quarta-feira, novembro 22, 2006

A PEQUENA JERUSALÉM (La Petite Jérusalem)



No que confiar? No sentimento ou na razão? Não seria um erro acreditar que a mente tem capacidade de discernimento melhor que o coração? Não seria o Iluminismo e a "idade da razão" apenas uma ilusão? A mente não é capaz de criar armadilhas muito piores para as pessoas? Apesar de essas questões serem até um pouco óbvias para muita gente, a estudante de Filosofia Laura (a bela Fanny Valette) é fascinada no pensamento de Kant e no racionalismo exacerbado. Ela tem medo de se entregar às paixões e deixar de pensar com clareza. Até chega a adotar o método de Kant de caminhar sozinha sempre no mesmo horário, todos os dias, seguindo o mesmo intinerário. (Confesso que fiquei interessado nisso também, eu que tenho uma relação de afeto com a rotina.) Para a sua família judaica ordodoxa, residente em Paris, a atitude de Laura é estranha, principalmente porque ela põe em discussão até mesmo a natureza de Deus e não participa das reuniões familiares para fazer a sua caminhada obrigatória.

A PEQUENA JERUSALÉM (2005), de Karin Albou, é um belo filme que combina com sensibilidade e harmonia o emocional, o racional, o religioso e o sensorial. Desde a cena inicial, quando vemos Fanny Valette seminua - closes de partes de seu corpo - e lendo a Torá, que percebemos esse caminho escolhido pela diretora. Apesar de o foco principal do filme ser Laura e o drama de se apaixonar por um mulçumano, o filme também lança um olhar bem de perto em Mathilde, a irmã casada de Laura. Ela fica abalada quando descobre que o marido (Bruno Todeschini) a está traindo. Descobre também que o motivo dessa traição é a insatisfação do marido em relação à rotina sexual do casal. Ele procura lá fora o que não encontra dentro de casa. Assim, Mathilde procura uma conselheira judia que possa lhe ajudar a encontrar uma maneira de temperar o relacionamento sem, com isso, infringir as leis de Moisés. Outra figura feminina importante no filme é a da mãe das duas, uma mulher que é adepta de uns misticismos estranhos ao Judaísmo. A cena de Mathilde falando sobre sexo com a mãe, de uma geração em que a mulher era mais subserviente e excessivamente recatada, é das melhores do filme. Porém, o maior alvo de interesse é mesmo Laura, com seu conflito interior e sua sensualidade à flor da pele. Depois de tanto tempo de auto-repressão, ela entra em ebulição.

Sobre o interessante ponto de vista judaico mostrado no filme, engraçado como o cinema francês tem se interessado em mostrar os imigrantes que moram no país, como pode-se perceber em filmes recentes como DESDE QUE OTAR PARTIU, de Julie Bertucelli, e A GRANDE VIAGEM, de Ismaël Ferroukhi. Percebemos o quanto a França, e principalmente a capital, Paris, tem se transformado num grande caldeirão cultural.

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