Meu amor e admiração pelo cinema de Paul Verhoeven remontam aos primeiros anos de minha cinefilia. O primeiro filme dele que vi no cinema foi O VINGADOR DO FUTURO (1990), mas, se não me engano, já havia me admirado em casa com o sensacional CONQUISTA SANGRENTA (1985). O que ele fez com INSTINTO SELVAGEM (1992) foi algo por demais marcante. Trouxe para o estrelato Sharon Stone, que, injustamente, nem aparece com o nome destacado no cartaz (há apenas o de Michael Douglas), e também trouxe um tipo de cinema muito ousado no quesito sexo, principalmente dentro das produções classe A de Hollywood.
Claro que houve o aspecto negativo, que foi a proliferação de softcores de suspense baratos e sem graça pipocando por todos os lados. Mas nem vejo isso como um problema. A verdade é que Hollywood voltou a ficar careta quando ele a deixou, depois de O HOMEM SEM SOMBRA (2000).
Porém, o momento agora é de festejar. Enquanto ainda não é possível pensar numa revisão na telona do filme, tomei o cuidado para conseguir uma cópia muito boa em 1080p, em vez de uma revisão em DVD. Mesmo assim, recomendo o DVD da Universal pelos extras contidos no disco 2.
Curiosamente, na época que vi o filme, nem tinha passado pela minha cabeça sua estreita ligação com UM CORPO QUE CAI ,de Alfred Hitchcock, e também em PSICOSE (o picador de gelo, a peruca loira). Apenas o via como um neo-noir mais picante. Se pensarmos no quanto UM CORPO QUE CAI é erótico para sua época (ainda o é até hoje, na verdade), o que temos no filme de Verhoeven é uma atualização para os dias de hoje das relações mais físicas entre os personagens. Logo, por mais que alguém vá reclamar que as cenas de nudez seriam gratuitas, o corpo nu e também a violência gráfica são muito bem-vindos para tornar a apreciação do enredo ainda mais fácil de comprar.
Quando o detetive Nick Curran (Michael Douglas) transa pela primeira vez com a romancista Catherine Tramell (Sharon Stone) e diz para a namorada de Catherine que aquela mulher era a foda do século, era perfeitamente natural que também sentíssemos algo muito parecido, depois da experiência que ele acabara de ter e havíamos presenciado. Não era apenas pelo sexo em si, mas pelo perigo. Aquela mulher seria, muito provavelmente, uma assassina que acabaria com a vida dele enquanto ele estava amarrado na cama. Ou seja, a excitação pelo perigo fazem parte do jogo. Assim como antes foi tão perigosa a perseguição de automóveis nas ruas de São Francisco. Aliás, a cidade é outro elemento que remete a UM CORPO QUE CAI.
INSTINTO SELVAGEM é dessas obras que encantam desde a primeira cena, com a câmera dançando ao redor da cama e também por cima, mas sem revelar o rosto da loira. Enquanto isso, a trilha sonora de Jerry Goldsmith que emula Bernard Herrmann, torna tudo ainda mais belo e mágico, assim como a fotografia de Jan de Bont, parceiro de Verhoeven desde seus primeiros filmes na Holanda.
E o que dizer da cena mais famosa do filme? A da cruzada de pernas? Catherine Tramell usa um um penteado e um vestido branco que remetem mais uma vez a Kim Novak no filme de Hitchcock e, sem calcinha, responde, com a maior tranquilidade do mundo, às perguntas daqueles homens boquiabertos com sua beleza, sua ousadia, seu sex appeal, sua segurança em tudo que diz e faz.
E o que é aquele sorriso de Sharon Stone? Consegue trazer algo de muito forte de uma feminilidade mais agressiva, mas que por vezes traz algo de candura, algo bem próprio da própria mitologia que a atriz acabou criando em torno de si, principalmente a partir deste filme. Então, é muito fácil se apaixonar por ela. Sharon era possivelmente a mais bela das estrelas do cinema americano dos anos 1990. E neste filme ela está no auge, em seu momento mais glorioso.
Há também a trama, bastante intrincada, mas talvez nem tanto assim, já que nesta terceira vez que vi o filme consegui entender o final direitinho. Acredito que, das outras vezes, os hormônios em maior quantidade acabaram por prejudicar um pouco o fluxo de sangue para o cérebro.
Quanto ao DVD lançado em 2011, ele conta com uma entrevista de quase uma hora de Paul Verhoeven. É uma entrevista bem reveladora, inclusive no que se refere à sua relação com Sharon Stone durante as filmagens. A entrevista foi concedida antes da produção de A ESPIÃ (2006), quando o roteiro desse seu retorno à Holanda ainda estava sendo finalizado. Outra coisa interessante nos extras é ver Sharon Stone fazendo teste de algumas cenas. Sempre um prazer vê-la. Outro extra curioso é a transposição de algumas cenas com palavrões para a versão para a televisão. Chega a ser tosca a montagem/dublagem que eles fazem para enxertar uma palavra para substituir a fala original. Pra mim isso foi uma novidade.
+ TRÊS FILMES
A VINGANÇA ESTÁ NA MODA (The Dressmaker)
É um filme todo errado. Vale pela presença, beleza, elegância e brilho de Kate Winslet. Gosto do aspecto meio sujo do ambiente também. Mas a trama é boba, os personagens são burros e a gente não se envolve nada. Ao contrário. Direção: Jocelyn Moorhouse. Ano: 2015.
JOGO DO DINHEIRO (Money Monster)
Queria ter me envolvido mais com este filme. A crise de garganta e o sono acabou atrapalhando um melhor julgamento. Aí não me envolvi com o filme, mas deu pra notar que é bem redondinho. O clima agridoce do final é bem interessante e o pessoal do elenco está muito bem. O cara da série THE AFFAIR já tem cara de mau caráter. Direção: Jodie Foster. Ano: 2016.
A GAROTA DO LIVRO (The Girl in the Book)
Eu achei bem interessante ver este filme menor, de baixo orçamento. Não que esse primeiro trabalho de Marya Cohn seja perfeito. Há vários problemas, e boa parte deles envolve personagens masculinos, principalmente o namorado da protagonista, e o que ela faz. Mas gosto da questão do trauma, do estrago que um sujeito pode fazer na cabeça e na vida de uma pessoa. E o filme se costura bem entre passado e presente também. É fluido. Ano: 2015.
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