É interessante notar uma espécie de gradação que ocorre entre cada filme dirigido por Fritz Lang. Lembremos que seu trabalho anterior havia sido uma espécie de comédia romântica, CASAMENTO PROIBIDO (1938). E por mais que tenha havido certa irregularidade no uso do humor nesse filme, há sim muitos momentos bem-sucedidos e um resultado bastante satisfatório. A VOLTA DE FRANK JAMES (1940), seu primeiro western e também seu primeiro filme em cores, traz um bocado desse senso de humor, dessa suavidade que parecia distante em seus trabalhos anteriores. Ainda assim, em alguns momentos, há algo de mais sombrio neste filme se o compararmos a seu antecessor, JESSE JAMES (1939), dirigido por Henry King.
A VOLTA DE FRANK JAMES é um filme de encomenda da Fox e que teve algumas restrições que o chefão Darryl F. Zanuck impusera. Lang não podia alterar certas partes do roteiro e questionou com o produtor o fato de não poder fotografar em close-up em cores. Lang não entendeu e eu ainda não entendi também, mas talvez tenha a ver com o fato de ser uma nova tecnologia.
Muitas coisas atraíram Lang para aceitar a oferta de dirigir este filme. Primeiramente, ele já tinha bastante interesse na mitologia de um país jovem como os Estados Unidos. Já havia passado um tempo com os índios, inclusive. O western para ele seria o equivalente às sagas e lendas de países mais antigos, como a lenda de Roland, na França, a saga dos nibelungos, na Alemanha, ou a lenda do Rei Artur, na Inglaterra. Os foras-da-lei foram tão romantizados quanto os homens da lei em seu tempo e se tornaram lendas. Aqui no Brasil podemos ter como exemplo também Lampião e outros líderes do cangaço.
O filme começa onde JESSE JAMES termina. Lang usa a cena do assassinato de Jesse pelas costas por Bob Ford como introdução e logo em seguida nos leva a seu irmão Frank, que já estava levando uma vida mais pacata, de lavrador e criador de gado, com um outro nome, junto com seus amigos Clem (Jackie Cooper) e Pinky (Ernest Whitman). Pinky é um homem negro que pertence ainda à era da escravatura e também possui resquícios de uma imagem muito engraçadinha dos negros americanos mostrados em filmes como ...E O VENTO LEVOU, por exemplo. A propósito, fiquei incomodado com o fato de Frank escolher ir atrás dos irmãos Ford para se vingar em vez de livrar Pinky da forca. Mas Lang ao menos lida com isso ao trazer a personagem de Gene Tierney questionando a execução de um homem inocente e funcionando como uma necessária consciência.
E Gene Tierney, no papel da jornalista (ou aspirante a jornalista) Eleanor Stone, é a melhor aquisição para o filme, que traz de volta alguns personagens/atores do anterior, como o advogado de defesa e editor da gazeta da cidade Rufus Cobb, interpretado por Henry Hull. Ele representa aqui, como já representava no filme anterior, o alívio cômico. Ele está excelente nas cenas de tribunal. Aliás, como é bacana ver que Lang estava bastante à vontade nessas cenas, depois de seu trabalho em FÚRIA (1936), em que fez pesquisas cuidadosas sobre como funcionavam as sessões nos tribunais americanos. Nas cenas no tribunal, o alívio cômico também tem a ver com a rixa existente entre sulistas e nortistas, em momento após a Guerra Civil. Nesse sentido, até o juiz se mostra parcial.
É interessante como o filme se esforça para tirar toda e qualquer culpa maior de Frank, que desde o épico de King já havia sido mostrado como o irmão mais moderado, em comparação com as tendências mais explosivas de Jesse. Frank, como vingador, não tem necessariamente que matar o assassino de Jesse. Ele acredita na justiça. Depois é que acaba por tentar se vingar quando vê que a justiça está corrompida. Mesmo assim, até para matar os inimigos, a morte é mostrada sempre como um acidente.
Mas o mais importante é que Lang faz um filme bem mais ágil que King, embora passe mais longe de sua grandiosidade. A VOLTA DE JESSE JAMES parece um filme de menor orçamento, até. Mas é impressionante como continua intenso nas cenas de perseguição a cavalo e de tiroteio. Fiquei particularmente admirado.
Quanto à personagem de Gene Tierney, atriz linda que debutava no cinema e se tornaria uma espécie de deusa dos filmes noir na década de 1940, os produtores até queriam que ela fosse de fato o par romântico de Frank, mas o estúdio ficou temeroso de que a viúva ou o filho do biografado fosse entrar com algum processo. Na dúvida, melhor deixar apenas no ar o interesse amoroso. De todo modo, seria uma bobagem, já que o filme em si não tem muito compromisso com a realidade, brinca mais com a lenda e acrescentando situações que não sujassem a imagem do protagonista.
A VOLTA DE FRANK JAMES deu tão certo que a Fox convidaria Lang para dirigir um outro western, CONQUISTADORES (1941). Falarei deste filme futuramente.
+ TRÊS FILMES
O ORGULHO (Le Brio)
Gosto de como o filme trata de um tema que me interessa, que é o estudo da oratória. Que eu nunca tive e que invejo quem tem esse dom ou essa prática. Pena que o filme se perca achando que o espectador é burro para tirar suas próprias conclusões. Além do mais, em alguns momentos, o texto é fraco. Vale pela relação que se estabelece entre professor e aluna. Direção: Yvan Attal. Ano: 2017.
O CONTADOR (The Accountant)
Não sei o que se passa com Hollywood quando fazem um filme como este. Aliás, até dá pra entender como existe, já que um nome famoso chama outro etc. Mas o resultado é um filme cansativo, com um personagem principal pouco interessante e tramas paralelas também pouco atraentes. Ben Affleck deveria ficar dirigindo, que ele se garante mais. Direção: Gavin O'Connor. Ano: 2016.
TERRA ESTRANHA (Strangerland)
Legal ver as atrizes que saíram da Oceania voltando para seus países de origem e fazendo filmes em lugares desertos, como este aqui. O filme vale pelo conflito familiar, pela trama que se descortina aos poucos e pela boa atuação de Nicole Kidman e do elenco de apoio. Direção: Kim Farrant. Ano: 2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário