quinta-feira, outubro 06, 2022

HELLRAISER – RENASCIDO DO INFERNO (Hellraiser)



Na época que HELLRAISER – RENASCIDO DO INFERNO (1987) estreou no Brasil, no ano de 1990, eu ainda estava vivendo o meu segundo ano de cinefilia. Então estava sendo muito excitante poder sair do trabalho (eu era estagiário do Banco do Nordeste, naquele tempo) e ir ao cinema para ver alguma coisa diferente. Lembro que a Revista SET havia dado um belo destaque para a estreia de Clive Barker na direção de longas-metragens e por isso eu já estava bastante ansioso para conferir mais essa experiência com o horror. Mesmo assim, fui pego de surpresa com uma obra séria, muito sangrenta e também muito sensual, mesmo com a presença dos cenobitas, que são como demônios de uma região onde o prazer e a dor se confundem, uma espécie de submundo sadomasoquista.

Porém, a presença dos cenobitas no filme, eu diria que é apenas um detalhe, apenas para criar uma mitologia e também conferir à obra cinematográfica um imaginário mais fantástico. O que mais importa mesmo é o renascimento em carne, osso e sangue de Frank (Sean Chapman/Oliver Smith), o sujeito sedutor que havia transado com Julia (Claire Higgins), a noiva do irmão, e conseguido dela um pacto de fazer qualquer coisa por ele. Sem falar que mais à frente veríamos que ele também tem um histórico de ter assediado a sobrinha Kirsty (Ashley Laurence), por mais que não tenhamos flashbacks para saber até que ponto ele chegou.

Frank havia mexido com forças sobrenaturais e sido fisgado (literalmente) pelos cenobitas, tendo seu corpo despedaçado. Passado algum tempo, Julia e seu agora marido Larry (Andrew Robinson) estão de volta à casa onde o corpo de Frank desapareceu. Novamente o que mais me encanta em HELLRAISER é a paixão da personagem Julia por Frank, a ponto de ela trazer para o abatedouro homens desconhecidos a fim de reconstruir o corpo do amado. Não é uma história de amor, na verdade. É uma história de obsessão, de desejo e de enfrentamento do medo. E esse enfrentamento serve tanto para Julia quanto para Kirsty. A imagem do líquido vermelho gotejando no chão em grande escala, na cena em que Larry tem sua mão ferida por um prego, é uma dica do que haverá ainda de muito sangue ao longo do filme. Sangue que ainda ficará presente no corpo sem pele de Frank, ele que pede um abraço da mulher, mesmo naquelas condições.

Na época que vi este filme no cinema fiquei muito impressionado, pois a maioria dos exemplares do gênero dos anos 1980 tinha um grau de comicidade típica da época, o que HELLRAISER tratou de mudar. Além do mais, a chegada de Barker para o mundo do cinema, adaptando seu próprio conto “The Hellbound Heart”, revelou o frescor e a originalidade de sua ficção para um público maior. Pena que suas adaptações cinematográficas não foram tão bem executadas nos anos seguintes, guardadas algumas exceções, casos de O MISTÉRIO DE CANDYMAN, de Bernard Rose, e de sua nova reimaginação/continuação, A LENDA DE CANDYMAN, de Nia DaCosta.

Acho que o pecado de HELLRAISER está em sua conclusão, já que me pareceu pouco imaginativo o modo como Kirsty se livra dos cenobitas, embora seja ótima a cena em que ela os leva para o quarto escuro onde habita Frank. De todo modo, os poucos efeitos de computador que o filme usa, apenas nas cenas com o cubo, ainda muito insipientes, são charmosos em sua imperfeição. O que conta mesmo são os efeitos práticos e de maquiagem do corpo de Frank, que seguem exemplares. Espero que o remake, a cargo de David Bruckner (do ótimo A CASA SOMBRIA), faça jus ao universo fascinante de Clive Barker.

+ DOIS FILMES

SORRIA (Smile)

Caso curioso de filme que manteve o interesse ao longo dos meses com a veiculação do trailer atraente. Uma pena que o resultado seja uma versão bem menos inspirada de CORRENTE DO MAL e com os velhos clichês manjados do gênero, que ainda funcionam quando um cara como James Wan, por exemplo, os utiliza. O mais interessante de SORRIA (2022), de Parker Finn, é a questão do sorriso macabro, que seria o seu diferencial. E há também algumas cenas de horror gráfico que parecem saídas de quadrinhos. Alguns cenas são bem difíceis de gostar, como aquela do louco no sanatório dizendo que a protagonista vai morrer (cena presente no trailer). Há coisas que funcionam bastante, inclusive me dando um baita susto, mas isso se deve também ao uso do som. Há também o problema de o filme se estender por muito tempo, desnecessariamente, e isso acabar prejudicando o que talvez pudesse funcionar se investisse mais na questão do suicídio da mãe da médica. De todo modo, foi bom ver a sala de cinema quase lotada para ver o filme, por mais que o público (eventual) para o gênero costume ser problemático.

A QUEDA (Fall)

Diversão e tensão em cerca de uma hora e quarenta minutos com duas personagens femininas subindo ou passando perigo em uma antena altíssima no deserto americano. A QUEDA (2022), de Scott Mann, é um filme de premissa simples, mas que tem um roteiro bem pensado e clássico, no sentido de que aproveita cada elemento de cena, seja o celular, o pau de selfie, a mochila ou até mesmo um sutiã. Como variação de filme sobre sobrevivência (me fez lembrar CROCODILOS – A MORTE TE ESPERA, inclusive na questão de relacionamentos entre os personagens), A QUEDA se sai melhor do que a maioria, e ainda tem um par de atrizes boas o suficiente para o gênero. Gosto especialmente de Grace Caroline Curry, que faz a Becky, a jovem que perdeu o marido no prólogo. E gosto também do final, que reserva algumas surpresas em um filme que parecia ser fadado à previsibilidade, mas que acaba entregando mais do que se esperaria.

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