quarta-feira, janeiro 23, 2008

O CAÇADOR DE PIPAS (The Kite Runner)



Quando escrevi sobre EU SEI QUEM ME MATOU não sabia que o filme havia tido tanta repercussão lá fora a ponto de ter sido indicado ao Framboesa de Ouro do ano. É o campeão de indicações, aliás. Mas eu acharia muito mais justo se um filme como O CAÇADOR DE PIPAS (2007) fosse um dos indicados e não esses trabalhos mais despretensiosos. Claro que se formos procurar, há até algo de bom no filme de Marc Forster, a começar pelos criativos créditos iniciais, que emulam os caracteres árabes, enquanto ouvimos ao fundo a música de Alberto Iglesias, colaborador assíduo de Pedro Almodóvar, que também tenta emular a música produzida nos países islâmicos.

Mas afinal, o que há de errado com O CAÇADOR DE PIPAS? Se eu tivesse que resumir, diria que é porque se trata de um dramalhão que não envolve, não emociona e ainda por cima incomoda em alguns momentos. Há também o fato de o filme passar a impressão de apoiar o Governo Bush, não lembrando que os os Estados Unidos também foram co-responsáveis pela destruição e miséria atual do Afeganistão, que começou a cair com a invasão russa e logo depois com o domínio assustador dos talibãs.

Hollywood não é besta e fica sempre de olho no sucesso de romances best-sellers, como foi o caso no ano passado de O CÓDIGO DA VINCI. O sucesso da vez é o romance homônimo de Khaled Hosseini, que emocionou muita gente, mas que, por alguma razão, não chegou a me interessar, por mais que tenha sido fácil conseguir o livro emprestado com um amigo. Se eu tivesse mais tempo disponível, até toparia ler, mas agora não quero mais, depois de ter visto o filme e ter ficado com essa má impressão. O fato de eu não ter simpatizado com o protagonista também contribuiu para a minha quase aversão à adaptação de Marc Forster.

Interessante reparar que há uma forte semelhança temática entre O CAÇADOR DE PIPAS e DESEJO E REPARAÇÃO, de Joe Wright. Ambos os filmes mostram um protagonista tentando se redimir de algo vergonhoso feito ainda criança. Como não acredito em coincidências, talvez o fato de esses dois filmes terem aparecido quase que simultaneamente venha de um forte sentimento de culpa que a sociedade carrega, apesar de que para os filmes e para os romances em que eles se baseiam, os atos dessas crianças pudessem ser relevados, levando-se em consideração o fato de que elas eram apenas crianças. Ainda assim, no caso de DESEJO E REPARAÇÃO, o filme consegue transmitir com força esse sentimento de culpa, tornando-nos até cúmplices da personagem.

Infelizmente o mesmo não acontece com O CAÇADOR DE PIPAS e a estória de dois amigos de infância que têm sua amizade posta em xeque depois de um incidente traumático ocorrido na infância. Os dois garotinhos são filhos de pais diferentes mas são como irmãos. Um é rico, o outro é pobre, filho do empregado da casa. O filme até exagera bastante no açúcar na hora de descrever o quanto eles se amam. Quando um deles (o menino pobre) promete pegar uma pipa que caiu e é ameaçado por um grupo de garotos maiores que ele, o menino prefere ser agredido - no caso, estuprado - a ter que devolver a pipa que prometera para o amigo, que assistia a tudo às escondidas, sem coragem para intervir. A presença daquele amiguinho que se sacrificou por ele era algo que ele não suportava, pois o fazia lembrar sempre de sua covardia. As coisas mudam quando o Afeganistão é invadido pela Rússia e o menino e seu pai fogem para o Paquistão e depois passam a viver nos Estados Unidos. O filme até fica mais interessante quando mostra a decadência do Afeganistão durante o domínio talibã e a tentativa de redenção do protagonista, mas aí já é tarde demais.

P.S.: Recebi com certa tristeza na noite de ontem a notícia da morte do ator Heath Ledger. Apesar de já ter trabalhado em outros filmes importantes, pra mim, a maior lembrança que vou guardar dele vai ser a cena final de O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN, a cena da camisa. Era uma ator que ainda prometia muito e em clara ascensão. Agora é aguardar a estréia de BATMAN, O CAVALEIRO DAS TREVAS para conferir sua performance como o Coringa.