terça-feira, outubro 07, 2008

ALBERT LAMORISSE EM DOIS FILMES



Provavelmente o sucesso de A VIAGEM DO BALÃO VERMELHO, de Hou Hsiao-hsien, no Festival de Cannes do ano passado fez com que o mundo voltasse os olhos para o quase esquecido trabalho pré-nouvelle vague O BALÃO VERMELHO (1956), de Albert Lamorisse. Talvez até mais marginalizados que os curtas-metragens, os médias-metragens são até um pouco mais complicados de serem exibidos no cinema. Mas a exemplo do que ocorreu quando da exibição de ANTOINE E COLLETE, de François Truffaut, que foi exibido com outro curta do cineasta, OS PIVETES, O BALÃO VERMELHO teve sua exibição possibilitada por conta da inclusão na programação de outro curta de Lamorisse - ou média, não sei até quantos minutos o filme pode ser considerado curta ou média -, o também premiado, O CAVALO BRANCO (1953). Assim, a distribuidora Pandora disponibilizou para o circuito alternativo esse programa duplo bem interessante que me fez descobrir um pouco da curta obra de um cineasta que até então eu não tinha sequer lido a respeito. Em texto de Luiz Carlos Merten, Lamorisse foi chamado de "o poeta da infância".

O BALÃO VERMELHO (Le Ballon Rouge)

Pascal, o personagem interpretado pelo próprio filho do diretor, é o astro desse colorido e belo filme sobre um garoto que se encanta por um balão vermelho que ele encontra no caminho da escola. Mesmo depois que os adultos tentam barrar a passagem de seu novo brinquedo (no ônibus elétrico ou na escola), o balão fica do lado de fora esperando, com a fidelidade de um cachorrinho. O belo colorido do filme é tão empolgante quanto os efeitos utilizados para fazer com que o balão se comporte não como um objeto, mas como algo com vida. E o diretor leva isso às últimas conseqüências até o final, poético e enigmático. Alguns dizem que o filme é sobre altruísmo e sacrifício (da parte do balão), mas pode ser também sobre o modo como as pessoas, mesmo as que se tornam superiores, são discriminadas pela sociedade: o menino, assim que adquire esse balão que tem vontade própria, passa a ser perseguido pelos outros meninos invejosos, que tentam raptar o balão vermelho de Pascal.

O CAVALO BRANCO (Crin Blanc: Le Cheval Sauvage)

Li por aí que Truffaut não era fã do trabalho de Lamorisse, o que me deixou até surpreso, a julgar pelo modo como ele respeita e vê com freqüência o ponto de vista das crianças e dos adolescentes em seus filmes. Independente de Truffaut gostar ou não da obra de Lamorisse, seus filmes guardam elementos em comum. Em O CAVALO BRANCO, temos uma estória que, assim como O BALÃO VERMELHO, tem pouquíssimos diálogos e se beneficia muito mais das imagens, sendo herdeira direta do cinema mudo – assim como também foi o maior diretor de comédias do cinema francês, Jacques Tati. No entanto, O CAVALO BRANCO tem um narrador, que funciona como um elo de ligação para as crianças. Talvez não mais as crianças dos dias de hoje, que provavelmente não tenham paciência de ver o filme, mas nota-se que a narração tem aquele tom de pai ou mãe contando uma estória para criança dormir. Nessa estória, há um cavalo branco selvagem, o Crina Branca, que se recusa a ser dominado pelos homens. Um garoto, admirado pela beleza e pela força de Crina Branca, tenta domá-lo. E consegue via amor. O cavalo se afeiçoa ao garoto, que em vez de batê-lo violentamente como os homens, trata-o com carinho. O filme, se não tem uma beleza e uma força poética tão forte quanto a de O BALÃO VERMELHO, tem o seu valor e faz um elogio à rebeldia, coisa bastante ousada para um trabalho que também pode ser direcionado ao público infantil.

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