estacionamento do prédio.

4."Secret Santa". Michael fica cheio de mimimi quando Phyllis o substitui como o Papai Noel do escritório. O personagem é levado ao limite de sua ridicularidade neste episódio.

5. "Body Language". Michael dá em cima de uma de suas clientes, sendo inclusive encorajado por seus colegas, que acreditam que pela linguagem corporal ela está "dando mole". Novamente, é no estacionamento que acontece o melhor momento.

sexta-feira, maio 21, 2010

SCARLET DIVA



O filme pode até ser mesmo ruim. Tive de ver "em fascículos", inclusive. Quer dizer, além de ruim, é chato. Mas vendo ontem a entrevista de Asia Argento - a que veio junto com o arquivo que baixei de SCARLET DIVA (2000) -, comecei a ter um pouco mais de respeito pelo filme. Acho que saber que se trata de uma obra autobiográfica ajudou. Asia não esconde que a personagem Anna Battista é o seu alter-ego e que muitas das situações apresentadas no filme guardam estreitas relações com a sua vida. Na entrevista, ela também não se importa em falar do quanto a criação dos pais gerou sequelas. Em especial, da mãe. E ela guardaria ainda um pouco de sua sessão de psicanálise para o seu segundo longa-metragem, o surpreendentemente ótimo MALDITO CORAÇÃO (2004). E acabaram sendo os únicos longas dirigidos por Asia, dois trabalhos muito pessoais e feitos praticamente como forma de exorcizar seus traumas.

SCARLET DIVA apresenta a protagonista se auto-entitulando a "garota mais solitária do mundo". Mas não sem antes mostrar como primeira cena pós-créditos Anna Battista sendo enrabada por um negão num trêiler. Aliás, parece até uma contradição a cena em que a atriz sofre o assédio de um produtor que quer oferecer trabalho em troca de "favores sexuais". Conversando com o tal produtor, ela comenta que quer mesmo é ser diretora; que atriz, principalmente na Itália, é tratada como prostituta. Os produtores só querem saber de tirar as roupas das moças e mostrá-las em cenas de sexo. Enquanto isso, a própria Asia não se incomoda nem um pouco em se despir e protagonizar cenas picantes no próprio trabalho. Acredito que, do seu ponto de vista, isso torna o filme não apenas mais atraente para a plateia masculina, como também oferece um retrato mais fiel da rotina profissional e amorosa da atriz.

Vale destacar uma das melhores cenas do filme, que é a primeira vez que ela "faz amor" com o rock star por quem fica apaixonada. Ela diz para ele que nunca tinha feito aquilo antes. Ele lhe pergunta se ela por acaso é virgem; ela diz que não, que é puta. Todas as relações sexuais que ela havia experimentado antes eram destituídas de amor. São questões muito interessantes e que até fariam de SCARLET DIVA um grande filme se fosse feito por um cineasta mais experiente e talentoso. Mas foi bom ter sido dirigido pela própria Asia, apesar do resultado pouco satisfatório. Outro ponto positivo do filme está no fato de flagrar a atriz no auge da beleza. De bônus, os fãs ainda vêem o anjo tatuado que vai da barriga ao púbis, em sua totalidade.

quinta-feira, maio 20, 2010

ZUMBILÂNDIA (Zombieland)



Não sei se George A. Romero se sente orgulhoso ou um pouco triste ao ver tantos filmes de zumbis, dos melhores aos mais vagabundos, sendo despejados todos os meses em cinema, vídeo e games. Comédias com zumbis não são novidade. Nos anos 80, pelo menos, A VOLTA DOS MORTOS-VIVOS, de Dan O'Bannon, lidou muito bem com o tema. O século XXI viu surgir uma nova febre de zumbis. Eles estão em todos os lugares. Ganharam até uma passeata, a zombie walk. Entre os novos filmes que brincam com a mitologia dos zumbis romerianos - vale lembrar que os filmes de zumbis pré-Romero são totalmente diferentes e que foi ele o criador da gramática zumbi -, o que mais ganhou fama foi o superestimado TODO MUNDO QUASE MORTO, de Edgar Wright. Que pode muito bem ter sido o objeto de inspiração para a criação deste ZUMBILÂNDIA (2009), de Ruben Fleischer, um trabalho ainda mais pop e mais leve que o filme de Wright, que ousava mostrar cenas explícitas de zumbis devorando as tripas das vítimas.

ZUMBILÂNDIA brinca mais com as regras para se fugir dos zumbis - que são seguidas à risca por seu criador, o jovem nerd Columbus (Jesse Eisenberg, de FÉRIAS FRUSTRADAS DE VERÃO) -, bem como com a comédia romântica juvenil. Columbus é virgem e não tem muita sorte com as meninas. Até porque ele é cheio de manias e fobias e vive trancado em seu apartamento. No dia que ele achou que seria o seu grande dia de sorte, que foi o dia em que a gatíssima moça do apartamento vizinho dormiu ao seu lado, ele teve que matá-la logo em seguida. A contaminação havia começado.

Agora Columbus tem como meta chegar à casa de seus pais. Quem sabe eles ainda estão vivos. No meio do caminho, ele encontra um sujeito que sabe se virar muito bem naquele mundo infestado, Tallahassee, vivido por um Woddy Harrelson muito à vontade no papel. Os dois encontram uma dupla de meninas que também aprenderam a ser espertas para sobreviver, Wichita (Emma Stone) e Little Rock (Abigail Breslin). Mas no início pelo menos, a relação entre meninos e meninas não é muito amistosa. Mas como o jovem Columbus conseguirá resistir aos encantos e o jeito selvagem da bela Wichita?

De bônus, o filme conta com uma ponta de Bill Murray. Fazendo o papel de si mesmo, Murray torna o filme memorável no pouco tempo em que aparece. Meio que compensa o humor nem sempre eficiente do filme, os clichês manjados das comédias românticas e a leveza extrema no território do horror, que faz com que os zumbis não despertem medo ou repulsa nem a criancinhas em lactação.

quarta-feira, maio 19, 2010

SEIS CURTAS























Não é regra, mas em geral, comentários sobre curtas-metragens levam textos curtos. Até porque não é minha intenção fazer uma análise sobre o curta e os textinhos são proporcionais ao tamanho, embora alguns curtas valham muito mais do que muito longa. Contando com o já comentado A VOLTA DO REGRESSO, do Marcelo V., que contou com post específico, principalmente por causa da entrevista, (re)vi seis outros curtas recentemente.

AS COISAS SÃO BONITAS NOS OLHOS DE QUEM ACHA

Tive o privilégio de ver este documentário dirigido por minha amiga Juliana Chagas numa sessão privada na casa de outra amiga, a Valéria, numa reunião especial para a despedida do Murilo, que agora está morando na "terra da garoa". AS COISAS SÃO BONITAS NOS OLHOS DE QUEM ACHA (2010) ainda está inédito nos festivais, mas pode ser que seja selecionado para alguma mostra da próxima edição do Cine Ceará. O que me impressionou foi o profissionalismo do curta, principalmente levando em consideração ser o primeiro trabalho. O filme tem uma estrutura tradicional, valorizando depoimentos, estilo Eduardo Coutinho. No caso, o depoimento de Dona Dica, uma senhora muito interessante que faz bonecas artesanais na Serra de Guaramiranga. O detalhe é que as bonecas não têm aquela aparência da beleza clássica. Muitas pessoas podem até achá-las feias. Uma das coisas que mais me chamou a atenção no documentário foi o aspecto da transferência do afeto. Dona Dica fala que, às vezes, quando a criança (ou mesmo uma pessoa adulta) está triste, ela se agarra àquela boneca como se fosse um ente querido. As cenas exteriores também são bem editadas, como quando a câmera mostra Dona Dica pegando material para o seu trabalho no bosque. Sobre o título, ele é retirado de uma fala da própria senhora.

JUVENÍLIA

Hoje ele é mais conhecido pelo elogiado documentário O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO (2003), mas antes de estrear na direção de longas-metragens Paulo Sacramento fez um dos curtas mais comentados dos anos 1990, até por quem nunca o viu. JUVENILIA (1994), assim como VINIL VERDE, de Kléber Mendonça Filho, utiliza o recurso dos stills. O que o tornou controverso foi o fato de o filme mostrar um grupo de jovens violentando brutalmente um cachorro na rua e exibindo sorrisos no rosto. Anos atrás, este filme gerou uma discussão bem acirrada numa lista de discussão de que eu participava. Como eu, e a maioria das pessoas da lista, não tínhamos visto o filme ainda, a briga que rolava era mais de natureza ética. Vale conferir o texto que recentemente Carlos Primati publicou em seu blog, o Cine Monstro, seguido de entrevista com o diretor e que reacendeu a discussão. Aproveitem para conferir o curta.

ÁGUAS DE ROMANZA

Esse eu vi no curso de especialização no último sábado. Como a disciplina é adaptação fílmica, comparou-se o conto homônimo de Eugênio Leandro com a adaptação para o cinema, dirigida por Gláucia Soares e Patrícia Baía. A experiência de ver as duas formas de expressão e analisar as escolhas das diretoras foi bem interessante. ÁGUAS DE ROMANZA (2002) mostra a dura vida de quem mora em zonas áridas e sem chuva. Vemos uma avó querendo levar a neta, de seis anos, para ver a chuva pela primeira vez na vida. Achei o curta muito corrido para uma história que gera, pelo menos no começo, uma sensação de letargia. Mas isso é mesmo complicado de se fazer num curta-metragem, onde o pouco tempo disponível para narrar uma história é de lei.

LA CONCEJALA ANTROPÓFAGA

Feito como uma obra ligada diretamente a ABRAÇOS PARTIDOS (2009), LA CONCEJALA ANTROPÓFAGA (2009) tem todo aquele cuidado visual que é característico do cinema de Pedro Almodóvar. A participação de Penélope Cruz é bem curtinha, apenas no começo. Quem brilha mesmo é Carmen Machi, no papel de uma vereadora cheiradora de cocaína que tem tara por homens. Mas uma tara de comê-los no sentido literal mesmo. O curta é cheio de boas tiradas, mas é tão curtinho que não diz muito. Foi supostamente dirigido pelo personagem-cineasta-cego de ABRAÇOS PARTIDOS.

CAMERA

Já tinha visto um tempo atrás, mas como o curta lida demais com as palavras e eu não tinha legendas, tinha perdido mais de 50% de seu conteúdo. Agora que existem legendas para o filme é que pude me deliciar com essa pequena pérola de um dos maiores cineastas em atividade no mundo. David Cronenberg é tão hábil em seus curtas de custo baixo quanto o é nos longas mais produzidos. O personagem principal é um senhor pessimista que vê a fotografia (e o cinema e o vídeo) como a morte. O instante registrado está automaticamente morto logo em seguida. Assim, tanto o cinema como a fotografia são imagens de fantasmas. CAMERA (2000) dá muito o que pensar. E é genial em seus momentos finais.

FRANKENWEENIE

Ainda não vi ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS (2010), mas entre os curtas vistos, selecionei o ótimo FRANKENWEENIE (1984, foto acima), que Tim Burton realizou antes de se tornar famoso. O filme, inclusive, vai ter um remake; vai ser transformado num longa-metragem, previsto para estrear nos cinemas em 2011. E é interessante como esses curtas iniciais de Burton dizem tanto de si e são tão pungentes e tocantes. Também adoro VINCENT (1982), o anterior. Algo se perdeu entre esse período mais "puro" de Burton e esses novos filmes, reciclados. Não é que Burton tenha deixado de ser Burton. Talvez ele tenha mostrado cansaço, falta de inspiração, já que quase nada de original ele tem feito. A bonita produção da Disney mostra o esforço de uma criança em reviver o seu cãozinho, atropelado por um caminhão. Numa aula de biologia, um professor mostra os efeitos da eletricidade no cadáver de um sapo. Isso é o suficiente para que o menino, batizado de Victor Frankenstein, experimente trazer de volta o seu cachorro, desta vez, todo costurado. Shelley Duvall aparece no papel da mãe do garoto e uma pré-adolescente Sofia Coppola aparece numa ponta. Na época, ela usava o nome Domino.

terça-feira, maio 18, 2010

O PREÇO DA TRAIÇÃO (Chloe)



O nome de Atom Egoyan me remete a meados dos anos 90, quando fui a uma memorável sessão matutina de EXÓTICA (1994). O filme tinha uma interessante trama de mistério, mas o ponto forte era a sensualidade. Garotas dançando de topless ao som de Leonard Cohen não é todo dia que se vê, não. E uma delas era a Mia Kirshner, na época ainda desconhecida. Delícia de filme. Acabei ligando o nome de Egoyan a esse universo misterioso e excitante. Pena que Egoyan nem sempre seguiu essa linha com eficiência. Eu mesmo ainda não sei qual é o ponto principal de sua carreira, se há um elemento comum, autoral. Depois do frio O DOCE AMANHÃ (1997), vi também O FIO DA INOCÊNCIA (1999), bom thriller, mas pouco memorável. Depois desse, não vi mais outro trabalho do cineasta egípcio-canadense. Até porque a maioria de seus filmes são complicados de chegarem nos cinemas locais. Com sorte, chegam em dvd. (Hoje em dia, isso não é nenhuma desculpa para não ver um filme, mas até um tempo atrás era.) VERDADE NUA (2005), um dos últimos a ter uma repercussão maior, ainda não cheguei a ver, apesar do cartaz atraente do ponto de vista erótico.

E é sabendo do poder da sensualidade que uma distribuidora independente - no caso, a PlayArte - soube vender muito bem o novo filme de Egoyan, O PREÇO DA TRAIÇÃO (2009). Eu fiquei tentado só de ver o trailer. Amanda Seyfried, no momento de maior visibilidade de sua carreira, vive uma garota de programa contratada para fazer um "teste de fidelidade" no professor universitário Liam Neeson. Ela é contratada pela própria esposa (Julianne Moore), que desconfia que o marido a esteja traindo. O trailer já adianta que Chloe, a personagem de Amanda Seyfried, vai ter também uma relação sexual com a própria Julianne Moore. E isso é um dos elementos que mais nos convidam a pegar uma fila enorme daquelas de domingo à tarde no Iguatemi só para conferir o filme.

Aliás, quero deixar registrado aqui o meu protesto. Cheguei no cinema faltando cinquenta minutos para a sessão começar. Demorei uma hora e vinte minutos para chegar ao caixa. Resultado: tive que optar pela sessão seguinte. Se fosse um filme de maior duração, teria ido embora para casa frustrado. Ou mais frustrado, já que o filme também é frustrante. Está mais para um clone de ATRAÇÃO FATAL do que para uma homenagem aos grandes filmes noir dos anos 40. Talvez o segredo para se gostar do filme seja mesmo não levá-lo muito a sério. Mas ainda assim fica complicado, pois o próprio filme se leva a sério demais. Tanto a personagem de Julianne Moore quanto a de Amanda Seyfried saem queimadas, com personagens constrangedoras. Liam Neeson consegue escapar ileso, porque seu personagem acaba ficando em segundo plano, já que a ênfase está na relação entre a esposa supostamente traída e a garota que quer se envolver com ela e sua família obsessivamente. O PREÇO DA TRAIÇÃO é uma prova de que, ao contrário do que muita gente pensa, fazer thrillers eróticos não é para qualquer um. E nem vou fazer comparação com um certo filme dirigido por um cineasta holandês meio maluco nos anos 90, porque aí ia ser covardia.

segunda-feira, maio 17, 2010

ROBIN HOOD



Impressionante o interesse que ainda se tem por Robin Hood. O personagem já foi tão adaptado para o cinema que fica até difícil fazer uma listagem. Entre os mais conhecidos e elogiados estão AS AVENTURAS DE ROBIN HOOD, de Michael Curtiz, de 1938, e ROBIN E MARIAN, de Richard Lester, de 1976. E os que mais a plateia de hoje lembra são os produzidos em 1991, num embate entre a Warner e a Fox: ROBIN HOOD - O PRÍNCIPE DOS LADRÕES, com Kevin Costner e aquela grudenta canção do Bryan Adams, e o concorrente ROBIN HOOD - O HERÓI DOS LADRÕES. Desta vez, o fora-da-lei que tira dos ricos para dar para os pobres está de volta, mas numa versão bem diferente, numa tentativa de dar um viés mais histórico para o personagem, apresentando o momento anterior a quando Robin Longstride se tornou uma lenda. Se é que ele existiu de verdade.

No ROBIN HOOD (2010) de Ridley Scott, vemos os acontecimentos anteriores às famosas ações do personagem contra o governo cruel do Rei João. Robin começa como soldado do Rei Ricardo Coração de Leão, tendo participado das cruzadas, e responsável até mesmo para entregar a coroa do Rei Ricardo a seu irmão, o sucessor Rei João. Que é pintado como uma figura asquerosa e perversa por Oscar Isaac. Russell Crowe, em sua quinta parceria com Scott, faz praticamente uma reprise de GLADIADOR (2000), inclusive com o mesmo corte de cabelo. O ator até tentou deixar as madeixas crescerem por um tempo, mas a produção do filme demorou tanto pra começar que ele resolveu cortar curto mesmo. Houve também mudanças nos figurinos, em comparação com os outros filmes de Robin Hood.

Ridley Scott deu preferência por uma trama cheia de intrigas políticas, envolvendo os reinos da França e da Inglaterra. Houve também uma preferência por uma narrativa mais tradicional, até lembrando os épicos produzidos em Hollywood e na Itália nos anos 1960. Se por um lado, isso deixa a câmera de Scott menos inquieta, o velho problema dos cortes que nos deixam desorientados e que eu atribuo como falha do diretor aparece nas poucas cenas de batalhas. Na principal delas, perto do final do filme, numa praia no País de Gales, mal dá pra entender o que está acontecendo. Perde-se a noção de perspectiva.

Isso me fez lembrar das excelentes cenas de batalha de CORAÇÃO VALENTE, de Mel Gibson, e de como o "Mad Mel" faria as batalhas não apenas mais sangrentas, mas também filmadas de modo a deixar o espectador senão inserido na ação, mas pelo menos a par do que está havendo. Por isso que ainda acredito que Scott se sai muito melhor em dramas mais intimistas. A cena do lançamento das flechas me fez lembrar de HENRIQUE V, de Keneth Branagh, que capricha muito mais. Por falar nisso, interessante como os reis ingleses, pelo menos alguns, parece que tinham esse hábito de entrar junto com os soldados no combate, em vez de ficarem no conforto do palácio.

Scott quase consegue fazer da relação entre Robin e Marion (Cate Blanchett) interessante do ponto de vista romântico. A dupla de astros pelo menos fez a sua parte. Blanchett, aliás, é um caso especial entre as atrizes contemporâneas. Ela praticamente não erra. No elenco, vemos também Max Von Sydow como o velho pai de Marion, e William Hurt, em papel discreto, quase invisível. Uma pena que tanta produção e um elenco tão bom tenha resultado num filme modorrento, um convite ao sono.

sexta-feira, maio 14, 2010

CABRA MARCADO PARA MORRER



Acredito que o meu principal interesse pela obra de Eduardo Coutinho está nas pessoas, na ênfase que ele dá aos entrevistados. Sou um sujeito meio paradoxal - gosto de ficar na minha e tenho poucos (mas ótimos) amigos - mas tenho especial interesse pelo universo particular de cada pessoa. E mesmo sabendo que Coutinho não é exatamente um humanista, que o seu interesse maior pelos entrevistados se dá principalmente a partir do momento em que a câmera começa a registrá-los, é do que ele consegue extrair de interessante dessas pessoas comuns o que mais me encanta. Como CABRA MARCADO PARA MORRER (1985) é um misto de reportagem investigativa com registro de depoimentos, não está entre os meus favoritos do cineasta, ainda que eu reconheça sua importância e suas muitas qualidades.

Há tempos deveria ter visto o filme. Lembro de que nos bons tempos da revista SET, numa eleição para os melhores títulos da década de 1980, CABRA MARCADO PARA MORRER ficou entre os dez. Levando em consideração que a tal revista é de 1989, fazendo as contas, são mais de vinte anos que eu levei para finalmente conferir o filme, ripado de um velho vhs da Globo Vídeo. Até pela sua estrutura, que mistura imagens registradas nos anos 60 e imagens contemporâneas (no caso, os anos 80, com o Brasil ainda em processo de redemocratização), o filme é uma amostra do talento de Coutinho em estado bruto, sem os esmeros que sairíam de suas produções a partir do final dos anos 1990.

CABRA MARCADO PARA MORRER era para ter sido um filme de ficção sobre o assassinato de João Pedro Teixeira em 1962, um líder camponês de uma cidade do interior da Paraíba. Nas filmagens, o jovem Coutinho e sua equipe contariam com a participação da própria viúva de João Pedro interpretando a si mesma. As filmagens foram bruscamente interrompidas em 1964, quando os militares invadiram o local, apreenderam boa parte do material, levaram várias pessoas presas, acusadas de estarem envolvidas com os comunistas. Coutinho conseguiu sair de fininho, salvando boa parte do material bruto das filmagens, quase todas sem áudio.

Dezessete anos depois, o diretor está de volta em busca das pessoas que fizeram parte daquelas filmagens. Elisabeth, a viúva, virou uma espécie de lenda entre os moradores que a conheceram. Ela havia se mudado há anos para outro estado. Coutinho apresenta as imagens do filme inacabado para os envelhecidos e sofridos camponeses, que gostaram de se verem mais moços. Um deles, inclusive, relata a tortura que sofreu dos militares, sendo colocado por várias horas num barril cheio de fezes, sem poder dormir ou mesmo se sentar. Elisabeth Teixeira é encontrada. Ela havia mudado de nome e distribuído os filhos entre os familiares, levando consigo apenas um deles. Sabe aquela frase de Euclides da Cunha para "Os Sertões"? "O sertanejo é, antes de tudo, um forte". Essa frase se aplica perfeitamente à fortaleza que é Elisabeth, uma mulher que sofreu muito, mas que parece forte, apesar de tudo. A dureza da vida no sertão nordestino não deixava muitas escolhas, mas não deixa de ser admirável a força dessa senhora. E ela é a mais explorada por Coutinho no documentário, por razões óbvias. Impressionante como ela ficou feliz com a presença do diretor, que acabou por modificar novamente o curso de sua vida. CABRA MARCADO PARA MORRER é o cinema fazendo história e nos ajudando a entender com a mente e o coração a História do nosso país. O filme é narrado por Ferreira Gullar.

quinta-feira, maio 13, 2010

A VOLTA DO REGRESSO / ENTREVISTA COM O DIRETOR MARCELO V.



Escrever sobre o trabalho de um amigo é sempre complicado. E se por acaso o filme que o amigo dirigiu não lhe agradar? Aí fica-se numa situação constrangedora. Felizmente não foi o caso do curta-metragem A VOLTA DO REGRESSO (2007), de Marcelo V., que eu tive a honra de assistir numa sessão privada com um grupo de amigos na própria casa do diretor, durante minha última visita a São Paulo. E se eu gostei do filme da primeira vez que o vi, gostei mais ainda na revisão, quando percebi melhor o cuidado que o diretor teve com cada tomada, com a fluidez narrativa própria de filmes bem editados, com as tomadas e fotografia caprichadas e um elenco que deve ter facilitado bastante o trabalho do diretor.

Na trama, Marciano (Gustavo Engrácia), jovem aspirante a diretor de cinema, convence um produtor veterano, Ademildo (Ênio Gonçalves, velho conhecido de quem acompanha os filmes de Carlos Reichenbach), a produzir seu primeiro filme. Para a escolha do protagonista, Marciano lembra de um ator esquecido, mas que fazia sucesso na época das pornochanchadas, o Costão (Carlo Mossy, muito à vontade no papel). Costão, que estava na pindaíba e ganhando uns trocados se fantasiando de Papai Noel em shopping center, fica animado para fazer o filme quando dizem ser uma adaptação de "Rei Lear", de Shakespeare. Também no elenco, outro nome memorável do cinema da Boca do Lixo: a musa Kate Hansen, em papel bem pequeno e um pouco fora de sintonia com o restante do elenco.

A VOLTA DO REGRESSO mistura no liquidificador Shakespeare com filmes clássicos de Hollywood (E O VENTO LEVOU é a referência mais explícita) e o cinema produzido no Brasil nos anos 70. Mas, melhor do que ler um texto meu é acompanhar a entrevista que fiz por e-mail com o próprio diretor. Ainda tenho muito o que evoluir como entrevistador, mas espero continuar a fazer isso sempre que possível. É a terceira que publico aqui no blog e considero essas entrevistas ocasiões especiais. Boa leitura!

Como surgiu a ideia de dirigir A VOLTA DO REGRESSO?

Foi uma necessidade, ou seja, a mãe de todas as ideias (boas ou não). A princípio, eu queria apenas assinar o roteiro, que foi escrito em 2003. Pensava em entregar a direção para alguém da minha geração que considerasse especialmente talentoso e acabei nunca conhecendo esse alguém. Sabemos que bons diretores são muito, mas muito raros. Então eu tive de encarar a função, embora não considere que seja minha maior vocação. Sei que tenho capacidade para dirigir, gosto especialmente de decupar e de trabalhar com atores, mas não sinto como diretor a segurança que sinto escrevendo. Ou montando, algo que também nunca tinha pensado em fazer e que só fui experimentar depois que esse roteiro já existia. Hoje me considero mais equilibrado entre essas
três funções, que são muito bem integradas, quase indissociáveis, mas "mon coeur balance", para citar Oswald de Andrade, entre roteiro e montagem.

No Brasil quando se fala de cinema, quase sempre se comenta de questões orçamentárias, de conseguir patrocínio etc. Você soube lidar bem com essas dificuldades? Quais os maiores problemas?

Você disse a verdade: praticamente tudo em torno do cinema (das perguntas nos debates dos festivais às informações publicadas nos ditos "cadernos culturais" dos jornais) gira em torno de dinheiro. Não se fala de arte, mas de "mercado". De quanto custou e de quanto ganhou. Conheci muitos cineastas jovens de cujas bocas insistia em sair a palavra "grana", seguida de um sorriso amarelo; dos filmes, da arte, nada. Acontece que não sou um desses.

Mas houve problemas de falta de verba? Como ficou a questão dos cachês, como do Carlo Mossy e da Kate Hansen? Sei que é uma obra mais modesta e que deve ter rolado muita camaradagem para ela se materializar, mas cinema é uma arte cara, não é? O que foi mais complicado nesse sentido? (Mas se preferir pular o assunto financeiro, a gente passa para a próxima pergunta. :))

Não vou fazer uma desfeita e pular uma pergunta sua nem tenho uma resistência específica em falar sobre o orçamento da produção. Só acho que não é o que mais interessa aos leitores de uma publicação de cinema (mas posso estar errado neste ponto). E também isso abre a compota de "chororô" de qualquer cineasta brasileiro, haja paciência. Mas se você insiste em falar de mazelas, vamos lá.

A falta de uma verba caudalosa obviamente afetou de maneira gigantesca a produção. É um filme amador, em uma bitola mais que obsoleta (16mm), sem nenhum patrocínio (com exceção de doação de refeições, o que foi uma grande economia) e com estrutura deficiente e equipe incompleta (e que trabalhou de favor, o que resolve um problema mas cria muitos outros); tudo isso infelizmente me levou a pensar, no set, muito mais em questões de produção que de direção. Dirigi o filme muito mais no papel e na moviola que no set e isso talvez explique melhor minha primeira resposta.

Também faltou negativo: houve momentos em que os atores me pediram de joelhos para fazer mais um take e a diretora de fotografia fazia "não" com o dedo (olhando desse lado, sobraram "negativos"). A decupagem que eu idealizei não foi realizada, muitos planos que eu queria ter filmado morreram no útero. Não era para ser um filme com tantos master shots e com tantos primeiros takes, mas foi o que deu para fazer.

Então faltou muita verba e o filme se ressente claramente disso. Mas também fiz a decisão de investir no elenco, em especial no Carlo Mossy, que não recebeu cachê como os demais, mas que trouxemos para São Paulo de avião, pagamos uma semana de estadia em hotel 4 estrelas, refeições, etc. Só as despesas com o Mossy comeram uns 40% do orçamento (para você ver como tínhamos pouco dinheiro), mas valeu a pena, porque ele é o ator perfeito para o papel (que não foi escrito para ele, mas é como se fosse).

E uma coisa que me emociona muito é lembrar que ele aceitou fazer este filme uns dez dias depois de ter passado pela maior tragédia de sua vida, a morte do filho caçula, de 4 anos, atropelado por um caminhão. Ou seja, no momento mais trágico, ele deixou a família no Rio para vir filmar com a gente e deu sempre o melhor de si, não criou nenhuma preocupação. E ainda me disse, nas filmagens, que fazer o filme estava ajudando a distraí-lo da dor. Isso não tem preço.

Puxa.. Realmente tocante essa história do Mossy. Ele se identificou com o personagem do filme? Pois ele passa uma naturalidade impressionante.

A ideia de chamá-lo foi da Ana Paul, que me ajudou muito durante todo o casting. Fiz um primeiro contato com o Mossy por e-mail, depois por telefone e finalmente fui ao Rio, dois meses antes da filmagem, para conhecê-lo. Nos encontramos para um chopp com batata frita no famoso Amarelinho da Cinelândia. De cara, ele me disse: "Esse roteiro foi escrito pra mim!"

Mas é claro que as semelhanças entre ele e o Costão param nessa história de "ex-galã de pornochanchada". O Costão não passa disso, enquanto o Mossy, que não renega essa faceta de "pornochanchadeiro" (pelo contrário), tem uma carreira e uma vida bem mais diversificadas (vale muito a pena ler a entrevista que a Andrea Ormond publicou em seu blog; eu cheguei a conversar com o Rubens Ewald Filho sobre um livro com o Mossy para a Coleção Aplauso e a eleição do Serra acabou não deixando isso acontecer, uma pena).

É curioso, porque antes do casting eu fiz um desenho conceitual de cada uma das três personagens principais, e tanto o do Costão (Mossy) quanto o do Ademildo (Ênio Gonçalves, a quem contatei graças ao Carlão) ficaram muito parecidos com o resultado final (a do Marciano era bem diferente e ficou muito melhor quando o Gustavo Engracia topou participar). Lembro de como um dos diretores de arte ficou impressionado com isso, foi como se as personagens saíssem da página e se materializassem. Acho que o elenco é o grande acerto deste filme. Também gosto especialmente da trilha sonora composta pelo Vinicius Calvitti, um músico muito talentoso e também cinéfilo. A meu pedido, ele se inspirou em marchinhas de Carnaval e depois fez umas variações jazzísticas, ficou excelente.

No filme, há algumas referências saudosistas ao cinema que se fazia na Boca do Lixo, inclusive com alguns títulos de filmes bem engraçados para as pornochanchadas. Você acha que o cinema brasileiro produzido naquela época tinha mais a cara do Brasil, como diz o personagem do Gustavo Engracia, do que o que se faz hoje?

Essa não é uma posição minha, mas da personagem, que não é meu alter-ego. Não acho que temos a distância histórica necessária para uma análise mais aprofundada, mas me parece claro que o cinema brasileiro se aburguesou, e não estou falando somente do aumento do preço do ingresso e das salas nos shoppings. O Marciano expõe isso quando cita NELSON FREIRE, o que não funciona como piada (no roteiro eu achava engraçado, mas nas exibições em que estive, ninguém riu), mas funciona como questão (muito complexa) a ser debatida. O país mudou e continua mudando, o cinema acompanha isso, naturalmente. Analisar essas mudanças é importante e considero meu filme um pequeno convite a esta reflexão.

Você falou em saudosismo, mas é importante frisar que o filme não é nem um pouco saudosista. O título A VOLTA DO REGRESSO já é irônico, como todo o resto. É curioso que muita gente venha encarando o curta como uma homenagem ao cinema dos anos 1970 (suponho que pela presença do Mossy, do Ênio e da Kate). Não é homenagem nem esculhambação. É um filme contemporâneo, escrito em 2003 e filmado em 2006. Ele olha para o futuro.

Achei o exemplo de NELSON FREIRE bem feliz. Mas já que você falou em futuro do cinema, aproveito a deixa: como você imagina que será o cinema no futuro, mais especificamente o cinema nacional?

Infelizmente, não vejo muita mudança pela frente. A maioria das pessoas é apegada ao status quo porque não enxerga (ou não quer enxergar) além dele. E não falo só do cinema, isso abarca tudo. Acho importante o Inácio Araújo dizer que é um absurdo o país ter dois ministérios diferentes para a Cultura e a Educação. Vejo que a cultura (como a educação e todo o resto) virou apenas mercado e/ou perpetuadora da política do governo de ocasião; ela deixou de formar as pessoas. E os governantes nem sonham em investir na formação da população; eles são desonestos, covardes e querem massa de manobra. Enquanto esse panorama não mudar (e é só o povo que pode mudar isso _mas como um povo sem educação e sem cultura vai mudar as coisas?), seguiremos atolados nessa vulgaridade bárbara, mesmo que tenhamos ares de novos ricos. A VOLTA DO REGRESSO é um protesto contra essa violência simbólica.

O filme tem algumas tomadas bem elegantes, como a tomada vista de cima da cama do Marciano ou aquela sequência em que vemos dois personagens se falando pelo telefone tendo apenas uma parede montada os separando. No aspecto formal, teve algo que estava nos seus planos e que ficou de fora? O filme era, digamos, mais ambicioso na sua cabeça, antes de encerradas as filmagens?

Sou muito rigoroso de maneira geral e na decupagem em particular. Tudo nesse filme foi pensado e repensado. Fui para o set com um plano de filmagem muito detalhado e completo. Ou seja, para o mal e para o bem, estou mais para Hitchcock que para Altman, nesse sentido.

Mas, como expliquei, não deu para cumprir todo o imaginado por falta de dinheiro, e o resultado final dos enquadramentos e da montagem deixa muito a desejar, na minha opinião _ muita gente já me disse que não é bem assim, mas não consigo me convencer, vejo defeitos mil. Isso é natural.

Entretanto, a intenção sempre foi filmar em internas (apenas duas locações são fora do estúdio), sem planos muito abertos. E também não sou afeito a movimentar a câmera ou a adotar determinado ângulo sem que exista um significado por trás disso. Então, por piores que fossem as condições no set, nenhum plano mais complexo deixou de ser filmado. Aliás, esse plano do telefonema que você citou foi o que mais teve tomadas: cinco! A que está no filme é a quinta.

O que acho que há de ambicioso nesse projeto é o roteiro, saturadíssimo de informação _ o que torna o filme bem abstruso, embora, como planejei, ele funcione em seu nível mais superficial. Gostaria de ser mais ambicioso ainda e atingir uma rara simplicidade em um projeto futuro.

Você tem muitas ideias para o futuro? Projetos engavetados esperando a hora? Títulos de filmes que não existem (ainda), como o Carlão costuma às vezes divulgar?

Tenho tudo isso aos montes. De longas e curtas, sem falar de projetos para livros e teatro, alguns prontos há anos. Mas a ideia de depender de arte para a subsistência não me agrada nem um pouco. E não sou rico nem tenho habilidades administrativas, contábeis, políticas ou antiéticas para ser um produtor independente. Tenho horror à burocracia e ao gosto da maioria, como vou fazer cinema no Brasil? Então, se as coisas não mudarem, a probabilidade de eu voltar a dirigir em um futuro próximo é pequena. Devo voltar a trabalhar como montador neste ano em pelo menos dois curtas, é só o que sei.

Mas para não te deixar apenas com esta resposta chata, vou citar pela primeira vez alguns desses projetos. Um curta que chegou a ter pelo menos um tratamento de roteiro inscrito em edital (argh) se chama "Batatinha". Outro, para o qual fiz uma pesquisa bem abrangente, é "Ciborgues". E tem também o "Às Moscas", que seria uma adaptação de um velho conto meu. O que seria meu primeiro longa não tem título definido, mas posso adiantar que a história se passa em parte em uma fazenda onde há trabalhadores escravos. E um outro é tão fantasioso, mirabolante e estimulante quanto o título indica: "Lampião contra a Coluna Prestes".

Marcelo, muito obrigado pela entrevista. Você teria mais alguma coisa a acrescentar? Algo que eu poderia ter tocado e não perguntei ou comentei?

Há milhões de coisas a serem perguntadas e comentadas, mas tenhamos consideração pelos seus leitores. No momento, gostaria apenas de citar uma frase que ouvi durante o 40º Festival de Brasília, onde A VOLTA DO REGRESSO estreou, que é de uma clareza cristalina para qualquer um com um mínimo de conhecimento de dramaturgia e no entanto muita gente acha paradoxal: "Comédia é coisa séria."

quarta-feira, maio 12, 2010

ZONA VERDE (Green Zone)



Saudades do Oliver Stone, saco de pancadas de tantos. E só agora que me toquei que ainda não vi W., que não foi sucesso nem de crítica nem de público e não chegou nos cinemas daqui. Também não sei se foi lançado direto em dvd. O documentário SOUTH OF THE BORDER, o último fime pronto dele, chegou a passar em festivais, mas não li nenhuma linha a respeito, se foi bem recebido ou não. Deve chegar aqui por lidar com assuntos diretamente ligados a nós, sul-americanos. Mas por que estou falando de Oliver Stone num espaço reservado a ZONA VERDE (2010), de Paul Greengrass? Por que ambos são diretores que costumam lidar com temas políticos controversos. E na comparação - algumas comparações nem sempre são válidas, eu sei - eu fico com Stone.

Vendo a montagem picotada de ZONA VERDE (2010), que é do mesmo Christopher Rouse de A SUPREMACIA BOURNE (2004), O ULTIMATO BOURNE (2007) e do único filme que eu gosto de verdade de Greengrass, VÔO UNITED 93 (2006), lembrei do que Martin Scorsese falou sobre a montagem dos filmes contemporâneos no documentário O CORTE NO TEMPO: A MAGIA DA EDIÇÃO DE FILMES. Os novos filmes, especialmente os thrillers, costumam ser excessivamente picotados, feitos por e para uma geração acostumada com a rapidez dos comerciais de televisão e dos videogames. Cada vez mais afastados de uma das coisas mais belas que o cinema pode provocar: a contemplação. Talvez eu esteja ficando velho fazendo esse tipo de reflexão, mas por mais que eu veja qualidades nesses filmes de Greengrass, chega uma hora que eles me cansam. Sim, eles são muito mais sofisticados que qualquer bagaceira de Michael Bay e ainda têm o mérito de fazer o espectador pensar. Mas o pensamento vem e vai tão rápido quanto aquilo que nossas retinas cansadas vêem.

No caso de ZONA VERDE, a impressão que fica é que as partes mais intrincadas e até instigantes da trama, quando o espectador fica meio desorientado não apenas pelo recurso da câmera na mão, são uma espécie de armadilha, já que no final ficou parecendo meio bobo o personagem de Matt Damon, em sua cruzada para desvendar a não existência das tais armas de destruição em massa que Bush afirmou que havia no Iraque, como desculpa para invadir o país e acabar com o regime de Saddam. Do jeito que ficou, o filme de Greengrass pareceu óbvio e o personagem de Damon, ingênuo.

terça-feira, maio 11, 2010

HOMEM DE FERRO 2 (Iron Man 2)



O primeiro filme do Homem de Ferro (2008) não me entusiasmou muito. Acho que o próprio universo do herói, ligado a espionagem e tecnologia, nunca me atraiu de verdade. Mas o filme foi elogiado até pelos fãs mais exigentes, que odiaram praticamente todas as adaptações já feitas dos heróis Marvel para o cinema até então. Como gostei bastante de O INCRÍVEL HULK, de Louis Leterrier, já percebi que a Marvel Studios está fazendo algo inédito no que se refere ao respeito pelos personagens da companhia. Ainda que haja um probleminha ligado aos direitos autorais de outros heróis, como o Homem-Aranha (Sony) e os X-Men (Fox), por exemplo, isso não tem impedido que heróis importantes do Universo Marvel possam se reunir no histórico e tão aguardado filme dos Vingadores, já com data de estreia para maio de 2012. Antes disso, ainda teremos o filme do Thor (maio de 2011) e o do Capitão América (julho de 2011), que apesar de se passarem em mundos e/ou períodos distintos do atual, completarão o quebra-cabeças que poderá fazer do filme dos Vingadores um marco na história da adaptação dos quadrinhos para o cinema. Mesmo sabendo que não é prudente comemorar por antecedência, saí da sessão de HOMEM DE FERRO 2 (2010) bem otimista quanto aos rumos das produções da Marvel Studios.

Trata-se de uma produção cheia de acertos em diversos aspectos. Coisas que poderiam dar errado, como o vilão Whiplash, vivido por Mickey Rourke, ficaram muito boas. A imagem de Rourke gritando de ódio após a morte do pai no prólogo do filme, com a câmera se afastando em travelling, trouxe algo de essencial dentro dos arquétipos das histórias em quadrinhos de super-heróis, ainda que o recurso seja quase tão antigo quanto o próprio cinema. Mas o melhor ainda estaria por vir. O personagem de Rourke seria responsável por uma das cenas mais empolgantes do filme: a da corrida de Fórmula 1 em Mônaco. Tanto essa cena quanto as demais sequências de ação e até mesmo a primeira aparição do Homem de Ferro mostram o quanto essas adaptações de HQs evoluíram. E o quanto se gasta com elas hoje em dia, mesmo em tempos de crise. Dá pra ver que não economizaram na produção, que está caprichadíssima.

Robert Downey Jr. continua sendo uma das escolhas mais felizes até hoje para um personagem de quadrinhos. Talvez só perdendo para a hoje lendária interpretação de Heath Ledger como o Coringa em BATMAN - O CAVALEIRO DAS TREVAS. Downey Jr. tanto tem um tipo físico próximo de Tony Stark, quanto combina sua persona debochada com o caráter muitas vezes duvidoso do personagem. Se nos quadrinhos, um dos momentos mais marcantes do Homem de Ferro foi a luta de Tony Stark contra o álcool, o segundo filme já ensaia isso, mostrando uma cena em que Stark toma todas numa festa de aniversário. E ainda por cima, usando a armadura do Homem de Ferro.

A dobradinha espionagem/tecnologia que se tornou uma marca das histórias do herói são muito bem aproveitadas no filme. Mas o que os marmanjos mais esperavam ver era Scarlett Johansson em ação, no papel da Viúva Negra. Se há uma coisa que se pode reclamar da participação de Scarlett é o pouco tempo de aparição. Por isso existe a possibiliade de que os apelos de que seja rodado um filme-solo da Viúva Negra sejam atendidoss. E de preferência, aproveitando ainda mais da sensualidade da personagem. HOMEM DE FERRO 2 também traz Samuel L. Jackson com muito mais tempo na tela, no papel de Nick Fury. Daí o filme ser considerado uma prévia da produção dos Vingadores, de tanto que se fala do tal Projeto Avengers. Outro acerto e que aumenta o nível de empolgação do espectador é a preferência por uma trilha sonora rock. The Clash, Queen e principalmente AC/DC são ouvidos com prazer durante as sequências de ação. Parabéns a Jon Favreau! Que os próximos filmes da Marvel continuem a curva ascendente! Os fãs agradecem.

segunda-feira, maio 10, 2010

A HORA DO PESADELO (Nightmare on Elm Street)



Diria que, na média, os remakes até que não estão fazendo feio. É normal as pessoas encararem com ceticismo e descrédito essas tentativas desesperadas de Hollywood de capitalizar em cima do que já foi sucesso no passado. É picaretagem mesmo, mas apesar disso, entregar o filme nas mãos de um bom diretor pode fazer uma diferença enorme. Vide os bons exemplos de SEXTA-FEIRA 13, VIAGEM MALDITA e A ÚLTIMA CASA. Infelizmente, não se pode dizer o mesmo do novo A HORA DO PESADELO (2010). Ao contrário, o filme se enquadra como um exemplo do que de pior já foi feito nesse terreno das refilmagens. Tão ruim quanto a nova versão de DIA DOS NAMORADOS MACABRO. Nesse pelo menos, eles não economizaram em corpos nus e violência.

Talvez a escolha do videoclipeiro Samuel Bayer para a direção se deva ao seu gosto pelo bizarro, como pode ser conferido em alguns dos clipes mais memoráveis da década de 90, como os que ele dirigiu para o Garbage ("Only Happy When It Rains"), para o Metallica ("Until It Sleeps") e para os Smashing Pumpkins ("Bullet with Butterfly Wings"). Aliás, eu gosto mais dos clipes pelas canções do que pelas imagens. Ainda assim, esses e outros clipes ainda são o que de melhor Bayer tem em seu currículo. Em A HORA DO PESADELO, o diretor não conseguiu imprimir nem mesmo inventividades visuais, a fim de tornar o seu trabalho minimamente interessante. Talvez o que pode ser visto como uma evolução seja a ênfase mais explícita na pedofilia de Freddy, algo que era visto de maneira mais discreta no original.

Os personagens mudaram, mas as situações são praticamente as mesmas. O momento mais impressionante do filme original, que é a morte da primeira vítima de Freddy, sendo levantada e arrastada pelo teto por uma força invisível e tendo seu peito rasgado pelas garras do maníaco, é repetido na refilmagem, mas sem um décimo da força do original. Os próprios personagens não despertam interesse no espectador. São apenas carne a ser fatiada pelas garras de metal de Freddy. Agora encarnado por Jackie Earle Haley, o personagem ganhou novas garras, a camiseta do Flamengo parece menos surrada, mas a maquiagem deixou a desejar. A original parecia perfeita. Pra completar, Haley, que esteve muito bem no papel de Rorschach em WATCHMEN, mesmo nas cenas usando máscara, não pôde repetir o sucesso, talvez por culpa da equipe do filme. Tomara que, depois desse fiasco, deem por encerrada a ideia de trazer de volta Freddy Krueger para o cinema.

P.S.: Está no ar a nova edição da Revista Zingu! Dessa vez, o foco da revista é o Dossiê Vera Cruz, do qual participei com uma resenha de A FAMÍLIA LERO-LERO. Outro destaque é o Especial Luís Sérgio Person. Confiram!

domingo, maio 09, 2010

MAMÃEZINHA QUERIDA (Mommie Dearest)



Esta produção é um exemplo concreto do que os maus tratos de uma mãe e o rancor de uma filha são capazes. MAMÃEZINHA QUERIDA (1981), de Frank Perry, causou polêmica na época de sua realização e exibição. Realmente é um filme bastante incômodo, pois lida, aparentemente sem atenuantes, com um lado pouco conhecido de Joan Crawford, muito bem interpretada por Faye Dunaway, num dos melhores papéis de sua carreira. Ela, inclusive, está muito parecida fisicamente com Joan, graças a um belo trabalho de maquiagem.

Não me considero um fã e grande conhecedor do trabalho de Crawford. Os trabalhos que vi dela sempre foram movidos mais pelo interesse pelo diretor em questão (Aldrich, Cukor, Ray, Browning) do que pela atriz em si. Mesmo assim, durante o filme, em alguns momentos ficava incomodado pelo fato de não dizerem exatamente em que ano ela estava. Só quando vi a cena da cerimônia do Oscar, que ela assistiu em casa, ouvindo rádio com os filhos, foi que eu tive uma ideia de que ano estava – no caso, 1946, quando ela ganhou o Oscar de melhor atriz por ALMA EM SUPLÍCIO, de Michael Curtiz -, que comecei a me situar um pouco. Senti falta, inclusive, de referências mais explícitas de sua fase "decadente", quando teve de apelar para o gênero horror, que é um de seus mais interessantes períodos, ainda que desconsiderado pelos preconceituosos.

Mas isso tem uma razão de ser: o filme não é sobre Crawford. Aliás, até é, mas é principalmente sobre sua relação com a filha Christina. A menina foi adotada e logo teve que se submeter aos caprichos e à disciplina exagerada da mãe, que tinha umas crises de quase loucura. Alguns detalhes dos maus tratos com a menina nem são assim tão escandalosos, mas como o filme é quase um inventário do que de ruim ela sofreu nas mãos da mãe, tudo é aproveitado. Talvez a pior coisa tenha sido internar a filha numa escola de freiras por achar que ela estava se depravando depois de ter sido flagrada deitada com um dos rapazes do colégio interno. Mas o que mais dói de ver é quando ela pune Christina, ainda criança, por causa de uns cabides de arame que encontra no guarda-roupa.

Talvez o problema maior da imagem de Crawford no filme nem seja sua relação com a bebida, que pode muito bem ser justificada com o fato de ela estar se sentindo solitária e amarga, nem a sua extrema mania de limpeza, que pode ser diagnosticada como um problema psiquiátrico, mas principalmente sua postura arrogante e exageradamente ligada à imagem de riqueza. Talvez o fato de ter sido considerada a rainha de Hollywood por um período tenha lhe subido a cabeça.

MAMÃEZINHA QUERIDA ganhou uma aura de maldito, sendo desprezado pela maior parte da crítica da época, além de ter sido meio que responsável pela decadência da carreira de Faye Dunaway. Acabou ficando num limbo de quase desconhecimento e é um filme que merece uma revisão mais respeitosa.

P.S.: A apreciação do filme se deu depois de eu ter visto um interessante post de Chico Fireman: um top 20 destacando as mães do cinema.

sexta-feira, maio 07, 2010

ACONTECEU EM WOODSTOCK (Taking Woodstock)



Os Estados Unidos já foram objeto de muito interesse e encanto por vários estrangeiros que chegaram lá para trabalhar ou apenas passar uma chuva. Ang Lee é mais um dos tantos cineastas estrangeiros que chegaram ao país e resolveram falar de assuntos bem americanos com uma propriedade e uma segurança impressionantes. No caso de Ang Lee, essa aproximação com os Estados Unidos se deu em doses homeopáticas. Primeiro, fazendo um filme sobre chineses vivendo nos Estados Unidos, com BANQUETE DE CASAMENTO (1993), até chegar ao coração da América em filmes importantes como TEMPESTADE DE GELO (1997) e O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN (2005). Depois de um retorno bem sucedido à China, com a obra-prima DESEJO E PERIGO (2007), o diretor está de volta a Hollywood para abordar à sua maneira um dos momentos mais importantes da história americana, o festival de Woodstock.

Com a serenidade que lhe é comum, ACONTECEU EM WOODSTOCK (2009) pode até frustrar quem espera o tradicional sexo, drogas e rock n'roll com direito a muita nudez e muita porra-louquice. Em vez disso, vemos um filme sobre os bastidores do mais famoso dos festivais de rock, pelo ponto de vista de Elliot Teichberg (Demetri Martin), o rapaz que possibilitou a realização do festival, quase sem querer. O filme é baseado em seu livro de memórias. Ang Lee faz parceria com o diretor de fotografia Eric Gautier, conhecido por suas colaborações com Olivier Assayas. E as telas divididas de HULK (2003) estão de volta em ACONTECEU EM WOODSTOCK, não só com o objetivo de vermos ações simultâneas, mas também para não abrir mão do ponto de vista de Elliot, em especial nas cenas que o mostram mais próximo do festival.

E quem disse que estar no festival é ter que estar presente nos shows da Janis Joplin, do Joe Cocker, do Jimmi Hendrix e demais nomes importantes? Entrar em contato com as pessoas, experimentar LSD e fazer sexo grupal no local de acampamento talvez seja mais importante e memorável. Porém, interessante que até nesses momentos Ang Lee foi discreto. Isso vindo de um cara que dirigiu a "cena do cuspe" de BROKEBACK MOUNTAIN e fez o casal de DESEJO E PERIGO ficar beem à vontade para as ousadas cenas de sexo. Sinal de que ele não precisa provar mais nada pra ninguém. O que não quer dizer que não bate um certo desapontamento. Ainda assim, há que se reconhecer a beleza, a fluidez, a segurança na direção, a ótima escolha do atores e mais uma porção de acertos que só um diretor de estilo e força como Lee seria capaz.

quinta-feira, maio 06, 2010

À PROCURA DE ERIC (Looking for Eric)



Mais um da série "faz tanto tempo que eu vi, que quase me esqueci". Não sou entusiasta de Ken Loach. O número de filmes que vi do diretor dá pra contar nos dedos de uma só mão. Para um cineasta que está na ativa desde a década de 1960, é pouco. Loach também não é uma unanimidade entre a crítica. Mas hoje em dia, o que é unânime mesmo? Entre os que vi, o trabalho dele de que mais gostei até agora foi APENAS UM BEIJO (2004), que considero um grande filme, tanto nas questões sociais e políticas quanto no trato sentimental. À PROCURA DE ERIC (2009), eu enquadraria mais no quesito 'interessante', o que meio que significa que eu não me entusiasmei com o filme, mas respeito e reconheço alguns momentos marcantes.

Como À PROCURA DE ERIC depende muito do carisma dos personagens/atores, eu diria que o filme não me disse muito. Provavelmente seja necessário alguns pré-requisitos para ser melhor apreciado. Gostar de futebol e saber da importância do ex-jogador francês que jogou no Manchester United, Éric Cantona, pode ajudar um pouco - tive de ler algo na internet sobre a figura mítica que Cantona criou para si mesmo. Na trama, Steve Evets é Eric Bishop, um carteiro loser que chora até hoje o fato de ter deixado a primeira esposa por ter entrato em parafuso e de não ter moral com os enteados do segundo casamento. De uma hora para a outra, ele passa a ver a figura imaginária do jogador Eric Cantona, que serve como uma espécie de guia espiritual para ele. Mais ou menos como Humphrey Bogart aparecendo para o personagem de Woody Allen em SONHOS DE UM SEDUTOR. Só que de maneira bem menos onírica e mais intrusiva com a realidade. A exemplo do brasileiro A MULHER INVISÍVEL.

Talvez comparar o filme de Loach com a comédia estrelada por Selton Mello e Luana Piovani seja um pouco ofensivo para os fãs de Loach, mas não acho a comparação de todo ruim. Ambos os filmes tratam de personagens em circunstâncias emocionais bem delicadas e que precisam da fuga da realidade para conseguir ficar de pé. Mas Loach é o cineasta do social e precisa ser, antes de tudo, cronista da sociedade e ver a situação com distanciamento, o que acaba tornando o personagem de Eric Bishop ainda mais idiota. Precisaríamos nos aproximar mais dele para podermos nos solidarizar e torcer por sua vitória diante dos obstáculos da vida. Ainda assim, não deixa de ser muito boa a sequência dos amigos de Eric se juntando para dar uma lição no mafioso folgado. Melhor do que vingança dos nerds é vingança dos losers.

quarta-feira, maio 05, 2010

DO MUNDO NADA SE LEVA (You Can't Take It with You)



Hoje, ao acordar, com aquela chuva forte me convidando a ficar em casa e uma falta de coragem imensa de sair pra trabalhar, lembrei-me do personagem de Lionel Barrymore em DO MUNDO NADA SE LEVA (1938), um senhor cuja filosofia de vida é: se você não está satisfeito com o seu trabalho, se você não gosta do que faz, pra que fazê-lo? Qual o sentido de estar fazendo algo que você não gosta por anos e anos? Mesmo sabendo que nem sempre é possível se dar ao luxo de fazer só o que se gosta, fiquei com essa mensagem na cabeça, até por estar já há um tempão insatisfeito com os meus empregos/remunerações. Mas no fim das contas, a necessidade financeira fala mais alto e a gente acaba se sujeitando a trabalhar pelo dinheiro. Sendo que, na maioria das vezes, nem é o suficiente para se ficar numa situação mais confortável, mas apenas para pagar as dívidas. O que não significa que esse cenário não possa ser mudado.

Em DO MUNDO NADA SE LEVA, Frank Capra, o cineasta que ficou conhecido por lidar com a ética no cinema e propor melhores maneiras de se viver, traça o perfil de uma família chefiada por um simpático senhor, o vovô Martin Vanderhof (Barrymore), que chega a convidar pessoas que queiram fazer o que gostam para morar com ele em sua casa. Sua neta, Alice (Jean Arthur), trabalha como secretária de Tony Kirby (James Stewart), um executivo filho de um grande milionário da cidade. A família milionária é conhecida por não admitir pessoas que não sejam da mesma classe social e uma das primeiras cenas do filme mostra Tony demonstrando afeto a Alice em seu gabinete. Ele é flagrado pela mãe, que não gosta nada do que vê. Mas os dois se amam e tentam vencer esse obstáculo. Tão ou mais importante que o romance dos dois é a rotina na casa de Vanderhof, cheia de tipos esquisitos fazendo coisas meio loucas, que só se acha engraçado num filme mesmo. Na vida real, quem é que gostaria de viver numa casa tão barulhenta e caótica?

Alguns momentos engraçados do filme são herdeiros das screwball comedies, se é que o filme também não se inclui nessa categoria. Inclusive, a cena do restaurante, com o casal tentando esconder algo que está escrito na parte de trás do vestido de Alice me fez lembrar muito LEVADA DA BRECA, de Howard Hawks, que tinha uma cena ainda melhor - Katharine Hepburn com o vestido rasgado e Cary Grant procurando um jeito de disfarçar. O detalhe é que os dois filmes são do mesmo ano. Talvez nenhum dos dois tenha copiado a ideia do outro. Vai ver esse tipo de situação fosse comum nas comédias da época, seja no teatro, seja no cinema.

O filme, apesar de bastante agradável desde os momentos iniciais, só emociona de fato lá perto do final, que é quando Capra mostra o seu gênio em criar histórias de mensagens positivas. No caso, vemos a humildade vencendo a arrogância. Por mais simplista e até careta que isso possa parecer, no filme isso até ganha um ar subversivo, já que há um questionamento do próprio sistema capitalista americano, da vontade de querer acumular mais e mais riquezas. Sem falar na brincadeira em torno da Revolução Russa de 1917, que numa produção da era do macarthismo seria provavelmente banida. Difícil não terminar o filme com um sorriso no rosto e uma lágrima furtiva descendo pelo canto.

DO MUNDO NADA SE LEVA foi vencedor dos Oscar de filme e direção.

terça-feira, maio 04, 2010

ATRAÍDOS PELO CRIME (Brooklyn's Finest)



No fim de semana, não pude conferir HOMEM DE FERRO 2 e nem vi ainda ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS, para citar duas grandes produções que estrearam nos últimos fins de semana e que, por falta de tempo (entre outras circunstâncias adversas), ainda não tive chance de conferir. E como tempo é artigo raro nestes dias, vou deixando esses filmes para ver quando puder. Enquanto isso, vou brincando de exercitar a memória, falando de filmes que vi há mais de um mês e que pretendo despejar no blog durante a semana. ATRAÍDOS PELO CRIME (2009) é um deles.

Trata-se da volta de Antoine Fuqua ao gênero que lhe trouxe fama, com DIA DE TREINAMENTO (2001). Pena que o filme estrelado por Denzel Washington e Ethan Hawke foi uma exceção na carreira do diretor, que não vingou, com projetos cada vez piores ou mornos. Mas quem sabe, com a volta de Hawke no elenco principal e com a sua volta ao gênero policial, Fuqua acertasse de novo. Digamos que ele quase acerta. ATRAÍDOS PELO CRIME tem os seus momentos, mas é um filme sem força. O que eu mais gostei foi o final, que parece que é justamente aquilo que tem sido mais criticado - houve até quem o comparasse a Iñarritú.

No filme, Richard Gere, Don Cheadle e Ethan Hawke são três policiais vivendo problemas distintos. Gere é o sujeito que lembra alguns funcionários públicos: quer só fazer o seu serviço sem muito entusiasmo; não acredita mais em seu ofício. Ele está prestes a se aposentar e quer tranquilidade nesses últimos dias de trabalho nas ruas. Cheadle é o policial infiltrado na máfia que se envolve emocionalmente com as pessoas da gangue. Hawke, por sua vez, é o policial corrupto clássico. Um mix de vários policiais corruptos já vistos em filmes e séries. Mas ainda assim, seu personagem é o que mais me interessou no filme. Talvez por ser mais subversivo, trazendo um pouco mais de veneno àquilo. A subtrama de Cheadle é manjada demais. E a de Gere, só melhora no final. Mas aí o filme já terminou. Tarde demais.

domingo, maio 02, 2010

AS FILHAS DO FOGO



Eu, como fã de Walter Hugo Khouri, sempre tive muita curiosidade em conferir os dois trabalhos que ele realizou direcionados ao gênero horror. Como todos os seus filmes, ainda que ancorados no drama existencial e no erotismo, guardam certo mistério, imaginei que ele seria bem sucedido ao se arriscar num gênero não muito tradicional da cinematografia brasileira. E de fato o foi. Finalmente tive a chance de conferir o raro AS FILHAS DO FOGO (1978), o segundo "filme de gênero" do diretor – o primeiro foi O ANJO DA NOITE (1974). A cópia é ripada de um vhs surrado, com uns pulos na imagem de vez em quando e uns tons esverdeados na parte superior da imagem em alguns momentos. Mas até que esses detalhes dão um ar de preciosidade ao filme. A cópia também conta com legendas em inglês – talvez seja de um vhs americano.

A música sempre bem vinda de Rogério Duprat dá o ar de mistério e ajuda a tornar a obra de Khouri sempre instigante e ao mesmo tempo familiar aos apreciadores. A parceria de Duprat com Khouri vinha desde o clássico NOITE VAZIA (1964). O filme se passa numa região extremamente verde, onde Ana (Rosina Malbouisson) chega para visitar sua amiga Diana (Paola Morra) num casarão em Gramado. Na verdade, a relação entre as duas ultrapassa o que se convenciona chamar de amizade. Inclusive, o momento mais belo e excitante do filme é vê-las beijando-se na cama. Não deixa de ser algo bastante comum da fantasia sexual masculina.

Mas o erotismo fica em segundo plano no filme, que se concentra no mistério envolvendo uma estranha senhora, Dagmar (Karin Rodrigues), que era amiga da falecida mãe de Diana. As meninas ficam assustadas quando Dagmar lhes revela que grava as vozes dos mortos na floresta. O interessante na conversa entre as duas é o pessimismo em relação à vida após a morte. Para Dagmar, de acordo com suas experiências, todas as vozes que ela captou revelavam angústia e tristeza. Ana pede para ouvir um pouco as fitas e consegue identificar as vozes. Mas o que talvez mais chame a atenção no filme não são as vozes, mas os olhos. Olhos que aparecem até mesmo na decoração da casa. Além dos olhos imaginários, da sensação de estar sendo vigiado, como na sequência em que o estranho homem que aparece pedindo comida tenta dormir na floresta e se sente ameaçado. E o que dizer também dos olhos belos e assustadores de Selma Egrei?

A proximidade com a cultura europeia, que era um dos pontos que mais incomodava os detratores da obra de Khouri, aparece ainda mais forte em AS FILHAS DO FOGO. Só o fato de se passar numa região colonizada pelos alemães já contribui para isso. Mas também há outros detalhes, como o fato de o pai de Diana ser um entusiasta da Primeira e da Segunda Guerra Mundiais. Há também as misteriosas cerimônias das religiões pré-cristãs, presentes em vários filmes ingleses de horror. Khouri não estava interessado em buscar brasilidade em suas obras. Ele preferia o universal. E acho que essa é uma das razões para eu gostar tanto de seus filmes.

Agradecimentos especiais a Laura Cánepa.