sexta-feira, março 09, 2012

A MULHER QUE INVENTOU O AMOR



O título do filme já é poético: A MULHER QUE INVENTOU O AMOR (1979), realização da fase áurea de Jean Garrett e meu segundo contato com seu trabalho. Por enquanto, acho difícil ver outro dirigido por ele que supere este, que ainda conta com a direção de fotografia de Carlos Reichenbach (também aparecendo num pequeno papel, como professor de inglês), roteiro de João Silvério Trevisan e Aldine Müller no papel principal, uma mulher que muda de face e de comportamento ao longo do filme.

Tanto que para vermos a atriz em seu momento glorioso, precisamos primeiro vê-la despida de produção, como uma simples e iniciante prostituta. E a princípio, o filme parece tratar tão somente do universo da prostituição, um pouco como PALÁCIO DOS ANJOS, de Walter Hugo Khouri. Mas depois vemos que se trata de algo além. Doralice (Müller) passa de prostituta decadente a dama da sociedade, depois que aceita a oferta de viver com um velhinho rico, que mais aprecia a sua beleza e a ama do que necessariamente sente desejo carnal por ela.

Interessante ver o filme nos dias de hoje e notar uma mudança de posturas, de como o Brasil da década de 1970 era machista ao extremo. A ponto de numa cena, por exemplo, em que Doralice toca a bunda de um cliente, enquanto o acaricia, ele logo reclama, dizendo que ali não é lugar para fazer festa. Em outro momento, Doralice, já dominando os homens com a experiência que obteve e com seu jeito estranho e sensual, pede para que o homem que ela ama emita gemidos. E ele acha aquilo muito estranho. Outra sequência: ela fica insatisfeita com um homem que não a faz gozar e chega a humilhá-lo com palavras. E assim ela vai invertendo as ordens, saindo da submissão para a dominação.

Essas e outras coisas mostram o quanto o filme foi ousado em mexer com esses pequenos tabus da sociedade em sua vida privada. Mas o mais importante de A MULHER QUE INVENTOU O AMOR nem está nesse aspecto comportamental, mas na inventividade e na condução da história, bem como no modo como a personagem vai se tornando cada vez mais sombria à medida que sua obsessão por um ator de televisão vai crescendo. E também à medida que seu desejo sexual por algo sempre mais e mais diferente vai sugando-a. As cenas de sexo são brilhantemente editadas por Eder Mazzini, técnico que trabalhou com mestres como Carlos Reichenbach, Walter Hugo Khouri e a dupla Garcia e Martins. É obra para ser redescoberta e divulgada.

Agradecimentos especiais ao amigo Sérgio Alpendre, que fez a generosidade de me enviar esta valiosa cópia. Valeu demais!

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