sexta-feira, abril 10, 2009

PRESSÁGIO (Knowing)























"Olhei, e eis que um vento tempestuoso vinha do Norte, e uma grande nuvem, com fogo a revolver-se, e resplendor ao redor dela, e no meio disto, uma cousa como metal brilhante, que saía do meio do fogo. (...) Vi os seres viventes; e eis que havia uma roda na terra, ao lado de cada um deles. O aspecto das rodas e a sua estrutura eram brilhantes como o berilo; tinham as quatro a mesma aparência, cujo aspecto e estrutura eram como se estivera uma roda dentro da outra. (...) As suas cambotas eram altas, e metiam medo; e, nas quatro rodas, as mesmas eram cheias de olhos ao redor."
(Ezequiel capítulo 1, versículos 4, 15, 16 e 18, tradução de João Ferreira de Almeida.)


Esse é um trecho da famosa (ou suposta) descrição de um disco voador, presente no primeiro capítulo do livro de Ezequiel. Recentemente um amigo foi me mostrar uma outra tradução desse capítulo, da Bíblia de Jerusalém, e a tradução não combinava com essa descrição. É o caso de tradução que tenta modernizar a linguagem para os dias de hoje e acaba deturpando os significados. Mas o que tem a ver esse trecho da Bíblia com PRESSÁGIO (2009), filme de Alex Proyas, estrelado por Nicolas Cage? Bom, tem tudo a ver. Pena que a produção do filme resolveu dar uma enfeitada no visual da nave, tornando-a bem diferente de como é descrito na Bíblia. A descrição da Bíblia mais se parece com os discos voadores vistos nos filmes de ficção científica da década de 50. Mas o filme tem uma porção de acertos nesse aspecto, como a aparência final dos "seres viventes" e o seu epílogo, que dá a entender, novamente com mais uma referência bíblica, o real sentido do título original ("Knowing").

Pois é. Deu pra notar que o filme de alguma maneira me impressionou. Bem mais do que eu esperava de mais uma fita envolvendo profecias e de tom apocalíptico. Ainda por cima levando em consideração que a última experiência com o tema foi com o abominável remake de O DIA EM QUE A TERRA PAROU. PRESSÁGIO começa de maneira envolvente, mas despretensiosa: em 1959, numa escola de ensino fundamental nos Estados Unidos, um grupo de estudantes faz desenhos sobre como eles imaginam que será o mundo cinquenta anos no futuro para colocar numa cápsula do tempo que será aberta em 2009. Uma das meninas, porém, em vez de desenhos, escreve, como num transe, uma série de números. Cinquenta anos mais tarde, conhecemos um dos meninos que estuda na escola e seu pai, vivido por Nicolas Cage. No dia da abertura da cápsula, o garoto recebe justamente o envelope contendo os tais números. O personagem de Cage, em casa, descobre que os números são compostos de datas e número de mortos em grandes tragédias da humanidade. Ele, apesar de ser um cientista cético, vê como missão tentar mudar o rumo dos acontecimentos e evitar novas tragédias.

Uma das coisas que eu mais gostei em PRESSÁGIO foi a coragem de o filme ir por um caminho nunca antes percorrido por outro filme do gênero. Pelo menos, não conheço nenhum outro que tenha feito algo parecido. A maioria desses filmes apocalípticos é covarde, exceto talvez os filmes de zumbi de Romero ou OS PÁSSAROS, de Hitchcock. Esse último tem o mérito de não oferecer nenhuma explicação para o evento. Não é o caso de PRESSÁGIO, que segue uma linha mais padrão, mas que segue um desenvolvimento que o destaca dos demais filmes sobre a possibilidade do fim da humanidade. Sem falar que o filme possui pelo menos três sequências assustadoramente belas, sendo a primeira delas, a queda de um avião. E o fato de o filme ligar-se a trechos da Bíblia de forma inteligente também está entre os seus pontos positivos. PRESSÁGIO é o caso de filme que vai melhorando com o desenvolvimento, surpreendendo o espectador aos poucos, até conquistá-lo de vez no final. Sem dúvida, o melhor trabalho do ex-videoclipeiro Alex Proyas, que até já tinha uma curta mas boa filmografia no currículo (O CORVO, 1994; CIDADE DAS SOMBRAS, 1998; EU, ROBÔ, 2004).

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