sexta-feira, março 19, 2021

A MULHER NA LUA (Frau im Mond)



Terminei a fase silenciosa de Fritz Lang. De certa forma foi um alívio, já que tenho mais dificuldade de me concentrar em filmes mudos. E Lang, talvez por ser um dos mais importantes realizadores da Alemanha na época, fazia filmes bem longos. Este último, A MULHER NA LUA (1929), tem quase três horas de duração. Mas para quem já maratonou as duas partes de AS ARANHAS (1919, 1920), as duas partes de DR. MABUSE, O JOGADOR (1922) e as duas partes de OS NIBELUNGOS (1924), isso não é nada. Na verdade, dá uma sensação boa. Não só de dever cumprido, mas também de que foi recompensador acompanhar essa fase da filmografia do genial diretor e já ir percebendo suas obsessões.

Em A MULHER NA LUA suas obsessões seguem firmes, como o gosto por lidar com a espionagem e seu combo, que inclui chantagem, intrigas, vilões que mudam de rosto, coisa que ele já havia trabalhado também em seu fantástico vilão Dr. Mabuse. Este filme tem, porém, uma ambição que o distingue dos outros, que é sua intenção de ser mais próximo da realidade do que se pensava naquela época a respeito de viagem em foguete. Houve consultoria científica de dois especialistas em foguetes, Hermann Oberth e Willy Ley. Com a ascensão do nazismo, Ley fugiu para os Estados Unidos e Oberth se tornou um nazista. Mais ou menos o que aconteceu com Lang e sua esposa, a roteirista Thea von Harbou.

Para os dias de hoje, UMA MULHER NA LUA mais parece fantasia do que ficção científica, tendo em vista a evolução que se deu ao longo dos anos. Tanto é que o filme de Lang até faz lembrar VIAGEM À LUA, clássico da aurora do cinema silencioso dirigido por Georges Méliès. Mas, sem dúvida, deve sim ser considerado uma ficção científica, já que tem toda uma preocupação em explicar o processo de decolagem, a questão da gravidade, o detalhe do lado escuro da Lua etc.

É até bastante divertido acompanhar esse processo, que vai da decolagem até a volta para a Terra. Mas antes disso há cerca de uma hora de intrigas de espionagem e a apresentação de um vilão que muito lembra Adolf Hitler, especialmente pelo cabelinho lambido. Depois disso, há a memorável cena da decolagem. Lang, inclusive, tinha o orgulho de dizer que foi o seu filme que inventou a contagem regressiva para um foguete, que seria usada décadas depois nos Estados Unidos e na União Soviética. Como um mestre do suspense que é, Lang injeta uma expectativa grande no momento da decolagem.

Há também questões sentimentais. O personagem principal, Wolf Helius, vivido por Willy Fritsch, é apaixonado por Friede Velten, papel de Gerda Maurus - ambos os atores estiveram em OS ESPIÕES (1928), de Lang. Mas Friede está em processo de casamento com Hans Windegger (Gustl Gstettenbaur), seu amigo e engenheiro-chefe da empreitada. No fim das contas, Friede resolve ir junto na viagem, que também leva o inimigo deles e o velho cientista que acredita haver ouro na Lua.

As cenas dentro da nave são admiravelmente belas, além das cenas que apresentam a luminosidade da paisagem lunar. Lang sabia trabalhar interiores dentro de estúdio como ninguém e construiu aqui um espaço muito interessante em que cada personagem fica deitado durante toda a fase de subida do foguete. A cena da nave atingindo uma velocidade intensa me fez lembrar do recente O PRIMEIRO HOMEM, de Damien Chazelle. Assim, por mais que, ao chegar na Lua, a história se encaminhe mais para uma aventura fantasiosa, é preciso lembrar que aqueles eram outros tempos. 

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