quinta-feira, março 03, 2016

O HOMEM QUE CAIU NA TERRA (The Man Who Fell to Earth)



Um dos maiores artistas do século XX (e XXI) deixou o nosso plano no dia 10 de janeiro deste ano. Foi um impacto e tanto para os admiradores do trabalho de David Bowie, que durante cinco décadas permaneceu relevante e trazendo sempre novidade e frescor a cada novo álbum, embora possa se verificar, o que é normal, alguma irregularidade na discografia. Mas embora saibamos que sua maior contribuição foi na música, Bowie foi também um artista muito ligado ao cinema. O artista sempre deu muita importância ao aspecto visual, antecipando o que viria a ser uma tendência muito forte a partir dos anos 1980, quando os videoclipes se popularizaram.

Embora ele seja bastante lembrado por seus papéis em FOME DE VIVER (1983), FURYO - EM NOME DA HONRA (1983), LABIRINTO - A MAGIA DO TEMPO (1986), A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO (1988) e em TWIN PEAKS - OS ÚLTIMOS DIAS DE LAURA PALMER (1992), sua estreia como ator no cinema foi bastante representativa do que ele mesmo incorporava em personagens que ele criava no terreno da música. Ele viveu um alienígena que chegou ao planeta Terra em um filme do cineasta inglês Nicolas Roeg, O HOMEM QUE CAIU NA TERRA (1976).

Trata-se de uma ficção científica um tanto perturbadora e que ainda possui muitas das características daquela geração de novos cineastas modernos que ganharam força na década de 1970. Nicolas Roeg, que já havia trabalhado com Mick Jagger em PERFORMANCE (1970) já tinha uma boa experiência de como trabalhar com um grande astro da música no cinema. E Roeg fez um filme enigmático, com uma edição cheia de idas e vindas no tempo e imagens que só completariam o quebra-cabeças ao longo da metragem. Por isso é preciso um pouco de paciência para que o grau de envolvimento do filme alcance o espectador em cheio, lá perto da metade do filme.

Assim como muitas ficções científicas europeias (ou mesmo brasileiras ou de países sem muita tradição no gênero), percebemos em O HOMEM QUE CAIU NA TERRA uma economia de efeitos especiais que costumam caracterizar o gênero. Mas, como a trama se passa mesmo na Terra, isso não chega a incomodar - só em flashbacks vemos o personagem lembrando de sua tragédia familiar, da nave espacial, de seu planeta áspero etc.

Por isso, o filme é mais um drama sobre alguém se sentindo um peixe fora d'água em um mundo hostil, além de mostrar também, tanto a inteligência do protagonista em construir uma fortuna a partir de seu conhecimento científico, quanto sua delicada constituição física para se adaptar ao nosso planeta. A cena dele passando mal no elevador e o posterior socorro da moça do hotel é bem representativa disso e também uma das mais memóraveis.

Aliás, não é difícil para o espectador se sentir um pouco na pele do alienígena disfarçado de homem de negócios. Quantas vezes não nos sentimos estrangeiros no próprio mundo em que habitamos diariamente? Quantas vezes não nos sentimos também frágeis e impotentes diante da crueldade humana ou mesmo da própria inabilidade em lidar com a vida? E embora estejamos diante de uma obra mais complexa em sua estrutura, em comparação com o cinema mais pop exibido no circuito mainstream, ainda assim é possível nos solidarizarmos com o personagem.

Nenhum comentário: