
Por mais que andem dizendo por aí, David Cronenberg nunca deixou de ser ele mesmo. Nem quando fez aquela célebre trinca de filmes com Viggo Mortensen. E se muitos reclamaran que ele foi por demais convencional em UM MÉTODO PERIGOSO (2011), com certeza não poderão dizer o mesmo de COSMÓPOLIS (2012), o retorno de Cronenberg às origens, de maneira ainda mais radical.
É difícil sair do cinema entendendo completamente o que se passa no filme. O clima de estranheza, tão presente em obras como VIDEODROME – A SÍNDROME DO VÍDEO (1983) e em EXISTENZ (1999), para citar dois grandes filmes do diretor, aparece ainda mais forte. Aliás, o filme é tão corajoso que até lembra a frieza cirúrgica de seus experimentais trabalhos iniciais – STEREO (1969) e CRIMES OF THE FUTURE (1970). Na tradução para as telas, o romance de Don DeLillo se transforma numa autêntica obra cronenberguiana, cheia de elementos familiares à sua filmografia, que certamente serão facilmente compreendidos por aqueles que acompanham o seu trabalho.
Em COSMÓPOLIS, o cineasta não oferece muitas concessões e deixa dúvidas quanto ao tema aparentemente principal do filme. Seria mesmo sobre o capitalismo às vias de entrar em colapso? Afinal, Cronenberg nunca foi um cineasta muito interessado em assuntos de política e economia. Seus principais temas são o corpo, as mutações e o sexo. E isso não deixa de aparecer no filme. Ao tentar compreender o que se passa no universo de COSMÓPOLIS, o espectador pode se ver com os neurônios fervilhando, já que os diálogos são ditos de maneira muito estranha e às vezes aparentemente sem sentido.
Na trama, Robert Pattinson é o magnata Eric Packer, um sujeito que quer atravessar a cidade em sua enorme limusine - que funciona para ele como casa e escritório - para cortar o cabelo. Sua fortuna foi construída fazendo especulações em bolsas de valores em todo o mundo. Mas ele é um sujeito entorpecido, em busca de algo que o faça se sentir vivo. Mesmo em situações intensas ele se mostra indiferente, apático. Um homem morto, como lhe diria o personagem de Paul Giamatti mais adiante. Seu relacionamento com a esposa, com quem ele se casou há poucos dias, vivida por Sarah Gadon, é de esfriamento. O sexo só aparece entre os dois como tópico de conversa, pouco depois de ele ter transado com outras mulheres, entre elas, a personagem de Juliette Binoche. "Você exala sexo", ela diz ao marido.
Falando assim até parece que o filme é fácil. Na verdade, ele é muito desafiador ao optar por usar longas sequências de diálogos frios. Assim, vale a pena experienciar o filme no cinema e ver a reação das pessoas, a maioria delas de ódio ou de rejeição. Então, qual a importância de um filme como esse, se é para desagradar a maior parte do público? Principalmente oferecer algo novo e diferente para as plateias, fazê-las pensar, não esquecer o filme que acabaran de ver assim que sairem do cinema.
Por isso, quem for ao cinema achando que o que é apresentado no trailer - com aquela edição frenética - representa o filme está enganado. Quem for à procura de ação talvez deva manter distância de COSMÓPOLIS. Ou então já ir preparado para uma experiência nova e fascinante. Um objeto estranho que ajuda a pensar, a refletir não só sobre o universo cronenberguiano, mas também sobre o nosso próprio mundo. Que é tão ou mais complicado quanto.