segunda-feira, julho 30, 2012

A TERCEIRA MARGEM DO RIO



A gestação de A TERCEIRA MARGEM DO RIO (1994) foi bem complicada. E é uma pena que o resultado tenha sido tão fraco, levando em consideração o fato de que era uma obra bastante perseguida por Nelson Pereira dos Santos. E todas as obras que ele trabalhou com obsessão, como VIDAS SECAS (1963), COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS (1972) e MEMÓRIAS DO CÁRCERE (1984), representam o que de há melhor na filmografia do cineasta. Não foi o caso de A TERCEIRA MARGEM DO RIO, adaptação de cinco contos de Primeiras Estórias, de João Guimarães Rosa, que já era um projeto antigo de Nelson, mas que ele só começou a querer materializar em 1989.

Nesse ano, ele já tinha o roteiro pronto, baseado nos contos "A terceira margem do rio", "A menina de lá", "Os irmãos Dagobé", "Sequência" e "Fatalidade". Em seu roteiro os personagens e as ações desses cinco contos, que são independentes, se reúnem e se interpenetram. O problema foi dar à luz a obra tendo um obstáculo tão grande quanto Fernando Collor de Mello, o homem que conseguiu fazer com o cinema brasileiro em um dia o que a ditadura militar não conseguiu em 21 anos de repressão: destrui-lo completamente.

Era o fim da Embrafilme e 40 projetos de filmes foram atirados na lata de lixo. Além do mais, a primeira parcela do dinheiro que havia sido depositada para a realização do filme de Nelson foi confiscada por Collor e sua ministra Zélia Cardoso de Mello. O lado menos ruim da situação é que Collor não conseguiu fechar o seu mandato: foi expulso em dois anos pelo povo brasileiro com um impeachment. Assim, aos poucos, o cinema brasileiro foi tentando ensaiar seu retorno.

Nelson Pereira dos Santos conseguiu metade do dinheiro da produção com os franceses, que entraram como coprodutores. O problema foi conseguir a outra metade. Foi tudo muito difícil. Após sete anos longe dos sets, Nelson finalmente voltava para filmar A TERCEIRA MARGEM DO RIO em Brasília e em Minas Gerais. Infelizmente o resultado não foi dos melhores e o filme foi bombardeado com críticas negativas. Nelson, em depoimento triste e cansado, chegou a dizer: "Mas consegui terminar o filme. As dificuldades não podem servir para justificar se fiz um filme bom ou ruim. Não teria sentido eu ficar me justificando atrás delas".

Antes de assistir o filme, resolvi ler os cinco contos. Fiquei particularmente encantado com "A menina de lá", pra mim, melhor até do que "A terceira margem do rio", que costuma ser mais incessado. A magia do conto infelizmente não encontra forças no filme, que parece amador, feito de qualquer jeito. Nem parece o mesmo diretor de MEMÓRIAS DO CÁRCERE ali. Dá-se um desconto por causa das dificuldades de produção. Mas há tantos filmes que passaram por infernos nos bastidores e que nasceram belos e poderosos.