A beleza enfeitiça. E a beleza, em geral, se encontra em flor durante a juventude. Claro que há a beleza tardia, a beleza madura. E há pessoas que conseguem driblar a força do tempo mais do que outras. Inclusive, diria que Maitê Proença é um desses casos. Mas como resistir ao ter a possibilidade de vê-la aos 21-22 anos, em seu primeiro papel para o cinema em PROVA DE FOGO (1980)? Esse foi o principal motivo de eu querer ver o filme, mesmo que não tivesse nenhuma cena de sexo/nudez com ela. E tem. Mais um ponto positivo. :)
Mas PROVA DE FOGO está longe de ser apenas um veículo para a beleza e também o talento de Maitê. Na verdade, o eixo do filme é a história de um homem que se descobre médium depois de ver um espírito em um despacho de umbanda e que se torna, mais adiante um pai-de-santo. Ou seja, estamos diante de um filme que explora com muito respeito o mundo da mais popular religião afrobrasileira. Uma religião que ainda me é estranha em muitos aspectos, até por eu ter crescido no protestantismo pentecostal.
Quem interpreta Mauro, o protagonista, é Pedro Paulo Rangel. Ele é um bancário que está se esforçando para terminar a sua faculdade de Administração, mas que acaba também dedicando muito de seu tempo e de sua energia no terreiro. Aliás, em determinado momento, ele fica incomodado com o fato de não ter mais tempo para nada e de estar muito cansado com a rotina. Até a hora em que percebe que tem que se dedicar exclusivamente ao trabalho espiritual.
O filme é composto por cenas que se revezam entre a rotina de seus personagens e as cerimônias no terreiro, quando Mauro "recebe" principalmente duas entidades, o boiadeiro e a ciganinha. Quem também participa no início do filme é a cantora Elba Ramalho, no papel da mãe-de-santo que enlouquece e acaba deixando o lugar vago para a chegada de outro líder, João (Ivan de Almeida). Sandra, a personagem de Maitê Proença, inclusive, é eleita mãe-pequena por João, que não escondia o desejo que sentia por ela. Sandra, por sua vez, tinha uma espécie de paixão não-correspondida por Mauro. Inclusive, a cena de sexo mais sensual do filme é um sonho da personagem, quando ela recebe em sua cama o colega, vestido de boiadeiro. A cena é muito bonita de ver. E por mais que alguém vá dizer que possa ser exploratória, o filme é tão sério na sua proposta de acompanhar a vida de Mauro que não fica aquela impressão de algo gratuito. Não que houvesse problema quanto a isso, pra mim.
PROVA DE FOGO foi o primeiro longa-metragem de Marco Altberg, que depois faria AVENTURAS DE UM PARAÍBA (1982), FONTE DA SAUDADE (1985) e SOMBRAS DE JULHO (1995), para citar os que talvez sejam seus trabalhos mais importantes.
Escrevi, no calor do momento, assim que assisti ao filme, que o cinema brasileiro não é apenas uma caixinha de surpresas, mas um manancial de tesouros infindáveis. Há tantos filmes que fogem do cânone dos clássicos e que são tão interessantes e relevantes e ricos que até eu ainda me pego admirado. E pensar que há tanta gente que não se permite conhecer o nosso tão rico cinema...
+ TRÊS FILMES
DATA LIMITE SEGUNDO CHICO XAVIER
Ouvi falar deste filme recentemente, em uma dessas lives sobre astrologia e esoterismo e fiquei curioso. Ajudou estar no cardápio da Amazon Prime, ajudou ter pouco mais de uma hora de duração. Mas mesmo do ponto de vista do conteúdo mesmo (pois da forma é muito pobre) não há muitas coisas que me empolgaram e há outras que pareceram-me muito ficção científica. O curioso deste filme ter sido lançado em 2014 não é nem trazer uma prévia da pandemia, já que a preocupação maior era por guerras nucleares. Se bem que os astrólogos também estavam achando que podia a grande conjunção dos planetas lentos em Capricórnio ser também através de guerras. Voltando ao documentário, o foco principal são os seres extraterrestres e a comunicação que tinham com Chico Xavier. Direção: Fabio Medeiros, Rebeca Casagrande e Juliano Pozati.
AZOUGUE NAZARÉ
O cinema brasileiro, e como não poderia deixar de ser o pernambucano, está tão em alta que um filme como esse, lançado no final do ano de 2019, acaba sendo uma enorme surpresa. Além de nos apresentar a um universo de rituais de maracatu, a trama é muito bem tecida, mostrando as relações existes entre algumas pessoas da cidade de Nazaré, em especial o embate entre um homem do maracatu e um pastor evangélico. Também gosto muito das cenas envolvendo a mulher do chaveiro e as disputas de repente entre os jovens. O filme é uma delícia, rende muitas risadas, tem alguns elementos fantásticos e ao final da sessão recebeu aplausos do público. É bom demais quando isso acontece. Direção: Tiago Melo. Ano: 2018.
CHUVA É CANTORIA NA ALDEIA DOS MORTOS
Curioso como o público brasileiro procura dar as costas para o índio até em nossas produções. Mas até que ultimamente tem se feito muitos registros sobre histórias passadas em aldeias indígenas. Nesta produção temos a história de um jovem rapaz atormentado pelo dever de ser um pajé de sua tribo. É um filme bem menos melancólico que EX-PAJÉ, por exemplo, já que a tribo parece estar relativamente tranquila em seu lugar, apesar da dificuldade de comunicação com os "brancos" da cidade grande. Fiquei bastante curioso com a realização, o modo como os diretores conseguiram fazer este filme. Direção: Renée Nader Messora e João Salaviza. Ano: 2018.
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