quarta-feira, março 09, 2016

WHITE GOD (Fehér Isten)



Apesar de ser também uma fábula sobre o racismo e a imigração, WHITE GOD (2014), de Kornél Mundruczó, funciona que é uma beleza como um envolvente misto de drama e horror envolvendo a maldade de uma sociedade em relação aos cães, especialmente aqueles que não são de raça. E é curioso o quanto é um filme que engana quem acha que vai encontrar apenas mais uma história sobre cão desaparecido passando por várias aventuras, como aqueles que costumavam passar na Sessão da Tarde. Aqui o bicho pega mesmo. Nos dois sentidos do termo.

O filme acompanha a jornada dura de Lili (Zsófia Psotta), que é deixada para passar três meses com o pai, com quem ela não tem muita intimidade. Como ela leva o cachorro consigo, começa a enfrentar uma série de dificuldades de aceitação: não é permitido cachorros no condomínio e no dia seguinte eles acordam com um fiscal da prefeitura informando que é preciso pagar uma taxa para mantê-lo, coisa que o pai não quer fazer de jeito nenhum. Para ele, o mais fácil é largar o cão em algum lugar. E é o que ele faz, para desespero de Lili.

E é tão fácil para o espectador se sentir nos sapatos da garota e também nas patas do cachorro naquele momento. E só em ter conseguido essa façanha, Mundruczó já merece o nosso respeito. Mas há muito mais por aí. Inclusive, cenas bem barra-pesada, que fazem alguns espectadores saírem antes de terminar a sessão, por não aguentarem ver os maus tratos, mesmo que eles não sejam mostrados de maneira explícita, embora bastante perturbadoras.

Assim, o filme segue durante um bom tempo em duas narrativas paralelas que se complementam: a de Hagen, o cão mestiço, tentando sobreviver a essa situação, encontrando, inclusive, outros cãezinhos que levam a vida fugindo da carrocinha e até mesmo de pessoas com intenções piores; e a de Lili, procurando pelo seu amiguinho e ao mesmo tempo também tentando levar uma vida mais ou menos normal, tocando em uma orquestra e experimentando também a maldade de jovens da sua idade.

Assisti WHITE GOD ao lado de um dos mais entusiastas e veteranos cinéfilos da cidade, Wilson Balthazar. E foi muito divertido vê-lo empolgado feito um garoto sempre que Hagen conseguia ir à forra na hora de se vingar de quem lhe fez mal. Mas ao mesmo tempo, não há como não sentir um gosto amargo na boca ao ver a transformação do animal de manso e adorável em uma máquina selvagem de matar. E nisso, o filme encontra similaridades com CÃO BRANCO, de Samuel Fuller, que também trata de racismo, mas de maneira menos alegórica.

Já Mundruczó, trata-se de um exemplo de cineasta que consegue criar imagens de uma beleza rara. E antecipa ao expectador logo no começo do filme, uma das mais impactantes sequências, quando vemos Lili andando de bicicleta em uma cidade abandonada e sendo perseguida por uma orda de cães de todas as raças e cores. A cena é impressionante e parece saída de um sonho. Mas adiante saberemos que essa sequência faz parte da trama deste filme que une a beleza e a agressividade de maneira extraordinária.

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