sexta-feira, novembro 29, 2013

DOCE AMIANTO























Curiosamente, neste ano de 2013, a quantidade de filmes com temática gay, ou que tangenciam tal temática, aumentou consideravelmente. Além do já tradicional "novo trabalho de Almodóvar", no caso, OS AMANTES PASSAGEIROS, vimos chegar às telas o prestigiado DEIXE A LUZ ACESA, o pouco visto ESSE AMOR QUE NOS CONSOME, o premiado TATUAGEM e agora entra em cartaz DOCE AMIANTO (2013). Até o final do ano, ainda teremos os franceses UM ESTRANHO NO LAGO e AZUL É A COR MAIS QUENTE. Sinal de que boa parte desses filmes não estão restritos a festivais de diversidade sexual.

Mas o mais interessante dessa produção é que há um interesse, antes de tudo, em fazer cinema, acima do interesse em buscar um lugar ao sol dentro de um circuito que reflete uma sociedade ainda preconceituosa. O caso de DOCE AMIANTO, de Guto Parente e Uirá dos Reis, é representativo dessa vontade de fazer cinema. Os personagens, inclusive, embora se vejam como homens travestidos e cheios de purpurina e coisas do tipo, em nenhum momento têm sua sexualidade questionada. Amianto é uma princesa e Blanche é sua fada madrinha. Uma fada madrinha que, inclusive, é dita como uma pessoa morta. O fato de ela ter uma volumosa barba não faz muita diferença para a narrativa, embora seja elemento de estranheza fundamental.

É o caso de filme que tem um senso de humor todo próprio por apresentar as personagens dessa maneira, mas, paradoxalmente, como em vários trabalhos de Pedro Almodóvar, é também um filme que pede a seriedade e o respeito do espectador, já que se trata de um drama sobre uma princesa que foi rejeitada por seu grande amor e, depressiva, encontra consolo em Blanche, que a ajuda a passar por aquele momento difícil.

No entanto, essa pequena sinopse não representa exatamente o filme, já que há uma intenção muito mais de exibir cenários e cores diferentes do que de contar uma história. Ainda assim, um dos momentos mais fascinantes de DOCE AMIANTO, no que se refere à narrativa, é justamente a história dentro da história: Blanche conta sobre um homem que acorda verde e cheio de pintas vermelhas. Esse conto é tão interessante que até chega a eclipsar a narrativa principal, mas serve para reforçar o fato de que aquele conto de fadas está longe de apresentar um final feliz ou a ingenuidade típica do gênero.

Como cinema, a influência mais nítida é a de David Lynch, seja no uso das cores (o azul quando está presente torna o filme mais sombrio e triste), seja no uso dos fade ins e da estranheza. É um passo corajoso dos jovens realizadores do coletivo Alumbramento, sediado em Fortaleza, que aqui constroem também uma música interessante e que dialoga com a narrativa. O que pode incomodar ou pelo menos atrapalhar um pouco a apreciação dos momentos mais poéticos (o filme começa com uma citação de Walt Whitman), especialmente os declamados por Amianto, é o uso constante do falsete por parte da protagonista. Porém, é importante lembrar que se fossem atrizes no lugar de Deynne Augusto e Uirá dos Reis seria um outro filme. Provavelmente menos interessante e certamente bem mais convencional.

Nenhum comentário: