terça-feira, maio 05, 2009

SIMPLESMENTE FELIZ (Happy-Go-Lucky)



A alegria e a tristeza são apenas resultados de processos químicos em nosso cérebro? Sendo assim, uma pessoa que é muito falante e alegre não deve ter um distúrbio mental tanto quanto uma pessoa muito reservada e caladona? Mesmo que seja, claro que as pessoas preferem estar eufóricas do que depressivas, certo? Muitos acreditam que não estamos neste mundo para sofrer, mas para sermos felizes. E por mais que digam que a alegria é superficial (enquanto a tristeza é profunda), nos dias de hoje, em que a sociedade vive atacada por paranóias, pânicos e pela depressões, é preciso encontrar um caminho para a felicidade, para a apreciação das coisas pequenas da vida. Aliás, não é preciso: é essencial não encontrar apenas consolações mas algo próximo da felicidade mesmo – se é que isso é possível. Poppy, a personagem de Sally Hawkins em SIMPLESMENTE FELIZ (2008), é naturalmente feliz com sua vida. Não importando a situação difícil em que se encontra, Poppy não esquenta nem mesmo quando, ao entrar numa livraria num belo dia de sol, percebe ao sair que acabaram de roubar sua bicicleta. Até faz um comentário engraçado: diz que nem teve tempo de se despedir da bicicleta. E à noite já está dançando euforicamente numa danceteria com um grupo de amigas solteiras. Inclusive, ela nem liga muito de estar sozinha. Talvez por achar que encontrar alguém é só questão de tempo.

Depois de dois filmes bastante depressivos – AGORA OU NUNCA (2002) e VERA DRAKE (2004) -, o inglês Mike Leigh volta com uma espécie de celebração da vida. Talvez por julgar necessário nesses tempos estranhos em que vivemos. Nem sempre o cinema (ou qualquer outra forma de arte) precisa ser um espelho da vida. Pode-se usar a arte como um meio de resistência, de luta contra a situação vigente, ainda que seja quase nadar contra a maré. Mesmo assim, o filme de Leigh não ignora os problemas vividos pela sociedade atual, apresentando, por exemplo, o personagem do instrutor de autoescola. O cara é mais nervoso do que o meu primeiro instrutor de autoescola, que era um grande pé-no-saco, de tão chato. O tal instrutor do filme é paranóico e está à beira de um ataque de nervos.

Um dos riscos de SIMPLESMENTE FELIZ é o de ser confundido com um filme de autoajuda. Mas acredito que Leigh tem o devido cuidado de distanciar o seu filme de um melodrama, o que, levando em consideração os últimos trabalhos do diretor, não deixa de ser um mérito. SIMPLESMENTE FELIZ também conta com uma fotografia bem colorida, que destoa dos tons marrons e sombrios ou as fotografias esmaecidas típicas da cinematografia inglesa. Até parece que os ingleses resolveram usar novos tipos de lentes. Ou então Leigh tem um carinho especial por seu filme, o bastante pra ter caprichado também no aspecto formal. A beleza da fotografia e o fato de o filme evitar os dias de chuva, privilegiando os dias de sol, passam um ar de alegria e descontração que não se via no cinema inglês desde sei lá quando. Bom seria que essa alegria fosse contagiante e duradoura e um filme como esse tivesse o poder de mudar o mundo.

P.S.: Está no ar um blog especial: O Dia da Fúria, comandado por um time de feras da blogosfera, vários deles, visitantes assíduos aqui do blog. Todo mês eles vão focar num diretor em particular. Acho que o projeto da turma vai ser uma contribuição valiosa para a cinefilia brasileira.

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