sexta-feira, outubro 14, 2005

CARNE

 

Pra um cineasta de apenas dois longas-metragens no currículo, Gaspar Noé até que deu o que falar nos últimos anos. Se bem que sua intenção era mesmo aparecer, chocar, causar náuseas no público. Aqui no Brasil, apenas IRREVERSÍVEL (2002) foi lançado comercialmente. O primeiro longa de Noé, SEUL CONTRE TOUS (1998), ainda permanece inédito. Na época da repercussão causada por seu primeiro longa, Noé dava depoimentos bombásticos na imprensa: dizia que seu objetivo era criar um cinema que fizesse oposição ao cinema tradicional francês, que queria fazer um filme que desonrasse a França. Seu filme era carregado de ódio e de energia negativa. 

Tive a oportunidade de ver ontem o curta-metragem que lhe deu a primeira repercussão internacional. CARNE (1991) lhe valeu o prêmio de melhor curta no Festival de Cannes daquele ano e tem tudo a ver com SEUL CONTRE TOUS. É uma espécie de preparatório para o longa. Nesse sentido, Noé me fez lembrar o brasileiro Cláudio Assis, que também é um cineasta que tem a intenção de chocar o público, e que também reaproveitou o enredo de um de seus curtas - TEXAS HOTEL - na sua estréia no cinema de longa-metragem. Não duvido que Assis tenha copiado a cena da morte do cavalo de CARNE no seu AMARELO MANGA, só que trocando o cavalo por um boi. 

Acontece que a cena do açougueiro matando o cavalo em CARNE é muito mais chocante, já que mostra o processo em três estágios: 1) furando a cabeça do cavalo e botando o sangue pra fora; 2) tirando o couro do bicho, deixando só a caveira; e 3) a carne no prato, pronta para ser comida. O termo "carne" se refere justamente à carne de cavalo, que é consumida normalmente na França e dizem ter sabor doce. CARNE é desses filmes que divertem justamente por serem apelativos e chocantes. Em alguns momentos, o filme nos pega mesmo desprevenidos, como na cena do açougueiro atacando o suposto cara qeu estaria paquerando com sua filha. Não dá pra contar muita coisa da história, sob o risco de contar demais, já que é um curta, mas o que posso dizer é que o filme mostra a rotina de um açougueiro de cavalos, que durante anos cria a filha, pois a mãe da menina tinha a abandonado logo após o nascimento. Aliás, outra cena de choque no filme é a seqüência explícita do parto. 

Ainda sobre Gaspar Noé, me arrependo hoje de não ter ido ver IRREVERSÍVEL no cinema. Tinha visto em divx e, como não gosto de rever filmes com um intervalo de tempo curto, acabei não indo ver esse que deve ser uma experiência única, se visto na telona. Qual será o próximo trabalho de Noé, hein? O homem tem uma dificuldade imensa pra conseguir financiamento para seus filmes. Parece que os franceses não gostam nada dele. A maior parte dos críticos da revista Cahiers du Cinéma odiou os seus filmes. Já nos EUA, críticos de renome, como Jonathan Rosenbaum (Chicago Reader), chegaram a considerar SEUL CONTRE TOUS uma obra-prima. P.S.: No site Senses of Cinema, Gaspar Noé está incluído na seção Great Directors. O artigo sobre o diretor está muito bom e há uma boa explanação sobre o chamado "cinema de atrações". 

P.P.S: Agradecimentos ao Fábio Ribeiro, que me forneceu o filme em divx há um tempão.

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