quinta-feira, junho 10, 2010

O DIA DA SAIA (La Journée de la Jupe)



Quando eu vi a sinopse de O DIA DA SAIA (2008) até fiz uma brincadeira, dizendo que queria ver o filme para ver se rolava alguma identificação com a protagonista. Isso porque em mais de quinze anos de docência, eu nunca peguei uma turma tão difícil, principalmente no aspecto disciplinar, quanto a que eu peguei este ano na escola. Trata-se de um grupo de perturbadores da ordem, que parece que vêm para a escola com o objetivo de sabotar a aula, mexer com os nervos dos professores, desafiar a autoridade deles. Cheguei a ser ameaçado por um dos alunos, inclusive, quando o levei à diretoria semanas atrás. Eu sei que a vida deles não é fácil, como pude ler em algumas das redações sobre a infância que pedi pra eles redigirem. Mas a vida das crianças e adolescentes do passado também não era. E eles recebiam tratamentos de terrorismo nas escolas, com palmatória e humilhações, como ajoelhar no milho ou coisa parecida. Pelo menos é o que a minha mãe conta.

A democratização do ensino nas grandes cidades acabou por gerar esse monstro que é a instituição escolar hoje. Também tenho a mania de culpar a geração atual. Costumo dizer que o futuro é dos nerds e das mulheres, teoria que fui construindo depois de ver o ótimo documentário PRO DIA NASCER FELIZ, de João Jardim. Há também o caso da convivência com o meu sobrinho de 15 anos, que não quer saber de estudar de jeito nenhum. Abandonou completamente a escola há uns três anos. Não sei se ele vai abrir os olhos em alguns anos ou se é o modelo de escola como a conhecemos que já está vencido para as novas gerações. Mas se ao menos eles aproveitassem o seu tempo de maneira produtiva... Como Truffaut, que fugia das aulas para ir à biblioteca ou ao cinema. Em vez disso, a juventude de hoje trata de massacrar a língua portuguesa em sites de relacionamento ou em chats. Não sei se a geração dos meus pais pensava o mesmo dos mais jovens, mas pelo menos de uma coisa eu tenho certeza: a minha mãe teve muita sorte com os filhos que teve, que nunca deram trabalho para ela com os estudos, sempre tirando as melhores notas. Pena que não tivemos a sorte de estudar em escola particular. Teríamos rendido bem melhor. Mas tudo bem.

A situação caótica das escolas públicas na França, especialmente em Paris, já havia sido muito bem radiografada no premiado ENTRE OS MUROS DA ESCOLA, de Laurent Cantent. Saí da sessão desse filme com dor de cabeça. É ver a experiência frustrante de se tentar dar aula para um grupo de jovens selvagens. Mais ou menos o que estou enfrentando agora. O DIA DA SAIA, de Jean-Paul Lilienfeld, mostra Isabelle Adjani em situação semelhante. A escola é composta por muitos garotos e garotas pobres, a maioria descendentes de africanos da África árabe. O problema do filme é que mal vemos os alunos aprontando e já começa logo a situação de a professora encontrar uma arma na bolsa de um aluno, surtar e fazê-los de reféns meio que sem querer. O drama tenso começa muito cedo e se estende por tempo demais. Assim, O DIA DA SAIA se torna uma espécie de ENTRE OS MUROS DA ESCOLA encontra UM DIA DE FÚRIA. E, com a chegada da polícia, a autorreferência ao filme A NEGOCIAÇÃO se torna uma brincadeira explícita. E não digo nada disso como um elogio.

Pra encerrar, não posso deixar de reclamar - mais uma vez - do problema da cópia digital tosca. A de O DIA DA SAIA é a pior de todas. Como se já não bastasse o filme ser ruim, a cópia escura e sem nitidez dá dor de cabeça. Ainda bem que o próximo filme que eu veria na sessão dupla compensaria o desgosto.

P.S.: O curta DE VOLTA AO QUARTO 666, produzido pelo amigo Davi de Oliveira Pinheiro e dirigido por Gustavo Spolidaro, ganhou o prêmio "melhor curta-metragem documentário" no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, que aconteceu na noite do dia 8. Quem ainda não viu o curta, imperdível, com participação de Wim Wenders, pode vê-lo por inteiro no Vimeo.

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