domingo, maio 17, 2020

OS 8 MAGNÍFICOS

Um dos cineastas mais queridos do Brasil é, ironicamente, um dos menos vistos. Talvez por ser querido mais pela comunidade artística e por uma boa parcela da crítica. Talvez porque ele não costuma fazer obras tão comerciais. Lembro que quando estava na sessão de TODO MUNDO TEM PROBLEMAS SEXUAIS (2008), exibido em um cinema de shopping, algumas pessoas saíram no meio, reclamando. E olha que não é um filme nada difícil; é leve, engraçado. Foi o último filme dele que foi exibido em circuito comercial em Fortaleza. Um outro que garantiu uma única sessão no Cinema do Dragão, na famosa mostra de janeiro, foi o delicioso BR-716 (2016), que é uma espécie de remake de seu maior clássico, TODAS AS MULHERES DO MUNDO (1968), que aliás, ganhou também um reboot como uma minissérie da GloboPlay.

Domingos Oliveira faleceu em março do ano passado e deixou uma série de filmes pequenos e baratos, mas muito interessados no amor, na passagem do tempo, nos relacionamentos, na alegria de estar vivo. OS 8 MAGNÍFICOS (2017), inédito nos cinemas, mas presente em uma mostra online nesta quarentena, no site https://www.inffinito.com/inff-online até 31 de maio, junto com todos os seus filmes, é um projeto diferente do diretor.

Aqui ele permite ser o menos controlador possível. Simplesmente convida oito atores e atrizes célebres para bater um papo principalmente sobre o ofício de ser ator, deixando a conversar correr suave, só de vez em quando fazendo algumas intervenções. Claro que é um filme cujo resultado depende demais da montagem, que é talvez o seu principal problema do filme, mas, como se trata de um filme que me deu um prazer tremendo de assistir, eu prefiro relevar os problemas e focar apenas nas coisas que muito me agradaram.

Os oito magníficos do título são Maria Ribeiro, Fernanda Torres, Wagner Moura, Carolina Dieckmann, Sophie Charlotte, Mateus Solano, Alexandre Nero e Du Moscovis. Alguns ficam mais à vontade com a situação e naturalmente se destacam mais, como Fernanda, Maria e Wagner. Mas o que me chamou mais a atenção no filme foi o quanto ele foi capaz de despir os seus personagens, principalmente nas cenas em que eles tomam uns vinhos. Maria mostra seu complexo de inferioridade diante da inteligência e da cultura de Fernanda, que, por sua vez, fica um tanto desconfortável com o elogio que recebe. Quem também faz um elogio muito bonito a um colega é Du, que diz nunca ter tido a honra de ter trabalhado ou estado com Wagner, mas que tem uma profunda admiração pelo ator desde que o viu pela primeira vez em uma peça de teatro, há muitos anos.

No mais, Mateus conta a piada mais engraçada; Alexandre parece desconfortável e quando ele explicita essa sensação é que o filme nos deixa mais desconcertados. (Afinal, aquilo foi uma atuação ou foi de verdade? Ao que parece foi diverdade. O beijo com Maria virou notícia de jornal tabloide, inclusive).

Quanto a Sophie, por ser a mais jovem do grupo, é geralmente elogiada pelos colegas, mas brilha sem precisar se esforçar muito. É a menina que fala (e canta em) alemão e que já foi capaz de trilhar um caminho admirável em sua carreira desde muito jovem. Inclusive, ela foi escolhida para a reencarnação de Maria Alice na série recente da Globo, até por ter repetido o papel, ainda que com outro nome, em BR-716.

Maria, por sua vez, é que havia tido mais contato com o diretor há mais tempo (pelo menos no cinema), tendo atuado em SEPARAÇÕES (2002). Em seu livro Tudo Que Sempre Quis Dizer, Mas Só Consegui Escrevendo, a atriz fala sobre Domingos: "Ele se apaixona muito. Ele separa e fica melhor amigos das ex. Ele se emociona com os amigos, com a vida, com a morte, com a arte." Ou seja, Domingos é bem o alter-ego de seu personagem em TODAS AS MULHERES DO MUNDO, e conta sua história em seus filmes.

E todo esse amor pela vida transborda neste filme, nesta sua declaração de amor aos atores e atrizes, talvez principalmente às atrizes (à Carolina, que não fala muito no filme, ele faz elogios à sua beleza como um dom divino). E que lindas que são as palavras finais do filme. São palavras de um homem que já estava com a saúde muito debilitada quando dirigiu esses últimos filmes, mas que mesmo assim soube celebrar a felicidade de estar vivo.

+ TRÊS FILMES

UM HOMEM FIEL (L'Homme Fidèle)

O menino Louis Garrel deve estar dando orgulho ao pai. Aqui trabalha com um roteiro a quatro mãos com o grande Jean-Claude Carrière em uma história engraçada de triângulos amorosos. Destaque também para o ótimo timing cômico do Garrel ator e também para as ótimas transições de eus narrativos (os três personagens principais se revezam), dando muito frescor e senso de humor ao filme. Uma grata surpresa, mas que já era de suspeitar devido à distribuidora (Supo Mungam Films). Ano: 2018.

GLORIA BELL

Às vezes a refilmagem sai melhor. Foi o caso deste GLORIA BELL, que tem uma história muito parecida (quase idêntica) à do filme original de 2013, mas que ganha muito ao contar com a atuação fantástica de Juliane Moore. O que não funcionou no filme anterior, neste foi uma beleza pra mim. Destaque também para as músicas que tocam, algumas da discoteca, outras baladas meio cafonas, outras sofisticadas. Mas tudo muito emocional. Achei lindo o final. Simples, mas admirável. Direção: Sebastián Lelio. Ano: 2018.

RASGA CORAÇÃO

Um dos melhores acertos de Jorge Furtado e um filme que sabe lidar muito bem com os diálogos entre pai e filho, sem tomar necessariamente o partido completamente de um deles. Na verdade, como é baseado em uma peça, muito do que há de bom no filme já vem da obra original de Oduvaldo Vianna Filho. Mas o elenco é ótimo, o trabalho de montagem é muito bom e há vários momentos bem tocantes. Sem falar que o tema é muito atual. Ano: 2018.

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