sexta-feira, julho 30, 2010

TOKYO!



Filmes de segmentos, apesar de já nos deixar preparados para ver um produto irregular, ao mesmo tempo passa a sensação de que estamos pagando para ver três pelo preço de um, quando é o caso de trabalhos como TOKYO! (2008), que conta com três médias-metragens dirigidos por Michel Gondry, Leos Carax e Bong Joon-ho. Cineastas de estilos totalmente distintos envolvidos num projeto que aparentemente só tem Tóquio como elemento comum e um pouco de cinema fantástico em suas histórias. Lembrando que os últimos trabalhos que vi, desses do tipo três em um, foram EROS (Antonioni, Soderbergh e Kar-wai) e AS SAFADAS (Reichenbach, Araújo, Meliande), comentado aqui no blog há poucos dias.

TOKYO! inicia-se com o trabalho de Michel Gondry, o mais pop dos três realizadores. Pelo menos, quando se fala em BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS (2004), quase todo mundo sabe do que se trata. Em seu segmento, intitulado "Interior Design", ele mostra as dificuldades de um jovem casal de conseguir emprego e moradia na grande cidade. Os minúsculos apartamentos de Tóquio não oferecem muito espaço e nem sempre dá pra abusar da boa vontade dos amigos. O casal consegue estadia temporária na casa de uma amiga, enquanto se arranjam. O rapaz tem vontade de ser cineasta. Até tem um filme trash pronto para ser mostrado. Ele curte obras com monstros e efeitos especiais. Mas nada nos prepara para o desfecho do filme, que me pegou de surpresa. É fantástico, é poético e é triste.

"Merde" é o segmento de Leos Carax. É o mais desagradável de ver dos três. E foi bem posicionado no meio. Carax, aproveitando o título de seu filme, faz um trabalho sujo. Não apenas o personagem, mas a fotografia também tem algo de suja. O Sr. Merda é uma espécie de monstro do esgoto. Um homem feio, fedido, com os cabelos estranhos, unhas como as do Zé do Caixão, olhos cegos. E ainda por cima sai atacando a multidão, comendo flores e dinheiro. O filme fica ainda mais bizarro quando entra em cena o advogado do Sr. Merda, que se parece bastante com ele e o único que entende a sua língua. É o corpo estranho num filme que já é um corpo estranho.

O segmento de Bong Joon-ho ("Shaking Tokyo") traz de volta a melancolia, ao contar a história de um "hikikomori", um sujeito que nunca sai de casa. Pode haver desses aqui no Brasil, mas no Japão, ao que parece, há muitos. O protagonista recebe mensalmente o dinheiro do pai pelo correio, fica em sua casa o dia inteiro lendo livros, revistas, dormindo ou satisfazendo suas necessidades fisiológicas, totalmente alheio ao mundo. Aos sábados, ele pede uma pizza por telefone. Nem sequer olha nos olhos do entregador e o ritual continua até o dia em que ele olha para os olhos de uma jovem entregadora de pizza. Um terremoto chacoalha literalmente naquele instante a casa e a vida do rapaz. Belíssimo trabalho de Joon-ho, que encerra com elegância e delicadeza este bizarro trabalho coletivo.

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